100 Days at a Coffee Shop escrita por prongs


Capítulo 1
U: she's like cold coffee in the morning




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Todos os dias ele ia para a mesma cafeteria. Era um lugar frio, com a iluminação fraca e cafés quentes. Ele gostava daquele lugar. Combinava com muitas poesias que ele lia. Ele já conhecia as garçonetes pelo nome e conversava com as pessoas que, como ele, frequentavam o lugar regularmente. Já sabia o cardápio de cor, e sempre que entrava no lugar, às 15h15min, um cappuccino e dois pães de queijo esperavam por ele, na mesma mesa.

James fazia sempre as mesmas coisas, na mesma ordem. Chegava, falava com Wendy, a garçonete, e se sentava na terceira mesa depois da porta. Comia um pão de queijo, ainda quente, e então parava para cumprimentar o casal de velhinhos que entrava às 15h20min. Puxava o bloquinho de anotações de seu bolso e desenhava alguma coisa, não importava se na cafeteria ou não, que lhe chamasse a atenção. Tomava metade do cappuccino, comia o outro pão de queijo, já frio, e então puxava do outro bolso um pequeno livro de poesias. Depois de ler algumas, ele tomava o resto do cappuccino, ficava lá por mais quinze minutos e então pagava a conta e ia embora.

Alguns dias chegava a ser entediante. A rotina. As mesmas coisas. Os mesmos gostos. E nos últimos dias, ele já não sabia porque fazia mais aquilo. Só fazia. Até que, numa terça-feira, ela entrou.

O sininho da porta tocou às 15h23min e ele se virou para ver quem entrava. James nunca a vira antes. Ela nunca havia estado na cafeteria antes. Ela tinha cabelos laranjas que, para ele, pareciam fogo, e foi o que chamou a atenção dele. Ela se sentou duas mesas depois dele, de frente para ele, e ele começou a observa-la. Ela usava um suéter de um filme da Disney, o que ele achou bastante anormal. Então, ele observou seu rosto. Ajeitou os óculos, com medo que a miopia atrapalhasse. Os olhos dela eram verdes e brilhantes, como esmeraldas, e seu cabelo não fazia o mínimo esforço para se manter no lugar.

Ela levantou os olhos e olhou para James. Só então ele percebeu que a encarava, então desviou o olhar para o seu café. Ele tomou o que restava na xícara, comeu o pão de queijo e saiu. Não sabia por que. Ele só saiu.

Aquele foi o primeiro dia.

No segundo dia, ele chegou mais cedo, deixando Wendy confusa. Depois ele percebeu que se fizera de estúpido, pois teve que esperar mais tempo. Ela entrou às 15h26min. James a olhou pelo canto do olho, não querendo parecer um psicopata. Ela se sentou na mesma mesa, e estava com um suéter diferente. Um suéter cor de café. Ele automaticamente puxou seu bloco e começou a fazer um esboço dela. Não sabia por que. Só fez.

Ele não conseguiu terminar o desenho naquele dia. Ele estava caprichando nos detalhes do rosto – lábios ressecados, cílios grandes, nariz fino e arrebitado, maçãs do rosto salientes. Tudo aquilo precisava sair perfeito. E eram coisas demais sobre ela que ele notava. Quando ela sorria ou ria, talvez lendo algo em seu celular, pequenas rugas apareciam nos cantos de seus olhos. E no desenho, ela estava sorrindo. Seus dentes, perfeitamente retos, com certeza haviam aguentado um aparelho durante anos.

Ele estava já nos seus lábios quando ela se levantou e foi até a porta, não antes de dar uma olhada para James, que imediatamente escondeu o bloco e desviou o olhar. James grunhiu. Por que ele estava agindo daquele jeito? Quem era aquela garota?

E assim uma semana se foi.

