Liberte-me escrita por Iara


Capítulo 2
02. Indesejado




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Pela primeira vez desde que o véu o cuspiu, Sirius não estava tendo um pesadelo, às 3h17 da manhã, seus olhos estavam bem abertos, olhando para o teto de seu quarto. Apesar do corredor ser longo e os quartos bem distantes, o que impedia Sirius de dormir eram os barulhos vindos do quarto de Hermione. O homem chegou a pensar que talvez ela estivesse se satisfazendo, já que aparentemente Hermione não tinha namorado e era comum para uma garota dessa idade ter desejos sexuais, mas um atormentado reconhece o outro e os sons que Hermione fazia eram de medo e de dor.

Sirius tinha ido até o quarto dela, pensou que talvez se a acordasse, tudo ficaria bem e ela poderia voltar a dormir, mas ao abrir a porta e se deparar com a mulher se contorcendo na cama, com o cobertor aos seus pés, suando e tremendo, seu coração doeu e ele se viu incapaz de acordá-la. Por isso, Sirius se limitou a segurar a mão pequena de Hermione e afastar o cabelo úmido da testa, ficou por lá até que ela se acalmasse, logo em seguida voltou para seu quarto. Mas o sono tinha ido embora.

***

O sol estava brilhando do outro lado da janela e Sirius gemeu de cansaço após a noite inquietante. Sua mente ainda trabalhava tentando encontrar um motivo que fizesse Hermione sofrer daquela forma. Guerra era sua única resposta, entretanto Harry, um dos mais prejudicados por Voldemort e seus Comensais da Morte, nunca havia demonstrado o que Sirius viu na noite anterior - talvez porque Gina tomava conta dele, uma voz disse em sua mente. Harry tinha Gina, mas Hermione tinha a quem?

– Sirius, posso entrar? - Hermione pediu do lado de fora do quarto.

– Claro. - Ela entrou devagar e o observou. Sirius notou que, apesar do pesadelo, Hermione não tinha olheiras nem parecia fisicamente cansada, ele a invejou por isso. Hermione tinha um leve tom de vermelho subindo do pescoço até as bochechas que Sirius achou absolutamente adorável.

– O café-da-manhã está pronto, só estava esperando você descer, mas como estava demorando muito… Espero não ter te acordado.

– Não me acordou, já estava descendo mesmo. - Ela acenou e saiu praticamente correndo do quarto.

Espreguiçando-se, Sirius caminhou até o banheiro querendo tomar um banho antes da refeição. O espelho do tamanho de um homem adulto pendurado ao lado da porta do banheiro refletia, mais uma vez, um homem cansado e conformado com a merda de vida que tinha, mas também refletia um homem só de cueca, com as tatuagens e cicatrizes a mostra.

– É de se esperar que ela estivesse corando daquele jeito. Cueca branca ainda por cima! - Riu para si mesmo diante do espelho. Será que Hermione havia gostado do que viu? Não, com certeza não. Uma garota como Hermione poderia ter homem melhor.

O banho foi rápido, a barriga de Sirius implorava por um pouco de comida decente e o bruxo não podia mais esperar para provar da culinária de Hermione. Assim que chegou na escada o cheiro de bacon o invadiu e seu estomago roncou.

– Cheira maravilhosamente bem, Hermione! - Ela se assustou por não ter notado Sirius entrando, mas logo tratou de voltar a postura normal.

– Imagina… são só bacons, salsichas e panquecas. Você gosta?

– Sim, claro.

– Café, chá ou suco?

– Café. - Hermione ofereceu a garrafa com o líquido preto para ele e Sirius notou que ela provavelmente tinha anotado sua preferência em algum canto da mente. A primeira mordida foi sublime, ou talvez fosse a fome que a fez parecer incrível.

– Você vai fazer alguma coisa hoje? - Sirius puxou assunto.

– Harry me enviou uma coruja, parece que Gina está melhor, ambos vem jantar aqui.

– Okay. Tenho que me lembrar de vestir algo melhor do que uma das minhas velhas e surradas camisas de bandas trouxas.

