A imensa esfera flamejante se aproximava. Vlad estava surpreso por um dos golpes de Margery ter se tornado tão ameaçador. A ruiva realmente estava lutando com todas as suas forças, demonstrando uma forte vontade de derrotar seu adversário, por isto não hesitou em utilizar uma magia de solemnia verba, um tipo de magia utilizada por devatãs com forte poder, pois para a conjuração ser realizada era preciso dominar as sentenças dos feitiços e ainda ter energia suficiente para a materialização. Se a sentença era pronunciada incorretamente, a energia seria desperdiçada e a materialização não ocorreria de forma alguma.

Com a pronúncia da palavra Actio após o recito, tornava-se possível aumentar o poder da magia consideravelmente e se o devatã fosse forte o suficiente, poderia aumentar mais ainda o poder destrutivo da magia, atribuindo um número frente a esta palavra. Existiam 3 níveis que poderiam ser explorados neste tipo de magia. Quando atribuída tal palavra com o número 1 á frente, atingia o primeiro nível. A atribuição dos números de 2 a 3 tornava possível aumentar o poder nestes outros 2 níveis. Porém, cada nível retirava muita energia do deva para a conjuração. Sendo assim, poucos foram capazes de chegar á níveis além do quarto. Existiam também um tipo de solemnia verba que somente devatãs com nível superior a classe A poderiam utilizar.

Margery havia pronunciado no final do recito a palavra Actio e ainda havia atribuído o número 1 aumentando uma vez o poder em relação ao poder destrutivo original. Vlad não teve alternativa a não ser arriscar utilizar uma magia da qual havia aprendido com seu amigo e ex-mestre, William. As magias que William lhe ensinava eram muito difíceis de serem aprendidas, até mesmo por um membro da família Chernobog e consumiam muita energia. O sábio devatã fora contratado pelos pais de Vlad, para ensinar tais magias tão difíceis. Isto era um ato de preocupação dos mesmos em relação ao Chernobog, pois desejavam preparar bem seu filho para as possíveis batalhas que ainda viriam a acontecer. Sabiam que seu filho seria perseguido por muitos devatãs poderosos ao longo dos anos, com a intenção de matá-lo somente para obter a fama de ter derrotado um Chernobog e, além disso, concretizar um plano extremamente sigiloso. A relação que William tinha com os pais de Vlad era de uma amizade antiga, que possuía raízes desconhecidas pelo próprio rapaz de cabelos prateados.

Durante sua adolescência até o início da fase adulta, antes do incidente do assassinato de sua família, foi capaz de aprender poucas técnicas ensinadas por seu ex-mestre, técnicas estas que o próprio as consideravam primárias, de nível inferior. Após o assassinato de seus pais, William desapareceu, pois estava sendo perseguido pelos assassinos. Vlad conseguiu se encontrar com ele poucas vezes depois do incidente, pois o mesmo utilizava suas habilidades para escapar. O Chernobog também estava sendo perseguido. Isto dificultava o encontro dos dois. Seu maior inimigo e aquele que o perseguiu durante muitos anos, tratava-se da pessoa que havia influenciado Margery á derrotá-lo. Vlad não tinha certeza se esta pessoa fora responsável pelo assassinato de seus pais ou se tinha alguma ligação. Apesar de persegui-lo, havia dúvidas, pois poucas vezes conseguiu interrogá-lo sobre isto.

Procurando escapar da imensa esfera flamejante, Vlad pronunciou as palavras de uma das poucas técnicas simples que conseguira aprender, ensinada por seu amigo:

– Commutare Trajectus – disse, seu corpo vibrou e se estendeu, desaparecendo subitamente.

A enorme esfera flamejante que se dirigia a toda a velocidade foi dominada por tal estranho fenômeno, enquanto estava prestes a atingir seu alvo. Quase que simultaneamente, a esfera trocou de posição com Vlad, ressurgindo aonde o mesmo se encontrava. Esta, por este fator, se dirigiu velozmente em direção ao infinito da transfiguração dimensional. Após ressurgir, com um leve impulso em seus pés, Vlad se dirigiu á sua oponente, desaparecendo desta vez por causa da alta velocidade que havia adquirido.

