Infinito escrita por The Escapist


Capítulo 1
Um história pra contar


Notas iniciais do capítulo

Eu não conhecia a música, de modo que usá-la como inspiração do capítulo foi difícil, mas eu acabei gostando do resultado. Não sei o que acontecerá nos próximos capítulos, já que tudo depende da música do dia. E isso é que o mais legal desse desafio. Espero que, se alguém estiver lendo, divida comigo sua opinião. É importante para a autora. As partes em itálico são trechos da música. By the way "pra sonhar" pertence a Marcelo Jeneci.



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Quando acordou na segunda-feira, atrasado como sempre, a última coisa que passava pela cabeça de Inácio era um relacionamento. Não, estava vivendo muito bem sozinho e não tinha a menor pretensão de mudar isso. Por que mudaria? Nunca dera sorte com essas coisas mesmo, então não via motivo para insistir.

Ele se vestiu em tempo recorde — uma das grandes vantagens em ser homem é que não precisava gastar horas se arrumando, pensava. Saiu do quarto arrastando os pés, carregando a preguiça do mundo inteiro nas costas. Tudo que queria, de verdade, era ficar ali deitado. Viver era algo tão pesado, que...

— Você vai chegar atrasado, menino! — a voz de sua mãe o arrancou dos pensamentos mórbidos.

— Obrigado por me lembrar do óbvio, mamãe.

— O que você falou? — Ela gritou. Sua mãe estava ficando surda, tinha certeza. Ela falava cada dia mais alto e ouvia cada vez menos. Às vezes ficava preocupado com ela. — Daí leva bronca e não sabe o motivo! Você não se ajeita, Inácio!

— Mãe... deixa pra lá. — Ele já ia andando em direção a porta da frente quando foi parado por mais um grito estridente da mãe.

— Vai sair sem comer, é? Pode sentar aí e tomar o café da manhã! — Como se fosse incapaz de desobedecer, ele deixou a mochila em cima do sofá e foi sentar à mesa. Atrasado como estava, sentar e tomar café era um luxo que não deveria se permitir, mas discutir com a sua mãe era igualmente arriscado. Seu maior medo era acordar um dia e descobrir que ela tinha tido um ataque cardíaco, e pior, por sua culpa.

Ele terminou de comer, e quando levantou novamente, a mãe o impediu de sair mais uma vez. Ela parou em frente ao filho, e quando fazia isso precisava levantar a cabeça para olhar para ele. O garoto tinha crescido absurdamente e ficado quase trinta centímetros maior do que ela.

— Ajeita essa gravata, garoto. — Dessa vez ele sorriu, e depois que ela terminou de arrumar sua roupa, deu um beijo nos cabelos embranquecidos da mãe. — Não volte pra casa muito tarde, ouviu bem?

Ele já ia no portão, e não respondeu mais. Apenas sorriu para si mesmo, sentindo-se com quinze anos novamente. Ouviu aquela mesma frase desde que saiu de casa sozinho pela primeira vez e parecia que sua mãe ainda não tinha percebido que ele crescera, que não era mais uma criança.

Para sua sorte, seu gerente imediato não estava por perto quando ele chegou ao banco, por isso não precisou dar explicações sobre o atraso, tampouco ouvir reclamações. Melhor, guardaria todo seu estoque de paciência para os clientes. E precisaria. Depois de cumprimentar alguns colegas e registrar a entrada no ponto eletrônico, foi cumprir o ritual matinal sagrado e pegar um copinho de café. Só quando estava devidamente abastecido de cafeína, pôde enfim, começar a trabalhar.

À primeira vista, não reparou nada diferente na mesa ao lado, até porque ela tinha ficado vazia por algumas semanas — desde que o colega Maurício fora promovido. Ficou concentrado na lista de tarefas que o aguardava. Tinha pregado vários post-its no computador e eles o lembravam de que precisava ligar para os clientes, rever alguns contratos e consertar algumas merdas que alguém — ou ele mesmo — havia feito.

Foi só quando deixou a caneta cair e abaixou-se para apanhar que percebeu um par de scarpins vermelhos. Subiu o olhar por um razoável par de pernas, e meio que ficou perdido na visão — pernas eram seu calcanhar de Aquiles. De repente, a dona das pernas estava de pé na sua frente e ele se sentiu um grande imbecil. Queria desaparecer, mas foi praticamente forçado a olhar para ela.

