Desejo e Reparação escrita por Ella Sussuarana


Capítulo 39
IV - Capítulo 37: Um conto de dois mundos


Notas iniciais do capítulo

Este é um looooongo capítulo, que se passa mais rápido do que vocês imaginam.
Espero que gostem, porque esse foi um dos capítulos que mais gostei de escrever, apesar de todo o sofrimento...



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Parte IV

{Sobre a loucura, o amor e a guerra}

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Capítulo 37: Um conto de dois mundos

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A parte mais fácil foi retirar os livros da sessão proibida da Biblioteca. Não levou mais que trinta minutos para que entrassem, localizassem os livros que pareciam ser úteis e saírem sem causar alarde. Durante esse tempo, Hermione e Draco não trocaram mais palavras do que o necessário para informar que estavam prontos para partir. A parte mais difícil seria manterem-se acordados enquanto liam e encontrarem o contrafeitiço certo, para, então, acharem uma forma de treiná-lo e de usá-lo para se defenderem.

A parte mais fácil foi explicar a seus amigos que ela havia agido sem eles, pior, na companhia do Malfoy. A parte mais difícil foi lidar com os sentimentos de amargura nos peitos de Rony e de Harry; e pior, no seu próprio peito.

A parte mais fácil foi convencer os seus colegas de que Blaise não era um inimigo. A parte mais difícil foi fazê-los agir como se realmente acreditassem nisso. Mesmo sem o brasão nem as cores da sua Casa, havia escrito na testa dele, nos olhos dele, em toda parte de seu corpo e no ar ao seu redor – Sonserina.

A maioria o olhava com desconfiança e receio, mas outros, como Rony e Gina, tinham expressões vagamente curiosas e amigáveis, o que foi uma surpresa para todos, sobretudo para Harry, que não gostou nenhum pouco do demorado olhar que Gina reservava a Blaise. O próprio sujeito em questão se sentia desconfortável sob toda aquela súbita atenção. Não gostava de estar no centro do espetáculo, preferia se afastar para um canto pouco iluminado e ficar observando a cena de longe. Mas, dessa vez, ele era o protagonista dela. E todos estavam interessados em saber como ele havia parado naquele lugar, com a mão de Hermione entrelaçada firmemente à sua.

Havia pouco sentido naquela imagem. Ela era uma questão metafísica, quase uma ironia disfarçada. Alguns tentavam, em vão, supor a resposta daquela equação, mas a lógica dela era demasiadamente complicada, pois, para compreendê-la, era necessário voltar anos no passado, para a primeira que Blaise falara com Hermione, quando ainda estavam no segundo ano.

– Eu acho que está tudo bem se ele participar – murmurou Harry. O que ele realmente quis dizer foi “Você tem certeza de que ele não nos entregará a Dolores?”.

– Todos aqueles que quiserem se defender têm o direito de fazer parte deste grupo – disse Hermione, de cabeça erguida. O que ela realmente quis dizer foi “Eu confio nele como confio em Rony e em você”.

– Você tem razão – disse Gina. E ela realmente quis dizer isto.

– Se todos estiverem de acordo... – falou Harry.

Todos murmurando uma afirmação que poderiam ser “Ok” ou “Não está ok”. De qualquer forma, já estava decidido que Blaise treinaria com eles, gostassem ou não. E, alguns, de fato, não gostavam nenhum pouco da ideia. Outros, porém, chegaram por trás dele, dando leves tapinhas nas costas e dizendo, com vozes eufóricas – Aquilo que você fez com o Malfoy, ano passado, foi incrível! Sério! Depois, você precisa me ensinar alguns golpes!

Ele estava feliz por ter sido aceito, na medida do possível. E Hermione estava ainda mais animada do que ele, tirando o fato de que ela estava com raiva por Harry estar sendo tão obtuso sobre aquilo.

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No final daquela semana, aconteceria a partida de quadribol mais esperada do ano, aquela em que a Casa da Grifinória duelaria com a Casa da Sonserina. Porém, os ânimos logo foram silenciados pelas regras que Dolores impôs ao jogo. Ela disse que ele era demasiadamente violento e que algo precisava ser feito a respeito disso. Por isso, criou regras bobas de segurança, que dificultava a execução dos movimentos dos jogadores e que tornava a emoção nesses jogos praticamente zero. E, de fato, ter assistido àquele jogo foi decepcionante. Fred e Jorge lucraram nada, pois mesmo apostas foram proibidas.

Após a partida, Rony e Harry não deixaram de ir reclamar para Hermione sobre isso. Ela, no entanto, estava distraída para as vozes ruidosas dele. No seu colo, tinha um livro, e era ele o que detinha a sua atenção.

Ela já tentara todos os feitiços que conhecia para tentar revelar o segredo que aquele livro guardava, assim como tentara encontrar quaisquer pistas esquecida numa de suas páginas. Havia nenhum traço que denunciasse que, certa vez, ele lhe mostrara uma visão repulsiva de seu futuro. Ainda lembrava claramente da visão, apesar de negá-la para si mesma. Esse era um segredo que iria à cova com ela. E com o Malfoy.

Na noite passada, ao investigar o livro mais uma vez e encontrar nenhuma pista substancial, aceitara a derrota. O sabor era amargo e infeliz. Porém, ao menos, tinha uma nova possibilidade para solucionar o mistério de suas visões. Bastaria encontrar o contrafeitiço certo para proteger sua mente e, então, comprovar que aqueles sonhos foram induzidos por alguém.

Quem?

Agora, enquanto Harry e Rony tagarelavam sem prestar atenção ao subido silêncio da amiga, ela lia um conto, ou, como o livro dizia, uma história que fora real um dia.

Era sobre uma garota que se perdera na floresta. Ela saíra de manhã para recolher frutas vermelhas, como fazia com frequência na estação em que as flores desabrocham e os frutos amadurecem; porém, daquela vez, a noite chegara mais depressa, quase como uma entidade viva, arrastando seu véu sobre os topos das árvores. Ela sentira muito frio, subitamente, era como se estivesse descoberta e olhos a seguissem. Quando escutara o mais sutil dos sons, possivelmente uma coruja equilibrando-se no braço de uma árvore, correra, deixando seu cesto esquecido no chão.

Ela era uma garota corajosa, era verdade. Mas escutara histórias sobre demônios que raptam belas jovens para usar do calor e comer da maciez de seus corpos. Por mais destemida e esperta que fosse, não poderia combater uma dessas criaturas de dentes afiados e olhares congelantes.

Acontece que, no desespero da fuga, não olhava para onde pisava; perdera a firmeza do passo e despencara. Rolara sobre cascalho, raízes e folhas mortas, até repousar, sem nenhum pouco de delicadeza, sobre superfície áspera. Por muitos minutos, permanecera imóvel, sentindo cada músculo seu arder, sentido o sangue vazando de seu corpo pelos cortes distribuídos em seu rosto, braços e pernas. Quando se movera, percebera que havia cometido um terrível erro, pois os seus músculos arderam como se estivessem sendo testados ao fogo.

Veja bem, ela era filha de um grande proprietário de terras daquela região, jamais tivera que experimentar labor debaixo do sol ou peso sobre os seus braços graciosos, sua pele era alva e limpa e seus cabelos bem cuidados. Um dia, casar-se-ia a mando de seu pai, não por amor. Nunca por amor. Portanto, aquela sua pequena aventura estava sendo o momento mais tortuoso de sua vida.