Margery finalizava a conjuração de seu ataque amenizando a irradiação de energia. Após se recompor da massiva dispersão, procurou com seu olhar a figura de seu adversário, suspeitando imediatamente que o mesmo havia sobrevivido ao seu golpe. Apesar de formular tal suspeita, surpreendeu-se por sentir sua presença, pois o rapaz se encontrava atrás da ruiva, aguardando que a mesma se virasse para encará-lo. Margery após concretizar o ato esperado, se deparou com seu oponente que estava a poucos metros de distância.

– Admirável. - disse Vlad, elogiando o golpe da jovem, sabia que não deveria se rebaixar em hipótese alguma, pois devido a sua análise aguçada, percebeu que para sua adversária aumentar sua força bruscamente, bastaria um mínimo de controle sobre a situação. Sendo assim, fitou seriamente a garota após pronunciar tais palavras e em seguida caminhou em direção á mesma, vagarosamente. - Desista, por favor. Eu não quero te matar. Apenas, desista. - implorou o devatã, parando e colocando as mãos no bolso. Nesta posição, aguardou a resposta da ruiva.

– Não me faça rir. - disse Margery, fazendo uma careta. - Animus nocendi! - exclamou e logo depois uma forte pressão no ar colidiu com Vlad que se protegeu com os dois braços, deslizando alguns metros devido ao impacto.

– Você não desistirá, não é mesmo? - indagou, em uma última tentativa. - Não tenho outra escolha... - suspirou, fechando os olhos por um instante, abrindo-os logo depois. - Prepare-se. - caminhou em direção á ruiva, novamente.

Margery provocou seu oponente com um gesto de seu dedo indicador da mão direita, chamando-o. Neste momento, expandiu sua energia rubra preparando-se para o ataque. O último Chernobog correspondeu exaurindo uma energia com coloração esverdeada. Desta vez, o rapaz se convenceu de que deveria lutar seriamente para obter a chance de confrontar-se com o responsável por tudo aquilo. Vlad não queria assassinar sua oponente, preferiu apenas deixá-la inconsciente ou fazê-la desistir da idéia de matá-lo. Por alguma razão, sabia que se escolhesse a opção mais cruel, teria muito trabalho, muito mesmo, pois um indivíduo na busca da sobrevivência frente o medo da morte, sempre atinge o limite, assim como qualquer criatura viva. Sendo assim, procurou pronunciar as palavras de uma magia que contribuiria para concretizar a segunda opção. Contudo, antes que pudesse terminar a conjuração, algo inusitado aconteceu.

Uma fenda longitudinal rasgou uma região a alguns metros de distância dos dois. Logo depois, pode-se ouvir uma voz extremamente familiar.

– Coercitio ad tempore. – após uma voz feminina pronunciar tais palavras, suavemente, que ecoaram pelo ambiente com um efeito sombrio, uma esfera transparente com uma coloração azulada surgiu ao redor do rapaz, paralisando-o e aprisionando-o.

A alta fenda longitudinal abriu-se bruscamente, como um grande olho em uma posição incomum, revelando seu interior que era negro e com algumas regiões que eram preenchidas por ofuscamentos de colorações diferenciadas, desaparecendo e ressurgindo após alguns segundos. Duas pessoas logo depois, caminharam até o exterior da fenda. Uma mulher com um vestido negro de veludo surgiu primeiramente. Seus ombros ficavam a mostra devido ao estilo do traje, era enfeitado com plumas de coloração prateada que se estendiam pelas bordas da região que circundavam seu tórax e seios simétricos. Seus cabelos longos, lisos e negros respondiam ao caminhar elegante e discreto. A pele da jovem era pálida como a de Vlad, sua silueta no vestido revelava um corpo modelado pelos padrões de beleza exteriores a época. Alguns enfeites no cabelo, como presilhas brancas e circulares mantinham-nos presos parcialmente, enquanto algumas mechas laterais deslizavam, devido ao caminhar, tocando levemente sua pele jovem. Seus calçados também negros se escondiam dentro do vestido revelando-se após cada passo. O término do tecido que cobria suas mãos tinha detalhes que lembravam flocos de neve. Enfeitavam a manga comprida, em contraste com o negro, circundando as mãos delicadas.

