Desejo e Reparação escrita por Ella Sussuarana


Capítulo 35
IV - Capítulo 33: Memória de sonho


Notas iniciais do capítulo

Oi, queria dizer que estou morrendo de tanta felicidade (e orgulho) por esta história ter recebido uma indicação. As lágrimas são de alegria, juro :D
Como estou muito, muito feliz, postarei dois capítulos :D



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Parte IV

{Sobre a loucura, o amor e a guerra}

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Capítulo 33: Memória de sonho

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Na tarde anterior, Dolores proibira a comercialização de artefatos produzidos pelos gêmeos Weasleys. Naquela manhã, havia rumores de que ela proibiria risadas, alegando que estas geravam estado caótico e indisciplinar nos corredores e nas salas de aula.

Era sexta-feira, enfim. O sol ainda se levantava, preguiçoso, envolto em seus lençóis feitos de algodão. O clima estava esfriando, as folhas douradas das árvores já se atiravam ao chão – era o prenúncio da chegada do inverno. Ele viria, cedo.

Hermione abraçou-se com força, enquanto caminhava em direção ao Grande Salão para comer o café da manhã. Não poderia encarar o sarcasmo odioso do Malfoy de estômago vazio.

Quando entrou no Salão, havia poucos alunos dispersos pelas mesas, a maioria parecendo ainda sonolenta demais para começar, apropriadamente, mais um longo dia de aulas e de tarefas. Ela sentou-se na ponta da mesa da Grifinória e, sem vontade, obrigou-se a comer os pedaços de pão que arrancava com as mãos, levando mais tempo que o necessário para mastigá-lo e engoli-lo. Precisava de tempo para se preparar para o quer que o Malfoy esteja planejando. O que ele faria? Mandá-la-ia marcar a sua mão até o sangue gotejar no carpete, como Dolores? Ou assumiria a sua condição maligna e usaria uma das Maldições nela?

Engoliu metade do suco num único gole, depositou o copo na mesa e ergueu, passando a mão sobre os lábios para limpar as gotículas de suco neles.

Dois dias atrás, descobrira que, junto com a posição de Prefeito, o Malfoy ganhou um novo quarto, amplo e privativo, que ficava no topo de uma das torres da Ala Oeste do castelo, não muito longe da sede da Casa da Grifinória. Era para lá que se dirigia, andando determinada com o nariz erguido e os olhos sem emoção visível. Quem a visse, jamais deduziria que, por baixo da epiderme, havia uma tempestade de relâmpagos incendiando os seus membros. Ela precisava de ação, fazer algo, qualquer coisa, para parar a Dolores e o Malfoy de conquistarem Hogwarts. Todavia, deveria se conter. Ainda não era o momento certo.

A subida aos aposentos do Malfoy era longa, o que a fez pensar que era mais do que bem feito para ele ter que subir todos aqueles degraus após um dia cansativo de aulas, quando tudo em que podia pensar sobre era em um rápido banho e uma boa noite de sono sem sonhos. Ela quase poderia rir. Na verdade, foi exatamente isto o que fez – virou a cabeça para trás e degustou a gargalhada.

Talvez, os constantes pesadelos a estivessem, de fato, enlouquecendo.

Ela bateu na porta do quarto dele e esperou pela resposta. Se ele ainda estivesse dormindo e a feito subir centenas de degraus para nada, ela seria obrigada a invadir o quarto e fazê-lo falar de qualquer jeito!

Não estava com bom humor o suficiente para ser compreensível.

Bateu mais três vezes com o punho na porta.

– Eu não sou surdo, Granger! – gritou Draco, de dentro do quarto. – Você poderia esperar um momento?

– NÃO! Eu não tenho tempo para esperar por sua realeza suprema, Malfoy!

Ela escutou o som abafado de uma risada e, segundos depois, a porta pesada sendo puxada.

Há momentos na vida que deveriam ser precedidos de avisos, uma placa brilhante com letras redondas, enormes e vermelhas gritando “Cuidado ao adentrar por esta porta!”, ou uma simples materialização de uma divindade para agarrá-lo pelos ombros, aproximar-se para bem perto do seu rosto e segredar “Você irá viver uma forte emoção em exatos cincos segundos. Prepare-se o melhor que puder!”.

