Camélias escrita por My Dark Side


Capítulo 6
Você está me vendo?


Notas iniciais do capítulo

Olá, bruxos e bruxas!
Preparados para mais uma aventura? Acredito que vocês gostariam de participar de uma aula de voo... Se não o desejarem, podem apenas levitar com a vassoura pelo campo. Tomem cuidado.
Também vamos fazer uma pequenas excursão pelo porão do castelo, espero que gostem.

Obrigada pelos comentários! E sejam bem vindos os novos leitores!



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Olhei para o céu, estava nublado.

— Gio.

— Hum?

— Demorar para amarrar os sapatos não vai livrar você da aula de voo. — olhei para baixo, vi suas orelhas virarem maçãs de tão vermelhas que ficaram. — Vamos logo que só temos cinco minutos para chegar lá. — ele levantou choramingando, tinha colocado uma presilha para prender o cabelo, tirando a franja dos olhos.

Era a quarta aula de voo, a primeira foi um desastre mesmo, mas as outras só foram um pouquinho diferentes. Agora demorava um pouquinho mais de tempo até que Gio vomitasse, não era mais uma mera questão de minutos, o objetivo da aula de hoje era sobreviver pelo menos por metade do tempo que tínhamos. Um desafio bem grande, já que a madame Hooch colocou em mim e em Derek a responsabilidade de cuidar dele.

— Millè, por favor... — ele continuou de joelhos juntou as mãos. — Vamos faltar hoje. — implorou, os olhos gigantes de gato pidão.

— Não. — respondi irritada, já estava batendo o pé impaciente e ele ainda insistia em continuar enrolando, era pior que eu!

— Isso é uma tortura.

— Quando você menos esperar já serão férias de inverno. — virei a cabeça e propositalmente deixei o rabo de cavalo bater no rosto dele. — Nós temos que ir.

— Você por acaso tomou suco de abóbora? Por que está tão irritada? — eu sabia que ele estava passando a mão na bochecha, estreitei os olhos na sua direção, ele levantou as mãos culpado. — Esquece.

— Nox me acordou no meio da noite, me fez sair escondida para o corujal e estava chovendo. — enfatizei. — Depois Ian decidiu roubar o meu café da manhã: sim, ele me serviu suco de abóbora, Tiel e Salaz decidiram que era um bom dia para testar gemialidades Weasley e os trigêmeos fizeram visgos do diabo crescerem no salão comunal. “Os lufanos são tudo paz e amor, nunca acontece nada com eles, é tudo tão calmo”, pode me dizer qual foi o idiota que falou isso?

Nós dois ficamos chocados com o que acabei falando, molhei os lábios e sussurrei desculpas, ele sorriu entendendo e fomos juntos para a quadra. Papai sempre me disse que quando eu explodia eu parecia a mamãe ou que eu parecia ser mais velha, eu não gostava de explodir, é ruim e pode machucar pessoas, mas... hoje foi bem difícil.

Por que raios o Nox tinha que me acordar para mostrar que Nerus estava com medo dos raios? Será que as outras corujas não deixavam ele entrar para cuidar do filhote? Que malvadeza. Eu tive que fugir do Filch, da madame Nora e do Pirraça, sem contar o Barão Sangrento que cruzou comigo umas quatro vezes, e os monitores noturnos. Foi muito ruim.

E isso é uma coisa que eu não vou contar para a vovó, ela me fez prometer que obedeceria às regras, faria tudo como ela ensinou junto do papai. Pena que eu não consigo fazer isso. Parece algum mal de família, porque eu já ouvi ela falando sobre uma pessoa... “Imprudente” como eu.

— Vamos logo, crianças, todas ao lado de suas vassouras.

— Direita ou esquerda?

— Esquerda. — Gio respondeu.

— Okay, então. — fiquei posicionada esperando a professora dar a permissão de chamar as vassouras, quando o fez, apenas sussurrei, a maneira bateu prontamente na minha mão.

— Você tem que começar a andar para a frente. — disse, inclinando-me. — Então dar a volta. Quer que eu vá junto?