Tratava-se de uma mulher de aparência jovem, de uma presença envolvente. Margery assim que a identificou, preparou-se para atacá-la. Porém, se conteve por perceber que a intervinde na luta havia cessado seus passos. Sem entender a atitude, analisou-a com seu olhar, seriamente. Procurou lhe dirigir a palavra, com a intenção de receber uma resposta que justificasse sua presença, contudo percebeu que outra pessoa também estava atravessando a fenda no momento. Reconheceu a presença de seu senhor rapidamente e com isto se conteve. Uma pessoa trajando uma robe branco semelhante ao de Vlad finalmente atravessou a fenda e caminhou em direção á Margery, deixando-a apreensiva.

– Por quê?... – indagou Margery, demonstrando perplexidade por seu mandante ter trazido a jovem de vestido negro á luta.

– Você vê, mas não enxerga, preste mais atenção. – repreendeu o rapaz de aparência jovem, trajando um robe branco que tinha uma linha negra tracejando toda sua extensão.

A ruiva fixou os olhos na jovem de vestido negro. Percebeu que a mesma erguia seu rosto para fitá-la, neste momento, notou um detalhe na testa da mesma. Este detalhe a fez mudar sua fisionomia.

– Não é possível... – balbuciou a devatã do fogo, assumindo uma expressão de surpresa.

– Sim, é possível. – disse o rapaz de roupas brancas. – Hecate Chronus está sob meu comando.

A ruiva gargalhou intensamente, enquanto observava o olhar distante de Hecate, que a observava com seus olhos esverdeados. A figura de uma linha vertical negra na testa da jovem, interceptada por duas linhas diagonais também negras, fora responsável por fazer Margery sentir-se aliviada e gargalhar por conseqüência. Por um momento, esqueceu-se de sua relação com o rapaz ao lado da Chronus e lhe dirigiu a palavra animadamente:

– Isto é fantástico! Agora conseguiremos encontrar o descendente da família Yggdrasil!

– Não se exalte... – aconselhou.

O superior de Margery apesar de trajar uma roupa semelhante á de Vlad, tinha um aspecto diferente. Enquanto procurou inibir a euforia da ruiva, ajeitou seus óculos que possuíam lentes discretas. Possuía cabelos lisos, curtos e negros que lhe davam um aspecto intelectual. Tinha a aparência jovem, parecia ter a mesma idade de Vlad. Sua pele também era pálida e seu porte físico não era proeminente, se assemelhando ao do rapaz de olhos vermelhos que ainda se encontrava paralisado dentro da esfera azulada que Hecate Chronus havia conjurado em sua técnica.

No momento em que o rapaz de trajes brancos iria iniciar outro diálogo com sua subordinada, a esfera de Hecate que prendia o Chernobog trincou em alguns pontos. Logo depois rachou por completo. Após se despedaçar libertou o deva de cabelos prateados que logo se recompôs. Surpreendeu-se por perceber que sua amiga de infância estava ali.

– Hecate! O que você... – as palavras cessaram, sua expressão de surpresa alterou subitamente em uma expressão mista de ódio e seriedade. – Você... – direcionou o olhar ao superior de Margery que se encontrava próximo do portal que se fechara logo depois das palavras direcionadas a sua pessoa. – O que você fez com ela, Hiero? – indagou, esperando a pior resposta.

– Veja... – disse, caminhando alguns passos adiante, se aproximando de Hecate. – Conhece esta técnica e sabe muito bem que agora eu estou dominando esta mente. Não é mesmo, minha querida? – indagou, direcionando seu olhar a jovem que tinha um olhar distante.

– Sim, senhor. – respondeu pausadamente.

– Muito curioso. – disse Hiero, silenciando-se por alguns segundos. Logo depois gargalhou por alguns instantes, chamando a atenção de Vlad. – Eu mereço uma salva de palmas por meu grande feito! Senhoras e Senhores! – acrescentou, virando-se e direcionando seu olhar as pessoas que não haviam sido paralisadas pela magia de transfiguração dimensional e haviam assistido todos os eventos.

As pessoas aplaudiram e gargalharam logo depois, deixando Vlad extremamente irritado.

