Candidatos a Deuses escrita por Eycharistisi
– Há quase quinhentos e cinquenta anos atrás, eu vim para Atlantis para ser treinada para deusa. Eu era uma rapariga mimada e fútil naquela altura e achei que causaria furor ao vir para aqui, que todos me adorariam e que eu descobriria ser Adepta de um qualquer deus fascinante, lindo de morrer e com poderes incríveis. Mas o tempo foi passando, ano atrás de ano, e o meu poder nunca despertou. Comecei a envelhecer, como uma humana, e acreditei mesmo que iria morrer como uma. As gémeas recusaram-se a dar-me Néctar para eu poder esperar mais tempo e eu nunca entendi porquê. Na verdade, eu achava que elas tinham o dever de me dar Néctar, uma vez que… todos diziam que eu era Adepta da Reorganização.
– Adepta da Reorganização? – repetiu Hisui, confusa.
– Era o que nós chamávamos aos deuses da profecia da Reorganização. Naquela altura, essa profecia era uma lengalenga que toda a gente sabia e pela qual todos ansiavam. Todos queriam a Destruição para eliminar o que estava podre e a Criação para criar de novo, e melhor, o que tinha sido eliminado. Acima de tudo, todos queriam a felicidade que a Protetora traria. Quer dizer… todos menos alguns. Mas isso não vem agora ao acaso, já me estou a dispersar.
«Como eu estava a dizer, todos diziam que eu era uma Adepta da Reorganização e, nesse caso, seria um elemento importante no futuro. Sendo assim, eu não podia pura e simplesmente morrer como uma humana. Teria de viver e esperar pela minha Suprema. Mas as gémeas e as Moiras, que agora são chamadas de Parcas, não pareciam estar interessadas nisso e recusaram-se a dar-me Néctar. Então… os meus pais deram-me Néctar.»
– O quê? – admirou-se Hisui, chocada.
– Isso mesmo. O meu pai era o Deus Supremo da Juventude e a minha mãe uma Deusa Adepta do Saber. Ela conseguiu roubar algum Néctar às gémeas e, depois de o meu pai me ter devolvido a minha juventude, eu bebi-o.
Elpída calou-se, o olhar fixo no vazio, a sua mente perdida nas lembranças do passado. Hisui ficou a olhar para ela, suspensa na sua história, ansiosa para que continuasse. Mas ao ver que isso não aconteceria tão depressa, apertou suavemente as mãos de Elpída, dando-lhe apoio e incentivo para continuar.
– As gémeas ficaram furiosas – continuou Elpída, depois de respirar fundo – As Parcas ainda mais. Elas poderiam ter cortado o meu fio na mesma, mas nem elas o poderiam fazer sem pagar caro por alterarem o curso natural da minha vida. Vingaram-se nos meus pais, cortando os fios deles. Quanto a mim, decidiram prender-me nas masmorras da escola. Decidiram que, já que eu bebera o Néctar para esperar o meu Deus Supremo, ficaria presa até que ele chegasse e despertasse o meu poder. Mas ele nunca chegou… até agora.
Hisui ficou a olhar para Elpída, que lhe dirigia um sorriso terno e comovido, sem saber o que dizer.
– Mas… quem eram as pessoas que não queriam que a profecia se realizasse? – perguntou Hisui.
– Não é óbvio? – perguntou Elpída – Quando a Criação, o Destino e a Destruição tomarem os seus devidos lugares… as Parcas deixarão de fazer sentido. São elas que querem impedir a concretização da profecia. Felizmente para elas e infelizmente para nós, elas estão na posição perfeita para o fazer. Elas controlam as nossas vidas como bem entenderem. Por elas… a profecia nunca irá realizar-se.
* * *
– Algum de vocês viu a Hisui? – perguntou Circe, quando se encontraram com os rapazes no primeiro intervalo da manhã.
– Não – negou Ouro – Porquê? Aconteceu alguma coisa com ela?