Isso tornaria a vida demasiadamente mais simples. E menos embaraçosa.

Hermione esperava dar de cara com uma cabeleira loira oxigenada, mas, na verdade, ela se deparou com uma garota de idade próxima da sua, abotoando os últimos botões da blusa. A garota não fazia o menor esforço para suprimir o largo sorriso no seu rosto. Obviamente, ela usava as cores da Sonserina. Obviamente, ela tinha um péssimo gosto e nenhum vestígio de bom senso nem de amor próprio.

– Péssima hora, Granger. O Draco estava muito ocupado – disse a garota, olhando-a com o familiar jeito de cobra que é a marca registrada dos sonserinos.

– De fato, deve ser um trabalho praticamente impossível achar a sua decência! – disse Hermione. Ela não deveria, mas estava muito irritada por estar sendo obrigada a presenciar aquela ridícula cena. Ela nem poderia se permitir pensar no que o Malfoy estava fazendo com aquela garota sem que o seu estômago se retorcesse.

– Quem você pensa é para falar comigo dessa forma, sua...

– Saía daqui, Penélope – falou Draco, aproximando-se dela por trás. Ele estava de calças compridas, mas esse era o único acessório do uniforme escolar mantido em seu corpo. Hermione não conseguiu se impedir de pensar o quão errado era ver tanta pele nua de um garoto, sobretudo quando este era um Malfoy.

A outra garota, Penélope, virou-se indignada, fitando Draco com o mesmo olhar venenoso que lançara para Hermione.

– Você me escutou. – O tom da voz de Draco permaneceu inalterado, levemente tediosa, como se ele tivesse acabado de se levantar de um rápido cochilo.

– Você está me trocando por uma sangue-ruim?

Ele revirou os olhos e cruzou os braços sobre o peito.

Ele ficava bem naquela posição, com o seu cabelo loiro bagunçado e seus olhos entreabertos, a boca puxada para um lado, num eterno sorriso de escárnio, porque, para ele, o mundo era uma piada deliciosa e aquela menina era apenas parte do café da manhã.

– Volte à noite, depois do meu turno – foi tudo o que ele disse. E, para pessoas como Penélope, nada mais era necessário.

– Sempre que você quiser, Draco – disse ela numa voz melosa e açucara, agarrando, literalmente, o garoto pelos braços e devorando-o com a sua boca.

Hermione desviou o olhar, enojada e, subitamente, muito irada.

Penélope virou-se e passou por Hermione com um largo sorriso, fazendo questão de bater com força no ombro desta e descer as escadas dois degraus de cada vez.

– Onde é o banheiro? Eu preciso vomitar – disse Hermione, sem sarcasmo.

Draco revirou os olhos e afastou-se da entrada.

– Entre, Granger, e feche a porta.

Hermione soltou uma curta gargalhada. Ela jamais ficaria trancada no mesmo quarto que um Malfoy, especialmente quando este usava apenas calças para esconder o pouco de seu corpo que não estava exposto.

Ela deu dois passos para dentro do quarto e isso era o mais longe que estava disposta a ir.

Draco, no entanto, caminhou até a cama, com o seu típico passo régio. Ele demorou um minuto ou três a mais que o necessário para atravessar o seu quarto em direção à sua larga cama. Durante todo esse percurso de tempo, Hermione encontrou-se cada vez mais irritada e, de certa forma, sufocada. Apesar de o quarto ser amplo, confortável e luxuosamente decorado, não havia espaço o bastante para ela, o ego e a pele exposta do Malfoy no mesmo ambiente.

E as costas dele tinham o tipo de contorno que uma mulher gostava de admirar e correr as mãos sobre e...

– O que você quer? – falou Hermione, cruzando os braços em autodefesa. Quando ele sentou-se na cama e a fitou com aqueles olhos azuis, ela sentiu, subitamente, que era a sua própria pele que estava exposta.

– Castigá-la. – A voz dele soou macia e a palavra parecia estranha em sua boca, como se ela não fosse suposta para significar exatamente o que foi dito, mas algo completamente diferente.

Hermione engoliu em seco.

Antes que pudesse começar uma longa e dramática discussão que terminaria exatamente como todas as outras vezes, Draco completou a sua linha de raciocínio. E, dessa vez, as palavras soaram realmente como deveriam.

