A pior das prisões escrita por Martins


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Fiz correndo, então me desculpem.Boa leitura.



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Minha cabeça dói. O chão está gelado. Meus olhos demoram para se abrirem, mas quando abrem posso perceber a situação em que me encontro. Me levanto aos poucos, assustada óbvio. Olho para os lados e tudo o que vejo é um enorme lugar espelhado. Meio assustador isso, mas era real. Os espelhos refletiam meu reflexo por metros de distância. Uma garota jovem, 16 anos, branca, um pouco baixa, com olhos e cabelos castanhos escuros. Ficava até perdida por essa imensidão de reflexos. Vejo um grandioso espelho pendurado, ou até mesmo flutuando, já que não consigo enxergar nenhuma corda o segurando. Era o mesmo espelho que recebi como presente de aniversário, por um anônimo. Grande, com pontas levemente curvadas e uma moldura dourada muito chamativa. O engraçado é que quando me aproximei, não vi meu reflexo nesse espelho. Achei que era impossível ficar mais assustada do que estava. Meus olhos começaram a lacrimejar. Olhei fixamente para o espelho, e como se fosse um movimento de águas, ele refletiu o meu quarto. Vejo meus pais entrando correndo à minha procura. Eles gritavam: “Amélia! Amélia!”, mas não me enxergavam. As lágrimas rolaram sobre meu rosto e enfim eu gritei: “Aqui! Eu estou aqui! Por favor, olhem para mim... eu estou aqui...”, mas ninguém me escutou. Não aguentei tamanha emoção e meu peso caiu sob minhas pernas, e acabei me sentando no chão e chorei por longos minutos.

Esse pesadelo havia começado um pouco antes, no meu aniversário. Eu estava muito animada, afinal estava completando 16 anos e isso era muito importante para mim. Pelo menos foi isso que as outras garotas colocaram em minha mente. Eu sempre achei que estava completando 16 anos, e não “evoluindo”, como as garotas falavam.

Eram 06:00 da manhã, e eu ainda estava na cama. O despertador logo toca com um barulho infernal. Me levanto e vou tomar uma ducha. Sou dessas pessoas que penso na vida enquanto estou sobre as águas mornas da ducha. Fico assim por alguns minutos, mas logo volto em mim e termino de me enxaguar. No meu quarto, pego uma roupa simples, uma camisa branca, uma calça jeans azul, e meu amigo de sempre, o all star preto. Depois de me vestir, desço as escadas de minha casa e vou para a cozinha tomar café.

–-Bom dia aniversariante! –fala uma simpática mulher com uma jarra de café nas mãos, era minha mãe.

–-Bom dia mãe. –falo revirando os olhos e dando um beijo no rosto dela.

–-Preparei um ótimo café da manhã pra você. –diz ela colocando um pouco de café em uma xícara, e pegando alguns pãezinhos com requeijão.

–-Obrigada. Hum, cadê o papai? –pergunto olhando para os lados.

–-Ele teve que sair mais cedo hoje. –ela responde colocando algumas frutas sob a mesa e um pouco de iogurte.

–-Alguma prisão a ser feita ou algo do tipo? –pergunto.

–-Não. Só o chamaram mais cedo mesmo. –ela me responde se encostando na pia da cozinha.

Mordo mais um pedaço do pão, e tomo um gole de café. Me levanto, pego minha mochila e dou um beijo em minha mãe.

–-Tenho que ir por colégio. Até depois. –falo andando em direção à porta.

–-Thau. Tome cuidado! –ela me adverte.

–-Ok! E nada de festa hoje! –falo saindo de casa e correndo para pegar o ônibus.

Fico ali no ponto por uns três minutos e logo o veículo chega. Entro, passo a roleta e me sento ao lado de um menino. Josh.

–-Feliz aniversário! –fala ele tentando me abraçar.

–-Obrigada. –respondo.

–-Então, que horas vai ser a festa? –ele me pergunta.

–-Não vai ter festa. Já deixei isso bem claro. –respondo brava.

–-Calma. Paz e amor. –ele fala rindo.

Josh tira de sua mochila um pequeno urso com o meu nome escrito. Ele me entrega e eu sorrio.

–-Que fofo. Obrigada. –digo.

–-Sei que não é muita coisa, mas espero que goste. –ele diz constrangido.

–-Tá de brincadeira? Eu amei. Obrigada mesmo! –falo dando um beijo em sua bochecha.

Logo chegamos na escola e muitas pessoas vieram me cumprimentar.

–-Nossa. Quanta gente. –falo.

–-Você é popular. Todo mundo gosta de você. –fala Josh rindo.