– Eu sabia. – disse o Chernobog, serrando os punhos.

– Margery... – chamou Hiero. – Eu assumo a partir de agora.

– Ufa! Eu já estava ficando cansada. – disse a moça, se dirigindo a Hecate e seu mestre, posicionando-se ao lado do mesmo logo depois.

– Meu caro Vlad, eu... – antes que pudesse terminar sua fala, um soco atingiu uma barreira azulada que se projetou a frente do jovem de óculos, protegendo-o. O Chernobog ressurgiu por diminuir sua velocidade deslizando pelo chão durante alguns segundos até parar. – Quanta falta de educação. – satirizou Hiero, retirando seus óculos para limpá-lo na camisa branca por dentro de seu robe robe aberto. – Muito obrigado, Hecate. – acrescentou, sorrindo para a jovem que lhe retornou o agradecimento. – Se você quiser ter uma conversa civilizada, não será problema para mim, Vlad. – acrescentou, recolocando os óculos.

– Eu juro que vou te matar!

– É mesmo? – indagou o jovem de trajes brancos e logo depois balançou sua cabeça negativamente. – Vejo que você só pensa em lutar, lutar e lutar. Pois bem, divirta-se. – acrescentou, aproximando-se de Hecate. – Meu anjo, dê o melhor de si para destruí-lo, está bem? Este verme já me deu muita dor de cabeça.

– Como desejar, meu senhor.. – respondeu, direcionando seu olhar aos olhos castanhos de Hiero.

– Isto é muito bom. – sorriu o rapaz. – Boa sorte. – acrescentou, caminhando em direção oposta ao Chernobog. – Vamos Margery, temos muito trabalho a fazer.

– Estou indo! – exclamou a garota, tentando correr. – Esse vestido é uma droga! Muito apertado! – gritava, enquanto tentava seguir seu senhor.

– Não irei deixar você escapar novamente! – gritou Vlad, desaparecendo.

– Coercitio ad tempore. – disse a jovem de vestido negro. Antes que a esfera azulada se formasse ao redor do Chernobog, o mesmo conseguiu escapar aumentando sua velocidade.

– Hecate! Não se deixe dominar por este cantio! Você é mais forte que a mesmerize do Hiero! – exclamou, tentando retirar a garota do transe.

– Senhor Hiero Krýpsimo para você! – exclamou, virando-se para olhar a luta, com um sorriso no rosto.

– Nós não íamos embora? – indagou Margery, demonstrando uma forma estranha de se dirigir ao seu superior, forma esta que correspondia ao seu tipo de personalidade. Ou talvez, a sua falta de experiência em pertencer a uma posição que nunca havia conquistado antigamente.

– Isto será interessante. Não posso perder esta luta e desta vez vou me certificar para que ele não sobreviva. – justificou.

– Ah! Droga! – exclamou a ruiva, arrumando seu vestido desastradamente.

Preview:

...

– Desista, Vlad. – disse Hiero, assumindo um semblante sério e um olhar sombrio. – Tenha um pouco de...

" Mestre... Tenho em mãos o que desejas. Estou a caminho para lhe entregá-la. Por favor, me conceda o portal. "

O devatã de olhos escarlate percebeu que Hiero cessou sua fala subitamente, assumindo um sorriso no rosto logo depois. Deduziu que algo o havia interrompido, mas não fazia a mínima idéia do que poderia se tratar.

– Hoje é meu dia de sorte! – exclamou, ajeitando os óculos e deixando seu alvo confuso. – Tenho outra surpresa para você. Espero que goste, pois juro que fiz isto de coração.

– Juro que o arrancarei de seu peito com minhas próprias mãos. – ameaçou o Chernobog, virando-se para encarar seu oponente, sem entender a euforia do mesmo.

– Ora, não seja insolente. – sorriu. - Ah! Desculpe-me! - exclamou, colocando a mão na testa. – Acho que perdi a cabeça. – pronunciou tais palavras, pausadamente. – Realmente não tenho coração.

Neste instante, uma nova fenda longitudinal projetou-se ao lado de Hiero e todos a olharam atenciosamente. Após a fenda se abrir, uma pessoa caminhou para fora.

....

Próximo capítulo: O grito do tempo.