— Não precisa. — riu nervoso. — Eu fico com o pé próximo do chão para andar.

— Então daqui cinco minutos eu faço uma pausa com você. — subi na vassoura e decolei, pude ouvi-lo rir e murmurar algo em francês, fiquei sem entender, no entanto.

Twwik escalou o interior de meu casaco e se ajeitou na minha nuca, ele fazia isso tão regularmente que eu já tinha até parado de sentir cosquinhas com seus movimentos e fazer reflexos involuntários. Só pedia muito que ele não fizesse isso em casa, porque a mamãe sinceramente... não gostaria de saber que tem um bichinho de estimação lá em casa.

Só corujas são permitidas porque ficam na gaiola.

Eu não sei o porquê da gente não ter uma “de família”.

— Olá, ruiva. — Derek trouxe sua vassoura para a altura da minha. — O Gio vai ficar bem sozinho?

— Cinco minutos não machucam. — falei vendo-o lá embaixo voando tão lento que perdia da tartaruga.

— Diversão é igual para todos, só é triste que alguns se sintam mal na vassoura. — o cabelo loiro dele parecia um arbusto espetado.

— Você levou um choque?

— Quase isso. Aula de poções. — fechou os olhos e colocou a ponta da língua pra fora. — Hoje é um dia doce.

— Você é estranho.

— Eu sei. — deu de ombros e fez um zig zag. — Vou descer e falar com o Lelly, até logo, Camil.

Por que sempre cortavam o meu nome? Balancei a cabeça e continuei aproveitando a vista do pátio, era interessante ver as estátuas que circundavam as torres mais próximas e de um ângulo diferente. Uma tinha o nariz quebrado, outra tinha alguns arranhões de feitiços, parecia que sobreviveram a Batalha de Hogwarts. Divaguei até sentir como se algo tivesse batido no meu rosto, isso me fez voltar para a realidade. Arregalei os olhos e respirei pela boca, diminuindo a altura gradativamente, até ficar pouco acima de Gio, que já estava sozinho de novo.

— Oi, Gio.

— Consegui andar direto por cinco minutos, um recorde.

— Sem fechar os olhos? — ele demorou para falar alguma coisa, mas só já ter conhecimento prévio de suas palavras já me fez gargalhar.

— Você é má.

— Só hoje. Posso ser um pouquinho Sonserina?

— Não vejo problemas nisso. Só se você saber que nem todos os sonserinos são maus. — ele olhou para cima, foi só o tempo de eu inspirar que ele baixou o olhar, enjoado. — Nem todos os grifinórios são corajosos, nem todos os corvinais são espertos, nem mesmo os lufanos estão sempre de paz com a vida. Temos características das casas, não somos representantes exatos.

— Isso mesmo. — concordei sonolenta, ouvindo o roncar assoviado de Twwik no meu ombro. — Eu estou com sono.

— Nossa tarde é livre, podemos dormir depois. Fazer uma visita naquele lugar e então ir nos preparar para o jantar. — ouvi a alegria em sua voz, tintilava como sinos.

— Acha que vai vomitar hoje?

— Não. Estou perto do chão o suficiente para conseguir me sentir firme. Não é tão ruim assim quando eu posso esticar e raspar os pés no chão. — ele olhou por cima do ombro para Madame Hooch. — A professora não gosta de insistir para evitar acidentes, mas ela falou para eu tentar um pouco mais até o final do ano.

— Você vai conseguir. — encorajei. — Mesmo com medo, é possível fazer coisas incríveis.

— Isso é verdade. Agora vai voar logo para longe de mim porque eu não aguento ver você sendo preguiçosa.

Quase uma hora voando em círculos, como no aquecimento do quadribol — que por acaso é um esporte incrível — competi várias vezes com Bianca para ver quem avançava mais, ou quem dava mais voltas. O fato de sentir o vento batendo nos pés e o cabelo balançando nos dava uma sensação única. Voar é realmente uma das coisas que eu amaria saber fazer sem magia, sem suporte, só simplesmente e livremente voar.

