O Preço da Honra escrita por Julia Nery


Capítulo 26
Bem Vindos a Nassau




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Não muito tempo depois, o ocorrido com a tribo de Ko’kuo foi lentamente juntando-se aos assuntos não falados entre Emma e Connor. Ele sentia que não deveria tocar no assunto, temendo frustrá-la ou deixa-la ainda mais chateada, e ela o agradecia internamente por isso. Ele havia feito companhia para ela durante a maioria das noites que se seguiram, o que tornava tudo um pouco mais fácil. Mas a tarefa de livrar seu coração de todo aquele pesar era extremamente tortuosa. No entanto, alguma hora ela teria de seguir em frente.

Os guerreiros da tribo estavam quase sempre escondidos na floresta, aparecendo na vila raramente, como uma presença discreta durante a maior parte do tempo. Todos sabiam que estavam ali, vigilantes, mas Emma percebera que os aldeões da fazenda os haviam recebido com gratidão e alívio. A propriedade estava segura. Então, Connor julgou ser seguro ordenar que o Aquila alçasse velas.

Foi numa manhã clara e gelada que os dois navios zarparam para fora da baía da Fazenda Davenport, deixando para trás apenas rastros de espuma no oceano. Emma havia sido avisada que a viagem seria longa, mas não teve de se preparar muito; não tinha muitas posses nem desse lado do oceano, nem na Inglaterra. Então, quando subiu no navio, tinha apenas suas armas e alforjes consigo, e era tudo que ela precisava.

De acordo com James, eles estavam seguindo em direção aos mares do Caribe, um lugar com uma fama terrível em Londres no qual Emma nunca colocara os pés antes. No entanto, ela ouvia os homens da tripulação comentando como se sentiriam mais em casa lá do que em qualquer outro lugar, e ela assumiu que teria que ver com seus próprios olhos para tirar uma conclusão melhor.

Passou a maior parte da viagem, que durou quatro dias inteiros, ou nos aposentos de Connor, lendo os vários livros e pergaminhos que se encontravam ali, ou no topo do mastro principal, sentindo o vento no rosto e observando a imensidão azul que os cercava por quase todos os cantos. Durante a noite esfriava, e ela era obrigada a descer, mas nesse período, não havia luz, então o mar refletia o céu estrelado, fazendo parecer que eles flutuavam na própria noite. Para superar o tédio, os homens organizavam pequenos conflitos quase amigáveis depois de beber algumas garrafas de bebida, para as quais Emma foi desafiada e nas quais ela não encontrou quase diversão nenhuma, uma vez que ganhou todas as lutas sem exceções. Uns ergueram suas garrafas brindando a ela, outros apenas esperavam por uma oportunidade de revanche.

A mudança no clima era quase palpável; conforme eles se aproximavam mais de seu destino, as montanhas vistas ao longe no continente iam se rareando, até que apenas se podia ver planícies. Os carvalhos foram substituídos por altas palmeiras, e arquipélagos começaram a surgir, cercados por águas extremamente claras. A temperatura subia, e o inverno parecia estar sendo deixado para trás como um sonho ruim.

Emma estava cochilando sentada na cadeira acolchoada na cabine do capitão quando ouviu o som de gaivotas lá fora. Abriu os olhos com um leve susto, sua mão indo automaticamente para a espada embainhada. Estivera lendo ali durante a noite passada e nem havia notado que pegara no sono; parecia que apenas alguns minutos haviam se passado, mas a luz que entrava pelo vidro opaco do ambiente provava o contrário. Já estava de manhã, e o cheiro de rum e peixes estava mais forte do que nunca, o livro que estivera lendo, no chão.

Quando se levantou para sair, percebeu que o navio oscilava suavemente, mas estava parado no lugar, e que ela estava sozinha. O som da tripulação chegou a seus ouvidos quando ela abriu a porta, e viu os homens amarrando as velas e baixando âncora.