– Por que? Você fica bem nelas, Sirius. - Era impressão dele ou Hermione Granger tinha acabado de o elogiar?

– Gina é um pouco exigente…

– Oh, eu sei bem disso. - Ela riu baixinho enquanto cutucava um pedaço de bacon - Mal posso acreditar que Harry e Gina vão ter um filho, o tempo passou tão rápido!

– Nem me fale, cada dia que passa eu me sinto mais velho! - Hermione olhou para Sirius e ele sentiu como se estivesse sendo avaliado.

– Para um homem idoso você está em boa forma, Sr. Black. - Sirius engasgou com o café. Idoso! Hermione Granger ainda era um tanto insolente.

– Você se surpreenderia, Srta. Granger. - Hermione corou e Sirius tentou encontrar outro assunto.

– E Ron?

– O que tem?

– Ele só me visitou uma vez, parece que a vida de jogador de quadribol consome muito ele.

– Vida de jogador? Não, o que consome ele são as milhares de mulheres que ele leva pra cama.

– Sempre achei que vocês dois, sabe, ficariam juntos.

– Sinceramente, eu também.

– Mas?

– Meu corpo não era suficiente para ele, e minhas memórias não eram exatamente felizes.

– Ele não sabia lidar com você, então?

– Eu não sei, ele simplesmente desistiu. Claro, antes ele me traiu com alguma loira oxigenada por aí e fez com que meu rosto fosse parar em vários jornais e revistas de fofoca, “Hermione Granger, heroína de guerra encontra namorado na cama com outra mulher”.

– Algo me diz que você não deixou só por isso. - Hermione encarou o vazio por alguns segundos antes de beber um pouco de chá.

– Na verdade eu deixei. A guerra tinha sido alguns meses antes, eu ainda tinha pesadelos, não estava com condições de brigar com Ron.

– Só pegou suas coisas e foi embora? - Sirius se sentiu tentado a mencionar a noite anterior, mas optou pelo caminho seguro.

– É, Ron tinha desistido de mim e eu sentia que a família Weasley não me olharia da mesma forma depois de terminar com ele.

– E Harry, o que ele fez? - Hermione pousou a xícara vazia na mesa.

– Faz muito tempo, Sirius, não importa mais.

– O que Harry fez, Hermione? - Ele insistiu, mas algo dizia que ele não gostaria da resposta.

– Harry me deu um Kama Sutra, conhece? - Hermione riu amarga. Sirius acenou positivamente. - Ele me disse que, como eu gosto de ler, o Kama Sutra é um livro de posições sexuais e Ron havia me traído por eu não ser o suficiente, o livro me ajudaria até mesmo a voltar com Ron.

– Isso é…

– Ridiculo? Eu sei.

– Harry é inacreditável.

– Ele só queria ajudar, mas nós sabemos que Harry pode ser um pouco obtuso. - Sirius estava descrente no que tinha acabado de ouvir. Tentando aliviar o clima, Sirius perguntou:

– Afinal, você leu? - Hermione corou vários tons de vermelho.

– Sou uma pessoa curiosa, - Ela se abaixou como se fosse contar um segredo e Sirius se inclinou para ouvi-lo - tem coisas ali que parecem humanamente impossíveis de se fazer! - O homem não pode se impedir de rir e Hermione riu com ele.

– Tenho certeza que algumas são bem interessantes. - Os dois se encararam por alguns segundos e Hermione foi a primeira a mudar de assunto.

– Enfim, como Harry e Gina vão jantar conosco, pensei em ir comprar algumas coisas. Quer vir?

– Eu não tenho certeza, Hermione, desde que cheguei eu não saí daqui.

– Entendo, a imprensa é um pouco ávida por informações.

– Parece alguém que conheço. - Sirius riu e Hermione tentou lhe enviar um olhar mortal, mas não conseguiu e riu junto a ele.

– Bem, poderíamos ir a um supermercado trouxa, ninguém vai nos reconhecer lá. - Sirius ponderou por um momento, ele se virou de costas para olhar a janela. Lá fora o sol estava brilhando e o dia parecia agradável.