— Oi — disse a moça, ao estender para ele uma mão de unhas bem feitas e pintadas de vermelho. — Você deve ser o Inácio. Eu sou Isabella. O Marcelo disse que você vai ser meu cicerone.

Quando te vi passar fiquei paralisado
Tremi até o chão como um terremoto no Japão
Um vento, um tufão
Uma batedeira sem botão


O sorriso dela o deixou desarmado, sem conseguir sequer responder imediatamente. Havia mulheres bonitas no escritório, várias delas, e não era a beleza daquela que chamava a atenção — ela nem era a mais bonita que já tinha visto nem nada —, mas havia algo, talvez a postura, o jeito de olhar firme.

— Tudo bem, colega?

— Desculpe, Isabella. Eu acho que fiquei surpreso com você. É que eu sempre trabalhei com machos feios do meu lado, finalmente colocaram uma mulher bonita aqui. — Optou ir pelo caminho do bom humor, que sempre funcionava para tirá-lo do sufoco. E dessa vez não foi diferente, Isabella deu uma risada divertida.

— Você é antigo aqui?

— Não, não tão antigo. Eu tenho um ano e três meses de empresa. Na verdade, não existem muitos “antigos” nesse setor, reza a lenda que ninguém consegue aguentar muito.

— Foi o que eu ouvi falar!

— E ainda quis entrar aqui? Você deve ser louca!

— Juízo nunca foi meu ponto forte.

Há tantas pessoas no mundo que seria impossível conhecer todas. Seria impossível também prever em que momento da sua vida você conheceria aquela que faria a diferença, e mesmo quando isso acontece, é impossível saber que aquele foi o momento. Inácio não sabia.

Sempre havia se dado bem com os colegas de trabalho. Era naturalmente uma pessoa paciente e agradável. Com Isabella as coisas não foram diferentes. Os dois se deram bem desde o começo, e para além de ser uma mulher bonita, ele pôde perceber que ela aprendia fácil, de modo que, ao final da primeira semana de trabalho, Isabella estava tirando tudo de letra, resolvendo até os pepinos mais podres que apareciam em sua mesa.

Ele a encontrou na sexta-feira, já no fim do dia, quando algumas pessoas já haviam ido embora. Ambos buscavam um pouco de café para ajudar a terminar o que tinham para fazer.

— Ei, desculpe por deixado o Jaime nas suas mãos — Inácio disse, referindo-se a um cliente chato que vivia ameaçando tirar seus investimentos do banco, mas como era um dos grandões e queridinhos da alta cúpula, eles precisavam fazer tudo para mantê-lo. — O Marcelo deveria lidar com ele pessoalmente, mas com a loucura que está aqui essa semana.

— Não, tudo bem, não foi tão ruim.

— Sério?

— A gente acabou se entendendo. E eu até consegui convencê-lo a aplicar quinhentos mil em LCI, o que, vamos combinar, não foi nada mal para minha primeira vez, certo? — Ele não conseguiu perceber se ela estava sendo engraçadinha ou modesta, por isso apenas sorriu e concordou.

— Não foi nada mal. Você vai se dar bem, garota.

Foi assim viu
Me vi na sua mão

A proximidade no dia-a-dia do trabalho, aproximou-os também fora do escritório. Entre uma happy hour e outra, em pouco tempo parecia que se conheciam de longa data. Inconscientemente, Inácio a tinha tornado uma parte da sua vida. Fosse quando precisava de alguma ajuda com o trabalho, fosse quando precisava sentar e conversar com alguém sobre a sua vida. Eles tornaram-se tão próximos, que as pessoas no escritório começaram a chamá-los de Lois e Clark, uma coisa que ambos encaravam apenas como brincadeira.

Eles ainda não tinham percebido. Ainda não tinha caído a ficha.

De pouco em pouco a gente foi erguendo o nosso próprio trem,

Nossa Jerusalém,

Nosso mundo, nosso carrossel

Vai e vem vai

E não para nunca mais


***

Quem vai sorrir?

Quem vai chorar?

Ave maria, sei que há

Uma história pra contar


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Notas finais do capítulo

So, até a próxima música.



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