O Lorde conseguiu conquistar tal habilidade.

— Oi, Nox. — ele batia as asas, acompanhando a velocidade da minha vassoura. — Tem alguma carta?

Obviamente, menina. Tua avó fez questão de responderes.

— Eu pego a carta com você assim que acabar a aula. Não atazane o Giovanni.

Como se eu possuísse tempo para gastar com atitudes imaturas.

Apesar de nós termos feito vários movimentos bruscos, nenhum foi ruim ao ponto de algum aluno cair. Alguns acabaram ficando pendurados e a professora ajudou-os a voltar para a vassoura, enquanto outros simplesmente não conseguiam controlar, fazendo manobras muito estranhas, como se a vassoura quisesse se livrar deles. Era engraçado e triste, pois alguns realmente queriam participar e conseguir, mesmo tendo medo de se tornar iguais as bruxas dos trouxas, aquelas que nas noites de Lua Cheia são vistas passando pelo céu com seus gatos pretos na garupa.

Desci com calma e saltei para o chão procurando por Gio, ele acenou, meio esverdeado e sem equilíbrio, mas estava de pé. Isso que contava.

— Não teve que pousar nenhuma vez!

— É... Ainda assim, voar é horrível. Quando eu crescer vou ir de pó de Flu e trem para todos os lugares.

— Boa sorte com isso.

— Obrigado. Acho que terei que me tornar Ministro da Magia para oficializar as viagens de Pó de Flu.

— Lelly! — uma sonserina gritou correndo até nós. — Nós temos que ir até a sala de poções, se lembra? Depois do jantar temos que resolver a detenção.

— É verdade... — ele choramingou.

Desviei deles sem ser percebida, aproximando-me de Nox que esperava pacientemente numa das estátuas do portal.

A carta.

— Eu sei, eu sei. — repeti. — Mamãe mandou algo?

Ele estivou o pescoço, evitando me olhar. A última coisa que mamãe mandou foi o bilhete no primeiro dia de aula.

Às vezes fazia falta.

Funguei enquanto desamarrava, assim que terminei pude me abaixar e espirrar.

Que Morgana salve-a.

— Graças a Merlin. Vou ter que ir até a Nerus? — inclinei a cabeça. — Ela já...

Quando a vida perecer e as cores descorarem.

— Okay, então no Natal você vai ensiná-la a voar.

Voltarás a sua morada?

Sacudi a cabeça. Algo me dizia para ficar, a não ser que o próximo mês e meio fizesse-me mudar de ideia. Encolhi-me no casaco quando o vento soprou, Nox aprumou as penas e levantou voo. A caminhada até o porão foi calma, a carta da vovó era estranhamente mais pesada que as antigas, quase se tivesse mais papeis. Algumas meninas mais velhas riam no corredor, murmurando algo sobre a terceiranista que ficou com o cabelo cor de rosa por causa de uma poção errada, mais à frente tinha um casal se beijando.

Cheguei no cômodo em que ficava o quadro que nos dava passagem para a cozinha — e que por acaso o nosso monitor contou muito educadamente que isso não nos dava o direito de assaltar a despensa de noite. E no fundo estavam os barris, bem no escuro, quase invisíveis na sombra. Aproximei e me agachei, olhando com o canto do olho para ter certeza de que ninguém estava me observando.

— Helga Lufa-Lufa. — sussurrei, ao mesmo tempo que batia no segundo barril, o ritmo ficava na cabeça depois de algumas tentativas, após passarmos pela primeira vez ficamos meia hora no salão comunal treinando com todos os veteranos, foi muito legal. Ian principalmente nos divertiu contando as histórias daqueles que erraram e ficaram cheirando a vinagre por quase uma semana inteira.

