Candidatos a Deuses escrita por Eycharistisi


Capítulo 83
Capítulo 83




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/528977/chapter/83

Gina estava a fazer um novo puzzle, com o lagarto de crista indo-chinês caído sobre os seus ombros, quando sentiu a morte aproximar-se do limite que separava os seus domínios. Ficou tensa por alguns instantes, com a mão suspensa sobre o puzzle, esperando que ela recuasse. Soltou um suspiro irritado quando isso não aconteceu. Muito pelo contrário, sentiu-a chegar-se ainda mais à frente, começando a alimentar-se da vida que ela com tanto cuidado cultivava e protegia.

– Parece que vou ter de me irritar outra vez – suspirou ela, falando para os seus animais enquanto se levantava.

– Espera, Gina – pediu-lhe Stephano, de cabeça ameaçadoramente espetada na direção da porta do quarto – Há algo de errado…

– Claro que há algo de errado – resmungou Gina, despindo a velha t-shirt com que andava pelo quarto e vestido umas calças de ganga justas – A morte está outra vez a desafiar-me…

– Não é só isso – negou Stephano – Tenho um mau pressentimento…

Os passarinhos e as borboletas que viviam na trepadeira por trás da cama enlouqueceram ao ouvir falar em mau pressentimento, parecendo também eles senti-lo, pelo modo como voavam desgovernadamente pelo quarto. As suas vozinhas agudas preenchiam a mente de Gina, tentando convencê-la a não sair do quarto, mas a rapariga já vestira uma justa camisola verde de marga curta.

– Vamos contigo – decidiram por fim as borboletas, poisando no cabelo de Gina e cobrindo-o em toda a sua extensão. Pensou em sacudir o cabelo para afastar as tolinhas, mas acabou apenas por soltar um suspiro.

Abriu a porta do quarto, percorreu o pequeno corredor até à cápsula, chegando por fim ao Átrio, e sentindo um baque no peito assim que deu o primeiro passo para fora. No quarto, envolvida pela vida que ela ali criara, não tivera verdadeira consciência do que se estava a passar. Mas agora que estava fora, conseguia ouvir as vozes das árvores do jardim chamando por si, enquanto eram devoradas por um calor abrasador que elas não sabiam de onde viera.

– Não – gemeu Gina, recusando-se a acreditar.

Com o coração aos pulos, Gina correu até à janela mais próxima que lhe concederia vista sobre o jardim. E empalideceu ao constatar que, de facto… o jardim estava todo a arder, completamente consumido por um incêndio inexplicável! As árvores, as flores, os animais encurralados pelas chamas…

– Não! – gritou, horrorizada, desatando depois a correr na direção das suas queridas e preciosas criaturas.

* * *

Darkness apareceu de repente na frente do grupo que corria na direção do jardim, fazendo com que os amigos derrapassem ao tentar parar.

– Descobri! – exclamou ele, felicíssimo – Descobri como podemos ir até ao esconderijo das Parcas!

– Isso é ótimo! – exclamou Yngrid, tão contente quanto ele.

– Como chegamos lá? – perguntou L, ansiosa e curiosa.

– Há uma passagem na escola – disse Darkness – Junto das antigas instalações, logo depois da chamada Casa do Repouso. Havia lá uma passagem em arco, agora tapada, que dava acesso a umas escadas de mármore branco, as chamadas Degraus Infinitos. O nome faz-lhes jus, são umas escadas mesmo muitos grandes e que deverão demorar várias horas a subir, mas levar-nos-ão até ao Olimpo, a montanha em que as Parcas vivem…

– Sim, isso é ótimo – cortou Saya, agitando a mão rapidamente para afastar o assunto – Mas agora temos algo mais importante de que tratar, como salvar o couro da Circe, da Hisui e do Ouro…

– Os Degraus Infinitos são igualmente importantes, se vocês quiserem chegar ao Olimpo – negou Darkness, num tom duro – Sou o Deus Supremo da Morte, sei que a Hisui está bem. Mas não sei se as escadas existem sequer e, se não existirem… não há forma de chegar ao Olimpo e conseguir o Livro dos Nomes.

