Volto para casa com meu olhar vazio, a cabeça encosta na janela do ônibus e observando o céu. Um lugar infinito onde esconde tantos segredos, assim como muitos, assim como eu. Não sinto meu peito, meu coração, mas acho que isso é normal devido a notícia que recebi agora.

Quando Carla me ligou eu já podia sentir que havia algo errado só pelo som da sua voz, pelos soluços ao meio do choro desolado. Zac tinha partido nesta manhã, ele se suicidou no banheiro de casa... Foi encontrado com os pulsos cortados. Não sei de muitos detalhes, eu saí de sintonia com o mundo, e pra falar a verdade eu não queria mais voltar.

Uma tela branca preenche toda a minha mente por enquanto, mas não é com isso que me preocupo, o problema é que eu ainda não acredito que isso tenha acontecido de verdade. Quero dizer, como isso pode acontecer? Estávamos fazendo planos, íamos dar um jeito em tudo e... Tudo simplesmente desapareceu, como se não fosse nada, nem se quer tivesse a chance de talvez dar certo.

Percebo então que nunca mais terei a chance de vê-lo novamente, de conversar com ele, de sorrir quando ele sorrir, de dizer coisas bobas e ser eu mesmo, pois com ele não importava mais nada, ser eu mesmo já era o suficiente. Se soubesse que aquele dia no aeroporto seria a última vez que eu o veria, teria te abraçado mais forte. Deus, como eu me culpo por isso!

Zac foi a única pessoa que teve paciência de me desvendar por inteiro, que mesmo com minhas relutâncias, ele não desistia. Foi me conquistando aos poucos e gradativamente, até que quando dei por mim, já estava completamente apaixonado por ele. E no final, depois de tantos momentos felizes juntos. A separação sempre vai ser algo muito difícil de se superar. Até porque, ele sabe que nada, nem ninguém, vai preencher o vazio que ele deixou.

Encaro o céu pelo vidro da janela e tento segurar o choro que vinha com mais força a cada piscada. Eu só queria entender, saber o motivo pelo qual isso está acontecendo comigo!? Talvez eu não tenha nascido para ser feliz, estou designado a viver apenas com as durezas da vida, só não queria que ele pagasse por isso. Me castigasse ao invés dele, me punisse da pior forma, mas o deixasse viver em paz. Não sei se alguém está escutando meus pensamentos gritantes nesse momento, nem mesmo se Deus está me ouvindo, mas eu só peço um sinal. Algo que me faça entender tudo isso, eu preciso de uma satisfação.

Hoje ele se foi e por mais que eu continue aqui, minha alma está com ele neste momento. Sem agüentar mais, as lágrimas escorrem por meu rosto. Fecho meus olhos e deito minha cabeça no banco, eu só suplicava para que tudo isso fosse apenas um pesadelo. Um maldito pesadelo que logo eu acordaria e tudo ficaria bem.

Desço em frente à praia, retiro meu tênis e caminho sem rumo pela areia gelada. O vento frio batia contra meu rosto, e acho que nem piscar eu conseguo, estou em choque completo. Ouço as ondas do mar quebrarem na beira da areia, as lágrimas teimam a escorrer novamente. Só preciso por a minha mente no lugar, passar um tempo sozinho, no silêncio, sem ter que dizer o que aconteceu. Só quero um tempo pra mim, sabe? Poder observar o infinito a minha frente e vê que não somos absolutamente nada quando se trata de destino.

Sento-me na areia onde meus pés podiam ser molhados pela água do mar. Observo o sol no horizonte com a minha visão levemente turva por conta das lágrimas.

– Não... - Murmuro a mim mesmo - Não... Não... - Nego abaixando a cabeça chorando sem parar, escondendo meu rosto ao meio dos braços apoiados nos joelhos.

Narayani me liga uma vez, e depois outra, e outra, outra... Ela está preocupada, eu sei, mas não quero conversar agora, não quero ter que falar, só quero ficar sozinho. Me deixe sozinho, não quero ver mais ninguém por enquanto.

Chuto a areia com tanta raiva que chego a ralar meu calcanhar. Olho para o céu e cada vez que o fazia, o choro vinha com mais força. Não podia ter feito isso comigo, não tinha o direito de fazer isso comigo. Eu passei cada dia da minha vida sendo uma boa pessoa, tentando ser um bom filho, um bom irmão, bom amigo... E é isso que eu recebo em troca? Eu odeio isso, odeio tudo que está acontecendo e odeio o jeito que me força a ter que lidar com as coisas. Droga, o que há de errado comigo?

Foi tão de repente, eu não sabia como reagir, não sabia o que falar para Carla no telefone, simplesmente não sabia mais fazer nada. Eu queria, mas eu travei, congelei de uma forma que não sei como explicar. Me vem na cabeça a lembrança dele me beijando pela última vez, não queria apenas um beijo, eu queria ele, comigo, pra sempre. Eu não sabia que ele estava com tantos problemas assim. Queria tanto ajudá-lo, passaria noites em claro se fosse preciso, apenas ouvindo-o desabafar comigo. Desde que eu o conheci, quis segurar a sua mão e dizer: enfrentaremos qualquer barra, seguraremos qualquer onda, estarei sempre ao seu lado, vou te amar, te desejar, ser fiel, ser tudo na sua vida e vamos olhar para os outros e dizer que, sim, vamos ser felizes para sempre. Mas o nosso 'para sempre' não durou muito tempo, E infelizmente viramos uma curta história de muitas lembranças.