– Eu não direi sobre o seu comportamento inapropriado à professora Dolores, porém preciso puni-la, ensiná-la uma lição para que isso não volte a se repetir e para que outros não fiquem pensando que podem vir com uma atitude idiota para cima de mim, como se eu fosse um subalterno qualquer. Eu pensei muito sobre isso e cheguei à conclusão de que a pior coisa que poderia acontecer com você seria passar uma noite inteira comigo.

Hermione tentou falar, mas se engasgou com suas próprias palavras. Ele não queria dizer o que ela pensava que ele queria dizer, não é? Não é? Isso é loucura!

– Pior do que isso seria passar mais de uma noite comigo.

– Você está completamente fora de si, Malfoy! – gritou ela, pisando forte no chão, sacudindo a cabeça na vã tentativa de afastar um fragmento de sonho que nunca lhe pertencera, mas que estava tatuado na sua mente de qualquer jeito. – Eu jamais faria isso, aquilo, ah, que nojo, com você!

A cabeça do loiro despencou para um lado, enquanto ele a fitava como se ela fosse uma atração exótica num zoológico, uma criaturinha tão desprezível que chegava até a ser engraçado.

– Oh, Granger – disse ele de forma suave, como se tentasse explicar um fato desagradável para uma criança boba toda suja de sorvete –, eu jamais decairia para o seu nível. Não era isso o que eu iria propor.

Hermione não sabia se deveria ficar aliviada ou irada, por isso expressou os dois, de uma forma muito estranha, numa careta.

– Eu não tenho todo o tempo do mundo para patrulhar Hogwarts. Como você bem sabe, esse lugar é enorme e eu tenho coisas mais interessantes para fazer. Então, o seu castigo seria me ajudar a patrulhar o castelo, todas as noites, até que eu decida que a sua alma já foi torturada o bastante.

– Só isso?

Draco acenou, novamente, entediado com toda a situação. Ele jogou-se na cama, esticando-se de forma preguiçosa.

Hermione, como toda boa estudiosa, analisou o movimento com a devida atenção.

– Você tem certeza disso? – perguntou ela.

Ele murmurou algo que poderia ter sido um sim, ao mesmo tempo em que poderia ter sido “Dispensada”.

– Eu não entendo... Isso parece ser tão... – Fácil. – Por que você está fazendo isso?

Ele deveria estar tramando algo a mais; com Draco, nunca existia um caminho sem tortura nem dor.

– Você prefere que eu a entregue para Dolores? – questionou ele, com uma ponta afiada de irritação na voz.

– Não – respondeu sem hesitar. – Mas estou surpresa que você não o esteja fazendo neste exato momento. Nada disso faz o menor sentido. Você jamais deixaria passar uma oportunidade dessas, de me ver sofrendo por sua causa!

Ele remexeu-se na cama, erguendo os joelhos para colocar os pés sobre o colchão, de forma a esconder o seu rosto do olhar dela.

– Ela iria machucar as suas mãos – sussurrou ele tão baixo, que ela não tinha certeza se o escutara. – Elas são bonitas.

Isso, ela tinha certeza que não havia escutado direito.

– Malfoy... – começou a falar.

– Compareça aos meus aposentos às vinte e duas horas. Tente ser pontual.

Ela suspirou, cansada de tentar compreender o que quer que passasse na mente daquele sonserino.

– O que você quiser, Malfoy – disse ela de forma bem pontoadamente irônica.

Hermione saiu do quarto e fechou a porta atrás de si, desceu as escadas, um degrau de cada vez, murmurando consigo mesma por todo o caminho à Biblioteca, onde planejava gastar o resto do tempo antes da primeira aula do dia estudando, sem pensar em toda a pele exposta do peito de certo garoto, que estava sozinho numa certa torre.

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Ao mesmo tempo em que Hermione tentava, em vão, se concentrar na leitura de um livro sobre feitiços avançados para bruxos e bruxas fenomenais, numa certa torre, certo garoto revirava-se na sua enorme cama, tentando dissociar emoções e sensações que existiam somente em estranhos sonhos daquilo que existia na realidade.