O mundo que a cumprimentou lá fora parecia vindo de uma pintura surrealista; o céu estava tão limpo que os olhos âmbar de Emma assumiram um tom azulado enquanto ela o observava. Andou até a rampa que descia do Aquila até um píer longo e malcuidado, surpreendendo-se com a cor do mar que beijava as praias de areia branca, salpicado por vários outros navios, inclusive o Mockingjay. Palmeiras decoravam a paisagem, e algumas aves vermelhas e azuis desconhecidas a Emma voavam por ali.

— Estamos bem longe de casa — Alguém comentou atrás de Emma, e ela virou-se ao mesmo tempo que Faulkner passava por ela, descendo para terra firme.

De fato, Emma murmurou para si mesma. Seus olhos curiosos detectaram Connor e James, já fora de seus navios, e provavelmente esperando por ela, no fim do píer. Ambos viraram-se quando ela se aproximou, puxando o capuz para cima da cabeça. Connor havia trocado de volta para seus robes brancos de assassino, mas James estava com as mesmas roupas de sempre.

— Bem-vindos à Nassau — Ele disse enquanto Emma e Connor o seguiam para longe da praia. — Não é grande coisa, mas serve bem aos nossos propósitos.

— A Inglaterra têm influência aqui? — Emma perguntou, olhando à sua volta.

— É uma longa história — explicou. — Depois da Batalha de Nassau quatro anos atrás os Patriotas Americanos conseguiram ocupar a cidade por algumas semanas, e levaram quase todos os mantimentos. Não há muitos olhos voltados para Nassau neste momento, uma vez que está em sua decadência, e é um dos motivos pelos quais escolhemos nosso ponto de encontro aqui. Mas sinto que isso mudará, logo.

— Acha que serão atacados novamente?

— Talvez. É um ótimo ponto de comércio e, mais cedo ou mais tarde, os europeus colocarão suas garras para fora. Mas enquanto isso não acontece, aproveitemos a sombra das palmeiras.

James virou-se, deu um sorriso torto e deu de ombros, bebendo um gole muito generoso da garrafa que parecia sempre estar em sua mão. Emma suspirou, dando-lhe um olhar de desaprovação, mas não conseguiu conter um pequeno sorriso. James era dono de um espírito único, muito entusiasta, o que Emma invejava de certa forma.

— Sigam-me — disse ele.

Emma andava atrás de Connor e James, observando com cautela o ambiente simples e apagado que a cercava. Era diferente de qualquer coisa que ela já havia visto, mas mesmo dali, ela conseguia ver que Nassau não era extremamente grande quando se tratava de terras ocupadas pelas casas, que eram de sua maioria feitas de palha e madeira. Poucas delas estavam intactas, algumas tendo destroços ao seu redor ou os tetos de palha chamuscados e pretos de cinzas que um dia haviam queimado, o que indicava os resquícios da batalha que James mencionara.

Algumas barracas simples se encontravam em pontos separados da orla da praia da qual se afastavam, e um enorme forte decorava o topo de uma montanha ao oeste. Tinha alguns buracos, provavelmente causados por balas de canhões, mas não perdera sua magnitude ou imponência. Provavelmente fora testemunha de muitas batalhas, mas agora parecia completamente abandonado.

As ruas eram quase desertas, exceto por alguns mercantes e piratas, talvez alguns moradores simples. A maioria andava com a cabeça baixa, evitando trocar olhares com outros indivíduos, mas quando passaram, quase todos desviaram-se para os forasteiros que chegavam, uma carregando uma águia no ombro. Aparentemente, em qualquer lugar do mundo, aquela cena era peculiar.

Emma suspirou, e observou os dois homens que andavam lado a lado à sua frente. Então parou no meio da rua. Os dois continuaram a andar, uma vez que James estava mais interessado e sua garrafa, e Connor parecia tão curioso quanto Emma, e observava os arredores como ela fizera. Talvez ele também nunca estivera tão longe de casa. Mas ela desejava ficar sozinha.

Ela então tomou à direita, querendo tomar sua própria rota. Entrou em um beco vazio onde podia apenas se encontrar caixotes úmidos vazios e farrapos velhos sujos de areia. Aquele ponto da cidade já não fedia tanto, e ela seguiu reto até se encontrar na orla da mata verde que cercava Nassau. O cheiro de orvalho era agradável, e ela se sentia um pouco mais leve.