Muito lentamente, colocara-se de pé. Lá fora, a noite engolira o mundo, estava frio e silencioso, como se fosse inverno. Para sua sorte – ou não –, caíra na proteção de uma caverna. A boca era estreita, mas podia ver, com o pouco de luz provido pela lua, que havia ali uma entrada que levava para as profundezas de algum lugar. Ela não gostava disso. Também havia escutado histórias sobre pessoas esqueléticas de brilhantes olhos azuis que viviam presas numa caverna muito semelhante àquela e que, famintas, devoraram toda sorte de criatura que pudessem colocar as mãos sobre.

Porém, numa noite misteriosa como aquela, era bom estar debaixo de algum abrigo. Assim, recolhera-se num canto, o mais longe possível da outra da caverna, e esperou.

– Hermione, você está nos escutando? – perguntou Rony, vermelho de raiva.

– Sim, vocês estavam falando algo como Dolores está arruinando toda a diversão da magia. E, bem, pelo que me lembro, ela disse mesmo que magia não era divertida nem era engraçada, não era algo para ficar maravilhado; magia é perigoso.

Rony respondeu algo, ou esse deve ter sido Harry. Hermione jamais saberia, pois já estava de volta, imersa em sua leitura.

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Em algum momento, ela deve ter caído no sono, porque a próxima coisa da qual lembra é o barulho de vozes melodiosas e pássaros cantando. Abriu seus olhos, assustada, sem saber onde estava. Levara meio minuto para se lembrar de tudo o que aconteceu e outro meio minuto para compreender que as vozes não faziam parte dos seus sonhos. Elas eram reais e estavam próximas.

Pelo canto dos olhos, vira uma luz amarela surgir pela outra entrada da caverna, a qual levaria para as suas profundezas. Pânico tomou conta de seu corpo. Erguera-se, esquecendo-se de sua dor e fizera a única coisa sensata que uma menina de quatorze anos poderia ter feito numa noite tão estranha quanto aquela – correra.

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– O que você está lendo? Não é um livro de Poções, é? – perguntou Rony, visivelmente indignado que, em um momento tão inacreditável e sensível como aquele, a sua amiga tivesse a coragem de se mostrar calma, quieta e com a cara metida num livro! – Você tem ideia da gravidade do que acabou de acontecer?

– É só um jogo, Rony – murmurou Hermione, distraída.

Rony e Harry soltaram um som de profunda indignação. Aquilo que ela acabara de falar era uma blasfêmia. Harry queria arrancar o livro das mãos dela e explicar sobre a incrível arte do Quadribol, mas ele bem sabia como Hermione reagiria a isto. Não seria nada bonito. Com uma voz mais macia que a de Rony, perguntou o que ela estava lendo.

Hermione suspirou e respondeu.

– Um conto.

– É sobre dragões? – perguntou Harry, mas poderia ter sido Rony.

– Não sei, ainda não terminei de ler. – Havia uma ponta de irritação na voz dela, mas, se qualquer um percebeu, considerou melhor ignorá-la.

– Hermione – sussurrou Harry –, alguém precisa devolver os primeiros livros que retiramos da Biblioteca.

Ela levantou o olhar do livro. O tom de voz de Harry indicava que ela não gostaria de como aquela conversa terminaria.

– Hoje, vamos receber nossos integrantes para a Ordem... Alguém precisa manter o Malfoy distraído.

Alguém, não nós.

– Vocês fizeram um escândalo quando descobriram que eu havia ido sozinha com o Malfoy, mas, agora, quando é conveniente para os dois, querem me obrigar a fazer isso de novo!

– Não vamos obrigá-la a fazer nada que não queira – disse Rony, ainda com um resquício de raiva no tom da voz e na coloração do rosto. – Nós também não gostamos de deixá-la sozinha com aquela víbora, mas não podemos arriscar que a Ordem seja descoberta!

– E por que eu preciso fazer esse sacrifício?! Por que um de vocês não vai entretê-lo?

Harry olhou para Rony, que devolveu o olhar e acenou. Então, Harry olhou para Hermione e preparou-se para o pior.

– Bem... Essa também é uma ideia válida, mas... Nós todos sabemos que o Malfoy se mostra mais...

– Prestativo – ajudou Rony.

– É, prestativo, quando é você.

Hermione explodiu em gargalhas sem humor.

– Vocês só podem estar brincando comigo! Aquele narcisista arrogante é tudo menos prestativo, sobretudo comigo! Vocês se esqueceram de todas as vezes que ele me chamou de sangue-ruim?!

– Não – falou Harry, imediatamente.

– Falando nisso, faz algum tempo que ele não a chama mais sobre isso – murmurou Rony, quietamente.

– Não na sua frente – falou ela, cruzando os braços e encarando-os como se ainda não acreditasse que estavam falando sério.

– Ele a deixou dormir no seu quarto – apontou Harry. – E aceitou nos ajudar a pegar os livros.

– E vocês realmente acreditam que ele estava fazendo isso de boa vontade?

– Não, claro que não – falaram os dois.

– Ele desconfiará se for um de nós e não você – disse Rony.

Hermione foi obrigada a admitir que isso era verdade. E, consequentemente, a aceitar a tarefa. O que ela não fazia pelos amigos? Estava certa – um dia, eles seriam a causa de sua morte.

Todavia, isso não significava que ela estava contente. Sua cólera era tamanha, que, como um tornado, ela ergueu-se e passou por entre eles, batendo com força nos seus ombros.

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Era sábado, o que significava que poderia gastar as próximas horas estudando. Como estava inquieta demais para isto, limitou-se a distrair-se com o conto que não tivera a oportunidade de terminar mais cedo. A verdade era que, após ter fugido da presença de seus melhores amigos, ela levara longos minutos para conseguir acalmar a frenética batida de seu coração. Sentia-se ansiosa e irritada, e sempre se encontrava imaginando como deveria se comportar próxima do Malfoy. Isso era tão ridículo!

Precisa esquecer seus problemas por um momento, só por um momento...

Os únicos sons que escutava eram o da sua própria respiração instável e o do grito de seu coração. Ao ter certeza que nada a perseguia, apoiara-se numa árvore e cedera sobre o seu peso. Somente agora lembrara o quão machucado seu corpo estava. Suas pernas tremiam pelo esforço e, em seus braços, novas feridas foram abertas, por onde escorria sangue, morno e grudento. O cheiro a enjoava. E ela acabou por vomitar a única refeição que tivera naquele dia.

Então, escutara um barulho. E a próxima coisa da qual se dera conta era que estava caída no chão, com um grande peso sobre o seu abdômen. A visão embaçada não possibilitava distinguir nenhuma forma naquela escuridão, mas ela foi capaz de sentir o bafo de podridão que exalava pela boca escancarada da criatura, assim como as presas em seus braços.

Era isso, pensou, ele iria usar seu corpo, lenta e dolorosamente.

Fechou os olhos, rezando para que algo acontecesse, para que sua consciência fosse furtada, para que tivesse a chance de morrer antes que ele a tocasse de forma repulsiva.

Ela estava com sorte, pois a sua prece foi escutada.

Naquela noite, havia sido salva por uma criatura tão antiga quanto a própria terra. Ela ficara tão deslumbrada com a presença dele e com a facilidade com a qual decapitara a besta, que se esquecera das histórias que contavam sobre os elfos. Quando ele lhe oferecera a mão, prometendo-a que a levaria para um lugar seguro, onde poderia descansar, comer e cuidar de suas feridas, ela aceitara.