Ele estava com raiva porque Granger atrapalhou o maravilhoso momento de descoberta que ele estava experimentado com o sexo oposto; ele estava com raiva porque Penélope não tinha exatamente a textura e a delicadeza que precisava sentir em sua boca; ele estava com raiva porque não tivera uma noite completa de sono nos últimos três, quatro meses; ele estava com raiva, sobretudo, de si mesmo, porque não conseguia esquecer a memória do sonho e porque existia uma parte dele que queria transformá-la numa memória de realidade. Em algo físico, que ele pudesse tocar com os dedos e com os lábios.

Era insano...

Aconteceu dois dias antes de Hermione ter subido a escada que dava acesso aos novos aposentos de Draco e ter, sem muita cortesia, atrapalhado um momento muito íntimo entre duas pessoas que não possuíam qualquer laço afetivo. Eles estavam interessados numa experiência puramente carnal.

Draco estivera sentado debaixo de uma árvore, no horário do almoço, tentando estudar. Porém, o cansaço das constantes noites de insônia fizeram os olhos se pregarem como se alguém tivesse passado cola mágica nas suas dobras. Resultado: Draco não abriu os olhos pelos próximos trinta minutos.

Nesse espaço de tempo, ele sonhou.

No sonho, ele era matéria animada debruçada sobre uma cama, em cima dele havia um sorriso e dois pares de olhos calorosos. O sorriso caiu de uma vez sobre a sua boca, furtando-lhe um longo e molhado beijo.

No instante em que abrira os olhos no sonho, ele sabia que era Hermione. Ela era a mulher em sua mente quando a consciência era brutamente silenciada.

O resto do sonho era uma tormenta de sensações. Ele havia a tocado, a beijado, a experimentado de todas as formas que julgava ser possível.

Mas ele não pensaria nisso novamente. Nunca mais. Aquilo era um segredo que morreria com ele.

* * *

Já fazia mais de uma semana que Hermione comparecia aos aposentos do Malfoy às 22h, pontualmente. A cada nova noite, ela descobria que se tornava inevitável não arrancar a cabeça dele e esmagar aquele desprezível sorriso e aquele par de olhos de cristal.

Naquela manhã, em especial, ela estava mais irritada e cansada do que já era corriqueiro. Se somasse todas as horas de sono que tivera nas últimas semanas, não daria para formar vinte horas inteiras. Ela estava mal humorada, a cabeça latejava e os membros pesavam com cada passo que se forçava a dar.

Quando ela despencou na mesa da Grifinória, ao lado de Gina, debaixo dos olhares preocupados dos seus amigos, percebeu que era tarde demais para se arrepender de ter comparecido ao almoço, dar meia volta e arranjar um lugar para cochilar pelos próximos três dias.

– Você está pálida, Hermione – disse Gina, afagando os cabelos da amiga. – Ela está comendo direito? – A pergunta, obviamente, não foi direcionada para o sujeito da questão.

– Um pouco – murmurou Rony, abaixando a cabeça, sentindo-se terrivelmente envergonhado debaixo daquele olhar que a irmã lhe lançava.

– Harry, Rony, por que vocês estão permitindo que ela continue desse jeito?!

– Não fale sobre mim como se eu não estivesse bem aqui! – vociferou o sujeito da conversa, que, supostamente, não deveria ser permitido a intervir.

– Hermione! – disseram três vozes diferentes ao mesmo tempo.

– Você não está em condição de argumentar – disse Gina. Para os meninos, completou: – O que está acontecendo com ela?

Rony olhou para Harry. Harry olhou para Rony. Um acordo mudo foi feito entre ambas as partes – não deveriam entregar o segredo da amiga.

– Você sabe como a Mione é, sempre estudando e tentando dar o melhor de si – declarou Harry, dando de ombros, como se o caso não fosse digno de alarme.

– E com toda a pressão de Dolores importunando os alunos da nossa Casa e criando novas regras a cada minuto... Ela só está preocupada – disse Rony, enfiando uma garfada com carne na sua boca.

Hermione encarou os três amigos e ergueu-se. Sem uma única interjeição, ela saiu do Grande Salão, seguiu reto pelo corredor, dobrou à direita, subiu vários lances de escadas até alcançar o terceiro andar, continuou reto no corredor, dobrou à esquerda, seguiu uma passagem estreita para a torre ao lado, subiu um longo lance de escadas e bateu forte na porta de madeira pesada dos aposentos do Prefeito de Hogwarts.

