Faltava uma semana para o exame de grau, Karina tinha se empenhado muito nos treinos durante esse período. Conquistar o próximo grau e provar para o seu pai que ela pode ser uma lutadora que fará diferença nos ringues era sua meta. A lutadora já estava usando as luvas que ganhou do namorado, para se habituar à elas.

Os últimos dias com ele tinham sido maravilhosos, a cada dia aumentava a ligação entre os dois. Pedro era uma pessoa fácil de lidar, sempre bem humorado e sempre falando o que vinha à cabeça. Já a lutadora, por mais que tentasse não conseguia se expor totalmente, não conversava com ele sobre seus problemas, seus medos. Mas ela estava se esforçando para conseguir, quem sabe com o tempo?!

Pedro acordou mais tarde na quinta-feira, pois não teria aula na Ribalta - teria uma seleção importantíssima de dançarinos para um clipe e o restante dos alunos estavam liberados nesse dia.

Ao escovar os dentes após o banho, Pedro contemplou o colar em seu pescoço. Inevitável não lembrar da sua Esquentadinha e daquele sorriso lindo que ainda hoje era tão difícil de conseguir. Com certeza valia todo o esforço. O músico nunca tinha se apaixonado de verdade...até agora. Karina trouxe uma mistura de sentimentos para ele: interesse, provocação, raiva, frustração e o mais importante que era essa alegria indefinível que sentia. Ela o fazia sentir-se mais vivo, mais real.

Hoje não tinha Ribalta, então nada de observá-la enquanto subia a escada, não tinham aula juntos então só a veria no intervalo, que estava tão longe. Decidiu ir até academia encontrá-la, poderiam almoçar juntos no Perfeitão antes de irem para a escola.

Vestiu uma bermuda azul e camiseta branca, ajeitou a cabeleira e foi ao encontro de sua musa.

Ao chegar na academia retirou o tênis, pois não queria levar uma bronca do sogrão.

–Fala seu Gael, beleza?

–Estamos no meio do treino!

–Foi mal, mas eu posso assistir?

–Você não tem nada melhor para fazer? Isso aqui não é TV para você assistir!

–Por favor, eu prometo que fico quietinho! O sr. nem vai perceber que estou aqui!

–Me vence pelo cansaço. Senta ali e fica quieto!–indicou um local para o garoto sentar.

–Sim mestre! – falou fazendo uma reverência ridícula.

–Vamos pessoal continuem que isso aqui não é bagunça!

Karina virou-se assim que ouviu a voz do namorado. Quando ele se acomodou, trocaram um olhar e ela deu-lhe um sorriso.

Pedro não conseguiu tirar os olhos de sua namorada durante o treino, ela era rápida e se movia com a elegância de um felino.

–Vamos lá galera, já está bom de aquecimento. Vamos começar uma série agora. – Gael orientou.

–Peraí, esse foi só o aquecimento? Caraca eu cansei só de olhar!

–O que aconteceu com o ficar quieto, Pedro?

–Desculpe! – fez um movimento de zíper nos lábios.

Ele não entendia muito de luta, mas dava para ver que a namorada era boa só pela segurança em seus movimentos. Obviamente a lutadora ao perceber a "plateia" exibiu-se um pouco. Ele tinha ido até lá somente para vê-la, ela sentiu uma sensação estranha no estômago diante desse pensamento.

Ao terminar o treino, Pedro acompanhou Karina até o vestiário, mas não estava falante como o habitual.

–Então você veio até aqui só para me ver? – a lutadora tentou puxar conversa.

–Foi. Te incomodei?

–Claro que não. Eu gostei. O que você tem?

–Nada, só pensando. Esse negócio de Muay Thai não é para os fracos né? Eu já estaria morto só com o aquecimento.

–Ah é tudo questão de prática. Com o tempo vai criando resistência, mas no começo é complicado mesmo.

–Bom, te espero aqui para almoçarmos.

–Nenhuma brincadeira hoje sobre o banho? Quem é você e o que fez com o meu namorado?

O garoto sorriu torto para ela, que jogou um beijo e entrou para o vestiário.

Karina terminou a higiene e encontrou Pedro ainda a esperando próximo dali. Foram para o Perfeitão almoçar.

–Esquentadinha a festa não é esse final de semana?

–É! Por quê?

–Precisamos decidir a cor da roupa, as máscaras.

–Precisamos?

–Ah a maioria dos casais vão combinando, achei que seria legal.