Ele a guiara de volta para a caverna, que, naquele momento, estava inundada por luz, e mostrara-lhe o caminho para o seu mundo debaixo da terra. Ela estava admirada demais por aquelas criaturas de sorrisos fáceis e risadas angélicas para lembrar-se de que jamais deveria comer as frutas dos elfos. Elas eram terrivelmente suculentas; dizem que, aqueles que experimentaram uma vez do seu mel, jamais aceitariam comer de outra fruta. Alguns chegavam a morrer de fome, outros enlouqueciam completamente; havia ainda aqueles que ofereciam suas almas em troca de mais uma mordida. Por sorte, esta não foi a fruta oferecida à menina.

Depois de ter descansado e de ter suas feridas cicatrizadas, ela foi levada para conhecer aquele novo mundo onde árvores cresciam tão alto, que precisava virar toda a sua cabeça para trás para conseguir enxergar suas copas, que tinham a cor dourada e vermelha do outono. Os lagos tinham água límpida, porém era perigoso se aventurar dentro de alguns deles – diziam que lá viviam sereias que enfeitiçavam meninas humanas para lhes roubar a beleza.

– Pensei que sereias só seduzissem os homens para o mar – murmurara a menina para si mesma.

– Essas são as sereias de água salgada – explicara uma menina elfo, como se isso fosse a coisa mais óbvia do mundo, porque, naquele mundo, o era.

Por dias, aventurara-se com seus novos amigos por terras mágicas, até onde era seguro ir. Por dias, ela conhecera a verdadeira alegria e sentira-se, pela primeira vez, livre. Sentia saudades de seus pais e de suas irmãs, mas sabia que futuro uma menina teria no mundo de cima – casamento arranjado, um filho para herdar as terras de seu marido e muitas meninas para trocar por mais terras e armas.

Ali, ela tinha a possibilidade de ser o que quisesse. Ali, existia magia e ela era parte disso. Além disso, descobrira o quão fácil era se apaixonar e o quão difícil era para aqueles seres sentirem o amor da mesma forma que os humanos o faziam. O amor deles era algo silêncio e gélido, algo calmo e comedido, não incendiava suas veias nem os faziam agir de forma espontânea, tomados pela emoção.

Ela encontrara-se amando sozinha. E não havia nada mais terrível que isso.

Certa noite, contudo, o elfo, aquele mesmo que a salvara, a levara para um passeio próximo a um lago de águas calmas, com peixinhos de cor laranja nadando em suas margens. Ele a segurara pelos ombros e a beijara.

– Você quer saber por que a salvei?

Ela não precisava responder, a resposta brilhava em seus olhos.

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Passaram-se cinco minutos após as vinte e duas horas. Hermione nunca se atrasou, até aquele dia.

Draco a esperava sentado no primeiro degrau da escada, remexendo a varinha nas suas mãos, como se estivesse relaxado e levemente entediado. Não era verdade por dois motivos. O primeiro deles era óbvio: naquela tarde, esperava derrotar o Potter e Casa dele, porém Dolores inserira uma série de novas e pretensiosas regras que anularam as chances daquela partida ser épica, que era como Draco imaginava sua vitória. No final, a partida terminara em empate e ninguém poderia se importar menos.

O segundo deles, contudo, era mais complicado. Draco estava impaciente, porque não gostava de ter que esperar pelos outros. Eram eles que deveriam ter que esperar por sua ilustre presença. Mas não era tão simples. Essa sua inquietação não era nascida de sentimentos narcisistas, ela vinha de um lugar misterioso dentro de si, de uma parte que estava acostumada com a sua rotina noturna e que não sabia o que fazer agora que ela havia sido rompida.

Era inevitável pegar-se imaginando onde a Granger estaria e o que teria acontecido para que se atrasasse. E isso o deixava ainda mais inquieto. Nem ao menos conseguira manter-se no seu quarto, andando de um lado ao outro.

Quando Hermione finalmente apareceu em meios às sombras, ele sentiu-se ainda mais inquieto. Queria perguntar onde ela estivera e com quem, por que o mantivera esperando por tanto tempo, queria gritar com ela, sacudi-la até que seus braços ficassem vermelhos com as marcas das suas mãos. Todavia, também queria... Esse pensamento o assustava, porque não estava certo do que realmente queria.

Ela parecia triste, com os olhos baixos e avermelhados e os lábios pressionados num aperto sem graça.

Ainda sentado, ele a observou se aproximar, sem demonstrar o quanto estava ansioso. Mas as batidas de seu coração o denunciavam, como sempre; elas gritavam em seus ouvidos e faziam suas veias latejarem. Apesar disso, Hermione não perceberia. Ele era excelente em esconder seus verdadeiros pensamentos e sentimentos.

– Você encontrou algo em algum daqueles livros? – perguntou ela, quietamente.

Ela tinha preso os cabelos num rabo de cavalo, mas alguns fios fugiram do aperto e se acumularam ao redor do rosto dela, pequenos cachos delicados. Draco tocara neles em sonhos e fora deles, sabia como o cabelo dela era macio, e era divertido brincar com os cachos dela, seguindo a forma deles e puxando-os suavemente, sem pretensão de desfazê-los.

– Não – murmurou ele, ainda mais baixo que ela.

Pensou que poderia admitir que gostava do cabelo dela, porque, enfim, era apenas cabelo. Mas essa era a parte mais fácil.

– Se você encontrar algo, qualquer coisa, você irá me contar, não é? – a voz dela era uma súplica.

– Sim...

– Malfoy – disse ela, mas esse era um dos casos em que a palavra não soa exatamente o que significa. Ela queria dizer algo a mais, ela queria fazê-lo compreender o quanto precisava proteger sua mente daquelas visões. – Por favor.

Ela o olhou com aqueles olhos avermelhados, e ele descobriu que não poderia negá-la, não poderia fingir que queria machucá-la nem poderia fazer uma piada daquilo. Então, limitou-se a acenar.

– Prometa-me!

– O que você viu, Granger? – perguntou ele, curioso. O que a faria agir daquela forma?

Quando ela não respondeu, ele segurou-a pelo pulso e a fez virar-se, ou teria, se ela não tivesse se arrancado do aperto dele e pulado para longe.

– Não me toque! – gritou ela.

Ele sabia exatamente o que ela tinha visto. Ela só tinha se comportado daquela forma tão instável e assustada uma vez, anos no passado, quando ambos viram uma mentira contida num livro.

Ela o vira tocando seu corpo nu com a boca e com as mãos, sentira-se humilhada e envergonhada e chorara. Por isso, fugiria do toque dele como se este fosse feito de chamas. Ele não fez nenhum comentário sobre isso, porque também viu a mesma coisa, nessa tarde, e isto era, em parte, o que o deixava tão inquieto. Draco perguntou-se se essas visões a faziam se sentir do mesmo jeito que ele.

– Nós precisamos devolver aqueles primeiros livros para a Biblioteca hoje – murmurou ela.

– Onde estão eles?

Ela retirou uma pequena bolsa de seu casaco e disse que eles estavam ali dentro, que ela não ficaria carregando o peso de seis livros pelo castelo.

– Pegue os seus – pediu ela.

E assim ele o fez.

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Hermione estava depositando o último livro na prateleira quando escutou o barulho de passos vindos da entrada. Sabia que estes não pertenciam ao Malfoy, pois este estava na parte de trás da ala proibida, colocando seus livros na prateira correta.

Na ponta dos pés, escondeu-se por trás da estante, tendo o bom senso de apagar a luz da sua varinha.