– Tudo bem, vamos nessa.

Hermione abriu um grande sorriso e depois de terminar seu chá subiu para o quarto para se trocar enquanto Sirius permaneceu sentado a mesa repassando a conversa em sua mente. Ficou um pouco assustado quando percebeu o quão a vontade ele se sentia com Hermione, coisa que, por exemplo, Gina não conseguiu. Harry era sua família, Sirius gostava de tê-lo por perto, mas Harry sempre escolhia o que falaria para Sirius, como se estivesse andando num campo minado capaz de explodir a qualquer momento e isso deixava Sirius tedioso, ele queria que seu afilhado conversasse com ele sobre tudo, lhe contasse qualquer coisa que julgasse importante, mas Harry fazia justamente o contrário. Hermione era o oposto, Sirius se sentia confortável com ela, apesar de ter muitas coisas que ele sabia que ela escondia dele.

***

Sirius e Hermione aparataram num beco mal cheiroso, o mercado estava do outro lado da rua e os dois atravessaram rapidamente. A lufada do ar-condicionado foi maravilhosa, como Sirius havia notado, o dia estava quente e suas calças de couro e blusa preta só pioraram a situação.

“Se eu fosse uma mulher…” pensou desgostoso, Hermione parecia nem ter sentido calor, afinal vestia um vestido azul sem mangas e bem leve. Sirius o aprovou. Ele mostrava as curvas, mas ainda era discreto e comportado, não mostrava muito as coxas, nem tinha um grande decote, mas era claro para qualquer homem que olhasse que por debaixo dele havia um belo corpo. Sirius balançou a cabeça para se livrar dos pensamentos.

Enquanto Hermione ia de corredor em corredor colocando coisas no carrinho, Sirius decidiu olhar para outras mulheres. Haviam várias, de todas as formas. Mas seus olhos sempre voltavam para Hermione, apenas para garantir que nenhum homem a estava olhando. “Ela é a melhor amiga de Harry, é meu dever protege-la dos olhares maliciosos” Sirius disse a si mesmo tentando se convencer do porquê de seus olhos sempre procurarem por ela.

– Que tal você ir na seção de bebidas e pegar um vinho e um suco? - Hermione o questionou e Sirius acenou positivamente enquanto se dirigia a seção de bebidas. Ele tinha vários vinhos na sua adega, mas se Hermione pediu um novo, ele compraria para ela.

Esse pensamento o assustou. Dois dias atrás ele estava jogado em seu sofá, bebendo e chorando por sua vida injusta e agora ele estava comprando um vinho novo e caro só porque Hermione Granger pediu. Sirius olhou para cima e fechou os olhos: que Merlin tenha piedade de mim e dos meus hormônios, pediu ao teto como se fosse o céu.

– Você tem uma irmã mais nova muito bonita. - Sirius olhou para o homem que estava ao seu lado em frente a prateleira de vinhos.

– Não é minha irmã. - O jovem olhou para Sirius com grandes olhos castanhos, tão escuros que pareciam pretos, o cabelo escuro penteado e uma pele bronzeada.

– Ah, filha então? - Ele parecia ansioso por uma resposta ‘sim’, mas Sirius não daria nenhuma esperança para ele.

– Não, - Sirius olhou para Hermione que estava na outra ponta do corredor, como se o sentisse, ela virou e sorriu timidamente para ele - minha namorada. - O garoto murchou visivelmente.

– Bem, você é um homem de sorte então. - Sirius notou que o menino o olhou de cima a baixo, provavelmente se perguntando o que Hermione tinha visto nele.

– Sim, eu sou. - Sirius pegou o primeiro vinha que viu pela frente, sem se importar com o nome e virou-se para o outro lado para pegar um suco que com certeza seria para Gina. Escolheu o de uva para que ela não se sentisse de fora.

– Um vinho e um suco natural? - O garoto ainda estava ali, provavelmente tentando tirar Sirius do sério.