No oitavo dia, uma quarta-feira, ela entrou usando um all star azul. James sorriu. Ele usava um preto de cano alto naquele dia. Quando ela se sentou, ele percebeu as olheiras em seus olhos, e viu também que ela pedira um café grande. De repente sentiu um peso nos ombros. E se ela fosse o tipo de pessoa que ele abominava? Indo para festas, não ligando para nada. Por que ele ainda a desenhava? E foi então que ele ouviu ela conversando com Wendy.

“Perdi a noção do tempo ontem à noite enquanto lia ‘Toda Poesia’, e agora estou morta”, ela riu.

Um riso que se igualava a mil sinos tocando harmoniosamente. Ele sentiu seu peito se revirar e saltar de prazer ao ouvir o som da voz dela depois de uma longa semana, e não sabia por que. Só sabia que era gratificante poder finalmente escutar a voz daquela ruiva. Ele puxou três lápis de seu bolso traseiro – um vermelho, um laranja e um preto. Puxou o bloco e começou a colorir o cabelo dela como fogo, com fogo. Um fogo rebelde que queimava o seu peito e fazia ele a encarar todo dia querendo, por alguma razão, saber mais e mais sobre aquela garota.

Ele levou mais dez dias para colorir o cabelo com fogo. No décimo nono dia, ele levou quatro lápis com diferentes tons de verdes, e se concentrou nos olhos de esmeralda dela. Ele tentou e tentou, mas não conseguia capturar completamente o brilho especial que havia neles. O que havia naqueles olhos que ele não conseguia reproduzir? Ele passou três dias para descobrir. E quando finalmente descobriu, ele teve medo de que não conseguiria passar para o papel.

Era esperança. Era amor. Era poesia.

E como se passa isso em forma de cores? Ele não sabia.

Então, no vigésimo terceiro dia, ele a encarou enquanto tinha dois lápis na mesa. Ele a encarava e pintava, sem se importar de olhar para o papel. E quando ela se levantou depois de comer um pedaço de torta de limão, ele olhou dos olhos dela para o papel, e ele havia conseguido capturar a magia deles. Ele sorriu, satisfeito, e foi embora. Wendy o encarou enquanto ele saía. Nos últimos dez dias, James não havia pedido nada e sempre chegava e saía em horários diferentes. Ele estava em outro mundo com toda a certeza.

No vigésimo quarto dia, ele teve um problema com as cores. A pele dela era clara, clara demais. Porém, ela tinha bochechas rosadas e lábios que misturavam a cor do batom com a cor da pele e com a cor dos próprios lábios. Ele precisou de seis lápis diferentes para essa missão. Depois de mais uma semana, ele ficou feliz com o resultado. As cores estavam enchendo seu rosto de paz como num arco-íris de fogo, esmeraldas e um vermelho escarlate nos seus lábios volumosos.

Ele passou os próximos quinze dias focando nos detalhes. Lápis de olho levemente borrado, sardas espalhadas pelo nariz, fios de cabelo caindo no rosto. Tudo aquilo era importante para firmar a imagem que ele tinha dela no papel. No trigésimo nono dia, ele chegou antes dela e escreveu num pequeno pedaço de guardanapo:

You're beautiful

Então, ele arrancou a página do desenho já pronto dela de seu caderno e o colocou na quinta mesa junto com o guardanapo. Então ele se sentou novamente no seu lugar, sentindo as mãos suarem enquanto mexia os dedos freneticamente. Seus pés não conseguiam ficar parados e ele sentia o seu estômago se revirando. Ele não sabia por que estava daquele jeito – já havia feito coisas assim centenas de vezes! Ele só estava. E Wendy, do balcão, observava com um sorriso no rosto. Sim, ele estava em outro mundo. No mundo da ruiva.

Quatro minutos depois o sino tocou. Era ela entrando. Assim que ela se sentou na quinta mesa, ela viu os papéis. Primeiro viu o guardanapo, e suas bochechas atingiram um tom de rosa particularmente adorável. E então, ela viu o desenho, e o seu rosto ficou indecifrável. James não sabia se ela tinha amado ou odiado, e ele sentiu o suor gelado descer pelas suas costas. Então, ela sorriu. Ela tinha gostado. James sorriu, e então ela olhou para ele, mas ele já havia se levantado e ido embora, deixando uma ruiva atordoada e um café gelado na terceira mesa.

