– Olá, Estranho! – XX-23 disse adentrando no local que seria sua primeira “aula” com Steve Rogers.

O Capitão estava distraído passando umas faixas brancas ao redor de suas mãos, ele foi tomado pela surpresa ao ouvir a voz da garota, virou-se para ela e sorriu timidamente.

– Olá. – Disse ele.

Ela foi se aproximando de Rogers olhando para o galpão. Era o mais cheio de coisas que ela havia estado, tinha um ringue de luta livre completo num canto, vários sacos de areia para treinar golpes dentro de um armário de porta de vidro, uma parede para escaladas com bastantes obstáculos, e uma rede de cordas para o mesmo. Havia também pesos para musculação e algumas fotografias pela parede.

A decoração do local era diferenciada, antiga, feita especialmente algum tempo atrás para agradar o Capitão, sendo um lugar mais familiar.

– Vou ter que lutar com você?... – Ela disse apontando o polegar para o ringue no fundo do cômodo -... Quero que saiba que sou pacifista.

– Você não foi “pacifista” quando teve que lutar com a agente Romanoff. – Ele observou desconfiado.

– Okay!... Você me pegou... É que... Você já viu o seu tamanho e já notou o meu? Olha a largura do seu braço!... Não será nunca uma luta justa. – Ela fingiu se encolher de medo.

– Não se preocupe, eu nunca te machucaria. – Ele tentou confortá-la enquanto enfaixava a outra mão.

– Então é sério? Vou ter que lutar com você? – XX-23 indagou.

– Sim, mas não por enquanto... Primeiro você deve aprender a dar um soco, pelo menos. – Disse ele.

– Eu posso dar um soco muito bem! – Ela disse quase ofendida.

– Você já deu um soco em alguém antes? – Rogers perguntou já imaginando a resposta.

– Não... Mas... Mas não deve ser tão difícil assim que eu não possa fazer. – Ela detestava não saber fazer alguma coisa. -... Me passe umas faixas dessas...

Steve passou os pedaços de tecido para a garota sabendo que a havia irritado um pouco, mas ele achou o motivo engraçado, segurava um sorriso.

XX-23 tentou imitar o que Rogers estava fazendo nas próprias mãos, mas não estava dando muito certo, Steve observou pelo canto dos olhos a embolação que ela estava fazendo com as faixas.

– Você está fazendo isso errado, eu posso te en... – O Capitão foi interrompido por ela.

– Não! Eu faço sozinha... – Ela teimou como uma menininha com birra, e tentou consertar sozinha. Mas acabou apenas piorando as coisas, Rogers não conseguiu aguentar mais e deu uma risadinha, e disse tomando a mão dela para tentar ajeitar a faixa:

– Me deixe te ajudar.

XX-23 não aguentou e disse rindo por um breve instante.

– Você está rindo de mim... Isso é uma coisa feia de se fazer... – Ela disse de cabeça baixa observando as mãos do Capitão arrumando a faixa, frente a frente com ela.

XX-23 por um instante levantou o rosto e, involuntariamente, Steve acabou acompanhando o movimento da cabeça da garota, resultando no encontro de seus olhos azuis com os castanhos dela. Rogers achou a situação constrangedora; ele, ali, segurando uma mão dela e olhando aqueles olhos curiosos e simpáticos.

Steve expeliu com a voz um pouco trêmula de nervosismo enquanto soltava a mão dela e voltava a ajeitar a sua própria mão:

– É assim que deve ficar a faixa na sua mão. – Rogers tentava não ficar vermelho.

XX-23 banhada em sua inocência não compreendeu a situação. Claro que achou um pouco estranho o modo de agir dele, mas não entendeu o motivo e nem ficou constrangida por nada, então ignorou aquilo e voltou a pegar uma faixa para tentar repetir o que Steve tinha feito.

Quando ela terminou, corretamente dessa vez, Rogers estava pendurando um saco de pancadas a poucos metros atrás dela. XX-23 caminhou até ele e no momento que este se virou notando-a, a garota fechou um punho e despejou um soco no bíceps direito de Steve.

O Capitão inconscientemente levou uma mão até o local que havia recebido o soco, mas não por dor, e sim por surpresa.

– Por que você fez isso? – Ele olhou pra ela confuso.

– Agora eu não posso dizer que nunca soquei alguém. – Ela explicou.

– Você não é normal. – Steve disse balançando sua cabeça como se estivesse desaprovando-a, mas terminou com um sorriso.

– Espero que isso tenha sido um elogio, porque se foi um insulto, é melhor ter cuidado, posso tomar gosto em te bater. – Ela ameaçou dando uns pulinhos e socos no ar imitando lutadores de boxe.

Steve balançou a cabeça e riu de novo.

– Para início de conversa você está fechando o seu punho errado. – Ele começou a ensiná-la. -... Você não pode por os dedões em cima apenas do dedo indicador fechado, ou você pode se machucar, seu dedão tem que ficar virado para dentro do punho fechado, dessa forma...

XX-23 o imitou e já estava pronta para socar Steve de novo.

– Não! Não é em mim que você tem que bater... É no saco de areia! – Ele explicou.

– Ah, é mesmo! – A garota começou a rir sozinha. -... Viu? Tomei gosto em te bater...

