Nightmares Come True escrita por Polo


Capítulo 7
Cruella De Ville


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigado pela paciência e pela compreensão de vocês, sério, a cada capítulo postado eu fico cada vez mais convencido que eu tenho os melhores leitores do Nyah. Bem, eu acho que nesse sábado não será possível postar um novo capítulo, mas durante a semana será postado.
Acreditem, depois da tempestade vem a bonança, essa fase turbulenta e confusa vai passar dando lugar a uma época bem mais interessante. Enfim, queria aproveitar para agradecer todos os comentários de vocês, legal falar com vocês toda a semana!



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Só eu sei o quanto cachorros são detestáveis. Nunca gostei de tê-los por perto e provavelmente nunca irei. Essa regra se aplica principalmente a Pongo e Prenda, dois dálmatas que seguem o nosso grupo desde que o fim do mundo começou. Normalmente, quando acontecia de nós nos encontrarmos com outras pessoas, nunca víamos um animal com eles. Porém, lá estávamos nós, andando com aqueles seres barulhentos e babões que atraiam os mortos para perto de mim.

O meu grupo era composto por cinco pessoas. Havia Roger Radcliffe, o compositor de piano, um homem especialmente irritante. Seu jeito idealista e travesso me causava tédio, isso, claro, quando eu não sentia outra coisa por ele. Era um homem loiro e alto com um sotaque inglês, não sou culpada de me sentir, talvez, um pouco atraída por ele. Também havia Anita, noiva de Roger e minha amiga desde os tempos de colégio, seu coração é puro, porém é muito boba. Sempre usando roupas comportadas e com o cabelo ruivo sempre preso em um coque, só Deus sabe o que o compositor viu nela. Junto conosco também andavam os irmãos Badun, Gaspar e Horácio, dois sujeitos que claramente deviam ser criminosos antes de tudo começar, mesmo assim, eu gostava deles, sempre faziam o que eu mandava. O mais velho e esperto era Gaspar, um homem magricela, alto e cheio de cicatrizes e o mais novo era Horácio, estava com o peso acima da média e era surpreendente como alguém com aquele porte físico tenha sobrevivido por tanto tempo.

Por fim, eu também estava no grupo, o liderando na verdade e era uma visão deslumbrante para todos os que estavam a minha volta. Com o meu cabelo longo, parte negro e parte branco, e minhas peles, eu exaltava poder por todos os que estavam ao meu redor. Eu sentia que todos sabiam que era eu que estava no comando e que era a mim que eles deveriam seguir. Todos, claro, exceto os dois dálmatas. Os cachorros de Roger e Anita, Pongo e Prenda, simplesmente não conseguiam entender que era eu que eles deveriam seguir, e não o contrário. Eu odiava admitir, mas aqueles cães eram especiais e eu tinha noção disso. Eles pareciam entender tudo o que nós falávamos para eles e, como se isso não fosse o bastante, eram os melhores assassinos de seres em decomposição do grupo. Mesmo assim, eu não confiava neles, o jeito que eles estavam preparados para um mundo como esse simplesmente não era natural.

– Cruella? – A voz de Anita me chamou e eu a olhei com o canto dos olhos, nosso grupo agora atravessava por um bosque e eu ia à frente – Desculpa incomodar, mas falta muito para chegarmos?

– Mais algumas horas a pé – Eu disse distraída – E por que a pressa? Tem algum compromisso inadiável por acaso?

– Não, não é isso – A garota respondeu no mesmo tom sem graça e sem notar a retórica da minha pergunta – Mas é que, sabe, os outros, eles, bem, nós estamos, como dizer...

– Põe pra fora, Anita!

– Nós estávamos preocupados porque nós achamos que a Mansão De Vil não existe mais! – A garota falou rapidamente e depois se assustou com o que disse – Bem, é isso.

Parei de andar e olhei para o rosto de Anita, eu podia notar o quanto ela estava nervosa. As outras pessoas do grupo pararam de andar também, todos estavam tensos, de certo eles estavam ouvindo a nossa conversa. Pongo e Prenda se posicionaram ao lado de Anita e rosnaram para mim. Esforcei-me para não demonstrar medo, mas os caninos dos cães me olhavam de forma ameaçadora.

– Você me escute, Anita... – Eu disse em tom baixo, porém o suficiente para que todos pudessem ouvir – Que vocês todos me escutem... A Mansão de Vil é tudo o que eu tenho, é todas as nossas chances de sobreviver a isso, é o meu lar. Eu não posso afirmar com toda a certeza que ela ainda está de pé, mas nós não vamos até lá, não vamos desistir até chegarmos lá.

– Como quiser, madame – Gaspar disse se aproximando de mim, algo em seu semblante me deixou subitamente nervosa – Mas é bom que toda essa viajem valha para alguma coisa.