Primeiro, ela avistou uma luz pálida, em seguida as feições estoicas de Snape. Mentalmente, soltou um dos largos e criativos xingamentos de Rony. Deus passos enormes e suaves para trás, esforçando-se para não fazer barulho, mas o salto da sua bota pressionava o piso de mármore e fazia o menor dos sons, que era suficientemente alto para ser distinguido no silêncio.

Para o que aconteceu em seguida, não houve aviso. Sua boca foi tampada e seu corpo foi puxado para trás e pressionado contra um dos pilares que sustentavam o teto e contra algo um pouco mais macio. Dois olhos azuis a olharam de cima, mandando-a ficar calada. Muito devagar, ela acenou. Draco retirou a mão da boca dela e apontou para os seus sapatos para logo em seguida os retirar dos pés. Hermione fez o mesmo. Proferiram um feitiço que tornaram seus sapatos objetos pequenos o bastante para caber em seus bolsos.

A luz moveu-se de um lado para o outro, como se procurasse uma figura que não era deveria estar ali. Ela se aproximou de onde estavam e, então, direcionou-se para o outro lado. Esse era o momento perfeito para correr, e foi isso o que Draco fez. Ele segurou a mão livre de Hermione e a puxou para o próximo pilar, que estava mais próximo da saída e mais longe de Snape.

Porém, os seus passos não soaram tão delicados quanto esperaram. Eles fizeram um som oco e constante, que atraiu a atenção do professor. Draco e Hermione entreolharam-se e fizeram uma decisão muda. Ao mesmo tempo, correram em direção à saída da Biblioteca, acompanhados dos passos igualmente apresados de uma terceira pessoa. Houve um momento de silêncio, em que um feitiço foi proferido. Nesse instante, Hermione sabia exatamente que feitiço Snape estava usando, pois, se fosse ela, teria feito o mesmo; por isso, abruptadamente, puxou Draco à esquerda. Eles teriam caído, se Draco não tivesse conseguido equilibrar-se usando a estante de suporte e agarrado Hermione pela cintura. Segurá-la foi um movimento tão natural quanto buscar apoio para o seu próprio corpo.

Todas as luzes da Biblioteca foram acessas. Ela estava tão clara como se fosse dia.

Eles respiravam forte, mas quando voltaram a escutar o som de passos, prenderam a respiração e moveram-se, com cuidado e suavidade, na direção oposta.

– Mostre-se agora – brandiu Snape.

O aperto de Hermione no braço de Draco se intensificou, mas, se isso o incomodava, ele não falaria. Não numa situação como essa.

Eles conseguiram atingir a extremidade da estante e tiveram tempo apenas de se moverem para de trás dela, antes que a figura de Snape aparecesse do outro lado. Hermione puxou o loiro na direção da próxima estante. O percurso foi feito com mais rapidez do que o anterior, pois eles poderiam sentir a aproximação de Snape.

Eles continuaram movendo-se para trás, até se sentirem um pouco mais seguros, então, começaram um movimento para o outro lado da Biblioteca, este que possuía uma passagem secreta conhecida por Hermione.

Subitamente, as luzes apagaram-se. Eles ficaram imóveis, respirando com dificuldade. Hermione foi a primeira a se mover, puxando Draco para frente. Na escuridão, não poderia ver com clareza para onde estava indo, mas preferia confiar na sua intuição, ao invés de no brilho da sua varinha.

Eles moviam-se mais devagar, tocando na borda dos livros para não caminharem numa direção diferente da pretendida. Quando saíram de trás de uma prateleira, observaram rapidamente o lugar à sua volta, procurando a luz pálida de uma varinha. Encontraram nada. Mas também não escutavam o som de passos. E isso só os deixava mais nervosos.

Continuaram a serpentear no escuro, fazendo prezes para que acabassem no lugar certo. Hermione finalmente conseguiu tocar em pedra sólida, porém não poderia afirmar se aquele era o lugar correto ou não. Precisava de luz, só por um momento. Retirou a varinha do seu bolso e puxou Draco para um lado, para que o seu corpo barrasse a visão de parte da luz. Com muita sorte, conseguiriam sair dessa enrascada sem serem expulsos da escola.

A sua varinha brilhou fracamente, fazendo luz o bastante para que conseguisse ver o que havia à sua frente. Hermione moveu-se, sendo seguida de perto por Draco, até encontrar o ponto exato onde sabia existir uma passagem secreta. Apagou a luz e tocou um ponto com a sua varinha, murmurando o feitiço para abrir. A pedra moveu-se sem fazer som. Eles deslizaram para dentro e desapareceram na escuridão. Não tinham dado cinco passos completos quando a passagem foi aberta. Não houve tempo para calcular os próximos movimentos, correram com o resto de força que tinham para as profundezas do corredor. O espaço tornava-se mais estreito à medida que prosseguiam, de forma que seus ombros e braços chocavam-se contra as imperfeições da rocha e eram machucados. Mas não havia tempo para se preocupar com isso agora. Havia uma luz vibrante seguindo-os e uma voz autoritária aproximando-se.

Desembocaram num espaço amplo e úmido. Havia três caminhos diferentes. Eles sequer pensaram, seguiram o buraco à direita. Escutaram Snape gritando o feitiço de paralisação e viram o feixe de luz se aproximando. Draco ergueu a varinha e sussurrou o contrafeitiço que seu pai lhe ensinara. Os feitiços se chocaram e uma grande explosão de luz iluminou todo o espaço. Eles não esperaram para que Snape os encontrassem e os avistassem, continuaram seu caminho sem parar para recuperarem o fôlego.

No final do corredor havia uma escada íngreme que subia dando voltas e mais voltas. Não havia alternativa a não ser continuar em frente. Deram tantas voltas, até se sentirem tontos. Mesmo quando já estavam enjoados e nervosos pela crescente escuridão, continuaram andando para cima. No final da escada, encontraram uma porta pesada de madeira, que não se moveu quando Hermione e Draco a empurraram. Suspirando, Hermione usou a varinha para abri-la. Por que não pensara nisso antes?

Nervosos, observaram a porta se afastar, dando espaço para que adentrassem a uma pequena torre. Hermione fechou a porta atrás de si e procurou uma rota de escape. Não havia nenhuma, exceto as muitas janelas abertas na rocha.

– Nós deveríamos pular – sugeriu Draco, apontando para o telhado abaixo. – Não é uma queda muito longa.

Ela o olhou como se ele estivesse completamente louco, porque esta era bem a verdade.

– Você tem uma ideia melhor? – argumentou ele.

Ela não tinha.

– Talvez ele não tenha nos seguido até aqui – disse ela, enquanto tentava recuperar o fôlego. – Acho que ele não tem estrutura física para isso. Além disso, eu não escutei passos atrás de nós.

– Francamente, Granger, no seu estado, acho que não é capaz de detectar mesmo um camundongo comendo a sola do seu sapato – disse ele, sorrindo de lado. Sua respiração também estava instável, havia gotículas de suor em seu rosto e manchas na sua blusa branca. O seu ombro doía muito, ma ele não iria reclamar sobre isso.

Ele olhou para fora da janela, buscando outra rota de escape.

– Nós poderíamos seguir esse caminho...

– Eu não vou para lugar algum, Malfoy! – cortou-o Hermione, pisando firme no chão para marcar o seu ponto.

Ele retornou o olhar para ela, encarando-a como se ela fosse uma coisa minúscula, mas muito engraçada.

– Você tem medo de altura!