– Percebi. – Steve sorriu. -... Agora, vamos! Soque... Mas lembre-se de manter seus pés afastados para dividir o peso do seu corpo.

Ela deu o primeiro soco e quase o saco de pancadas nem se moveu.

– Fiz certo? – Ela olhou para ele esperando aprovação.

– Err... Você tem que bater com força... – Ele explicou. -... É um teste para sua força... Saber se está mais forte do que uma mulher normal.

– Ah... – Ela sibilou. -... Mas é melhor eu te avisar, sou meio mole, nunca bati em nada até o soco que te dei agora há pouco.

– Tenho certeza de que conseguirá. – Steve a apoiou.

XX-23 despejou uma centena de golpes no saco de areia e ainda assim não transparecia força alguma, continuava parecendo uma garota indefesa.

– Viu?!... Sem força especial ou coisa parecida... – Ela desistiu.

– Talvez devêssemos tentar algo... – Steve sugeria.

– O quê? – A garota questionou curiosa.

–... Conversei com o Barton e a Natasha, e ambos afirmaram que quaisquer das habilidades que você contraiu só apareceram para eles quando você passou por motivações específicas... Talvez devêssemos tentar motivá-la. – Ele explicou.

– Entendi... Mas como você vai me motivar a usar a minha suposta “força escondida”? – Ela tentava raciocinar.

– Bom... A raiva pode ser um tipo de motivação... – Steve continuou explicando. -... Todo mundo sempre tem alguma coisa que o faz ficar irritado... Então, respire fundo e concentre-se nesse sua razão, e soque como se estivesse destruindo-a... Deve dar certo.

– Certo. – XX-23 resolveu tentar. Ficou frente a frente ao saco de pancadas novamente e tentou pensar em algo que a irritasse. Não foi preciso demorar muito e o pensamento veio logo em sua cabeça, enquanto a garota que sempre se mantinha estável, sempre aparentando felicidade, quase sentiu vontade de chorar por uns instantes.

– Soque. – Steve não sabia a intensidade dos pensamentos dela.

XX-23 começou a socar com certa força, ao passo que sua mente não estava mais ali.

Estava escuro, exceto por uma fresta da porta entreaberta, ela sentia algumas roupas tocarem suas costas. A garota estava encolhida e apenas um de seus olhos assistia o que acontecia do lado de fora.

Ouviam-se muitos gritos, o barulho ensurdecedor de bombas a alguns quilômetros de distância. Uma mulher do lado de fora implorava por sua própria vida para alguns homens que adentraram o local, XX-23 estava dentro de um guarda-roupa escondida e assustada.

A mulher tentou afastar os homens do móvel onde a garota estava e acabou sendo esfaqueada, algumas gotas de sangue atravessaram a fresta da porta respingando na bochecha de XX-23.

A garota acordou de sua lembrança e sua mente voltou para o prédio da SHIELD, quando os socos que despejava no saco de areia acabaram, fizeram as correntes que o prendiam no teto despencarem, lançando-o a metros de distância, ao passo que, a lona que envolvia a areia se rompeu graças ao golpe final.

Ela ofegava e pingava de suor. Steven não ficou tão surpreso com a proeza da força anormal dela se confirmar.

Depois que acompanhou com os olhos a trajetória do saco de areia, ele direcionou seu olhar para a garota e pode ver que o rosto dela estava ensopado não só de suor, mas também de lágrimas. Isso sim o deixou surpreso.

– Você está bem? – Ele se aproximou mais dela.

XX-23 passou as mãos pelo rosto para secar-se e disse:

– Sim, estou ótima. – Ela voltou a mostrar seu rosto sorridente escondendo-se dentro de sua habitual muralha de felicidade.

Mas era tarde demais, Rogers já tinha pegado-a em uma situação sensível.

– Não, não está... Pode falar comigo... – Desajeitado, ele pousou uma mão num ombro dela.

– Estou bem, pode acreditar. – XX-23 colocou uma mão em cima da de Steve.

O Capitão não insistiu, sabia que agora não conseguiria convencê-la a falar; sem perceber, Rogers passou “as costas” de dois dedos suavemente pela bochecha ainda úmida da garota.

Ela congelou e arregalou os olhos surpresa, não esperava por aquilo. Steve recobrou a consciência e ficou mais sem graça do que tudo, retirando os dedos do rosto dela e a mão de seu ombro.

– Me perdoe... Não quis parecer um abusado. – Ele estava mais vermelho que um pimentão olhando para os lados atordoado.

– Não pareceu!... Está tudo bem. – Ela sorriu mais uma vez olhando-o nos olhos. XX-23 não entendia muito bem a situação, primeiro por ser uma coisa muito nova para ela, e segundo porque sua mente ainda estava abalada pelas lembranças que ela evitava desde sempre.

– Obrigada. – Ela disse.

– Pelo quê? – Ele ainda estava sem graça.

– Por sinceramente se importar. – XX-23 disse colocando uma mão sobre um braço dele.

Rogers não conseguia mais lidar com aquilo.

– Err... Está na hora da pausa para o almoço. – Ele anunciou.

– Que bom... Estou faminta. – Ela disse distraidamente ignorando os últimos minutos de lágrimas e aproximações esquisitas com Steve.