– E valerá! – Falei, pude notar que o meu tom de voz não soava tão convincente dessa vez – E você, Gaspar, pode parar com ameaças! Não importa o que você fez antes desse apocalipse começar, é de mim que você deve ter medo!

– Naturalmente – O jovem alto e sinistro disse abrindo um sorriso bobo e olhando para o seu irmão – Com um cabelo como esse, quem não ficaria com medo de você?

– De Vil, – Roger me chamou pelo sobrenome – Nós só queremos saber se você tem certeza de que a mansão ainda está inteira.

– Eu sei, Beethoven – Respondi usando o seu apelido – E eu entendo a preocupação de todos vocês. Mas vocês não tem opção se não confiar em mim, não é? Nós vamos parar um pouco, vocês podem ficar aí descansando, eu vou dar uma volta...

Sem esperar qualquer resposta dos meus companheiros comecei andar para leste, sem saber ao certo onde eu iria chegar, pude ouvir críticas sobre mim pelas minhas costas, mas não lhes dei atenção e continuei andando. Meus pensamentos estavam a mil, sempre que eu cogitava o fato de que a Mansão pudesse estar destruída, eu me sentia verdadeiramente mal. E ser confrontada por todo o meu grupo daquela maneira, não foi nada agradável. Quem eles eram para falar comigo daquela maneira? Um compositor fracassado, uma dupla de bandidos e uma perfeita dona de casa. Eu sou Cruella De Vil, a CEO de uma das maiores empresas de moda do país. Toda a economia da nossa cidade natal, Nova Londres, gira em torno de mim.

Porém, ao chegar nas margens de um riacho e sentar no gramado, a realidade. Eu não sou mais Cruella De Vil, eu era. Não existia mais a noção de poder, todo o meu dinheiro agora era útil apenas para esquentar uma fogueira, eu era essa sombra usando peles de uma mulher que uma vez fui. Deitei e olhei para o céu, era manhã ainda, não tinha certeza de que horas eram. Quando percebi que o fim do mundo havia me tirado até a noção de tempo, não pude me conter, a minha mão pálida e fria foi em direção, e comecei a chorar. Mas eu chorava como uma criança, chorava sem motivo, chorava apenas por chorar. Naquele momento me desconectei do mundo lá fora, isso era um erro grave.

Não percebi que, com passos lentos e arrastados, um morto vinha em direção a mim. Talvez, na camada mais profunda da minha mente, eu tenha notado a presença daquele ser. Talvez, apenas talvez, eu tivesse desejado desesperadamente a morte naquele momento. Porém, não foi isso o que aconteceu.

Abri os meus olhos e vi que Roger Radcliffe agora golpeava repetidas vezes a cabeça do pobre homem em decomposição usando uma faca. Era em um desses momentos que eu o achava mais lindo, era um selvagem, agia por extinto, faria tudo apenas para me salvar. Porém, logo esse momento se foi e Roger Radcliffe sentou cansado ao meu lado.

– Dia difícil? – Perguntei olhando para o homem loiro coberto de sangue que estava sentado junto a mim.

– É, já tive piores – Ele deu de ombros e depois olhou para dentro dos meus olhos lacrimejantes – E você? Dia difícil?

– O pior de todos – Disse encostando a minha cabeça no ombro de Roger – Por que a vida é assim, Beethoven?

– Porque ela é cruel, Cruella – E depois disso ele riu – Cruella Cruel, você lembra?

– E como eu poderia esquecer? – Revirei os olhos – Foi a música que você compôs pra mim quando nós nos conhecemos! Admita, Roger, você era apaixonado por mim naquela época!

– Cruella Cruel, Cruella Cruel – O compositor começou a cantar a canção que ele havia feito apenas com a pretensão de me irritar – É mais traiçoeira que uma cascavel...

–... Em suas veias só circula fel... – Completei a música, era uma música bem animada, eu teria gostado bastante dela se não fosse a letra – Cruella... Cruella...

– Exatamente, Cruella! – Roger falou em tom despreocupado, ele realmente sabia como me colocar para cima – Agora vem, vamos continuar essa viagem e chegar a essa droga de Mansão dos De Vil!

No mesmo instante que Roger disse isso pudemos ouvir um grito agudo no lugar onde estava o nosso grupo. Era o grito de Anita. Beethoven e eu nos olhamos por um segundo e depois corremos a toda velocidade até o local. Como pudemos ter sido tão tolos? Deixar Anita a sós com os irmãos Badun? Porém, ao chegar lá, notei que o problema era muito maior que Gaspar e Horácio.

Anita chorava freneticamente, estava em pé e andava de um lado para o outro compulsivamente. Seus olhos negros revelavam um misto de horror e de nojo. Gaspar estava sentado encostado a uma árvore, estava claramente em estado de choque, não conseguia tirar os olhos do irmão. Horácio estava morto. Sua barriga estava aberta revelando nada mais que suas tripas, seu cheiro era nauseante e havia sangue por todos os lugares. Não havia sinal de Pongo e Prenda em nenhum lugar.

