Infinito escrita por The Escapist


Capítulo 25
23. Wicked game


Notas iniciais do capítulo

Está fofo



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A última semana do mês era sempre um pesadelo para todo mundo. Além do fluxo maior de clientes no banco, havia as metas. Não era incomum chegarem aos últimos dias tendo alcançado apenas cinquenta ou sessenta da meta mensal, tampouco era incomum que fossem cobrados para batê-las. Na reunião da manhã Inácio fora questionado por que ainda não tinham chegado a noventa e cinco por cento da meta mensal, como seria considerado satisfatório. Infelizmente ele não conseguiu explicar — ao menos não conseguiu dar uma explicação realmente boa. O que poderia dizer? A equipe estava trabalhando com força total, mas nem mesmo a campanha promocional que premiaria os melhores funcionários parecia dar resultados.

Ele e os outros três colegas assistentes de negócios do segmento pessoa física, saíram da reunião com a missão de reverter aquele quadro. Como? Perguntavam-se mentalmente, e a resposta silenciosa dos diretores da empresa parecia dizer: “se virem”. Não que isso fosse uma novidade, “se virar” era algo que eles faziam com muita frequência ali.

Estava a caminho de ir falar com Isabella, talvez ela tivesse milagrosamente conseguido vender alguns seguros residenciais e aplicar uns vinte milhões de reais em LCI — vinte milhões daria para o gasto, pensou Inácio, tentando manter o bom humor mesmo diante de uma crise. Reparou que Isabella estava esbravejando com alguém ao telefone e ficou de repente feliz por não ser o alvo da ira dela dessa vez.

— Então o senhor vá para a puta que o pariu — ela disse, grosseiramente, e desligou o telefone. Inácio desejou sinceramente que aquele tratamento não estivesse sendo direcionado a um cliente! — Eu vou matar aquele maldito!

— Isabella, por que você não se acalma um pouco? — ele ponderou, olhando discretamente para os clientes que aguardavam atendimento. Felizmente Isabella conseguia manter-se discreta mesmo quando mandava pessoas irem à puta que pariu pelo telefone.

— Se acalmar é o caralho — ela respondeu, moderando o tom de voz. — Aquele mecânico desgraçado pediu uma semana pra consertar meu carro, e já faz mais de um mês. Um mês!

— Ok, isso é realmente chato, querida. Mas antes de matar o seu mecânico, eu preciso que você fique calma e consiga alguns negócios pra gente, porque nós estamos muito fodidos. — Ele sorriu para disfarçar o palavrão, já que tinha gente ali por perto. Conversou por mais uns cincos minutos com Isabella sobre algumas estratégias de cross selling(1) para tentar alavancar os resultados do segmento empresa.

— Se eu conseguir essa aplicação você poderia me emprestar o seu carro até que o meu fique pronto, já que você mal o usa... — Isabella sugeriu. O mau humor tinha diminuído e ela estava mostrando o dossiê de um cliente com quem teria uma reunião logo mais.

— Amor, se você conseguir essa aplicação, meu carro será seu.

Mais tarde, naquele mesmo dia, Inácio foi levá-la em casa. Isabella conseguira, de fato, fechar contratos importantíssimos com o cliente, mas o liberou de pagar a aposta. Primeiro porque podia “obrigá-lo” a ir buscá-la e deixa-la em casa até que seu carro saísse da oficina. Em segundo, Inácio podia não ser maníaco por carro como alguns homens eram, mas ainda era um homem e ela podia ver o ciúme que ele sentia daquela BMW.

— Um carrão desse na garagem e você prefere pegar o metrô? Não te entendo! — Ele balançou a cabeça e riu. Nem se deu ao trabalho de explicar de novo os motivos, ela continuaria sendo chata.

Havia duas razões principais pelas quais não usava o carro tantas vezes: a primeira era que nem sempre valia a pena passar pelo estresse do trânsito. Ele morava a menos de trinta de minutos do trabalho, mas se o tráfego estivesse intenso — o que geralmente acontecia—, poderia demorar mais de duas horas para chegar; com o metrô gastava vinte minutos apenas. A segunda razão era que não gostava de ostentar. Jamais teria comprado um carro de luxo com o seu próprio salário — ainda tinha que ralar muito para chegar a isso —, a BMW fora presente do pai, o último antes dele morrer. Claro que numa cidade grande havia centenas de carros importados, mesmo assim, ele preferia ser discreto e não manter uma rotina tão rígida quando aos seus hábitos.

— E que música é essa que você tá ouvindo? — Isabella estava mexendo no player do carro, fazendo careta para a playlist dele, a qual ela chamou de brega. Quando ele começou a cantarolar a letra, ela fez um gesto de quem ia vomitar. A música em questão era Wicked Game, de Chris Isaak, um hit dos anos 1990.

The world was on fire and

No one could save me but you

It's strange what desire make foolish people do

I never dreamed that I'd meet somebody like you

I never dreamed that I'd lose somebody like you

— Você agora manda nas músicas que escuto? — ele reclamou quando ela baixou o volume. Ainda estava fuçando à procura de uma música melhor para ouvir.

— Você deveria me agradecer por tentar melhorar o seu gosto, meu bem.

— Aham! Isso de quem escuta BackStreet Boys como se ainda tivesse quinze anos. — Ela lançou um olhar furioso para ele e tornou a aumentar o volume. Entre a música piegas e ele sendo engraçadinho, preferia ouvir a música. — Eu te amo, sabia? — ele falou, sobrepondo a voz à música.

And I wanna fall in love

Isabella assentiu, sorrindo.

— Aham, obrigada. — Ele balançou a cabeça. O jeito durão e a teimosia de Isabella eram provavelmente as coisas que ele mais amava nela. Além do senso de humor, inteligência, a bondade. — Eu também te amo — ela falou, despretensiosamente, no mesmo tom que usaria para dizer “me passa a manteiga”. Entretanto o efeito disso em Inácio foi tão devastador que ele quase avançou o sinal vermelho. — Agora para de ser lerdo.


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Notas finais do capítulo

(1) A quem interessar possa, cross selling (venda cruzada) é uma estratégia de mercado que consiste em vender mais de um produto a um mesmo cliente, num pacote. Por exemplo, se você abre uma conta corrente e contrata junto um crot e um cartão de crédito. Cross selling é totalmente legal, oposto a venda casada, que significa condicionar a compra de um produto a de outro. tipo, se você abrir uma conta corrente e alguém te empurrar o cartão de crédito. ehehe.



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