–-Para! –falo dando um tapinha em seu ombro.

–-Olha só quem vem lá. Saindo daqui. –fala Josh se afastando de mim.

Olho para minha frente e vejo Caio, meu namorado. Tá certo que começamos a namorar à duas semanas, mas eu sempre o amei, desde o primeiro dia em que o vi nessa escola. Quando ele ainda era novo, eu vivia olhando para ele e imaginando nossas vidas perfeitas, um ao lado do outro, e como “quem espera sempre alcança”, agora estamos namorando.

–-Olá. –ele fala beijando meu rosto.

–-Oi. –respondo.

–-Sonhou comigo esta noite? –ele pergunta.

–-Claro que não, seu bobo. –eu respondo timidamente.

–-Então tá né?! Tenho uma surpresa pra você. Fala ele retirando dois papéis do bolso.

–-Qual? –pergunto.

Ele me mostra os papéis. Eram duas entradas para o show de NX Zero. Naquele momento pulei de alegria e dei um beijo em seu rosto.

–-Obrigada, obrigada, obrigada! Quando será? –pergunto tentando conter a emoção.

–-Semana que vem, mas tá valendo como presente de aniversário. –ele responde.

–-Obrigada mesmo Caio... –falo sorrindo, mas com um pouco de lágrimas nos olhos.

–-Não vai chorar não é mesmo? –ele diz enxugando uma lágrima que havia caído.

Tudo o que simplesmente faço é lhe dar um abraço.

O dia passa muito rápido, voando até. E logo no final da tarde, depois que as aulas terminaram, fui embora para minha casa. Logo quando fui entrando, percebi algumas caixas embrulhadas, eram presentes.

–-Eae maninha! Já viu quanto presente você ganhou? –fala meu irmão Jean, me dando um baita susto.

–-Tô vendo. Mas de quem tanto são esses presentes? –pergunto.

–-Família e amigos. Agora aproveita porque 23 de julho não dura pra sempre. –fala Jean indo em direção à cozinha.

Olho bem os presentes. Tinha tanta coisa boa. Mas me deparo com um embrulho encostado na parede. Não havia inscrições de quem havia me presenteado com aquilo. O pego e o abro, era um espelho médio com pontas levemente arredondadas, e uma moldura dourada muito chamativa. Decido levá-lo até meu quarto. Lá, o penduro na parede e vou tomar um banho. Minutos depois, me visto com um vestido rosado e uma sapatilha branca. Tinha que ficar bonita, era meu jantar de aniversário. Estava tentando secar meu cabelo com o secador, e quando enfim consigo, fico me olhando naquele espelho. O toco suavemente, e sinto como se tivesse tocado na superfície de um lago. Me assusto. Então o toco novamente, mas dessa vez, uma escuridão toma conta do ambiente, e eu sinto uma força me puxando em uma direção, e é a partir daí que meu pesadelo começa...

Eu ainda não acreditava que estava dentro do espelho, achava que tudo isso não passara de um sonho, mas era real de mais. A polícia estava no meu quarto, vasculhando, procurando pistas para me encontrarem, mas eu estava à frente deles.

Olho para a parede e percebo que o calendário está marcando 13 de setembro, sendo que meu aniversário foi em julho. Já tinha se passado muito tempo desde que tudo isso aconteceu, e para mim foram apenas algumas horas. Aquilo estava sendo muito doloroso, apenas observar as outras pessoas. A polícia finalmente vai embora sem nenhum sucesso. Mas meus pais e meu irmão continuam no quarto.

–-Amélia, onde você foi se meter? –minha mãe chorava angustiada.

–-Seja lá onde ela estiver, tomara que ela esteja bem. –diz meu pai abraçando minha mãe.

–-Será que vocês não percebem? Ela está morta! Não há nada que possamos fazer! –grita Jean.

–-Não! –minha mãe cai em prantos.

–-Isso é jeito de falar com sua mãe? –grita papai.

–-Caem na real. Aceitem que ela está morta. Desde que ela foi adotada, ela tem sido a queridinha de vocês, e esse foi o maior erro de vocês! –grita Jean saindo do quarto.

Eu... Eu sou adotada? Essa hipótese nunca havia passado antes em minha cabeça. Mas por que eles esconderiam isso de mim? Esse fato da minha vida é muito importante. Me sinto traída agora. Acho que meu dia não pode piorar, mas eu estava errada.