Quando não houve resposta, ela bateu mais forte, repetidamente, até que escutasse uma voz exasperada do outro lado da porta falar que quem quer que fosse, deveria se sentir no dever de dar meia volta e fazer o caminho para bem longe dali, antes que ele perdesse a paciência e azarasse a inconveniência.

Hermione sorriu satisfeita consigo mesma, sabia que ele estava fazendo Merlin sabe o que no seu quarto, porque havia reparado, mais cedo, que o seu lugar de costume na mesa da Sonserina estava vazio.

– Malfoy! – gritou Hermione, esmurrando a porta, da mesma forma que desejava fazer com o proprietário do quarto. – Nós precisamos conversar! AGORA!

Uma pausa.

Um xingamento longo e fluente em palavras desconhecidas, mas que soavam como um chute na cara.

Levou dez segundos para a porta ser puxada para trás, dando espaço o suficiente para que apenas parte do corpo do Malfoy ficasse visível. Mesmo assim, ainda era mais do que Hermione pretendia ver.

Os braços, o peito, as pernas dele estavam nus, completamente. A única peça de roupa que ele usava era um calção preto que parecia estar demasiadamente apertado no espaço entre as suas pernas.

Suba os olhos, Hermione. Mais para cima, Hermione. Não pense nisso, Hermione.

– Dê-me um motivo para não a matar nesse exato momento – latiu ele. Os seus olhos... Eles não estavam azuis, mas negros.

Mentalmente, ela deu um chute em si mesma para lembrar-se de manter a compostura e não demonstrar o quanto ele a estava afetando. Quer dizer, ele nem estava a afetando, em primeiro lugar! Ela só estava surpresa por tê-lo encontrado de tal forma, com aquela interessante auréola da cor do céu em volta da sua pupila dilatada e...

– É para isso que você utiliza a propriedade da escola? – falou Hermione, mais alterada que ele. – Alguém deveria castrá-lo para ensiná-lo a controlar os seus hormônios!

– Esse não é o momento mais sábio para brigar comigo, Granger – disse ele, suavemente.

Por algum motivo, aquilo a intimidava mais do que se ele tivesse gritado e apontado uma varinha para o seu coração.

Infelizmente, Hermione não estava num de seus dias de brilhante sabedoria.

– Eu não estou brigando com você, apenas estou expressando a minha opinião. – Ele ergueu uma sobrancelha, como se ponderasse se deveria rir ou arrancar um pedaço do pescoço dela. – Estou profundamente desapontada e sentindo-me injuriada que aquela mulher louca tenha dado o posto mais importante que um aluno pode ocupar em Hogwarts para alguém como você e ninguém tenha levantando uma palavra contra essa insensatez. – Ela apontou um dedo para o peito dele, mas não ousou tocá-lo. – Este, definitivamente, não é um comportamento adequado para se ter dentro da escola! É esse tipo de coisa que você deveria ser responsável por evitar! Você não tem o menor direito de ocupar essa posição! Você deveria fazer um bem para todos nós e renunciar, agora!

Um momento antes, Draco estivera fervilhando de tensão e de raiva por ter sido interrompido pela mesma pessoa que assombrava seus pensamentos. Agora, no entanto, ele soltou uma gargalhada profunda e perigosa, um som rouco, algo que deveria ser revelado somente para uma pessoa no meio da noite, entre quatro paredes largas.

– Você acha que pode vir até aqui, me dizer o que fazer e esperar que eu me sinta envergonhado, intimidado, e a obedeça?

Bem, na sua cabeça, todo o plano havia soado mais inteligente do que o Malfoy estava tentando fazer parecer.

– Eu acho que alguém deveria pará-lo antes que você machuque alguma dessas garotas!

Ele sorriu de lado, sarcástico.

– Eu faço apenas o que elas me pedem. Um dia, você vai descobrir que, se você pedir do jeito certo, um homem fará o que você quiser e um pouco mais.