– Querida, o que houve? – Roger disse abraçando Anita, ela aparentou ficar mais calma depois disso – Onde estão os cachorros?

Anita olhava para o corpo sem vida de Horácio. Pude escutar o choro de Gaspar ecoar pelo bosque, senti um arrepio sinistro passar por dentro das minhas vértebras, Anita balbuciava, mas depois de um tempo eu consegui entender o que ela dizia.

– Foram eles – Anita falava – Pongo e Prenda. Eles mataram o Horácio.

...

Naquela mesma noite nós chegamos a Mansão De Vil que, na verdade, não era uma mansão. Era uma fábrica, a primeira de muitas que a minha família construiu que possibilitou a existência do nosso império. Os grandes portões pretos de ferro guardavam o grande edifício sombrio e excêntrico que era a fábrica. Gaspar foi na frente para ver se havia algum morto pela propriedade, mas ele não conseguiu avistar nada. Saquei a chave de metal que estava no bolso do meu casaco de pele e abri os portões do lugar que eu mais conhecia como lar.

E o que eu senti naquele momento? Decepção. Eu imaginei aquela cena por tanto tempo, triunfantemente eu abriria os grandes portões da Mansão de Vil e que todos nos grupos me reconheceriam como uma verdadeira líder. Porém, até essa sensação foi tirada de mim por esse mundo impiedoso, não estávamos no clima. Desejei com todas as minhas forças que Roger não tivesse me salvado mais cedo naquele dia.

...

Já estávamos a mais de uma semana na fábrica e o clima de luto não havia passado por completo. Gaspar, entre todos, era o que parecia mais distante. Anita, muitas vezes, começava a chorar do nada e era Roger quem ia consola-la, eu nunca me oferecia, não por não gostar da garota, mas porque eu tinha a certeza que eu acabaria piorando a situação. Foram dias muito solitários, ás vezes formávamos pequenos grupos para sair e procurar por mantimentos.

Porém, depois de muito tempo, tivemos um momento bom. Estávamos nós quatro sentados na sala que antes era usada para colocar botões nos casacos. Gaspar estava sentado em uma esteira de produção, Roger e Anita estavam no chão abraçados e eu estava deitada em cima do meu casaco de pele. O silêncio tomava conta da sala.

– Ele comia muito – Gaspar disse cortando o silêncio do local – Mas eu vou sentir saudades daquele belo pedaço de bosta que era o meu irmão...

– Gaspar – Eu disse olhando para o teto – Eu sei que não disse isso antes, mas... Eu sinto muito! De verdade, eu não sou boa com pessoas, porém, eu sinto de verdade!

– Você sente? – Gaspar disse em tom de brincadeira – Certo. Agora isso é novidade!

– Ora, Gaspar – Anita disse se abanando e soltando uma risada – Que horror!

– Ah, Anita, eu te amo, sua vadia! – Eu disse rindo – Você não existe, sério, quem abana as mãos dessa forma?

– Alguém bem charmosa e educada – Roger respondeu mostrando a língua para mim – Você não entenderia, Cruella!

– Não, Roger, pode deixar... – Anita disse olhando diretamente para mim – Vai... Vai se foder Cruella!

Todos nós rimos, porém não durou muito tempo para nos calamos. Ouvimos latidos e uivados ao longe. Porém não eram poucos e separados, eram muitos, eram assustadores. Entreolhamo-nos e sabíamos que não era algo bom que viria a seguir. No mínimo uma centena de cachorros estava lá fora e eu tinha a impressão que eles se aproximavam cada vez mais.

– Cruella – Roger se pôs de pé e olhou diretamente para mim, olhei ao meu redor e agora todos faziam o mesmo – O que nós fazemos agora?

– Agora, Beethoven? – Eu disse fazendo minha voz ecoar pela sala – Agora, nós fazemos um casaco com a pele de cento e um dálmatas!


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Notas finais do capítulo

Vamos lá, talvez você já deva ter notado que cada apocalipse zumbi tem as suas regras e se diferem muito. Por exemplo, existem zumbis lentos (como em The Walking Dead) e zumbis rápidos (como em Guerra Mundial Z), existem muitos métodos de transmissão: Arranhão, mordida, pelo ar ou apenas morrer. Bem, em Nightmares Come True não é diferente. Temos nossas regras, temos uma origem diferente, métodos de agir e de sobreviver diferentes e e.t.c.
E temos também os cachorros. Qual será o mistério envolvendo eles? Bem, isso só o tempo dirá! Bem, por hoje é só pessoal. Conto, como sempre, com o seu comentário porque ele me deixa bastante feliz e me impulsiona a continuar, é isso, até a próxima. Abraços, Polo!