Candidatos a Deuses escrita por Eycharistisi


Capítulo 66
Capítulo 66




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/528977/chapter/66

– Qual é a próxima carta? – perguntou Shark, baixinho.

Com as mãos a tremer, L retirou a segundo carta da caixa, franzindo o sobrolho ao ler o nome que lá estava escrito.

– Karina.

Hisui soltou um suspiro, deixando descair os ombros enquanto dava um passo em frente.

– Sou eu – revelou, estendendo a mão para receber a carta.

L entregou-lhe rapidamente a carta e Hisui abriu-a com uma expressão dura, preparando-se para o que desse e viesse.

Minha pequena Karina,

Antes de mais nada, desculpa-me. Desculpa-me por ter deixado que te largassem no mundo, sozinha. Desculpa-me por ter deixado que te largassem no mundo sem sequer te dar a bênção de um beijo de despedida. Mas não me deixaram. Assim que saíste do meu corpo, entregaram-te ao teu pai, para que ele te abandonasse no mundo humano. Não me deixaram dar-te de mamar, lavar-te ou sequer segurar-te no colo. Eu implorei, Karina, implorei tanto, para que me deixassem segurar-te por um só segundo. Não pedi mais do que isso! Mas não me deram essa oportunidade.

Quando a Luz, a Deusa Suprema da Vida que te trouxe ao mundo, te tocou, soube logo quem tu eras e explicou que a única forma de sobreviveres era abandonar-te no mundo humano. Pelo que ela me contou depois de o teu pai sair contigo, foi assim que o Destino escapou às garras das Parcas. Aqueles dois deuses que misteriosamente morreram há dois meses atrás eram, afinal, os pais do Destino. Por eles terem conseguido enganar as Parcas e terem deixado o Destino viver, pagaram com a própria vida. A Luz já me avisou de que o mesmo acontecerá comigo e com o teu pai. E provavelmente com ela também, por nos ter aconselhado a esconder-te no mundo humano.

É por isso, minha filha, que provavelmente nunca nos chegaremos a encontrar. Choro por pensar que, apesar de te ter carregado durante nove meses no meu ventre, serei a única pessoa que jamais te poderá tocar. Poderia dizer que o teu pai foi mais afortunado, porque teve oportunidade de te segurar no colo, mas imagino também o quanto lhe irá custar largar-te no mundo dos humanos, tão cruel e perigoso que é. Não gostaria de estar no lugar dele. Eu jamais conseguiria apartar-me de ti.

Apesar da pressa com que te levaram, consegui ter um vislumbre do teu rostinho quando te levaram para longe de mim. És perfeita, meu amor, absolutamente perfeita. Adoraria poder passar o resto da eternidade a mimar-te tal como mereces, mas não posso. Ainda assim, jamais te esquecerei, minha querida, jamais. Podes ter a certeza de que, quando as Parcas me vierem buscar, o teu rostinho continuará bem presente na minha mente. Morrerei por ti, com um sorriso nos lábios, se souber que estás bem.

Mas, por agora, apenas choro. Espero o regresso do teu pai, que deverá estar neste preciso momento a largar-te em algum lugar muito longe daqui, muito longe de mim. Felizmente, também longe das Parcas. Estou sentada junto do berço em que planeava deitar-te todas as noites, com as roupinhas que deveriam ter sido tuas no colo. Passei meses a planear cada pormenor deste quartinho, a torna-lo absolutamente perfeito, só para ti, minha querida Karina. Tenho na minha frente todos os brinquedos com que adoraria ver-te brincar. Sendo tu a Destruição, o mais provável seria que os carbonizasses a todos. Mas até isso gostaria de te ver fazer. Enfim… foi este o lugar que escolhi para te escrever esta carta de despedida, ideia da Luz. Ela achou que me faria bem. Tinha razão, sinto-me melhor agora que já chorei tudo o que tinha a chorar e que já deixei neste papel todas as palavras que gostaria de te dizer. Sinto-me melhor por saber que quando cresceres terás, pelo menos, este pedacinho de mim. Deixarei junto desta carta a receita de uma torta de chocolate e framboesa que eu adoraria ter feito para ti. Acho que tenho alguma esperança de que, sempre que comas este doce, te lembres de mim, do muito que te amo e de que sempre estarei a velar por ti.

Agora é altura de nos pedirmos, por muito que me custe.

Um grande beijo e um abraço muito apertado,

Da tua mãe.

Hisui retirou outro papel do envelope, possivelmente a receita, para onde olhou longamente, uma só lágrima cristalina e silenciosa descendo-lhe pelo rosto. Depois, sem uma palavra, recolheu-se num canto, junto de Ouro, que ficou a lançar-lhe olhares preocupados, as mãos ligeiramente erguidas, querendo consolá-la mas sem saber muito bem como.

– E-eu posso fazer o bolo para ti – acabou ele por dizer.

Hisui abanou a cabeça, fazendo uma nova lágrima soltar-se.

– Quero fazê-lo eu mesma – murmurou, numa voz débil.

– Hisui – suspirou Ouro, desistindo de pensar e abraçando simplesmente a rapariga, com toda a força, beijando-lhe carinhosamente a cabeça, logo acima da orelha.

Hisui aceitou o consolo, apertando também Ouro e continuando a chorar, silenciosamente, no seu ombro.

– Quem é a próxima? – perguntou, entretanto, Shark, também ele começando a ficar nervoso, com o coração a palpitar.

L voltou a mergulhar a mão na caixa, retirando o envelope seguinte.

– Trinity – anunciou, olhando para Gina.

A Criação avançou, a expressão mais sombria e carregada do que o costume, os cabelos negros quase tapando o seu rosto na totalidade. Pegou no envelope e ficou a olhá-lo, os olhos poisados no seu segundo nome, escrito numa letra fina, alta e elegante.

– Gina? – chamou Niko, quando a rapariga continuou a olhar para o envelope, sem reagir – Gina, que se passa?

– Nada – murmurou ela, em voz baixa, enquanto voltava o envelope e o abria cuidadosamente.

Niko estava quase a saltitar de expectativa quando Gina por fim começou a ler a sua carta, em silêncio.

– N-não a vais ler para nós? – perguntou Niko, desiludido.

– O que é que uma carta dos meus supostos pais vos poderá interessar? – perguntou Gina, erguendo uma sobrancelha.

– Supostos pais? – perguntou Hisui, erguendo o rosto do ombro de Ouro e fulminando Gina com o olhar – O que é que estás para aí a insinuar?

– Nada – negou Gina, encolhendo os ombros – Apenas não temos provas nenhumas de que estas cartas tenham sido escritas pelos nossos pais. Poderão ter sido escritas por ele – concluiu, apontando um dedo acusador a Darkness.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Candidatos a Deuses" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.