Os outros dois dariam falta dela em alguns minutos, mas Emma acreditava que, àquela altura, eles soubessem que ela podia se virar sozinha, ou quase. Mas Nassau não era tão grande e ela confirmou isso quando, em seu próprio ritmo, escalou um penhasco onde a floresta terminava, e deixou seus pensamentos viajarem mais uma vez enquanto observava a ilha com Akwe.

A solidão, em tempos turbulentos como aqueles, mostrava-se uma ótima aliada para quem sabia aproveitar sua companhia. Ela desejava ficar ali, sentindo a pedra fria do penhasco sob seus dedos, deixando Connor e James lidarem com algo que ela não saberia ajudar. Queria suspirar através dos minutos, pensando em seu pai. Mas os distúrbios sempre achavam seu caminho até ela.

Os sentidos sempre atentos de Emma detectaram movimentos e sons perto de sua localização, e os olhos cor-de-mel desviaram-se de leve para baixo visando identificar sua fonte. Franziu as sobrancelhas quando descobriu três casacas-vermelhas reunindo-se sob as árvores, conversando.

O que eles poderiam estar fazendo ali ainda era um mistério, mas Emma levantou-se do penhasco e lançou Akwe ao alto para que alçasse voo, e pulou para o galho mais próximo. Se aproximou tomando cuidado para não fazer muito barulho, abaixada em uma posição quase felina enquanto deslizava pelas árvores.

— Não sei se deveríamos fazer isso — Emma conseguiu escutar a primeira voz, vinha do guarda mais baixo dos três, e ela parou quando conseguiu seu ponto de vantagem. — Talvez devêssemos pedir reforços do armazém.

— Não seja tolo — repreendeu o próximo, desta vez o mais alto do grupo. Tinha uma voz um tanto ríspida e um rosto severo. — São apenas piratas, e eles estão em seu pior momento em Nassau. Willy disse que eles estavam planejando algo grande, e nós estamos aqui para dar um fim a isso. Há apenas quatro deles, quase um para cada bala de nossos rifles. Talvez nem estejam armados.

— Melhor irmos logo, acabar com isso de uma vez — o terceiro finalmente manifestou-se. — Estou com uma sensação estranha.

Os três continuaram a caminhar em direção ao norte, seguindo a floresta que margeava a cidade. Emma os seguiu de cima, mantendo-se sempre atenta. Poderia pará-los agora, mas queria ter certeza de que poderia escutar cada pedaço de informação que poderia, e saber de quem eles estavam atrás, apesar de seu instinto indicar que talvez ela já soubesse a resposta.

— O que Willy disse exatamente? — Perguntou o mais baixo novamente enquanto os três andavam estranhamente devagar, segurando os rifles nas mãos na posição usual dos guardas.

— Disse que os piratas estão planejando um ataque grande — respondeu o mais alto, que Emma suspeitava ser uma espécie de líder. — Sabemos que ele pode ser um pouco paranoico as vezes, mas temos que levar em conta que o batalhão confiscou recentemente alguns dos canhões dos navios deles. Então é melhor cortarmos o mal pela raiz antes que eles finalmente comecem a se movimentar.

— E quem foi que deu estas ordens? — Perguntou o terceiro. — Foi você?

— Não importa quem foi — resmungou o líder. — É por um bem maior.

— Se formos punidos por causa de suas ideias malucas, eu juro que tornarei sua vida um inferno.

Com aquela última ameaça, a conversa deu-se por encerrada e eles continuaram em silêncio. Emma estava se preparando para eliminá-los em silêncio, ativando suas lâminas, mas eles haviam chegado ao seu destino, e ela se distraiu ao ver quem estava ali.

Os guardas pararam na entrada de uma pequena clareira onde, mais à frente, no centro, uma mesa redonda se encontrava numa área quase sem grama, com pequenas construções de madeira em volta que poderiam ser depósitos de algo. Cinco homens estavam reunidos em volta dela, e James e Connor ergueram seus olhos com os outros três quando os casacas-vermelhas entraram em seu campo de visão.