Os barris giraram, se afastando, dando espaço suficiente para que apenas um aluno passasse por vez, assim que atravessei, corri escada abaixo, chegando na porta de madeira que guardava o salão comunal. Espiei por cima do ombro, vendo o portal de volta no lugar entrei. O cheiro das flores me recebeu e fez com que eu esquecesse do motivo de estar tão tensa naquela tarde, alguns alunos estavam apinhados nos sofás, enquanto outros simplesmente estavam de barriga no chão. Helga me cumprimentou erguendo a taça e voltando a sua posição original, ao lado dela os texugos dançavam alegremente na moldura.

— Irmã! — gritou uma secundarista indignada.

— Catherine, se acalme. É somente um jogo. — a mais velha disse, misturando as cartas dos Sapos de Chocolate.

Nesse momento a porta do dormitório masculino se abriu, Ian saiu de lá, seguido de mais um ou dois colegas, seu rosto estava vermelho e parecia que o outro tinha fumaça saindo das orelhas. Eles riram e subiram para o castelo, abri a portinha redonda de madeira que levava ao dormitório feminino, aparentemente fui a primeira chegar. Pulei na minha cama depois de tirar os sapatos, subindo a colcha de retalhos e me encostando nas pedras da parede, a luz era suficiente para que eu não precisasse nem de um “Lumus” nem uma vela, estiquei as pernas, cruzando uma sobre a outra. O envelope estava com as pontas amassadas e o selo com o símbolo da família da mamãe estava quebrado já, implorando para ser lido.

Tirei os pergaminhos de dentro, a carta tinha folhas, inúmeras, coloquei-as do meu lado para pegar o objeto primeiro. Era um... cordão? Parecia ser um cordão ou algo muito parecido, tinha um pingente intrincado, cheio de detalhes, mas estava meio óbvio que era um anel, na verdade. Ele era escuro e parecia um pouco enferrujado, o trançado do metal era muito bonito, no centro tinha a imagem de alguma criatura, mas eu não conseguia reconhecer, era apenas isso que eu via. Teria que colocá-lo depois, não queria acordar Twwik, visto que ele tinha dormido muito pouco nos últimos dias. Coloquei a corrente no pulso e peguei as cartas para ler.

Minha querida netinha,

Vejo que suas cartas estão ficando mais breves e espaçadas, mesmo que você responda todas as que envio, pode me contar se eu estiver exagerando, tudo bem, meu amor? A sua avó só quer o seu bem, e vendo você crescer tanto em tão pouco tempo me dá um aperto no coração, mas me deixa muito feliz. Sempre pensei que falar com você todos os dias como se fosse um bebê fizesse você ficar inocente demais, só depois que você recebeu a carta que comecei a me perguntar se realmente estava certa em fazer isso.

Você contou que tem aula de voo todas às quartas-feiras, está tudo bem? Como foi a aula de hoje? Se me lembro bem, tenho certeza de que seu amigo sonserino faz parte dessa turma, não é? Ele parece ser um amigo muito bom, ajude ele se ficar enjoado de novo, não podemos deixar nossos amigos passarem por apertos desse tipo. Ainda mais que depois de tudo que aconteceu nessas semanas ele deve estar cansado e você também. Afinal, mocinha, que história foi essa de ter recebido duas detenções em menos de dois meses de aula? Não acredito que a diretora McGonagall teve que escrever para mim avisando que a minha adorável neta estava com problemas, principalmente na aula de herbologia! Achei que estivesse gostando do professor. Não pense que o assunto acabou, mocinha, eu tenho que te dar um puxão de orelha ou te deixar de castigo.

Primeiro: seu pai ensinou você como cuidar das plantas, como é que você fez um visgo do diabo crescer em plena luz do dia? Segundo: você tem afinidade com as plantas e não é maldosa, por que você deixou ela se enrolar na sua colega? Terceiro: por que você azarou um colega na sala? Eu não acredito que você tenha feito isso sem ter um excelente motivo, ou estava encobrindo alguém que ficou com mais detenções que isso. Sério, você parece seu pai, não tem como você ser uma encrenqueira.

Mantenha essas duas detenções até o fim do ano senão estaremos sem comemoração do aniversário e sem viagem para lugares novos.