– Apareceu uma Adepta dela – disse Bella.
– A sério? – admiraram-se os rapazes.
– Sim – confirmou Circe – Mas ela a mim parece-me meio passada da cabeça, completamente psicótica. Ela raptou a Hisui sabe-se lá para onde!
– Não a podes encontrar com as tuas visões? – perguntou Dest, erguendo uma sobrancelha.
– Eu já tentei isso – disse Circe – Mas acho que estou demasiado ansiosa para convocar uma visão, porque vi-as numa sala que não acho que exista na escola. Eu, pelo menos, nunca vi nenhuma sala assim.
– Temos de a encontrar – decidiu Ouro.
E então começaram todos a procurar Hisui e Elpída. A busca resultou num choque entre Ouro e Hisui ao virar de uma esquina, fazendo com que os dois caíssem no chão com gritos, o rapaz em cima da rapariga.
– Ah… desculpa, Hisui! – desculpou-se o rapaz, muito corado.
– Desculpa-me eu – murmurou ela, levemente corada.
– Saí já de cima da minha Vara’lia! – berrou Elpída, arrancando Ouro de cima da sua Suprema e empurrando-o contra a parede enquanto levava um punho atrás, pronta para o esmurrar.
– Elpída, não! – gritou Hisui, levantando-se com um salto e segurando o braço da Adepta – Não lhe batas. Foi um acidente e eu não me magoei.
– Não foi isso que me incomodou – rosnou Elpída – Ele estava a olhar para ti dum jeito que não me agradou… e ele não parecia estar a esforçar-se muito para sair de cima de ti. Ele está interessado em ti!
Ouro e Hisui olharam um para o outro, coraram e desviaram muito rapidamente o olhar.
– Isso é um absurdo – murmurou Ouro – Agora, podes soltar-me?
– Solta-o, Elpída – pediu Hisui, depois de pigarrear suavemente.
Elpída soltou Ouro lentamente, continuando a lançar-lhe um olhar ameaçador.
– Estás a ver o que eu queria dizer quando disse que ela era psicótica? – perguntou Circe a Ouro, cruzando os braços na frente do peito.
Elpída ignorou-a completamente.
– Adiante – disse Hisui, virando-se para os amigos de repente – Temos de ir para a Bolha de Isolamento. Agora!
– Porquê? – admirou-se Circe.
– Há umas coisas que a Elpída tem para nos contar. Ela já me contou e foi imprudente termos falado nisto fora da Bolha, eu sei, por isso é que agora temos de ir para a Bolha.
– Mas… as aulas – lembrou Yngrid.
– Esqueçam as aulas! – exclamou Hisui – Isto é mais importante do que as aulas! Vamos embora!
* * *
– E lá vão eles para a Bolha. Maldição!
– Não importa. Nós já sabemos do que eles vão falar.
– Poderão falar de outras coisas que nós não sabemos que eles sabem.
– Não me parece que o façam.
– Não sei porque é que vocês se estão a preocupar tanto com isso. Eles já sabem demasiado! E nós sabemos o suficiente. Vamos acabar com eles enquanto ainda é tempo!
– Não te precipites…
– Precipitar? Isto está já a arrastar-se há demasiado tempo! Deveríamos tê-los morto no momento em que soubemos que eles de facto eram os deuses daquela maldita profecia!
– Eles estão já demasiado envolvidos pelas forças do universo. Se os matarmos agora, nós é que pagaremos! Talvez… talvez devêssemos desistir. Admitir que eles finalmente ganharam e deixá-los tomar aquilo que é deles por direito.
– Desistir? Deixá-los tomar o que é deles?! Eles não têm nada. Rigorosamente nada! O que eles pretendem tomar é nosso! E eu não vou deixá-lo ficar com aquilo que é meu! Não quero saber se as forças do universo se poderão virar contra nós. Vou matá-los. E vou fazê-lo agora!
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