Emma parou acima dos guardas, e tinha certeza de que ninguém conseguia vê-la ali, já que estava cercada por folhas. Mas ela conseguia vê-los bem acima dos galhos, e se encostou no tronco, cruzando os braços e suspirando, esperando que o conflito começasse.

— H-Há cinco deles, Thomas — gaguejou o mais baixo e claramente o mais covarde de seus companheiros. — Parece que suas informações estavam erradas.

No entanto, os outros dois não fraquejaram, e tomaram a dianteira de seu amigo, segurando os rifles em uma posição mais agressiva desta vez, mas não os apontavam aos outros presentes ainda. Os piratas tinham olhares de desdém para os guardas, mas Emma não conseguiu ver o rosto de Connor.

— Viemos avisá-los — o líder falou mais alto com um tom falso de coragem que Emma conhecia bem. Estava presente na voz de muitos templários que ela matara, e ela bufou quando viu a mentira que o guarda estava prestes a balbuciar. — Há ordens de Vossa Majestade e do comandante do batalhão de Nassau para que saiam desta ilha imediatamente. Sem barganhas.

Ninguém respondeu por um instante, deixando apenas as árvores sussurrarem, mas então uma risada de escárnio alta ecoou pelas árvores, e Emma viu que vinha de alguém ao lado de James, um homem alto com uma barba grossa e loira que esbanjava robes negros gastos pelo tempo.

— Pode mandar seu rei para as profundezas do tártaro! — Gritou ele, apontando um dedo para o guarda. — Ele não dá ordens por aqui, plebeu! Vá-se embora daqui.

Emma deu uma pequena risada do sotaque forte francês daquele homem e do modo artístico estranho do qual ele falava.

— É uma ordem das autoridades sem discussões! — O terceiro guarda berrou de volta, e ergueu seu rifle para os piratas. Os outros dois o seguiram. — Ou sua saída, ou suas mortes! A escolha é de inteiramente de vocês!

Os homens do outro lado não possuíam rostos nada amigáveis, e até mesmo James parecia mais perigoso que o normal, os olhos verde-esmeralda cintilando. Connor tinha os braços cruzados, e sua passividade fez Emma suspeitar que ele talvez soubesse que ela estava ali. Ela suspirou, decidindo acabar com aquela brincadeira ridícula que não era nada além de uma perda imensa de tempo.

Ativou suas lâminas e saltou do galho, eliminando os dois guardas da frente com perfurações na parte de trás da cabeça. Ambos deram gemidos engasgados antes de suas vidas escorrerem para fora de seus corpos, e o terceiro deu um berro quando Emma apareceu ali, como uma assombração.

A assassina se levantou devagar, sabendo que ele possuía sua arma apontada para ela, e em menos de milésimos de segundos ele atiraria, mas havia alguém ali que era mais rápido que aquilo. Uma flecha passou zunindo tão próximo do rosto de Emma que ela sentiu o ar se movendo, e um pedaço de seu cabeço esvoaçou com o objeto, mas foi um tiro certeiro vindo das mãos de Connor.

Akwe mergulhou do céu e abriu as asas enormes antes de pousar novamente no ombro de Emma enquanto o lugar voltava ao seu silêncio original. Mas não por muito tempo.

— Por deus! — Exclamou o mesmo pirata que gritara para os guardas antes, o com sotaque francês. Ele andou com passos largos até Emma, estendendo sua mão para ela. — Quem é esta leoa magnífica que apareceu para salvar nossas miseráveis peles?

Emma deu um tapa na mão dele, abaixando-se para checar os bolsos dos guardas enquanto o ignorava com um olhar frígido e imparcial. No entanto, ele riu novamente, fazendo o som ecoar nos arredores, e Emma revirou os olhos. Ele não era muito sutil.

— Muito feroz, não? — Ele abaixou-se ao lado dela e tentou segurar seu rosto entre os dedos cheios de anéis.