Josh estava no meu quarto dessa vez, estava chorando. Eu sentia a mesma dor que ele. Eu queria poder dizer um “adeus” à ele, ou um “obrigado” por me ajudar nas horas mais difíceis. De repente meu irmão entra no quarto também. Os dois se olham e se beijam. “Jean? Você é gay? Josh, por que não me contou que tinha um caso com meu irmão?” me perguntei. Eu não acreditava no que meus olhos estavam me mostrando, mas era bem real. Não havia nada que eu pudesse fazer.

Mais alguns dias se passaram, e pude ouvir uma discussão.

–-Você é uma vergonha para nossa família! –grita papai.

–-Por quê? Só porque sou gay? Isso não tem nada haver. O que vale é o caráter! –grita meu irmão.

Meu pai da um tapa em sua cara.

–-Aprenda a gostar de mulheres. –ele diz indo embora.

–-Amélia. Onde você foi se meter? –se perguntava meu irmão.

–-Eu estou aqui meu irmão. –falo.

Jean sai dali, mas volta rapidamente com uma mochila em suas costas.

–-Vou fugir, com Josh. Não sei se isso vai dar muito certo, mas eu quero achar a minha felicidade. Me deseje sorte irmãzinha. –diz ele saindo do quarto.

–-Que a sorte esteja com você. –digo sem resposta.

No dia seguinte, Caio foi até minha casa e pediu o espelho para si, como objeto que o lembraria de mim. Claro que minha mãe o deixou levar. Ele o levou até seu quarto e o pendurou. Estava muito contente em estar no quarto do meu namorado, ou ex até uma pequena surpresa. Lívia, uma garota popular da escola, foi visitar Caio, e nisso os dois já foram para o quarto se beijando. Era bem nojento, já que eu nunca tinha dado meu primeiro beijo em Caio. Aquilo foi muito humilhante e decepcionante. A situação só piorou quando os dois transaram na minha frente. Os dois corpos se esfregando um no outro, a sensação era horrível. Depois da cena de sexo dos dois, eu simplesmente não tinha mais estômago para aguentar novas emoções. Foi aí que em um dia, eu estava observando Caio trocar-se de roupa, mesmo depois de tudo o que acontecera com ele e Lívia, eu ainda o amava. Por que quando a gente ama alguém, esse amor não pode simplesmente desaparecer. Ele pode ser guardado ou transformado em ódio, raiva, rancor. Mas eu ainda o amava e esse amor me consumia. Eu o observava quando ele olhou no espelho e se aproximou, parecia que ele estava olhando em meus olhos, foi muito profundo. Tocamos o espelho no mesmo lugar, no mesmo instante.

–-Amélia? –ele pergunta em voz alta.

–-Caio. Sou eu. Eu estou aqui! –grito inutilmente.

–-Amélia! –ele grita e sai correndo do quarto.

Me assusto com essa atitude. Mas horas depois me assusto mais ainda com a cena que eu vi. Caio correu pela casa inteira gritando que eu estava viva. Sua mãe achou que ele estava ficando louco e decidiu interná-lo num hospital psicológico. Aquela ação realmente me entristeceu.

Fiquei semanas ali. Esperando que ele voltasse. Até que um dia ele voltou. Alegrei-me imensamente com sua chegada.

Ele veio até o espelho e o olhou. Eu ainda tinha esperanças de poder me comunicar com ele. Mas tudo o que aconteceu, foi um pano preto sobre o espelho que ele colocou, tapando minha visão. Chorei mais um pouco, mas pensei “O resto da minha vida vai ser assim?”, e talvez poderia ser, sozinha naquele lugar tenebroso.

Até que um dia, um vento que passeava no quarto de Caio, derrubou por “engano” o pano que cobria o espelho, tornando minha visão possível outra vez. Olhei aos lados, a procura de Caio, foi quando ele entrou no quarto e deu de cara com o espelho. Ele olhou bem, e colocou o pano novamente sobre o espelho.

–-Se ela ainda está ali dentro, tenho que falar com ela. –diz Caio baixinho.

Ele retira o pano e olha fixamente para o espelho. Suas mãos tocam suavemente aquela superfície, e eu faço o mesmo. Ele fechou seus olhos por um instante e falou: “Amélia.”, quando os abriu, viu minha imagem embaçado.

–-Amélia! –ele gritou.

–-Caio. –falei sorrindo.

Lágrimas escorreram de nós dois. Um fato aconteceu, minha imagem estava desaparecendo, e nos assustamos.

–-Um beijo. –eu pedi.

Foi nesse momento em que encostamos nosso lábios no espelho, mas sentimos como se realmente estivéssemos nos beijando. Depois disso, tudo o que se pode ouvir, foi um trinco. Caio se afasta e percebe pedaços do espelho espalhados pelo chão.

Eu acordo.


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Notas finais do capítulo

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