Era primavera e a manhã tinha um cheiro fresco de garoa fina.

Wilson acordara a pouco e agora se encontrava na cozinha, apreciando o cheiro quente de café e a brisa úmida que entrava pela janela aberta. O piso era gelado contra seus dedos descalços e o gosto da geleia na torrada era doce em sua língua.

Sentia-se leve e feliz e, com uma satisfação subconsciente, agradecia pela preguiça de House o manter no quarto. A cozinha estava silenciosa e tudo o que ele menos precisava era do sarcasmo do outro em seus ouvidos. Embora uma parte sua lutasse contra isso e desejasse se juntar ao grisalho na cama que partilhavam a mais de um ano.

Sorriu ao pensar no assunto e mordeu mais um pedaço da torrada doce. Quando sonharia que, um dia, compartilharia a cama com o amigo?

Sentiu o amargo do café preto contra os lábios vermelhos e suspirou. Nunca sonhara que isso pudesse acontecer.

Olhou o céu azul-pálido e teve que se policiar para que não se deixasse sonhar acordado. Fizera muito isso nos últimos dias. Ficava perdido numa maré de sonhos de um futuro talvez não tão distante. E, apenas com um arrepio leve percorrendo todo o seu corpo, ele acordava para a realidade.

Sonhava com convites a enviar. A festa - que ele batizara apenas de "reunião para formalizar o que já era óbvio". A comida para preparar. Os detalhes que fariam do dia inesquecível. Sonhava com uma vida inteira chamando House de "meu marido".

Sonhos bobos que não o deixavam pensar em uma coisa que não no dia de seu casamento.

Sorriu para o anel em seu dedo anelar. Ele brilhava refletindo a luminosidade natural que enchia o ambiente. Seus olhos se encheram de uma felicidade calorosa quando se lembrou do pedido. De quando House, simplesmente, aparecera com um par de algemas e uma de alianças brilhosas.

– Vai ficar olhando pra essa aliança até quando? - a voz rouca de House se fez soar no silencio da cozinha, o timbre carregado de sarcasmo.

Wilson se assustou quando sentiu a barba de House pinicar seu pescoço da forma leve, arranhado sua pele e a fazendo arrepiar.

–Até passar a acreditar, acho - Wilson disse simples, sem se importar com o tom do outro. - Ainda acho que isso é só um sonho.

–E é - o grisalho passou os braços desnudos em volta do corpo do moreno. - A diferença é que nunca mais vamos acordar.

–Espero que esteja certo - o moreno sorriu com carinho.

–Claro que estou - disse com falsa modéstia. - Quando não estou certo?

E pela primeira vez, Wilson desejou que todo o narcisismo de House fosse verdade. E que todos os sonhos continuassem a se fazer realidade.