–Sou péssima para essas coisas. Por mim nem iria nessa festa, mas o seu Gael me chantageou. Se eu não for ele não me deixa fazer o exame. – comentou pesarosa.

–Que bom que ele chantageou! Eu gosto de festa, além disso minha banda vai tocar.

–Não me importaria se você fosse sozinho.

–Sério? Cadê a Esquentadinha ciumenta?

–Eu não sou ciumenta!

–Não tem medo que uma das minhas fãs me agarre?

–Há se alguém se atrever a encostar em você eu acabo com ela! -respondeu dando uns socos no ar.

–Viu? Ciumenta!

–Não achei que eu precisaria me preocupar com isso. Pensando em me trocar moleque?

–Claro que não! Só estou dizendo que sou um menino indefeso sem você para defender minha honra.

–Realmente tão indefeso que parece até uma moça.

–Ah é? Quando eu te beijo não pareço uma moça! – puxou-a para um beijo apaixonado.

Chegaram ao restaurante e após darem um beijo em Delma, pediram o almoço.

–Depois de te ver treinando hoje, nem posso mais zoar que você come muito!

–Eu não como muito!

–Come sim, uma montanha de comida!

Karina jogou uma batata frita no Pedro e Delma interrompeu a implicância:

–Deixa disso Pedro. Karina pode repetir quantas vezes quiser viu? Não precisa de cerimônia.

–Obrigada Delma! Viu pentelho?

Terminaram de almoçar em meio as brincadeiras e aproveitaram os minutos restantes para combinar sobre a festa.

–Essa semana está complicado, mas precisamos achar um jeito de ir logo comprar as máscaras.

–Se você conseguir sair um pouco mais cedo do treino, posso pedir uma dispensa para o Nando. Aí vamos antes de ir para a escola.

–Pode ser, depois eu dobro o treino da noite.

–Fechou.

*****

Na escola Karina e Pri estavam sem aula, o professor havia faltado e não tinham conseguido substituto de última hora. Aproveitaram para ver um site de uma loja de artigos para fantasias, procuravam por máscaras para usar no baile. Pri gostara de várias, mas Karina estava tendo um pouco de dificuldade, achava tudo muito exagerado e purpurinado demais.

–Estou detestando essa história de festa.

–Deixa de ser chata K. Vai ser muito divertido. Todo mundo bem vestido, com máscaras, vamos olhar tentando adivinhar quem é. Sem falar que é todo um clima de mistério, acho muito sexy.

–Pode até ser, mas não gostei de nenhuma dessas máscaras.

–Relaxa, amanhã você vai encontrar algo que sirva perfeitamente.

–Onde será que os meninos estão?

–Tipo em aula?

–É.

–Acho que o João tinha educação física agora, eles devem estar na quadra.

–Ótimo, vamos entrar na aula deles, assim não ficamos aqui sem fazer nada.

–Tá doida? Não quero problema.

–Deixa de ser medrosa. Tenho certeza que o professor deixa.

–Ok, mas se ele disser não, não iremos insistir.

–Prometo!

As amigas dirigiram-se até a quadra onde os alunos realizavam os esportes. De longe Karina avistou Pedro, jogando futebol com os colegas. João estava sentado na arquibancada com o celular do primo, provavelmente jogando.

–Vocês não são dessa turma, posso saber o que fazem aqui?

–Professor Beto! Que susto! – exclamou Pri.

–Estamos sem aula Profe. Podemos ficar aqui? – pediu Karina

–Claro que não!

–Por favor, ficaremos quietinhas apenas assistindo.

–Só porque você é uma boa aluna Karina, mas sem arrumar confusão ou distrair os meninos hein?

–Valeu Profe, você é demais!

As meninas foram até João e sentaram-se ao seu lado. O garoto demorou um tempo a perceber, pois estava concentrado no celular. Após elas explicarem como tinham ido parar lá, ele voltou a jogar. Pedro jogava futebol e nem percebeu que a namorada o assistia. O músico não era nenhum craque, mas também não jogava mal.

Próximo de onde estavam sentados, quatro garotas jogavam três cortes.

–Olha quem está aqui Bruna. – comentou uma das garotas.

–O que aquela vaca faz aqui? – perguntou Bruna para as amigas.

–Quem? Ah a Karina. Sei lá. – respondeu outra garota.

–Deve ter vindo ver o namorado.– comentou a quarta garota.

–É uma idiota. Vou ensinar ela a não vir onde não é chamada. - Bruna acertou a bola na cabeça de Karina, propositalmente.