– Acho que ainda existem – disse Elpída, pensativa – Eu lembro-me de um dos frescos na parede da Casa do Repouso retratar algo sobre umas escadas gigantescas…

Elpída calou-se quando Gina passou disparada por eles, correndo também na direção do jardim, com o cabelo subitamente todo colorido de negro, azul, laranja e branco.

– Mas onde é que ela vai com tanta pressa? – perguntou L, admirada.

– Ah, não – gemeu Lilás, empalidecendo subitamente – As minhas plantas…

– Cheira-me a… queimado? – perguntou Burn, farejando rapidamente o ar.

– O jardim está a arder! – gritou Ónix, aparecendo também sabe-se lá de onde, com Niko ao lado, os dois passando por eles a correr.

Os amigos trocaram olhares assustados.

– Hisui! – gritaram todos ao mesmo tempo, correndo atrás de Gina, Ónix e Niko.

* * *

As Parcas voltaram a poisar os pés no chão, sem um só cabelo fora do sítio, enquanto se desviavam de cada bola de fogo que Hisui disparava na sua direção. Nem sequer pareciam preocupadas por estarem completamente rodeadas de fogo, o qual estava a consumir tudo em redor. Ouro e Circe estavam de novo desmaiados e Hisui completamente fora de si, mas ainda reservava sanidade suficiente para saber que, se continuasse a lançar bolas de fogo desgovernadas, os seus amigos acabariam por morrer. Sentia-os já inclinados para o vazio, enquanto os seus pulmões se enchiam de fumo e eles não conseguiam respirar. E o pior era que ela não conseguia controlar o fogo a partir do momento em que o libertava. Não podia agora impedir a escola de arder por completo. Ela era a Deusa da Destruição: conseguia convocar tudo o que lhe permitisse devastar algo, mas não conseguia parar essa mesma devastação.

– Cansada? – perguntou Esmeralda, já com o seu verdadeiro aspeto, lançando um sorriso cínico a Hisui.

Hisui lançou-lhe um olhar ameaçador, ofegando levemente, agachada, com um punho apoiado no chão. Mas não respondeu. Ela conseguiria destruir as Parcas, conseguiria mandar a escola inteira pelos ares. Mas não com os seus amigos ali, prestes a ser também vítimas da sua fúria.

– Não! – gritou, do outro lado das chamas, uma voz chorosa e desesperada, expressando a mesma dor que uma mãe sentiria se lhe arrancassem um filho dos braços.

– Gina – murmurou Hisui, admirada, distraindo-se por um segundo.

– Morre de uma vez! – gritou Esmeralda, lançando um novo raio de luz verde contra Hisui.

A Deusa da Destruição desviou-se rapidamente, o raio abrindo uma cratera poucos metros atrás de si.

– Hisui! – gritaram novas vozes.

De repente, um vulto ardente saiu disparado de entre as chamas, lançando-se para cima das Parcas e atirando-as ao chão, incendiando as suas roupas e fazendo-as guinchar como espíritos do além. Elas desapareceram com nuvens de pó brilhante pouco depois, surgindo por trás de Hisui, completamente despidas, mas pouco preocupadas com isso.

– Como te atreves?! – gritou Obsidiana ao vulto, os olhos negros arregalados de incredulidade e susto.

Hisui olhou para o vulto pelo canto do olho, vendo as chamas serem consumidas pelo corpo que cobriam, revelando o sorriso desdenhoso de Burn, que limitou-se a sacudir umas quantas cinzas do ombro do seu casaco de cabedal antes de se levantar, no meio das labaredas que ainda devoravam a roupa das Parcas.

– Desculpem a entrada repentina – disse Burn, enfiando as mãos nos bolsos das calças – mas queria apresentar-me. O meu nome é Burn e sou o vosso pior pesadelo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Candidatos a Deuses" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.