No quadragésimo dia, quando James entrou, ela já estava lá. E hoje ela estava sentada na quarta mesa. E isso significava que ela estava sentada mais próxima de James, o que deixou ele mais nervoso. Ao mesmo tempo, ele queria e não queria conversar com ela. Ele não sabia seu nome nem quem ela era, só sabia que gastara quarenta dias fazendo um desenho de seu belo rosto. Mas, para sua sorte, ele pensou, ela não falou com ele naquele dia.

No dia seguinte, James se sentou de costas para onde ela normalmente se sentava, esperando que assim ele não precisasse encarar ela. Na realidade, foi pior. Assim que ela entrou, ela se sentou de costas para ele, seus cabelos de fogo se roçando às plumas negras de James. Por extensos minutos eles ficaram ali, de costas e encostados, um sentindo o calor do outro, sem falar ou fazer nada. Até que, após terminar o seu café, ela sussurrou algo.

“Qual o seu nome?”

Ele sentiu seu coração literalmente pular uma batida. Ela estava realmente falando com ele? Ele não sabia por que se sentia assim. Ele só... sentia.

“James”, ele sussurrou de volta. “E o seu?”

Ele ouviu ela rir. Imaginou suas bochechas volumosas subindo e formando covinhas e rugas nos cantos dos seus olhos.

“Isso você vai ter que descobrir sozinho.”

E dizendo isso, ela se levantou e foi embora.

Ela ficou cinco dias sem ir até a cafeteria. James ainda a via pela vitrine de vidro, passando direto pelo lugar, mas ela não chegou nem a olhar para dentro do lugar. Toda vez que o sino da porta tocava, ele se virava, esperançoso que fosse ela, mas nunca era. Então, no quadragésimo sexto dia, quando James entrou, ela estava sentada na terceira mesa.

Na primeira mesa estavam sentados o casal de velhinhos que sempre iam lá, na segunda, um homem de cabelos escuros e seu cachorro, na quarta, um garoto loiro com sua namorada também loira, e na quinta, a mulher solteira que sempre lia livros de Nicholas Sparks. Não havia outra mesa para ele se sentar. Ele respirou fundo e se sentou de frente para a ruiva.

“Faz algum tempo que não te vejo.”, ele murmurou.

“E você descobriu meu nome?”, ela sorriu, enquanto tomava seu cappuccino e melava a boca com a espuma.

“Não”, ele falou. “Ainda não.”

Ela sorriu mais uma vez e chamou a garçonete. “Coloque tudo o que ele pedir na minha conta. Amanhã eu pago.”

E então ela foi embora de novo. E James bufou. Bufou e suas mãos se mexiam loucas pelo seu cabelo e pelas suas roupas, sem saber o que fazer. Quem era ela? O que ela estava fazendo com ele? Bem, provavelmente enlouquecendo-o. Ele pediu um pedaço de bolo de morango e depois foi embora, com as mãos geladas e inquietas nos bolsos.

E no dia seguinte, ele chegou mais cedo. Foi até Wendy e pôs as mãos no balcão.

“Wendy, você sabe o nome daquela ruiva?” Ela assentiu com a cabeça. “E você me diria o nome dela?” Ela mordeu o lábio inferior e fez que não com a cabeça, fazendo James gritar.

“Me desculpe, James!”, ela disse, colocando uma das mãos no ombro dele. “Ela me fez prometer que eu não diria o nome dela pra você.”