Fui na feirinha no outro dia, Lucia perguntou sobre você, sentia a sua falta na escola, mesmo que ela esteja bem ocupada com o pai com as aulas particulares, ela é uma menina muito engraçada. Mandou lembranças. Você disse que ela se parecia com uma amiga sua do dormitório, não é?

Lembro que você falou que — apesar disso parecer loucura — Madame Norra está viva e ainda cuidando dos corredores, é verdade mesmo? Mal posso acreditar! Eu tenho certeza que quando estudei aquela gata já estava nos corredores, não é possível um gato ter mais de cinquenta anos! Já pensou nisso querida? E se simplesmente um dia nós descobríssemos que ela não é uma gata? Seria legal não seria?

Esse mês tem o Halloween, está animada? Não se esqueça de pedir proteção para seus antepassados. Para você, sua família e seus amigos. E falando sobre família, eu pensei num lugar bem interessante para visitarmos no Natal, mesmo que não seja comum nós comemorarmos. Eu recebi uma carta do seu avô, estranho, não é? Foi tanto tempo sem contato que fiquei muito surpresa quando a coruja pousou na minha janela. Aparentemente, ele mandou muitas mensagens para o chalé desde que seu pai morreu, e sente muito por não ter te conhecido ainda. Você quer passar o natal em casa? Podemos ir até lá, se preferir pode ficar em Hogwarts, é maravilhoso também.

Eu vou visitar o seu avô de qualquer maneira, o St. Mungus não é fácil assim para ficarmos sem contato com a família. Ficar uma temporada em Londres no feriado seria divertido, não? Claro que podemos fazer isso no verão.

Talvez você não se lembre do St. Mungus, mas é o hospital dos bruxos que fica em Londres, seu avô não está doente, ele é médico de lá. Então não se preocupe tanto, tudo fica bem, de uma maneira ou de outra.

Antes que você pergunte novamente se ficar com o seu corvo, não há problema nenhum, ele é uma excelente companhia. Parece um bichinho muito arrogante por sinal, o modo como ele fica nos olhando, eu notei mais porque você não está aqui para amolecer este coração de pedra. Tenho certeza que nossos animais, por mais que seja um tanto fora de expectativas, tem pensamentos e conversam conosco mesmo sem receber respostas.

Acho que isso não faz muito sentido, não é, querida?

Mas o que eu queria dizer para você, meu amor, é para não se preocupar com a sua mãe, por favor. Ela está passando por uma fase difícil sem você aqui, a sua presença durante o ano era muito importante para nós duas. Além disso, você sabe que conversas não são o forte dela, ela te ama, saiba disso. Encontrei ela no seu quarto no outro dia, parecia desolada, vi que você se preocupou com a falta de bilhetes, o fato dela não escrever não necessariamente quer dizer que algo de ruim aconteceu. Lembre-se de que nós duas ficamos surpresas no primeiro dia de aula, a primeira mensagem a ser entregue foi de sua mãe, por isso nunca esqueça que ela se importa muito com você, meu amor.

Você deve estar se perguntando sobre o anel agora, não é? Eu contei várias coisas que aconteceram neste curto período de tempo que passou, mas acabei não explicando a importância desse pequeno objeto que enviei para você.

É um amuleto de proteção, seu pai queria dá-lo quando você fosse para a escola, encontrei quando estava limpando a casa no fim de semana. Engraçado, não é? Por isso demorei tanto a responder sua carta, eu tinha que fazer um resumo e encontrar o significado desse anel para poder te contar. Aparentemente, ele é uma joia de família, herdada da sua outra avó, ela entregou para seu pai e seu pai iria entrega-la quando estivesse pronta. Ele tem a inscrição da família e um feitiço protetor forte que não reconheci, mas sei que é muito importante. Guarde ele com muito carinho, está bem?

Escrevi demais, espero que não fique brava com a vovó.

Tenha uma boa semana, minha querida!

Beijos,

Sua vovozinha.

 

Olhei para a corrente no pulso, o anel brilhou na luz poente.

Acho que teria só mais um mês para decidir entre ficar no castelo e ir para casa no Natal.