– É completamente razoável – falou ela, dando-lhe as costas e certificando-se que a porta estava bem fechada, aplicando alguns feitiços de proteção só para ter certeza. – Pessoas podem cair, de repente, e morrer, porque elas estão a metros do chão!

Ele riu fraco, visto que seus pulmões ainda tentavam estabilizar o ritmo da respiração.

– Eu posso conjurar a minha vassoura. É mais seguro. – Draco não a esperou responder, pois bem sabia o que ela teria a dizer sobre aquilo, e chamou a sua vassoura com um movimento da varinha.

– Se você realmente acredita que eu confiarei a minha vida em você... – Ela calou-se, subitamente.

A porta foi pressionada com força, como se algo ou alguém tivesse jogado o seu peso contra ela. Draco e Hermione xingaram ao mesmo tempo.

Hermione ergueu a varinha e fez o melhor para impedir que os feitiços de Snape tivessem algum efeito, mas a porta cederia em breve, se ela não se desfizesse em pedacinhos antes.

Draco segurou a sua vassoura, que finalmente havia aparecido, subiu no parapeito da janela e equilibrou-se sobre ela.

– Não seja cabeça dura – falou ele, impaciente.

Suspirando exasperada, ela fez a única coisa que poderia – subiu no parapeito da janela e segurou a mão que Draco a oferecia. Ela estava convicta que aquele tipo de vassoura não fora feita para sustentar o peso de duas pessoas. Apesar de ela ser mágica, ainda existiam coisas como física e gravidade.

Dizer que ela se segurou forte em Draco seria eufemismo, porque, na verdade, ela agarrou-se a ele com suas unhas e com suas pernas, encolhendo-se na curvatura das costas dele, de olhos fechados e com o grito entalado na garganta.

A viagem não foi nenhum pouco agradável e dizer que ela foi curta seria ignorar o desespero crescente dentro de Hermione. Quando eles finalmente chegaram ao quarto de Draco – como eles o fizeram, ela jamais saberia, visto que não se preocupara em observar o trajeto –, ele teve que a arrancar de seu corpo. Hermione ficou grata em tocar o solo, mas ela ainda não estava recuperada. Sentou-se no sofá, encolhida numa bola, ainda de olhos fechados, inspirando e expirando muito devagar.

Draco, como sempre, olhou em volta, incerto sobre o que deveria fazer com ela.

– Não vomite nas minhas coisas – falou ele, de forma autoritária.

Hermione passou os próximos dez minutos quieta, naquela mesma posição, com Draco observando-a de perto, como se esperasse que a qualquer minuto ela fizesse algo estúpido.

Sentindo-se melhor, sentou-se no sofá. Ao se lembrar do que acontecera sobre ele, poucos dias no passado, ergueu-se rapidamente.

– Eu não acho que seja uma boa ideia perambular por Hogwarts nesta noite – disse Draco, com o seu usual tom de voz desinteressado. – Snape irá vasculhar cada centímetro do castelo até encontrar alguém fora da cama.

Ele não precisa dizer o óbvio, mas gostava de vê-la empalidecer com aquela ideia.

– Por que você está tão assustada, Granger?

– Nada – murmurou ela. Mas era mentira. A sua mente gritava – Rony, Harry!

Os seus amigos ainda deveriam estar treinando com os demais integrantes da Ordem, sem ter como saber da ira que deveria estar possuindo Snape no exato momento em que ele encontrou aquela torre vazia. Apenas esperava que eles fossem cuidadosos. Mas, isso seria pedir demais. Harry era a pessoa mais imprevisível que já tivera o desprazer de conhecer, exceto pelo Malfoy.

Ela sentou-se no sofá, novamente, tentando ignorar as ondas de náusea. Agora, que estava um pouco mais calma, podia finalmente sentir a dor das feridas nos seus pés, nos seus braços e ombros. Desejou que tivesse trazido consigo alguma pomada de cura.

Para distrair-se, retirou um livro de dentro da sua pequena bolsa. Quando Draco viu o nome dourado na sua capa, bufou.

– Há boas histórias nele – disse Hermione, dando de ombros.

– Você não deveria estar andando por aí com ele, como se ele fosse um inocente livro sobre histórias bobas para criança dormir. Ele é um desses artefatos malignos que precisam ser destruídos depois que seus segredos forem revelados.

– Isso não muda o fato de que eu posso me divertir com ele enquanto não descubro uma forma de fazê-lo se manifestar novamente.

Draco revirou os olhos. Todavia, estava curioso para saber que conto ela leria. Ele próprio já havia lido aquele livro várias vezes e chegado a decorar os seus contos preferidos, apesar de que jamais admitiria isso.

– O que você está lendo? – perguntou ele, baixo, esperando que ela não escutasse ou que o ignorasse. Ambos teriam o mesmo efeito.

Hermione explicou a história para ele. Era sobre uma menina que havia sido salva por um elfo e levada para viver em seu mundo debaixo da terra.

– Ah! Você não irá gostar desse – murmurou ele.

Ele ergueu-se, retirou uma toalha do guarda-roupa e entrou no banheiro, onde pretendia passar os próximos minutos deitado na sua grande banheira.

Hermione estava contente por ter sido deixada sozinha para ler em silêncio.

.

– Você quer saber por que lhe salvei a vida?

Ela não precisava responder, a resposta brilhava em seus olhos.

– Eu lhe salvei, porque queria desposar uma humana. As mulheres de meu povo são frívolas e esnobes, o nosso amor é algo sereno. Mas ouvi as histórias de amor da sua espécie, de cavaleiros que vão a guerras pela esperança de, um dia, tocar uma bela jovem para quem canta os seus mais puros sentimos. O amor dos humanos é um grito, enquanto o nosso é apenas o mais breve dos sussurros. Para alguém que viverá para sempre, eu gostaria de experimentá-lo uma vez ao menos, gostaria de sentir o seu calor e a sua vibração, a sua dor e a sua alegria.

– Você quer que eu seja a sua esposa? – perguntara ela, surpresa. Seu coração gritava “sim, sim, sim”, mas sua razão a mandava ser cautelosa.

– Se assim você também desejar.

Ela era jovem e sentia tudo muito forte, e ela também o desejava.

Casamento naquele mundo debaixo da terra era algo esquisito, no mínimo. Não havia igrejas nem padres para realizar a cerimônia. No primeiro dia de primavera, ela caminhara pela relva num simples vestido bordado e tivera suas mãos enlaçadas com a do seu amado. Não houvera juras de amor eterno, pois, para ela, não haveria eternidade; o que acontecera foram trocas rápidas de palavras numa língua que ela mal compreendia, algo sobre como a folhagem despenca no outono para se renovar, todos os anos, na primeira.

Nos primeiros meses, ela fora feliz, da mesma forma que uma criança fica contente ao ganhar o presente que pediu para o Natal. Ao final do primeiro ano, a felicidade diminuiu, mas não se esvaeceu. Para ela, na sua condição de humana, era difícil compreender o amor de um elfo, uma criatura de emoções moderadas e sorrisos escassos. Ele era um ser moldado para a eternidade, um bloco cru de gelo que resistiria mesmo ao mais intenso verão na sua alma. E ela, no entanto, era uma criatura feita para sentir o sol na sua pele todas as manhãs.