Ele assentiu. Claro. Claro que ela havia feito aquilo. Ele foi embora sem ver ela naquele dia. Passou o dia deitado, pensando em um jeito de descobrir o nome dela. E claro que ele não conseguiu. E assim se foi uma semana. Deitado, sem ver seus cabelos de fogo ou seus lábios de sangue ou seus olhos de esmeralda. Durante a semana, só ouvia sua mãe gritando o quanto ele era irresponsável, idiota e bagunçado. Ele sabia que ela estava tendo problemas com o pai, mas não precisava descontar nele. Então, no quinquagésimo sétimo dia, ele não aguentou mais. Se levantou e foi até lá. Seu cabelo estava bagunçado como nunca e seus olhos estavam escuros e fundos.

Quando ele entrou, ela estava sentada na quinta mesa novamente, usando o mesmo suéter do primeiro dia. Ela parecia preocupada, e enquanto lia seu livro seus dedos, finos e com unhas bem cuidadas, impacientes, tamborilavam a mesa. Quando o sino tocou, ela levantou a cabeça imediatamente, e por alguns segundos seu rosto se iluminou, até que ela viu o estado do garoto. Ela se levantou no mesmo instante, pegou um café que estava no balcão – ela não ligava se era para outra pessoa. Ele precisava mais. –, puxou James pela mão e se sentou com ele na quinta mesa.

“Você está bem?”

Ele estranhou toda aquela ternura e cuidado em suas ações e em sua voz.

“Aconteceu algo?” Ele não respondeu. “Problemas em casa?”

Ele engoliu em seco e assentiu. Ela se levantou e se sentou ao lado dele, e o abraçou, afundando o rosto dele em seu fogo. Cheirava a baunilha e chocolate. Fogo não combinava com nenhuma das duas coisas, mas ela fazia funcionar. Ela o soltou depois de alguns segundos, o suficiente para ele gravar aquele cheiro. Ela o olhou, fundo em seus olhos afundados e sem brilho. Ela sorriu.

“Lírios.”, e então ela se levantou e foi embora. E ele suspirou.

Quem era ela, que o confortava, dizia uma palavra sem sentido e então ia embora? Mas então ele resolveu seguir as pistas dela. Passou duas semanas rodando a cidade, procurando pelos melhores lírios de Londres. No septuagésimo segundo dia, ao chegar na porta da cafeteria, suas mãos suavam ao segurar os caules dos lírios reunidos em um buquê, suas pernas pareciam prestes a desmoronar e seu nariz coçava absurdamente.

Ele entrou, e a ruiva ainda não estava lá – ela estava atrás dele. Ele parou por um momento e olhou para o relógio em seu pulso. Já eram 15h30min, e ela já deveria estar lá. Então, ele sentiu um dedo cutucar seu ombro, e ele se virou de imediato, fazendo o capuz de seu casaco cair de sua cabeça. Ele sorriu ao ver a garota sorrindo para ele, e então espirrou, e depois soltou algumas risadas.

“Aparentemente, eu sou alérgico a lírios.”

Nesse momento, ela também soltou um espirro e riu. Mil sinos tocando. James sorriu.

“Eu também sou. Pode jogar essas coisas no lixo.”

Ele sorriu e as colocou gentilmente na mesa da mulher dos livros de Nicholas Sparks. Ela olhou para ele, já com lágrimas nos olhos, e sorriu como que agradecendo.

“O lixo seria um destino muito doloroso para aquelas flores.”, ele disse, se sentando na terceira mesa. Ela se sentou ao lado dele. “Teresa vai cuidar bem delas.”

E ela cuidou. Ela as levou pra casa, as replantou e não deixou-as morrer.

Eles andaram lado a lado até a terceira mesa e sentaram-se. A ruiva abaixou a cabeça e um silêncio breve se plantou no lugar. Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. Seis. Sete segundos foram precisos para ela falar.

“Eu vi que você tem um caderno. Posso ver ele?”

James gelou. Ninguém nunca vira seu caderno. Porém, sua mão, sem obedecer ao seu cérebro, foi até o seu bolso, se fechou ao redor da capa azul e a entregou às mãos brancas da garota. Ele observou suas unhas, pintadas com um esmalte branco que já saía.