Emma desviou-se, mas desta vez segurou sua mão e deu-lhe uma rasteira, mesmo estando agachada. O homem caiu com as costas nas folhas, e ela prosseguiu para colocar uma de suas lâminas sobre seu pescoço.

— Não me toque — disse, em um tom brando, mas ameaçador. — Outros já cometeram este erro. E cometeram-no apenas uma vez.

O homem ergueu as mãos em ato de rendição, mas estava visível em seus olhos que ele estava se divertindo muito com aquela situação. Emma suspirou, lançando olhos entediados de desaprovação para ele, e retraiu suas lâminas, voltando a checar os guardas.

— Que mulher! E tem um pássaro também!

— Devo perguntar como apareceu aqui, minha querida Emma? — James apoiou uma mão na espada e deu as costas para ela, continuando a ler os papéis. — Sabe, sentimos sua falta.

— Estava apreciando a vista — Emma respondeu com eufemismo, levantando-se e levando consigo apenas algumas moedas e cartas dos guardas. Removeu a flecha de Connor da testa do homem e pulou o pirata que ainda a observava do chão com olhos sonhadores. Andou até Connor, entregando-lhe sua flecha de volta. — Aqui está — e parou ao lado dele, cruzando os braços e baixando a cabeça para as cartas, como se nada tivesse acontecido. Akwe pareceu observar de seu ombro enquanto ela folheava os papéis.

— Emma, estes são Gilbert e Travis — James indicou cada um com um aceno rápido de mão. — Maurice você já conheceu. Homens, Emma Pierce.

— Onde estávamos? — Outro dos piratas disse, Travis, e este parecia mais sério. — Realmente não temos tempo para introduções.

Emma concordava. Enquanto eles retomavam o que quer que seja que estavam conversando antes daquela inoportuna intromissão, Emma lia os papéis que encontrara nos guardas, que estavam amassados e negligenciados, abrindo-os e correndo os olhos pelas palavras escritas em uma caligrafia nada elegante.

Alguns eram cartas, outros apenas relatórios de mantimentos como comida e munição. No entanto, em uma das cartas – que estava endereçada a um certo comandante Briggs – eram mencionados os canhões dos quais ela ouvira falar anteriormente, e haviam algumas informações ali que poderiam ser de utilidade aos homens à sua frente.

— Ouvi dizer que tiveram seus canhões confiscados pelas autoridades locais — Ela ergueu os olhos por baixo do capuz para os piratas em volta da mesa. Eles voltaram-se para ela com surpresa, como se não esperassem que ela falasse novamente. — É verdade?

— Há! Confiscaram! — Debochou o homem com o sotaque francês, Maurice, que havia voltado à mesa. — Esta palavra está extremamente mal utilizada, se me perguntar. “Roubaram” seria mais adequado.

— Sim, é verdade — simplificou o outro, que possuía os olhos azuis mais profundos que Emma já vira, e um rebelde cabelo marrom claro. James o apresentara como Gilbert. — É exatamente o que estamos tentando resolver. Por qual razão pergunta?

Emma não respondeu, apenas lhes estendeu a carta aberta e quem a pegou foi James, lendo-a com atenção. Quando chegou à parte que fizera Emma questioná-los sobre os itens roubados, ele deu um sorrisinho, e teve a carta arrancada de suas mãos por Gilbert, que também deu uma risada alta ao ler seu conteúdo.

— Ah, Emma — James aproximou-se dela, tomando sua mão e deixando um suave beijo ali. — A divindade solucionadora de problemas alheios.

Emma puxou sua mão de volta, mas não segurou um pequeno sorriso que se manteve em segredo pela sombra que seu capuz projetava. Era difícil manter uma posição ou atitude ameaçadora com James e sua aura revigorante por perto. Emma perguntou-se se aquele era o verdadeiro efeito do rum.

Connor mexeu-se ao lado dela.

— O que diz a carta? — Perguntou pela primeira vez.

— Diz que os canhões de meus companheiros ainda estão aqui, num armazém perto da orla da praia do outro lado da ilha — revelou James. — Talvez a situação não esteja completamente perdida.