O amor dela também era sólido e constante, e era isso o que mais doía. Mesmo com toda a indiferença nos gestos dele, ela não conseguira deixar de amá-lo. Ele era uma noite longa de inverno, e ela sempre se curvava mais para dormir nos braços da sua frieza. E isso a matava lentamente. Primeiro, a sua pele tornara-se pálida e os seus fios de cabelo, quebradiços. Depois, foram os seus sorrisos fracos e as suas constantes tosses. Então, viera a febre no corpo e na alma, acompanhada de dolorosos delírios. As tentativas de curá-la foram em vão, pois sua doença tinha uma causa que não poderia ser remediada nem mesmo por magia. Era seu coração que estava perecendo por amor.

Um dia, ela finalmente morrera.

Morte num mundo onde mesmo as flores foram feitas para viverem para sempre é um acontecimento bizarro. Aquelas criaturas não estavam acostumadas a tal feitio e, por isso, não sabiam como agir. Tudo o que poderiam fazer era observar a carcaça da jovem com olhos surpreendentemente melancólicos. Eles, que nunca temeriam a morte, podiam vê-la agora, e isso os fizera compreender a dimensão de seus poderes e quão delicados e belos eram os humanos, com suas vidas que duravam apenas minutos.

Eles não a enterraram, mas a confinaram num caixão de cristal, onde poderiam sempre observar a morte contida no corpo dela, e, apenas por um momento, sentirem-se incapazes e trêmulos ante tal imagem.

Quanto ao elfo que fora o esposo dela, pouco se sabe o que aconteceu com ele após a morte da humana. Alguns dizem que ele fora se aventurar em outras terras, outros acreditam que ele, toda primavera, sobe à terra, à procura de uma nova esposa para destruir. Há ainda os que defendem que ele ficara tão triste pela perda dela, que chorara um dia inteiro, até se transformar num pássaro, que sempre canta, tristemente, sobre o caixão dela.

Embora ele nunca tenha conseguido demonstrar, ele a amara completamente não do jeito que ela precisava ser amada, mas do jeito que ele queria. E foi isto que a matou de tristeza.

.

Draco saiu do banheiro enxugando os cabelos. Ele não vestia blusa nem calçados, apenas a calça cinza do pijama e uma expressão de puro tédio, que foi rapidamente alterada para desconfortável surpresa.

Ao sair do banheiro, encontrou Hermione fitando o livro em seu colo e chorando quietamente. Na verdade, parecia que ela se esforçava para se manter quieta, pela forma como seus ombros tremiam e como sua boca se apertava para conter soluços altos. Ele pensou que aquele era um ótimo momento para deixar passar sem um comentário maldoso, porém algo dentro dele não se sentia no humor correto para ser um bastardo arrogante. Era um aperto nas estranhas e um peso incomum no peito. Ela não deveria estar chorando. Ele odiava quando meninas choravam, pois era sempre por um motivo fútil e era sempre de uma forma escandalosa; o fato de Hermione não se encaixar nesse padrão o perturbava ainda mais.

– Eu disse que você não gostaria desse conto – falou ele, enrolando a toalha com as mãos.

Ela levantou os olhos para encará-lo, mas ele desviou os seus. Não achou que melhoraria o aperto no seu peito se visse as lágrimas brilhando nos olhos dela.

– O que você tem contra blusas? – falou ela, mas, com a sua voz fraca e em meio aos soluços que lhe escaparam, a frase ficou completamente incompreensível aos ouvidos de Draco.

De qualquer forma, ele deu de ombros e jogou-se na sua cama, puxou os cobertores para cima e apagou as luzes.

Não foi uma surpresa quando, no canto do sofá, uma fraca luz azul cintilou. Ela não iria dormir tão cedo, imaginou. Nem ele. Ao menos, não com a presença dela tão próxima de si.

Ele suspirou, infeliz, porque aquela seria outra noite longa demais.

.

Horas deveriam ter se passado, quando Hermione virou-se e perguntou, baixo, mas não baixo o bastante para que ele não fosse capaz de ouvir.

– Há algum conto feliz nesse livro?

Draco cogitou se tinha disposição para responder ou não. Mas ambos sabiam que nenhum dos dois conseguiria dormir, não depois do que acontecera. Esquecendo-se de que deveria fingir estar dormindo e não se importar com as besteiras escritas naquele livro para crianças e meninas crescidas que ainda acreditavam em contos de fadas, ele respondeu que sim, havia um ou outro, se você procurasse bem.

– Diga-me o nome de um – pediu ela, com a voz ainda embargada por lágrimas.

Ele tentou se lembrar de algum, mas era difícil. Todas as suas histórias favoritas tinham um final infeliz. Porém, havia uma, sim, uma divertida e engraçada com uma valente dama que domara uma fera.

– Dê-me o livro, irei lhe mostrar – disse ele.

Ela pareceu relutante ao se aproximar da cama dele, mas o fez mesmo assim e entregou-lhe o livro. Ele passou páginas e mais páginas, até encontrar o que queria, então ofereceu o livro para Hermione.

– Leia! – falou ele, com um tom estranhamente animado.

– Em voz alta? – perguntou ela, confusa.

– Granger, às vezes, você realmente me desaponta.

Ele sorriu de lado. Mas Hermione não conseguia parar de olhar para ele com certo receio, como se ele estivesse aprontando alguma brincadeira de mau gosto.

Sem esperar ser convidada, ela subiu na cama e sentou-se de frente a ele, escorando-se num dos mastros de madeira, e começou a ler, equilibrando a varinha na sua mão esquerda.

Não demorou muito até que sua voz fosse reanimada com incontroláveis risadas. No outro canto, Draco estava sentado, observando-a com um meio sorriso que se alargava até se tornar um sorriso completo. Ele não ria como ela, mas seus olhos brilhavam com diversão.

Ele nunca antes a escutara rir daquela forma, tão leve e espontânea. De alguma forma, ele sempre soubera que a risada dela seria uma explosão de felicidade, forte o bastante para abalar a prisão torácica de seu coração. Ele se sentia peculiarmente morno. E inquieto.

Ela leu e leu, até o conto se encerrar com um “Viveram felizes para sempre”. Ele observou a curva dos lábios dela, enquanto eles formavam as últimas palavras. Por um momento, Hermione permaneceu calada, ainda sorrindo, olhando para a gravura na página, onde uma princesa e um príncipe sorriam de mãos dadas.

– Essa foi divertida – falou ela.

Draco sorriu abertamente, estranhamente satisfeito consigo mesmo.

– Eu disse – falou ele, cheio de pompa.

Hermione ergueu os olhos para encará-lo com o que ele esperava ser desprezo ou ironia. Contudo, havia uma profunda tristeza nos olhos dela, algo que ele não imaginava existir em alguém tão jovem, em alguém que ainda não fora à guerra. Ele deveria saber melhor, nos pesadelos dela, ela vira coisas terríveis.

– Pergunte logo, Granger – falou ele.

Ele poderia ler na expressão dela o quanto ela tentava se conter para não deixar suas emoções transparecerem, mas ele havia se tornado um especialista em desvendá-la.

Ela mordeu o lábio inferior e suspirou alto. Então, preparou-se para a inevitável discussão.

– Você acha que... Vamos supor que, se você não fosse um idiota presunçoso...

– E se você não fosse uma sabe-tudo irritante – completou ele, apenas pela diversão de ver os lábios dela se contraindo numa expressão de raiva.

– Se não houvesse nomes entre nós... Se não existisse nada além de você e eu – falou ela, ignorando-o –, você acha que nós poderíamos... Funcionar?

– Que tipo de pergunta é essa, Granger? – perguntou ele, afiado.

– Apenas responda!

– Por que você se importa?