Ela o abriu, ansiosa, e perdeu o fôlego ao folhear o livrinho. Desenhos maravilhosos, coloridos magicamente, poesias dignas de Neruda. Abrir aquele livro era como abrir uma porta para um mundo diferente, mais bonito e mais simples, onde tudo se resolvia com lápis-de-cor. Ela encarou o moreno. Ele parecia enxergar o mundo de uma forma completamente diferente. Ele via o mundo com mais cores, ele via as nuvens com formas, ele via folhas marrons com um tom dourado. E aquilo era tão maravilhoso que deixava ela sem ar.

“É lindo”, foi a única coisa que ela conseguiu dizer.

O sangue subiu ao rosto do garoto e ele sorriu de lado.

“Obrigado.”

Um. Dois. Três. Quatro.

“E então?”, a ruiva falou, mexendo nas unhas. “Descobriu o meu nome, não foi?”, ela riu.

James franziu as sobrancelhas. Do que ela estava falando?

“Não, não descobri.”

Os olhos da ruiva se arregalaram, e foi quando James ligou os pontos. Lírios. Cabelos vermelhos.

Lily.

Um sorriso se abriu no rosto dele. Ele pôs a mão em cima da mesa e timidamente segurou os dedos da ruiva que tanto mexia com ele. Levou sua mão delicadamente aos seus lábios e a beijou com leveza. Segurou sua mão perto ao seu rosto e olhou nos olhos esmeralda dela com os seus castanhos e cinzas.

“Bonjour, Lily.”

Ela soltou uma risada nervosa e levemente soltou sua mão da dele. Seu rosto ia do branco ao rosa ao vermelho em instantes. Ela levantou o olhar e o encarou, sorridente.

“Oi, James.”

E então ela se levantou e foi embora, deixando um James atônito e sorridente sozinho na mesa.

Lily. Lily. Lily. Soava tão bem em seus lábios. E seu nome soava tão bem nos lábios dela. Lily. Um nome tão delicado quanto seu rosto, tão alegre quanto sua risada, tão vivo quanto seu fogo e tão brilhante quanto suas esmeraldas. Se encaixava tanto com ela. Ele se levantou novamente, ainda com o sorriso bobo nos lábios e com o estômago cheio de borboletas, e andou para fora da cafeteria.

No dia seguinte, ele chegou às 15h02min, e ela estava sentada na terceira mesa com dois cafés na mesa. Ele se sentou em frente à ela e sorriu timidamente. Não sabia o que fazer ou dizer, ainda mais depois dos últimos dias. Até que ela, novamente, tomou a iniciativa.

“Então...”, ela mordeu o lábio inferior, e James cravou seus olhos neles. Rachados, vermelhos, e com feridas. Ela provavelmente arrancava a fina camada de pele nos lábios. “Você já sabe meu nome. E eu sei o seu. Eu acho que deveríamos nos conhecer melhor. Você começa.”

Ele franziu as sobrancelhas. Não fazia a mínima ideia do que dizer sobre ele.

“Não sei o que falar”, ele admitiu, sorrindo de lado.

Lily riu. Milhares de sinos.

“Comece com o básico. James, sua idade, de onde você é, do que você gosta.”

Ele balançou a cabeça, respirou fundo e começou a falar.

“Meu nome é James Potter. Eu tenho dezenove anos, nasci em Hampshire e estou cursando direito na University of London. Eu gosto de Johnny Cash, rodas-gigantes, futebol. Gosto de desenhar, gosto muito. Gosto de escutar Ed Sheeran. Eu gosto das rugas que aparecem quando você sorri, e das sardas no seu rosto. E eu odeio palhaços.”

Quando terminou, ele sorria, e seu rosto estava avermelhado. Lily soltou uma risada nervosa, e estava tão vermelha quanto seus cabelos, o que fez James rir. Ela retirou uma mecha que estava caída sobre seus olhos, tomou um gole do café, respirou fundo e começou a falar.