–Cuidado garota, tá maluca?–reclamou a loirinha.

–Desculpe, não foi de propósito.– respondeu rindo com as amigas.

–Presta mais atenção!

Elas continuaram jogando e após mais alguns minutos a garota a acertou novamente e Karina perdeu a paciência. Foi para cima da garota.

–Você só pode estar de brincadeira! Qual é o seu problema?

–Meu problema são piriguetes que entram na aula alheia!

–Ué, pensei que essa aula fosse a sua. – respondeu ironicamente.

As amigas riram, deixando a garota mais incomodada com a lutadora.

–Não sei o que o Pedro vê em você, é tão sem sal, parece mais um menino!

Diante do comentário, Karina partiu para cima da garota, a derrubando no chão. Os garotos pararam de jogar reparando na confusão e foi então que Pedro reconheceu a namorada no meio da confusão. Correu e a tirou de cima da menina.

–Esquentadinha, o que você tá fazendo aqui?

–Me larga Pedro, eu vou ensinar uma coisinha para essa vaca!

–Para com isso, quer ir para a diretoria?

–Que ódio!

–Calma, me fala o que aconteceu?

–Essa garota estava me provocando, acertou a bola na minha cabeça duas vezes!

–Pode ter sido sem querer.

–Ah claro, duas vezes Pedro?

–Por que ela faria de propósito K?

–Por que mais? Por sua causa! Quer saber já estou ficando cansada disso. Fica com elas! – e foi saindo, mas o garoto a segurou firme pelo braço.

–Espera, não sai assim. Eu não tenho culpa.

–Tem sim! Você que dá moral para elas.

–Presta atenção no que você tá dizendo.– falou sério.

–É isso mesmo, você adora essa atenção. E sou eu quem paga o pato!

–Quer saber? Fica aí dando piti, que eu vou voltar a jogar.

Pedro voltou para a quadra com os garotos deixando a namorada boquiaberta com a atitude dele.

Karina saiu da quadra e foi para o banheiro tentar se acalmar. Acabou chorando um pouco, pois estava muito nervosa.

A lutadora ficou aliviada quando Cobra apareceu para buscá-la no horário de saída. Tinha enviado uma sms para ele pedindo para irem treinar direto. Entrou no carro sem falar uma palavra.

–Oi loirinha! Quanto mau-humor.

–Dirige Cobra.

–Haha tá achando que sou seu motorista? Fala direito comigo novinha.

–Foi mal. Oi.

–Melhorou. Então vai me contar o que aconteceu? – perguntou saindo com o carro.

–Não aconteceu nada.

–Claro e você andou chorando por nada?

–Como sabe que eu chorei?

–Seus olhos estão vermelhos. Ou você anda usando drogas e eu não sei?

–Claro que não.

–Então só pode ter chorado. Vai, desembucha.

–Eu gostava mais de você quando não tinha tantas perguntas.

Cobra riu com a observação da amiga e resolveu não pressioná-la mais por ora. Depois do treino talvez ela quisesse falar.

Treinaram intensamente, Cobra gostou do desempenho de Karina.

–Lutou bem hoje, para uma menina.

–Qual é, eu luto melhor do que a maioria dos meninos da academia.

–O que não é difícil né? Bando de maricas. Está melhor?

–Estou. Briguei com uma garota da sala do Pedro, depois acabei discutindo com ele.

–Ele ficou do lado dela?

–Não vai perguntar o que ela fez?

–Não preciso, você não perderia a cabeça a toa.

–O Pedro não parece pensar assim.

–Eu sei que você se irrita fácil com ele, mas com as outras pessoas não costuma ser assim.

–Acho que exagerei com ele. Mas ainda continuo achando que ele foi um idiota.

–Ele é um idiota.

–Na maior parte do tempo não é não.

–Deixa ele para lá, tá a fim de pegar um cinema?

–E a Jade?

–Ela ia ver o vestido da festa com a mãe, algo assim. Você vai nessa festa?

–Vou, mas não de vestido.

–Então, topa? Te deixo em casa para tomar um banho enquanto passo no QG e depois vamos?

–Quer saber, vamos.

Pedro estava na porta do Perfeitão, iria ajudar seus pais naquela noite. Ele viu quando a namorada saiu com o lutador, mas não dirigiu nenhum olhar na direção dele. Ela ainda deveria estar irritada com ele, mas ele também não tinha gostado da atitude dela. Se ela quisesse que o procurasse para se desculpar. Resolveu dar um gelo nela.