Candidatos a Deuses escrita por Eycharistisi


Capítulo 94
Capítulo 94




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Softhe estava a dormir com a cabeça poisada na maca de Burn, a sua mão caída sobre a do rapaz. Estando os dois inocentemente adormecidos ao lado um do outro, calados e sem discutir, ninguém podia dizer que eles não faziam um lindo casal. Quando Burn acordasse, Saya esperava que ele e Softhe se entendessem de uma vez. A proximidade da morte deveria ter ensinado Burn a não desperdiçar o seu tempo com orgulhos idiotas e discussões sem razão de existir. Ou assim esperava Saya.

Soltando um suspiro pelo nariz, Saya esfregou os olhos.

Estava cansada. Apesar de Lilás ter feito questão de arranjar uma maca onde ela pudesse dormir, ao lado de Burn, a rapariga não pregara olho. Depois de alguma resistência, a temperatura de Burn começara rapidamente a descer e Saya tivera de ir recuando com o seu poder do gelo de tantos em tantos minutos. Pudera já cobrir a sua mão de gelo, deixando agora a mão esquerda sobre a testa de Burn. Era o suficiente para segurar a sua temperatura no valor certo. No entanto, apesar de a temperatura de Burn estar estabilizada há horas, ele ainda não acordara.

“Deve estar a concertar-se a si mesmo, como a Gina disse”, pensou Saya para si, esperançosa.

Saya raspou com a unha um pedacinho de gelo que estava colado à testa de Burn e, quando o fez, o rapaz fez uma pequena careta, abrindo depois os olhos. Piscou-os várias vezes, tentando focar a vista, até que olhou para Softhe, com a cabeça deitada no seu leito. Soltou a mão que ela lhe agarrava para lhe poder fazer uma pequena carícia nos cabelos e só depois olhou para Saya.

– O que é que aconteceu? – perguntou ele, baixinho e com voz fraca.

– Parece que as Parcas viraram o teu poder contra ti mesmo – respondeu Saya, num tom de voz igualmente baixo, para não incomodar a Softhe ainda adormecida.

– Isso eu sei – resmungou Burn – Mal consigo controlar a energia dele… podias arranjar-me um Colar Negro? Seria mais fácil controlar-me se o usasse.

Saya acenou com a cabeça.

Burn ergueu a outra mão e tocou na mão que Saya tinha na sua testa, apalpando-a como se para verificar a temperatura da sua pele.

– Não gosto disto – negou Burn, franzindo o sobrolho – Não gosto da ideia de o gelo ter conseguido domar o fogo.

Saya revirou os olhos levemente. Afinal, a proximidade da morte não fizera Burn largar o seu orgulho desmedido. Com esse pensamento, ficou completamente desarmada quando Burn deixou a mão cair e lançou um pequeno sorriso a Saya.

– Mas… obrigado – murmurou ele – Por me salvares.

Saya acenou, confundida.

– Se algum dia precisares de algum calor, basta pedires – acrescentou, rindo.

Pela mente de Saya passou uma ideia que nunca antes lhe tinha ocorrido. E teria falado nela a Burn, se Softhe não tivesse acordado nesse instante, desorientada e choramingando:

– Burn…?

– Acordaste, pirralhita? – perguntou Burn, com um sorriso provocador.

Softhe nem se queixou de Burn lhe ter chamado pirralhita, atirou-se logo ao pescoço dele, abraçando-o com força.

– Burn! – exclamou, aliviada – Estava com tanto medo…

– A minha pequena com medo? Uau, isso não é comum.

– Tive medo de te perder – murmurou Softhe.

– Bem, se não me queres perder – disse Burn, fazendo uma nova carícia na cabeça de Softhe – é melhor correres a ir buscar alguma coisa para comer, porque eu estou a morrer de fome.

Softhe riu-se levemente, aliviada por estar tudo a voltar ao normal.

– Queres alguma coisa também, Saya? – perguntou Softhe, levantando-se.

– Agradecia – confirmou Saya, sorrindo levemente.

Softhe acenou, espetou um beijinho na bochecha de Saya murmurando um “obrigada” e depois saiu a saltitar do quarto.

– A Softhe esteve aqui o tempo todo? – perguntou Burn.

Saya acenou e Burn soltou um risinho, passando uma mão pelos cabelos.

– Quem diria que me iria apaixonar por uma humana – murmurou.

Saya fez um pequeno sorriso, algo triste, e depois pigarreou.

– Burn?

O rapaz olhou para ela, esperando que falasse.

– Disseste que me darias calor se eu precisasse… – lembrou Saya, falando lenta e cuidadosamente, esperando pela confirmação de Burn, que veio em forma de aceno – e… eu preciso. Preciso de algum… calor.

– Para? – perguntou ele.

Saya engoliu em seco e fez o dedo indicador da sua mão enluvada deslizar pela pequena cicatriz por baixo do seu olho.

– Para poder chorar – murmurou, muito baixinho, os olhos enchendo-se já de lágrimas de antecipação.

Burn ficou a olhar alguns momentos para Saya, sem expressão, até que ergueu uma mão e agarrou a cabeça de Saya com ela, a palma ficando sobre os olhos da rapariga. Quando Saya sentiu o calor atingi-la, não se conseguiu controlar mais e deixou que a primeira lágrima lhe deslizasse pelo rosto. Ao sentir a lágrima líquida deslizar-lhe pelo rosto, sem dor alguma, sem a queimar, deixou que todas as suas mágoas viessem ao de cima e se misturassem com o alívio de finalmente as poder libertar, desfazendo-se numa torrente de lágrimas que parecia nunca mais ter fim. Soluçando, abraçou o braço de Burn, comprimindo a mão dele com ainda mais força contra o seu rosto.

Lilás espreitou para o interior do quarto nesse momento, ficando completamente cilindrado com a imagem que se lhe apareceu. Aproximou-se sob o olhar de Burn, mas apenas com olhos para Saya. Ao chegar junto dela, apenas a abraçou, puxando a cabeça dela contra o seu peito mas dando espaço para que Burn pudesse manter a mão sobre os olhos dela.

– Já posso chorar – murmurou Saya, deixando-se relaxar contra Lilás, a quem reconhecera pelo inconfundível cheiro a flores – Já posso chorar, Lilás…

Lilás não respondeu, apenas lhe acariciou o cabelo. Olhou finalmente para Burn e inclinou ligeiramente a cabeça, numa pequena vénia, enquanto murmurava:

– Obrigado.

Burn acenou, aceitando o agradecimento.

Saya acabou por se acalmar, enroscando-se contra Lilás no momento em que Softhe voltou com os braços cheios de comida.

– Estás bem, Saya? – perguntou ela, reparando nos olhos vermelhos da amiga.

– Sim, estou ótima – confirmou Saya, fazendo um sorriso como nunca nenhum dos presentes antes lhe vira – E estou cheia de fome. O que trouxeste para mim?


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