“Meu nome é Lily Evans, tenho dezoito anos. Sou de Londres e decidi começar meu curso só no ano que vem. Eu gosto de ler poemas, eu gosto de assistir filmes antigos, gosto de usar moletons. Gosto de seu cabelo, que se parecem com plumas negras...” ela se debruçou sobre a mesa, se aproximando dele. “Gosto de como seus olhos me deixam confusa. Amo fotografia. E odeio pipoca doce.”

James também se debruçou sobre a mesa, e de repente seu rosto estava a centímetros do dela. Ele podia sentir sua respiração. Calma, e acelerando lentamente devido à proximidade.

“Está nervosa?”, ele perguntou.

“Não.”, ela respondeu prontamente.

E antes que ele pudesse responder algo, ouviu um clique no seu lado direito. Ele virou o rosto automaticamente, se afastando da ruiva, e viu Wendy com uma Instax mini 8 na mão e uma foto na outra. Ela balançou a foto por alguns segundos e a entregou para Lily, que sorria.

“Então, eu disse que eu amava fotografia. Mas eu não disse que amava fotografar.”

Ela mostrou a foto a James, e ele perdeu o fôlego ao vê-la. Eram os dois, debruçados sobre a mesa, se encarando com uma intensidade fora do normal. Seus olhos estavam olhando diretamente para os dela, e vice-versa, e seus dedos se tocavam – e havia uma coisa que James não havia percebido. Lily segurava seus dedos com carinho. Ele olhou rapidamente para ela e de novo para a foto, e suspirou.

“Eu fico com isso”, e após dizer isso, ele pôs a foto com cuidado no bolso de seu casaco e saiu correndo em direção ao seu apartamento.

Durante a próxima semana por inteiro, James não apareceu. Escutou por sete dias seus pais discutindo novamente, quebrando coisas, gritando. Gritando com ele, o chamando de nomes. Mas ele não se importou. Estava em seu quarto, sentado em sua mesa, concentrado em duas coisas: na foto e no papel. Ele reproduzia a foto no desenho com o maior cuidado e precisão possíveis. Suas plumas e as lentes de seus óculos refletindo as esmeraldas dela, seu fogo caindo sobre sua pele pálida sem queimar. Havia algo entre os dois, algo especial, que ele não sabia explicar. Ninguém sabia.

No octogésimo dia, ele apareceu. Havia um sorriso em seus lábios e uma paz no ar, dividindo o espaço com o cheiro reconfortante de café. Mas ela não estava lá. James suspirou e se virou para ir embora, quando uma voz o chamou.

“James!”

Era Wendy, a garçonete. Ele se virou, o desapontamento claro em seu olhar. Wendy sorriu de lado para ele.

“Talvez você devesse dar uma olhada na sua mesa.”

Ele franziu as sobrancelhas, e andou até a terceira mesa, e havia um guardanapo em cima dela, com um escrito nele, em letras borradas devido à textura do papel.

91 Great Suffolk St

Milhares de borboletas invadiram o estômago de James, e ele sorriu. Aquilo era um endereço, o endereço dela. A Great Suffolk era há cinco minutos dali. O coração dele acelerou, ele enfiou o guardanapo no bolso e saiu correndo da cafeteria. Ele atravessou ruas sem olhar para os lados, ignorou as buzinas e os gritos dos motoristas o chamando de louco. Ele precisava chegar àquele lugar.

E quando ele finalmente chegou, perdeu o fôlego. Era uma pequena casa com tijolos, aparentando ser muito antiga. Havia um pequeno jardim na frente e um caminho de pedras até a porta de madeira. Ele sorriu. A casa combinava com ela. Ele seguiu pelo caminho de pedras com o coração acelerado, e apertou a campainha. Dois segundos depois, atenderam a porta.

Era ela.

Estava usando pequenos shorts de pijama e um moletom de Doctor Who. Estava descalça e usava óculos redondos para a miopia – então, pensou James, ela usa lentes quando sai. Mas aquilo não afetava de maneira alguma o brilho de suas esmeraldas. Seu cabelo estava extremamente bagunçado, e ela usava um colar com algum pingente escondido dentro de seu moletom.