Respiro fundo olhando para frente, agarro a areia com toda a minha força e a lanço para o mar com um grito que na hora achei que fosse sangrar minha garganta. Fraquejo ajoelhando-me e então deixando que depois de toda a adrenalina, a calmaria se espalhasse por todo meu corpo.

– Você não podia fazer isso... Não tinha esse direito de fazer isso - Digo fechando os olhos com tanta força que doía.

Eu te amava tanto. Queria passar o resto da minha vida ao seu lado, construir uma família com você, ter conquistas e derrotas, pois eu sempre teria você comigo e você sempre me teria com você. E agora, o que eu tenho? Às vezes, eu só queria te trazer mais pra perto de mim. Só queria perder meu riso junto do seu. Queria poder esticar o braço e tocar sua mão. Te sentir mais perto e mostrar que a gente só dá certo junto. Que somos uma combinação simples como 2+2 e tão perfeita ao mesmo tempo.

Voltando para casa após momentos quietos enquanto minha mente se perdia em alto mar, lembro-me da nossa primeira e última viagem. Nesse final de semana eu tive os momentos mais inesquecíveis da minha vida com Zac ao meu lado, ele me fazia tão bem e nem sabia disso... Ou talvez sim!

Paro em frente a porta de casa, respiro fundo enquanto enrolo com a chave em frente a maçaneta. Não queria entrar, eu só queria fugir, sair dessa vida que já não me faz nenhum sentindo. Não é besteira, não é idiotice, é simplesmente o meu primeiro amor. Você já teve seu primeiro amor? Digo, o amor de verdade, que você ame as qualidades e defeitos da pessoa, pois é isso que a torna especial. Então me diga, estou exagerando? Você perder tão subitamente alguém que você amava incondicionalmente, e a última vez que você o viu foi por uma tela de um aparelho eletrônico.

Passo pela sala de casa, cumprimento quem está lá, desejo um bom dia e digo que o dia foi ótimo, sorrio e continuo andando. Abro a porta do meu quarto, pego minha toalha e uma roupa, vou até o banheiro, ligo o chuveiro, fico vendo a água cair, e quando minha ficha também cai, desabo… E ninguém escuta. Ninguém percebe. Ninguém entende. Apenas eu.

Choro apoiado na parede, debaixo do chuveiro que fazia a água quente escorrer por minhas costas. Meus soluços eram abafados, por mais que eu tente controlá-los, é praticamente impossível. É como se minha alma estivesse pondo toda aquela dor para fora de uma só vez. Só de pensar que ontem eu ainda o tinha aqui do meu lado. Como seguir em frente se uma parte do seu coração ficou pra trás? Porque no final, quando você perde alguém, cada vela, cada oração, não vai mudar o fato que a única coisa que sobrou é um buraco na sua vida, onde alguém que você se importou costumava estar.

Entenda, é possível amar muito alguém... Mas o tamanho do seu amor por uma pessoa nunca vai ser páreo para o tamanho da saudade que você vai sentir dela.

Saio do box e encaro-me no espelho, meus olhos tão vermelhos como se eu não dormisse há 4 dias. Arrumo-me devagar durante minha tentativa de não transparecer nada a minha família, eles jamais iriam entender. Saio do banheiro com um forte suspiro e caminho em direção ao meu quarto.

Era óbvio o que acontecia com as pessoas, com as pessoas boas, com as pessoas más, até mesmo com as pessoas terríveis não parecia justo. Mas “justo” não passava de uma palavra no dicionário.

E deitado na cama, olhando para o teto no escuro, aquele velho sentimento de vazio passa pelo meu coração. Fico quieto debaixo da coberta, as lágrimas persistem em descer pelos cantos dos olhos. Não aguento mais essa dor, não aguento mais suportar a ideia de ter que viver sem você ao meu lado. A dor da sua partida trouxe toda a dor do mundo. De uma só vez.

Horas se passaram enquanto eu observava a escuridão que me cercava. Não quero mais fugir dela, cansei disso, decidi que ficar aqui agora, sem ninguém, é o melhor pra mim. Essa sensação de ter tido minha alma rasgada por inteiro é devastadora, e só rezo para que isso pare. Eu me apaixonava mais a cada dia pelos mesmos olhos que eu vi pela primeira vez a um tempo atrás. Os seus olhos. Aquele brilho incomparável que refletia a luz do sol, e que só tenho guardado agora em minha memória.

Minha saudade não começou agora, ela sempre existiu, desde o momento em que o vi passar para aquela sala de embarque. Desde aquele momento ele levou meu coração embora. Agora tudo que eu tenho para poder me lembrar dele é a prancha de pelúcia, que estou praticamente esmagando-a com meus braços.