— Não entendo a comemoração de vocês, sinceramente — Travis rebateu, sentando-se em uma cadeira próxima enquanto tirava a garrafa de rum das mãos de James e dava um gole lento e bem-vindo. — Diferente do resto da cidade, aquele armazém está altamente protegido. Mesmo se conseguíssemos entrar, nunca conseguiríamos destrancar o galpão sem uma chave, muito menos sair com vinte e quatro canhões de lá sem sermos vistos e sem que soem o alarme.

Emma suspirou, cansada daquela negatividade e estava prestes a sugerir uma ideia que formulara em sua cabeça discretamente enquanto eles falavam. No entanto, antes que ela pudesse dizer algo, Connor se manifestou.

— Deixe isso conosco — disse o assassino, tirando as palavras da boca de Emma enquanto se afastava da árvore onde estivera encostado. — Nós lidaremos com os guardas e com seus canhões.

Era um pouco surpreendente a Emma como sua mente e a de Connor haviam adquirido aquela sincronia silenciosa. Ela iria sugerir exatamente a mesma coisa, e nem precisou falar que concordava com a ideia dele; ele já sabia.

— Vamos, Emma — disse, andando para longe dos outros com passos largos, e ela o seguiu.

— Posso perguntar como farão isso? — Gilbert perguntou, fazendo-os parar e se virar novamente para os piratas. — Há apenas dois portões ao longo da muralha de estacas de madeira, um com um grupo inteiro de guardas em frente e outro trancado com um cadeado, voltado para a praia.

— Há dias que estamos tentando recuperar aqueles canhões — Travis comentou com um tom de descrença. — O que os faz pensar que conseguirão sozinhos?

— Eu não os subestimaria ainda, Travis — James sugeriu e virou-se para Emma. — O que precisa de nós, Emma?

— Apenas reúna alguns de seus homens para levar os canhões de volta para seus navios — ela murmurou em resposta, e Maurice deu uma risadinha nada discreta, como se achasse engraçado que ela já estava assumindo que os recuperaria sem qualquer esforço. — Como Connor disse, deixem o resto conosco. Não interfiram em nada, e terão suas armas. Atacaremos durante a noite.

***

O armazém ficava muito longe da cidade, numa área remota da ilha e próxima à floresta, onde Connor e Emma haviam ficado durante a tarde e crepúsculo sentados em um galho alto de uma árvore observando os padrões das patrulhas dos guardas. Quando a noite envolveu toda a cidade e os animais noturnos começaram sua sinfonia, ambos já haviam formulado um plano.

— Tem certeza de que consegue escalar com estas roupas? — Connor perguntou, olhando-a da cabeça aos pés. — Você também não poderá levar nenhuma de suas armas mostrando... Tanta pele assim.

Ao invés de todo seu traje assassino, Emma usava uma saia verde musgo e púrpura cheia de babados, com um corte enorme ao longo de seu comprimento que mostrava uma quantidade indecente de suas pernas, juntamente com um corpete de couro preto com um decote generoso demais. Ela os havia roubado de um prostíbulo decadente de Nassau e pouco combinavam com suas botas — a única peça que mantivera de seu traje usual — mas ela se recusava a colocar sapatilhas. Estava ridícula, mas era parte essencial do plano.

— Eu sei, mas é a única forma que possibilitará que eu entre — Emma suspirou. — Tentarei ser rápida. Quer repassar o plano?

— Vá em frente — Connor cruzou os braços e se encostou contra a árvore.

— Muito bem — Emma respirou fundo. — Eu irei encontrar um guarda e usá-lo para entrar no perímetro do armazém. Quando eu me livrar dele, entrarei na casa do comandante Briggs e tentarei encontrar a chave do galpão e do portão de saída. Enquanto isso, você cuidará de uma distração que permitirá que você e os homens de James tenham uma passagem livre quando forem retirar os canhões do armazém.

— Correto — ele assentiu, puxando o capuz para cima da cabeça.

— Vamos lá, então — Emma ficou em pé no galho. — Vá verificar se James já mandou seus homens para a saída da praia, leve Akwe com você. Vou encontrar um guarda para seduzir.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler, comentários são muito apreciados ♥