Ela sorriu ao ver ele, e ele sorriu ao ver ela. Foi uma felicidade mútua que confortava a ambos.

“Oi.”

Mas ele não a respondeu. Não. Em vez disso, ele envolveu seu rosto pequeno e gelado com suas mãos grandes e quentes e alcançou seus lábios vermelhos e rachados com os seus embranquecidos pelo frio. E ela não reclamou. Não, ela puxou ele para dentro da casa, fechou a porta com um pé enquanto ainda retribuía o beijo e empurrou o corpo forte dele contra a porta. Quando o ar lhes faltou, eles se separaram um pouco, ofegantes.

“O que diabos estamos fazendo?”, James riu, ainda de olhos fechados.

“Eu não faço a mínima ideia, acredite.”, ela riu de volta, encarando seu rosto de feições tão belas antes de pressionar seus lábios contra os dele rapidamente.

Ela pegou sua mão e o guiou até o seu quarto lentamente. Aquele dia estava frio, mas com o calor de seus corpos, eles não se importaram.

Já era tarde da noite quando Lily acordou ao lado de James. 22h47min. Ela colocou a mão em cima de seu peitoral forte, fazendo carinho.

“Eu realmente gosto de você, Lily”, James falou, os olhos fechados. “Gosto mesmo. Eu não sei explicar, eu só...” ele se virou de lado para encarar os olhos de esmeralda dela. “Eu só gosto muito de você, de verdade.”

Lily sorriu. Alguns minutos se passaram até que Lily finalmente falasse alguma coisa.

“Você poderia me contar por que sempre chega de casa com olheiras e uma aparência horrível?”, ela perguntou. “Não, não, não horrível, você só parece estar muito cansado e... hm...”, ela tentou se corrigir, temendo que ele tivesse entendido errado, mas ele apenas riu e soltou um longo suspiro.

Uma de suas mãos se dirigiu aos cabelos de fogo da pequena, enquanto a outra foi atrás de sua cintura. Ele a puxou para perto, seus corpos se encaixando.

“Meus pais... eles tendem a discutir por coisas como um pássaro ter pousado na janela e bebido a água das plantas da mamãe. Ou por coisas como o fato de meu pai sumir por dias sem avisar a ninguém. Ou o fato de eu não fazer nada como eles querem. Então eles estão o tempo todo gritando palavrões na minha cara e quebrando coisas dentro de casa. Eu já me acostumei, pra falar a verdade... mas é cansativo. Ás vezes é uma madrugada inteira de briga, e eu até tento me trancar no quarto, mas no final os gritos são muito altos...”

Sua voz falhou. Por mais que tentasse aparentar força, aquilo sempre o abatia. No fundo, carregava aquela culpa e vez ou outra, os pensamentos vinham à tona. “A culpa é minha. Estão brigando por minha causa. Por que eu ainda estou aqui?”. Lily fechou os olhos ao ouvir aquilo. Era horrível. E então, ela começou a falar.

“Minha mãe faleceu tem cinco anos. Depois disso, meu pai ficou... diferente. Ele não é mais carinhoso e não conversa com ninguém. Na verdade, ele tá mais ignorante, fechado. E eu não sei o que fazer pra isso parar. Ele grita comigo na maior parte do tempo. E de uns meses pra cá, eu procurei um jeito de fugir disso. E eu achei a cafeteria.”, ela disse, encarando os olhos dele. “E, sabe, eu nunca realmente soube o porquê de eu gostar tanto daquela cafeteria velha.”, ela sorriu. “Eu acho que o tempo todo, era você.”

James sorriu. Ele aproximou seu rosto do dela, encostando seus narizes e testas.

“Eu acho que, possivelmente, talvez, eu esteja me apaixonando por você.”, ele sussurrou. “Sim, há uma pequena chance de eu estar me apaixonando de verdade por você.”