Será que valia a pena?

Nox bicou a janela, subi na cama com cuidado para abra-la, ele entrou e pousou na minha mesinha de cabeceira, os olhos escuros me encarando.

Não irás responder?

— Tenho que pensar. — confessei. — A vovó contou que encontrou o meu avô.

Tens certeza de que não deliras? Teu antepassado encontra-se abaixo da terra com certeza.

— Você é mau, sabia disso? — fiquei de joelhos. — Nunca seja grosseiro desse jeito com alguém. — sussurrei.

Enganas-te se pensas que pode controlar-me.

— Só quero que você tenha mais respeito com aqueles que estão à sua volta. Não entende? — ele inclinou a cabeça, procurando algo.

Teu amigo agitado possui sono de trasgo.

— Sim. Agora, por que você não vai fazer amigos na plantação de abóboras? — exclamei com a doe e colo coloquei as costas da mão na boca. — Por que me bicou?

Desrespeitar os nobres traz punição.

— Só falei para ir brincar!

Com um bando de criaturas sem razão.

Passei as mãos nos cabelos puxando-os para trás.

— Vai ver a Nerus, tenho que terminar a tarefa de Transfiguração, falo com você depois. Agora sai daqui. — dei batidinhas na parte debaixo de sua cabeça. — Vai, vai.

Ele bateu as asas, derrubando algumas penas, mas conseguiu sair sem problemas, ainda assustou alguns alunos que passavam perto das paredes do castelo sem ter ideias de que tinham janelas rentes ao chão. Ri com isso, era sempre engraçado de ouvir esses acontecimentos.

— Você estava falando com alguém? — Sally perguntou, apertando os cabelos crespos na toalha. — Eu ouvi vozes.

— Só a coruja que veio entregar uma carta. — respondi, fechando a janela. — Elas podem não responder, mas parece que fazem caretas dependendo do que a gente fala.

— Isso é verdade. — ela disse sorrindo. — Sua avó mandou de novo?

— Sim. — respondi, guardando todos os papéis na gavetinha. — Você estava no banho?

Ela assentiu e deitou na cama depois, abrindo o livro de transfiguração para ler. Encostei a cabeça na parede depois de me recostar de novo e fechei os olhos. Twwik ainda dormia profundamente, também queria tirar um cochilo, os últimos dias pareceram mais desgastantes que o normal, acho que é um efeito dos trabalhos feitos até tarde. Acabo sempre fazendo a tarefa só depois da meia noite e por causa disso eu vou dormir tarde demais. Já perdi a conta das vezes que acordei quando o sol estava nascendo com a colcha ou casaco de alguém nos meus ombros. Livros eram bons travesseiros, mas dormir curvada sobre a mesa de chão do salão comunal causava dor também.

— Pss. Psiu! — sibilaram, levantei a cabeça, dois olhos azuis grandes e opacos me encaravam. — Você está me vendo?

— Sim... Por que pergunta? — franzi as sobrancelhas e tombei a cabeça bocejando. — Quem é você?

— Eu só precisava saber se você conseguia me ver. Eu não consigo te ver, então não é muito importante você saber quem eu sou. Assim como eu não sei quem você é. — ele sussurrou, era um garoto da minha idade.

— Você não está falando coisa com coisa... — choraminguei cansada.

— Vem comigo. — ele segurou minha mão. — Você precisa saber quem eu sou.

— Por que isso importa? — resmunguei, mas deixei ele me arrastar, levantei cambaleando e ele praticamente corria comigo. — Você disse que não precisávamos saber um do outro.

— Mas agora eu sei quem você é, você precisa saber quem eu sou. O papai está com problemas. — nós entramos num nevoeiro, logo senti sua mão deixar a minha e fiquei parada, perdida no meio do nada.

— Ei! Cadê você? — virei de um lado para o outro até ouvir um relincho, caminhei naquela direção. — Menino cego?