Ele cruzou os olhos, revirando os olhos para aquele absurdo. Eles jamais poderiam funcionar, porque ele seria, sempre, o filho do seu pai e ela seria, sempre, a melhor amiga do Potter.

– É só uma hipótese – respondeu ela, dando de ombros. Ela olhou de volta para o livro, para a ilustração colorida numa das páginas.

– Isso é tão impossível de acontecer, que, no momento em que você levantou a questão, já foi responsável por invalidá-la, porque eu sou Draco Malfoy e você é uma sangue-ruim. Haverá sempre nomes entre você e eu, haverá sempre o glorioso legado da minha família e os tolos ideais dos seus amigos.

– E há a guerra – falou ela num tom que o desafiava a negá-la. – Você sabe que ele está lá fora, recrutando novos seguidores. Provavelmente, sua família deve ter oferecido um enorme banquete para comemorar a sua volta. Deve até mesmo tê-lo acolhido debaixo do seu teto, oferecido o quarto mais luxuoso da casa e todas as mordomias que alguém tão importante quanto ele merece.

Os olhos dela estavam tão frívolos, que parecia ser incrível que eles ainda não tivessem o congelado. Draco teve o bom senso de não se mostrar abalado.

– Provavelmente, você está certa – disse ele, sem esboçar reação.

Ela não era tão boa em matéria de controle de sentimentos. Por isso, arremessou o livro na direção da cara do loiro, que, por sorte, conseguira se desviar a tempo.

– Como você pode dizer isso, como se significasse nada?! – gritou ela, batendo no peito dele.

Ele segurou-a pelos pulsos e conseguiu arrancar a varinha da mão dela, chutando-a para fora da cama. Até Merlin teria medo do que ela seria capaz de fazer com a posse de sua varinha, enquanto mantinha aquele olhar enraivecido!

– Ele matou os pais de Harry, ele é razão por Neville ter crescido com a sombra da loucura dos pais a atormentá-lo! Ele quer destruir tudo o que há de bom! E o que você faz? Você o serve como se fosse um cachorro ansiando por satisfazer o seu dono!

Ele suspirou, infeliz, imaginando quando as conversas entre eles não terminariam com Hermione tentando arrancar-lhe o pescoço.

– Eu não sou um dos cachorros dele – falou Draco, com o seu orgulho ferido.

Hermione riu alto, de forma sarcástica.

– Eu mal posso imaginar o quanto você abana o seu rabo toda vez que ele se aproxima, e levanta a cabeça esperando que ele faça carinho – disse ela, ainda cheia de sarcasmo. Ele apertou os seus pulsos com mais força, mas ela não pareceu sentir. – Você deve estar tão ansioso para receber a marca dele, para mostrar a todos os seus amiguinhos o quanto você é malvado – dessa vez, havia um toque de malícia na voz dela, algo que ele nunca antes a escutara usar. – E para fazer o seu papai ficar, finalmente, orgulhoso dessa escória que ele tem para mostrar como filho. Imagino o quão envergonhado ele deve ficar toda vez que precisa admitir que isso foi o melhor que ele pode arranjar para usar o seu sobrenome.

Draco a empurrou contra a cama e ficou sobre o seu corpo. Ela tentou lutar para se desvencilhar do peso dele, mas ele prendeu suas pernas entre as suas e pressionou o corpo dela para que permanecesse quieta. Ele a encarou com seus olhos azuis que faiscavam ira. Ele queria fazê-la engolir suas palavras, machucá-la até ela implorar por seu perdão. Ele queria azará-la, torturá-la, fazê-la se sentir tão mal e humilhado quanto ele.

– Você deveria nos fazer um favor e se trancar em Askaban antes que machuque alguém – disse ela, lutando para soltar as suas mãos do aperto de aço dele. – Saía de cima de mim!

– Você sabe nada sobre mim, sua sangue-ruim! – ele disse como se pudesse cuspir as palavras nos olhos dela.

– Por que não me tortura? – falou ela, gargalhando de forma maldosa logo em seguida. O som feriu os ouvidos dele. – Não é essa uma das especialidades dos Comensais da Morte? Eles acham que você ainda é muito novinho para aprender essas coisas? Ou, talvez, você não tenha a coragem necessária para fazê-lo. Realmente, é melhor deixar essa tarefa para os homens!

Ele respirava pesadamente, esforçando-se para contralar a vontade de fazê-la gritar.

– Cale a boca! – pediu ele na forma de um uivo desesperado.

Ela riu mais uma vez, daquela forma horrenda e raivosa.

Ele inspirou fundo e prendeu a respiração. Fechou os olhos e abaixou a cabeça, encostando o nariz na curva do pescoço dela. Subitamente, ela ficou muito quieta, e ele agradeceu por isso.

Draco expirou, lentamente, e sentiu o arrepio na pele dela onde suas roupas não cobriam. Se ele conseguisse mantê-la calada o suficiente para recuperar a razão, conseguiria evitar o pior de si. Só precisava inspirar e expirar, devagar, dando tempo para que as batidas do seu coração se tornassem estáveis novamente e para que a pressão na sua cabeça diminuísse.

– Eu quero machucá-la – sussurrou ele contra a pele. Ele beijou o pescoço dela e o mordeu, sentindo-a tremer debaixo de si. Repetiu-os três vezes mais, até arrancar um baixo gemido dela. Apoiando os cotovelos na cama, ele conseguiu inclinar-se o suficiente para encará-la sem diminuir a pressão sobre ela.

A loucura nos olhos dela era o reflexo da sua própria.

Ele abaixou-se para tomar os lábios dela nos seus, porém parou a poucos centímetros ao escutá-la.

– Pensei que você jamais corromperia o seu sangue com o meu.

Hermione esperava que as suas palavras fossem como um tapa na cara de Draco. Apesar da fraca luz da lua que entrava pela janela, ela conseguiu ver o sorriso malicioso dele.

– Isto não é sobre sangue – disse ele –, isto é sobre carne.

Ele a beijou com força, prendendo os seus pulsos acima da sua cabeça, fazendo-a arquejar as costas na direção dele.

– Você não pode me beijar – Hermione conseguiu se afastar o suficiente para dizer, debaixo da respiração pesada de ambos. No minuto seguinte, a boca dela estava pressionada contra a dele.

Não havia o menor traço de delicadeza no jeito que a língua dele acariciava a dela. Era um beijo, mas facilmente poderia ser uma briga de socos. E a forma como ele a beijava dizia que poderia fazer o que quisesse com ela.

O jeito como ela o beijava era um grito que repetia de novo, de novo e de novo – Você me deseja! Aquela sentença o assombrava, por isso cada beijo era uma tentativa de silenciá-la. Ela não poderia ganhar, também, aquela batalha. Mas não havia nenhum vencedor. Ela não fora capaz de recusá-lo, e ele não fora capaz de impedir-se.

Subitamente, Draco empurrou-se para o lado, afundando na cama, com os olhos fechados e a respiração irregular vazando pela boca.

Hermione não estava melhor do que ele, e, entre todos os seus confusos sentimentos, um se sobressaía – a vergonha. Ela deveria ter lutado com mais força contra ele, ter mordido a sua língua, feito qualquer coisa que não fosse aceitar o seu beijo e devolvê-lo com a mesma voracidade.