Ela riu e o beijou. Era tão bom finalmente estar ali, tão perto dela, física e sentimentalmente. Os lábios dela tinham gosto de café, e seu coração tinha gosto de morango com açúcar cheio de gentileza. Os lábios dele tinham gosto de tutti, e seu coração tinha gosto de café gelado pela manhã, cheio de disposição para amar.

“Por que você gosta de mim?”, James murmurou, a sinceridade clara em sua voz. “Digo, eu sou uma bagunça, em todos os sentidos.”

Lily sorriu.

“Eu gosto de arrumar bagunças”, ela riu. “E você é uma bagunça linda. E muito intrigante, por sinal.”

James riu, encarando ela, incrédulo.

“Você fez todo um mistério para eu saber o seu nome e EU sou intrigante?!”

Ela gargalhou e o abraçou com força, encaixando seu rosto na curva do pescoço do maior.

“Boa noite, James.”

Ele beijou seus cabelos.

“Boa noite, Lily.”

Ele cantou para ela até que ela dormisse. Fez carinho em seus cabelos. A abraçou, a protegendo de todo o mal do mundo, e assim, ele se sentiu protegido. E assim, dormiu sentindo a paz que não sentia há vários dias.

No dia seguinte, eles andaram de mãos dadas até a cafeteria às 8h23min. Conversaram, se descobriram e se encaixaram. Eles sorriram em sincronia e descobriram que eram mais compatíveis que peças de LEGO. Chegaram na cafeteria rindo, e Wendy sorriu. Tomaram dois cafés, sentados um em frente ao outro, seus pés se abraçando debaixo da mesa e seus corações se abraçando por meio dos sorrisos.

Em um certo momento, James soltou um “oh!”, colocou o café na mesa e começou a procurar algo nos bolsos de seu casaco desesperadamente. Lily arqueou uma sobrancelha, colocando seus waffles de lado.

“James? Tudo bem?”

“Sim, sim... eu só... me esqueci de algo... AH!”, ele sorriu, tirando um pedaço de papel de um dos bolsos. “Tinha me esquecido completamente. Aqui, quero que fique com isto.”

Assim que Lily examinou o papel, perdeu o fôlego. Era uma versão da fotografia deles, uma versão em desenho, um desenho feito por James. Era tudo tão detalhado e tão belo. Ela sorriu para ele, incrédula.

“James, é... perfeito!”, ela riu.

Ele sorriu, envergonhado, e deu de ombros.

“Agora você tem um pedaço do meu desenho e eu tenho um pedaço da sua fotografia”, ele disse, mostrando para ela a pequena foto guardada na sua carteira.

Ela balançou a cabeça, como se dissesse “você não existe”. Com sua mão pequena ela encostou os dedos no queixo de James e puxou o rosto dele para perto dele. Eles ouviram um clique. Olharam para o lado, e lá estava Wendy, os fotografando de novo.

“Desculpa, eu não podia deixar isso passar sem registrar!”

Os três riram e Lily e James resolveram que era melhor ir para casa. Trocaram telefone e os próximos dias foram um mar de rosas – melhor, um mar de lírios. Trocaram mensagem, foram ao parque, passaram noites na casa de Lily, foram ao cinema, e, claro, foram à cafeteria. Como deixar de ir àquela cafeteria? Sem ela, eles nunca teriam se apaixonado. E então, no centésimo dia, eles estavam lá, sentados lado a lado, envolvidos num abraço, um café frio na mesa, um livro de poesias na mesa sendo lido por James em sussurros para Lily, ele disse.

“Eu te amo, Lily.”

E ela disse, com um sorriso nos lábios vermelhos, a esmeralda deu seus olhos brilhantes como nunca.

“Eu te amo, James.”

E, agora, eles tinham uma razão para passar mais cem, duzentos, trezentos, mil dias naquela velha cafeteria.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, se sim, WEE OBRIGADA, se não, foi mal por ter feito você gastar seu tempo.