– Mulheres grávidas não podem beber álcool. - Se fosse possível os olhos do garoto teriam saltado para fora e caído no chão como bolinhas de gude.

– Parabéns. - Sirius franziu a testa pronto para perguntar o por quê, mas logo concluiu que o outro achava que Hermione estava grávida e que Sirius era o pai. Sem notar, um grande sorriso apareceu em seus lábios, Sirius estava se divertindo com isso.

– Obrigado.

Finalmente o menino se virou e foi embora e Sirius gargalhou, algumas pessoas ao redor o olharam, mas ele não se importou. Dizer que Hermione era sua namorada não tinha atingido o garoto, Sirius achou que mesmo assim ele tentaria dar em cima dela, mas dizer que ela estava grávida desarmou o menino completamente. Com certeza nesse momento ele deve estar tentando a sorte com outra mulher.

– O que é tão engraçado? - Hermione perguntou quando se aproximou dele.

– Nada. Aqui, me dê esse carrinho, eu levo. - Ela concordou e juntos foram para o caixa. Enquanto esperavam sua vez na fila, o mesmo garoto passou pelo casal e se aproximou. Sirius não gostou disso.

– Senhorita? - Ele chamou a atenção de Hermione e ela se virou para ele. - Cortesia da casa. - Ele sorriu malicioso, estendendo um chocolate para Hermione. Sirius abriu a boca em choque, o garoto era um filho da puta, dando em cima de uma mulher acompanhada e supostamente grávida. E bem na frente do suposto namorado e pai do bebê!

– O que? Não precisa, obrigada. - Hermione recusou.

– Eu insisto, uma mulher na sua condição sempre gosta de chocolate, certo? - O menino era tosco, Sirius concluiu e decidiu intervir.

– Obrigado mais uma vez, muito gentil da sua parte. - O tom de Sirius dizia claramente “Ei, dê o fora, essa é minha mulher” e por sorte o garoto entendeu e foi embora. Sirius suspirou de alivio.

– O que ele quis dizer com isso? - Hermione perguntou confusa, com um olhar mandão de quem pegou o filho fazendo travessura. Sirius deu de ombros como se não soubesse de nada.

– Baby, não podemos recusar chocolate de graça, é um pecado! - Hermione balançou a cabeça negativamente, ainda não satisfeita, mas decidiu deixar para lá e pagar pelas compras, Sirius se sentiu meio mal por não ter dinheiro trouxa com ele, mas Hermione colocou as mãos na cintura e o olhou desafiadoramente, deixando claro que ela não se importava em pagar. De volta ao beco, Sirius notou que Hermione estava olhando para as sacolas, como se estivesse listando tudo que comprou.

– Esqueceu algo?

– Não, Sirius, podemos voltar para casa. - Sirius gostou do tom disso, mas sem comentar nada, segurou o braço de Hermione e em segundos eles estavam na cozinha do Largo Grimmauld.

– Você quer ajuda para preparar o jantar? - Hermione levantou uma sobrancelha para ele e Sirius ergueu as mãos em sinal de rendição. Ele era um horror na cozinha. - Vou estar na sala, se precisar de mim.

– Obrigada por ir comigo, Sirius, e por... sabe, segurar minha mão essa noite. - Sirius ficou chocado ao saber que ela o tinha notado na noite anterior, ele esperava que ela brigasse com ele ou talvez pedisse para ele não fazer mais isso, mas Hermione apenas o olhou agradecidamente.

– Não foi nada, Hermione.

Sentado no sofá, Sirius murchou e suspirou. Aquele garoto era mais uma prova de que Sirius estava velho e sem graça, não só para Hermione, como para qualquer mulher. Sentiu-se tentado a beber um pouco de Uísque, mas controlou a vontade e decidiu ignorar a sensação de indesejo que sentia por si mesmo. Sirius não era bom para Hermione e quando ela fosse embora, ele voltaria a ser mais um bêbado infeliz.


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Notas finais do capítulo

Agradeço aos comentários que recebi no primeiro capítulo, foi um grande incentivo a continuar a escrever a história! xx