Eram apenas sete da noite. A brisa fria rodava a cidade, tirando as pessoas das ruas e as trancando dentro de casa. Apenas os corajosos e os amantes do frio caminhavam pelo parque naquela época do ano. Sou professor de literatura, e é uma coisa da natureza o fato de eu amar tanto ler. Os livros, o cheiro, a história, os amantes, a violência, o sexo, a vida que não é nossa. Tudo em pedaços de papeis juntos entre duas capas grossas, onde grandes letras prateadas davam nome aquela falsa realidade. Tudo tão diferente do real. Tudo tão parecido com minha vida.

Eu andava pelo parque a noite, naquela época do ano. Três de setembro. Havia sido o primeiro dia do ano letivo. Novos alunos, novos desafios, novas histórias, mas um antigo amor. Um amor inalcançável. Todos os dias e todas as noites eu me perguntava.

Depois de tanto tempo sem nenhuma resposta ao meu apelo desesperado por um amor simples, por que responder a mim com um amor impossível como nos livros?

Era uma droga. Sim, era. Era algo que eu já não sabia mais como controlar. Eu não era mais um adolescente. Eu não tinha mais 15 anos de idade. Eu já não tinha mais direito de sonhar com um primeiro amor como os livros que eu tanto lia. Então por que eu estou passando por isso, assim tão tarde? Eu estava no auge dos meus 23 anos. Se eu tivesse que sonhar com um primeiro amor, que fosse mais suave. Mas por que tinha que ser por ela? Por que tinha que ser alguém que está tão perto, mas que mesmo se eu esticasse meus braços, não poderia alcançá-la? Eu realmente não posso fazer isso? Seria tão cretino a esse ponto?

Oito horas.

Eu ainda não havia levantado do banco que havia sentado meia hora atrás. O parque continuava frio e vazio. Apenas eu e aquela brisa fria, mas suave pra alguém como eu?

– Professor Jared?

Por que tinha que ser você? Por que tinha que ser tão linda? Por que meu coração estava tão acelerado naquele momento. Por que eu estava começando a desejar você em meus braços. Desejava te proteger e te tirar deste frio. Por que eu queria que você parasse de tremer tanto assim. Por que estava com um casaco tão fino? O que estava pensando ao sair de casa assim? E se pegasse um resfriado? Eu não poderia cuidar de você.

– O que faz aqui, Lily?

– Eu marquei de encontrar meu melhor amigo, mas acabei levando um bolo – ela sorria; meio decepcionada por ter sido abandonada. Não fique assim. Eu estou aqui. – Por que está... Olha, tudo bem se eu te chamar de Jared fora da escola? Eu me sinto estranha... É estranho, mas se você não quiser eu posso...

Eu não consegui segurar uma longa e alta risada. Por um momento, Lily me olhou como se eu estivesse louco, como se eu não fosse o Jared sério que seu professor de Literatura. Mas logo ela se juntou a mim e sua risada aqueceu meu coração. Estava menos frio, agora. Era aceitável o fato de ela ter estranhado minha risada tão alta. Eu não era assim. Digo, dizem que sou imprevisível. Devo concordar com isso? Definitivamente. Ou então, eu não teria me apaixonado por você.

– Claro que pode. Você pode.

Ao terminarmos aquele momento descontraído, percebi que ela continuava tremendo. Como nos livros que eu devorava nas noites em que ficava sozinho no apartamento, tirei o casaco grosso que vestia e a cobri com ela, tomando cuidado para que não tocasse em sua pele, ou não saberia o que poderia fazer em seguida.

– Não precisa fazer isso, eu já estava indo pra casa...

– Então deixa eu te ac... – Eu tentei, mas ela sempre fazer atitudes desse tipo. Eu estava apaixonado. – Deixa que eu te acompanhe até em casa.

Lily apenas acenou com a cabeça com um magnifico sorriso envergonhado. Ela era linda. Ela era graciosa, tão tímida, mas tão forte e intimidante quando queria. As outras garotas não a viam como ela deveria ser vista, não a aceitavam do jeito que ela era e isso sempre me machucava por dentro. Sempre me feria de um jeito inimaginável. Mas ela sempre dava um jeito dessa ferida sumir quando sorria. Um sorriso que não havia igual.

– Lily, você... Este é seu ultimo ano no Ensino Médio, pretende cursar o nosso departamento universitário?

– Definitivamente. Não tem melhor lugar, além disso... – Ela respirou fundo antes de continuar. – Não tem outro lugar onde eu queira ir.

– Isso é bom, por que... Por que...

– Por quê? – Por que assim eu vou poder continuar a ter ver. Mas eu não podia dizer isso a minha aluna. Minha aluna.

– Lily, onde você mora?

– Naquele apartamento logo ali – ela não pareceu se importar com a maneira súbita de eu ter trocado de assunto tão rápido. Era melhor assim.

Estávamos chegando perto do lugar onde ela morava com a família. Aquela noite havia se tornado tão aconchegante. Eu queria poder segurar na mão de Lily e pedir que ela mantivesse meu coração calmo, do jeito que ele estava naquele momento.

– Bem, é aqui.

Ela se virou pra mim. E sorriu.

Não faça isso, Lily Victória Cockburn.

– Obrigada por ter me acompanhado, Jared.

Não faça isso. Não diga meu nome com esse sorriso.

– Até amanhã.

Não me faça cometer loucuras, Lily Victória Cockburn.

– Volte pra casa com segurança, okay? – Ela tirou o casaco e o colocou em meus ombros.

Não faça eu me apaixonar por você desse jeito.

– Boa noite, Jared.

Não vai ter volta.

– Boa noite, Lily.

Ela virou e eu a segurei pelo braço. Segurei seu rosto e encostei nossos lábios. Foi simples. Apenas um beijo que não poderia ser descrito nos livros. Nem os sentimentos. Esse tipo de coisa é bem diferente na vida real. Não existe aqueles choques que tanto são descritos. O mundo ao nosso redor não para. O relógio não para. Não existiu, durante aquele beijo, apenas nós dois. Porém, foi algo que os livros não podem descrever, livro nenhum pode dizer com precisão o que acontece nesse exato momento. A única coisa que eu poderia pensar era que eu estava completamente apaixonado por minha aluna.

– Lily, quem é seu namorado?

Eu afastei meus lábios, mas não soltei seu rosto. A voz feminina vinha de cima.

– É a minha madrasta – Lily sussurrou.

– Me desculpe. De verdade.

Afastei-me dela, sem olhar para cima. Se ela visse meu rosto, eu estaria em perigo. Lily também.

Apenas abaixei a cabeça e virei-me, voltando o caminho, agora sozinho.

Era uma droga.

Não posso mais voltar.

Eu estou apaixonado por você, Lily.