O pensamento de que ele a desejava o bastante para ignorar seus próprios ideais a fazia sentir coisas estranhas, e vergonha não era uma delas. Ao tomar conhecimento disso, o que lhe restava fazer era encurvar-se e chorar. Ela não queria chorar na frente dele, não depois do que acontecera, mas não suportava a agonia da realização de seu próprio desejo e de seu próprio veneno. Ela disse coisas terríveis a ele. E ele aguentara sem dizer uma única palavra, sem nenhuma vez levantar a mão contra ela.

Draco abriu os olhos, observando a forma pequena dela na escuridão. Ela estava chorando novamente, e, dessa vez, a culpa era sua. Ele sentia o corpo pesado, sobretudo o peito, e descobriu, tarde demais, que preferia as risadas delas às suas lágrimas. Ele ficou calado, inerte, escutando-a chorar, as mãos pressionadas em forma de punhos na lateral do corpo, a respiração irregular, o peito batendo de uma forma dolorosa. Até quando ela choraria?

Felizmente, o choro dela foi diminuindo, até se tornar pequenos fungados e espaçados soluços. Ainda de costas para ele, Hermione murmurou:

– Desculpe-me... – Quando ele não disse nada, ela completou. – Eu não deveria ter falado da sua família desse jeito. Não foi certo nem justo.

– Você não está completamente errada – foi a resposta que ele tinha para dar.

Hermione fungou mais uma vez e enxugou as últimas lágrimas, fazendo o melhor para se recompor.

Ele realmente está lá? – perguntou ela, baixo. – Na sua casa...

Draco hesitou por um momento, então soltou o ar.

– Mesmo se eu soubesse, não diria a você, pois o Potter ficaria sabendo e tentaria fazer algo sobre isso. E eu jamais trairia a minha família.

O que ele não disse, mas ficou implicado no seu tom de voz foi – Nem mesmo por você.

– Como você não tem certeza se ele realmente está usando os recursos da sua família? – Ela não conseguiu evitar a pergunta.

Novamente, Draco hesitou. Dessa vez, o silêncio perdurou por tanto tempo, que ela estava certa de que ele não mais responderia.

Ela virou-se para encará-lo, mas encontrou apenas um garoto infeliz na cama.

– Eu não sei, Granger – respondeu ele. – Meu pai não me confiaria essa informação. Ele nunca está satisfeito comigo, não importa o quanto eu tente me mostrar merecedor do seu orgulho. Eu até engulo a loucura de Dolores, com a inútil esperança de que, dessa vez, será o bastante.

– Você não precisa fazer essas coisas – sussurrou ela, suavemente, com medo de assustá-lo ou de despertar a ira dele.

Draco não retrucou, o que não era compatível com a sua personalidade. Ele encarou o teto, mas Hermione não precisava olhar dentro dos seus olhos para descobrir a natureza de sua dor, ela podia lê-la em seus traços tensos e duros. Ela podia ver que ele estava se debatendo para controlar a vontade de falar algo, talvez, para explicar a delicadeza dos laços que mantinha com a sua família, a necessidade que tinha de se provar ao seu pai e de agradá-lo.

– Você não deveria querer ser igual ao seu pai. Você poderia ser uma pessoa diferente – falou ela, com o mesmo tom de antes.

Dessa vez, Draco direcionou o olhar para ela. Porém, ele não denunciava nada, nem um traço de raiva, de desprezo ou de escárnio. O olhar dele estava vazio de significado, assim como toda a sua expressão. Isso fez Hermione sentir-se muito fria e tremer. Ao perceber que ele jamais continuaria aquela conversa, ela ergueu-se para sair da cama e ir deitar-se comprimida no sofá, para mais uma madrugara em que não conseguiria dormi.

– Durma aqui – murmurou Draco, tão baixo, que Hermione tinha certeza que havia escutado errado.

Ela ficou inerte, o pé a centímetros do chão.

– Eu não acho que esta seja uma boa ideia – falou ela, tão baixo quanto ele. A única coisa em que ela conseguia pensar era no que acabara de acontecer, a língua dele guerreando com a sua, o peito dele pressionado ao seu. Engoliu em seco.

– É mais confortável que dormir num sofá – disse ele, dando de ombros. Mais estranho do que o que ele sugeria, era a forma como o fazia, mexendo os lábios o mínimo possível, olhando para um ponto fixo no teto. – E não é tão frio. Mesmo com a lareira acessa, o vento frio da janela deve ser desagradável.

– Se me desse um lençol...

Ele não respondeu.

Hermione considerou a sugestão, não era uma das mais agradáveis, porém, sem dúvida, era a mais confortável. O colchão era macio e as cobertas mornas. Talvez, ela até conseguisse esquecer todos os seus problemas e dormir.

– Se você tocar em mim, arrancarei cada um dos seus dedos da forma mais dolorosa que conseguir pensar – advertiu ela, voltando a se deitar na cama, o mais distante possível dele.

Draco ajeitou-se na cama e cobriu-se com o lençol e o cobertor. Sentiu quando ela os puxou para mais perto de si, e não conseguiu resistir à vontade de puxá-los de volta, mais forte. Contrariando as suas expectativas, ela não repetiu a puxada. Ele bufou, fechou os olhos e tentou relaxar, mas com ela tão próxima de si... Todo o seu corpo ainda se sentia vivo por causa do beijo e, por isso, ele estava bem consciente de cada movimento que ela fazia, mesmo que estivesse distante de si. O calor do corpo vibrava no espaço, e ele descobriu que não conseguiria ficar debaixo do cobertor por mais tempo.

Pouco tempo depois, Hermione revirou-se, inquietamente, de um lado para o outro. Até que, por fim, bufou e o encarou com aqueles seus dois olhos castanhos brilhando no escuro.

– Você também sente que essas visões estão nos mudando? – perguntou ela. Contudo, não esperou pela resposta dele. – Ultimamente, eu sempre estou com raiva. Estou me tornando uma pessoa tão maldosa... Várias vezes, tratei Harry e Rony de forma rude, porque eu precisava liberar toda a tensão que sentia, ou, talvez, porque eu não saiba mais me comportar de outra maneira. E isso me assusta... As coisas que lhe falei... Eu sinto muito!

– Eu me sinto diferente também...

Isso seria o máximo que ele falaria, e ela sabia disso.

– Eu preciso descobrir qual o feitiço que irá proteger a minha mente desses ataques – falou ela. Na sua voz, havia um tom latente de desespero.

– Nós iremos encontrá-lo!

A firmeza no tom de voz dele tranquilizou-a o suficiente para que cedesse ao cansaço.

Ele, no entanto, não conseguiu dormir pela próxima hora.

Pelo canto do olho, ele a observou, pensando quão tola era ela por se permitir dormir tão perto de uma víbora, ao alcance de seu veneno, onde ele poderia destruí-la. Ele jamais cometeria esse erro, jamais cederia perto do inimigo. Era estúpida ignorância.

Porém, havia outra parte dele que relaxou. Sentia-se satisfeito que ela se sentisse segura o bastante para dormir, pacificamente, próximo a ele. Foi esta parte de si a responsável por fazê-lo deitar debaixo das cobertas e se virar na direção do calor dela.


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Notas finais do capítulo

Infos:
1 - Recebi alguns comentários de pessoas me perguntando se teria mesmo um romance entre a Mione e o Draco, e o que eu tenho a dizer sobre isso é: Eu não faria uma capa linda com eles dois se não planejasse escrever um romance tão lindo quanto sobre eles.
2 - Provavelmente, próxima semana não haverá nova postagem. Não me joguem pedras, por favor.
3 - Estou pensando em lançar uma cena de uma capítulo bem mais à frente. O que vocês acham?