Uma clareira quase vazia, tinham dois unicórnios no centro, o bebê tinha o pelo dourado e relinchava alegremente, o mais alto, branco e cintilante, respondia com doçura. Ouvi uma risadinha, quando olhei para baixo vi uma criancinha, muito mais nova que eu, ela tinha os cabelos bem loiros, mas pareciam estar ficando mais escuros, seu sorriso era familiar, parecia que eu tinha encontrado ela em algum lugar ou conhecia uma pessoa muito parecida com ela. Quando ela me viu, minha boca se abriu e eu vi a semelhança.

— Shiu... Eles vão nos ouvir. — ela apenas fez os sinais e fez as palavras sem som, dei um passo para trás e depois outro, no terceiro eu apenas senti o meu corpo cair.

Não sei se demorou, só sei que tudo ficou mais escuro, esverdeado e repleto de bolhas e fitas dançantes que se enroscavam nos meus braços e me puxavam para baixo. Eram firmes, mas escorregadias. Largas, porém finas. Meu peito se apertou e senti como se estivesse ficando dormente, sem poder me mover. O medo cresceu e cresceu, até que chegou um ponto em que gritei chorando, eu estava com medo.

— Camillë, Camillë! — sacudiram o meu ombro, pulei de susto e me abracei, respirando fundo como se realmente tivesse caído. — Está tudo bem? Você gritou. — Bianca me olhava preocupada, o dormitório já estava alaranjado.

— Foi... foi só um pesadelo. — murmurei olhando ao redor procurando as outras.

— Elas foram jantar. — respondeu à pergunta que estava na minha cabeça. — Você parecia estar precisando dormir então falei que acordaria você quando eu fosse subir. — abaixei a cabeça e agradeci. — Disponha. Vamos?

A segui sem trocar nenhuma palavra durante a caminhada, passamos pelo salão comunal, cruzando com alguns alunos mais velhos e subimos, passando sigilosamente pelos barris. Um grupo de meninos estava na frente da porta da cozinha, batendo no quadro e trocando ideias entre si, Bianca se aproximou deles.

— O que estão fazendo? — ela perguntou com a voz transbordando de curiosidade e simpatia.

— Oh, oi, Bia. — um garoto falou envergonhado. — Estamos... estamos tentando descobrir a senha da cozinha.

— Está na hora do jantar, por que vocês não tentam descobrir isso depois?

— Porque eles querem descobrir agora. — falei desviando os olhos. — Não tem quase ninguém aqui, é a melhor hora para fazer isso. — argumentei.

Os garotos ficaram num silêncio surpreso, mas ouvi eles confirmarem logo depois. Foi o suficiente para eu continuar andando, seguindo meu caminho para o jantar como se fosse o último. Senti Twwik se remexer na minha nuca, esticando os braços, se alongando como quem tinha acabado de acordar, sabia disso porque suas garrinhas arranharam a pele de novo, isso sempre acontecia.

— Boa noite, Mêlli. — ele me cumprimentou. — Fazia tempo que eu não dormia tão gostoso. — disse feliz então escalou para fora da minha camisa e se sentou no meu ombro. — Tudo bem? Você também dormiu, não foi?

— Pesadelo. — murmurei. — E um sonho que eu não tenho ideia do que era.

— Hum... — ele resmungou. — Acho que hoje tem peixe.

— Isso foi meio aleatório.

— Não tenho culpa. Faz tempo que eu não como peixe. São gostosos.

Acabei me distraindo no corredor e perdi o rumo, acabei passando por dentro de um dos fantasmas sem querer. Foi... estranho, é como passar por um véu leitoso e gelado. Passei as mãos no meu braço para aquecer e pedi desculpas, o Barão Sangrento apenas me encarou, o rosto sem expressão alguma e os olhos duros. O medo veio e me fez tremer. Senti uma voz, quase que uma lembrança sussurrar várias e várias vezes na minha cabeça quando corri para o Salão Principal.

“A maldição será eterna. ”


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado.
Gostaria de saber se vocês tem ideias do que pode acontecer, ou se os sonhos tiveram algum significado.
Até logo!



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