Miguel sabia que podia ter simplesmente esperado no aeroporto. Sabia também que esse seria o certo a fazer. Afinal, Bia lhe garantiu que apesar do voo estar atrasado, ela devia chegar às cinco da manhã.

E eram onze horas, então… Tomaria um chá de aeroporto, é claro, mas onde mais poderia ir?

Sabia também que não devia ter feito o check-out do hotel em que estava hospedado quando o voo da amiga começara a atrasar, cada vez mais. Mas queria economizar e dissera para cima mesmo que não morreria se ficasse andando por aí ao invés de pagar mais uma diária.

Ele sabia de muitas coisas. Porque, então ignorou todas elas e entrou naquela balada, era um mistério.

Mas sei lá. Talvez ele simplesmente precisasse esfriar a cabeça depois de tudo o que passara.

A mãe o expulsara de casa quando contara que era gay e ele simplesmente não tinha lugar para ir. Bia disse que podiam dividir um apartamento, mas Bia morava longe e só chegaria ao Rio no dia seguinte então ele teria que esperar por ela. Mas o voo atrasara. Ele passara a noite anterior em um hotel, mas agora já não tinha onde ficar.

E, bom, a balada piscava com luzes coloridas e música alta mesmo de longe. Talvez tenha se sentia tentado a relaxar um pouco.

Foi assim que foi parar lá. Tinha ainda a mochila nas costas, todos os seus pertences nela. Bom, talvez estivesse simplesmente ferrado, não sabia dizer. Mas ninguém falou nada sobre sua mochila com algumas trocas de roupa e uma escova de dente.

Tudo piscava e girava lá dentro. Uma música antiga tocava, mas Miguel não sabia o nome dela. Bom, não lhe importava. Ele era menor, mas tinha uma identidade falsa muito útil e que lhe serviu perfeitamente no momento.

Foi assim também que bebeu uma bebida atrás da outra, até que o álcool lhe subiu completamente à cabeça.

Quando se deu conta, estava dançando como se não houvesse amanhã.

Foi assim que ele conheceu “aquele de olhos mel pingados de verde”.

O mais velho se aproximou dele, sussurrando palavras que lhe deixaram arrepiado, dançando com o corpo perto do seu. Disse que ele era lindo e Miguel não pensou duas vezes antes de beijá-lo.

– Serei seu amante – o outro disse, tão perto da orelha de Miguel que o fez se arrepiar. – E vou lhe dar meu amor.

Os dois passaram o resto da noite juntos. Na verdade, Miguel não conseguiu se lembrar de muito sobre o que aconteceu no dia seguinte, com o sol nascendo no horizonte, enquanto vomitava já fora da balada sem saber como fora parar lá. Guardava na memória apenas alguns flashes confusos sobre a noite anterior, os beijos e a música, os olhos mel pingados de verde do desconhecido.

Ele conseguiu entrar no banheiro de uma lanchonete 24 horas para se recompor e lembrar que devia encontrar Bia no aeroporto. Ele teve que comprar um sanduiche na lanchonete para que deixassem que ele usasse o banheiro, mas quando saiu de lá, parecia um pouco melhor.

Mais tarde, quando encontrou a amiga, não conseguiu esconder que uma ressaca começava a fazer sua cabeça doer. Ela brigou e se preocupou, levando-o para o novo apartamento e querendo saber se ele estava bem.

E Miguel lhe contou muito. Menos sobre o desconhecido que encontrara na balada e de quem tinha certeza que nunca se esqueceria.

Seria difícil esquecer aqueles beijos e aqueles olhos mel pingados de verde…