Choro com ela embaixo de meu rosto, meu peito já dói de tanto que chorava. E acreditei que nunca mais fosse parar de chorar. Zac foi uma pessoa tão importante na minha vida, queria só poder olhá-lo mais uma vez. Ele foi embora sem nem se despedir. Me deixou aqui, sem ao menos uma última ligação, nada... Apenas se foi! Você me descobriu. Me reinventou. É como se toda a minha vida tivesse sido uma mentira antes de você chegar. Eu sou tão grato por ter lhe conhecido, só queria ter uma explicação, algo que me fizesse entender.

Nada mais será como antes, sempre que eu for a um lual, a algum festival ou a um parque de diversões, vou lembrar de você. Essa dor que sinto toda vez que eu acordar e saber que não vou mais falar com ele, é diferente, ela parece que é para sempre. A gente descobre que as pessoas com quem mais nos importamos na vida são tomadas da gente muito depressa. Por isso sempre devemos deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas, pode ser a última vez que as vejamos. E minhas últimas palavras a ele foram 'Até Mais' e então se tornou a minha despedida.

Aprendi hoje que você nunca sabe quanto tempo você tem com alguém, então não esqueça de dizer 'eu te amo' enquanto você pode.

Hoje, deu vontade de chorar e eu só queria um colo para encostar minha cabeça e fingir que o mundo lá fora não existe. Hoje eu queria um abraço daqueles que te sufoca de tão apertado e ao mesmo tempo te protege de tudo. Hoje eu só queria ouvir “eu liguei pra saber se você tá bem” pra sentir uma dor menos doída dentro do peito. E quando você ama uma pessoa, você suporta tudo, menos perder ela.

O dia se passa. Minha mãe entra no meu quarto e depara-se comigo sentado na cama, com a cabeça encostada na parede olhando para janela, com a prancha em meus braços.

– Já acordou? - Ela espanta-se um pouco e adentra no quarto desligando o ar-condicionado - Ta fazendo o que ai?

Sim, eu a ouvi, mas não tenho forças para respondê-la. Eu juro que eu tentei, mas simplesmente não conseguia mexer um músculo do meu corpo.

– Ih, tá ficando maluco - Ela diz saindo quarto e fechando a porta.

Não quero fazer nada. Não quero escrever, não quero ouvir música, não quero ler. Só quero ficar aqui, sozinho, enquanto meu cérebro ainda está digerindo tudo o que aconteceu. Não pense que estou sereno por dentro. Talvez não esteja chorando por não ter mais lágrimas para escorrer por meu resto, mas acredite, por dentro ainda estou um caos... E chorar por dentro é um dos piores choros.

Lembro que desde o primeiro momento em que o vi, eu o amei. E sempre vou amar!

Lembro que ouvi uma vez uma pessoa dizer que quando uma pessoa pensa em suicídio, ela quer matar a dor, mas nunca a vida. Deus, eu não sei mais o que pensar. Se você pode me ajudar agora, eu ficaria muito grato, pois eu só quero que essa dor passe, que eu possa reagir a isso. Não sabia que Zac estava com tanta dor, e quando ele já não parecia mais como antes, achei que fosse o local, as pessoas, e que ele voltaria para o Rio e tudo seria como antes, mas não... Ele estava partindo aos poucos. Sem barulho, sem ferimentos, sem longas despedidas. Apenas partindo sem que ninguém percebesse.

Talvez eu pudesse tê-lo amado mais, ou aproveitado mais, se ao menos eu tivesse como fazer para voltar no tempo e viver tudo aquilo de novo. Sinto que eu poderia ter me entregado mais, mas ninguém sabe o que tem até que no final o perde.

Me desculpa por tudo que poderíamos ter sido e não fomos.

Você era tudo que eu queria e agora meus sonhos estão morrendo. Lembro-me de quando o vi pela primeira vez, naquele festival de cinema. Hoje em dia eu nunca fiquei tão feliz de ter caído em público! Fecho os meus olhos para poder reviver aquele momento que mudou muitas coisas na minha vida.

Zac, eu só quero que saiba, que não haverá um dia em que eu não me lembre de você.

Dizem que um segundo antes de morrer, sua vida toda passa em sua frente. Espero que isso seja verdade, que você veja um álbum de fotos de cada momento, para saber que esteve ali, que foi amado, que existiu. Deve precisar desse segundo pra se preparar, e esse segundo entre a vida e a morte, é todo tempo que você tem pra dizer adeus. Nada mais faz sentido agora, porque quando finalmente as coisas estão seguindo, fluindo, você morreu. Eu não consegui chorar quando me disseram, pois sei que se o fizesse, isso tudo seria real. A ficha finalmente iria cair. Quero chutar, gritar e tentar recuperar tudo. Daria qualquer coisa pra esse vazio horrível ir embora. E, mais do que tudo, não quero ter que te dar adeus. Então, não vou. Só vou agradecer por tê-lo conhecido. Não há necessidade de dizer adeus, quando você vai lembrar pra sempre.