Contrariando as enormes expectativas que ele nutria que ela abaixasse a cabeça, constrangida, e se virasse, apressada, para sair o mais depressa possível dali; Hermione ergueu a cabeça, com aquele seu delicado nariz apontado para cima, e encarou Draco com desprezo.

– Você não é um homem, você é um rato! – disse ela, sem humor. – Eu não estarei comparecendo a patrulha pelo castelo nesta noite.

Contrariando as enormes expectativas que ela nutria que ele se enfurecesse, alfinetasse-a e falasse que ela nunca mais precisava retornar, porque já estava mais do que cansado de perder suas noites com uma sangue-ruim imunda que nem ela e, no meio disso, verbalizasse sua frase padrão – “Espere até meu pai escutar sobre isso!” –; Draco ergueu a cabeça, olhando-a do alto como se ela fosse uma sujeira em um de seus caríssimos sapatos de couro. Ele disse absolutamente nada por um tempo mais longo do que Hermione julgava ser possível, considerando a personalidade mimada e infantil dele.

Ela se moveu, visivelmente desconfortável. Ele estava tão quieto...

– Às vinte e duas horas, compareça aos meus aposentos ou aos de Dolores, a escolha é sua, Granger.

Ele fechou a porta na cara dela.

Hermione piscou, sentindo diferentes emoções ao mesmo tempo, completamente confusa, com raiva, sentindo-se humilhada, ou como se ele a tivesse esmurrado no rosto, ou a beijado em sua intimidade.

Ela afundou o rosto nas mãos e suspirou exasperada.

Tudo o que queria era dormir, mas, ao invés disso, passaria a tarde tentando retirar pensamentos dúbios sobre o loiro da cabeça. Isto era pior do que as visões, porque era real.

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Draco encostou as costas na porta, respirando de forma descompassada. Fechou os olhos e contou até trinta.

Dois. Três. Quatro.

– O que a sangue-ruim queria, Draco? – disse uma voz que estava ao mesmo tempo distante e perto, sussurrada no seu ouvido.

Quinze. Dezesseis. Dezessete.

Sentiu mãos sobre os seus ombros e uma boca úmida acariciando seu pescoço, subindo em direção à sua bochecha.

Vinte e dois. Vinte e... Três.

Uma das mãos em seu ombro deslizou pelo seu peitoral, trilhando um caminho demasiadamente longo ao ponto do seu ser que doía.

Vinte... Vinte... Seis?

As mãos sobre si não era realidade, mas memória de sonho. Mesmo com os olhos fechados, poderia ver o sorriso apertado da garota, os seus olhos castanhos admirando o incrível trabalho que fazia para desarticular Draco Malfoy e deixá-lo à sua mercê.

Se abrisse os olhos, sabia o que encontraria – outra garota, com cabelos negros e curtos e um sorriso venenoso. Ele gostava do jeito desinibido com que ela o tocava e de toda a pele desnuda que ela o oferecia, porém não era o seu toque nem a sua pele que o fazia tremer necessitado.

Vinte? Trinta? Quem se importa!

Ele a beijou, acariciando a língua dela com a sua, um movimento tão delicado e faminto. Ele queria testar o gosto dela na sua boca, sentir aquele familiar sabor adocicado que ela tinha, aquele que contrastava tão bem com a amargura da sua própria boca.

Ele a pressionou contra si, arfando ao sentir os seios macios dela em seu peito. Isso, também, era uma sensação familiar, que o fazia se perguntar se um dia ele se acostumaria e não se surpreenderia com o jeito como o quadril dela se movia devagar e a sua perna se prendia a dele, ao mesmo tempo em que ela agarrava os cabelos dele e o beijava como se ele fosse o ar que lhe faltava nos pulmões e gemia baixinho, assoprando na bochecha dele.

Draco abriu os olhos, mas ele não poderia afirmar com convicção se estava preso num de seus pesadelos ou se a pulsação entre as suas pernas era real.

Naquele momento, ele não poderia nem ao mesmo se lembrar de se importar sobre isso.

.

Hermione cochilou três minutos numa cadeira da Biblioteca, vinte minutos em outra, trinta e cinco num banco do lado de fora dela, outros vinte minutos no sofá do Salão Comunal da Grifinória, mais quarenta minutos na sua cama, cinco durante alguma aula, sete durante outra, vinte e três minutos à mesa da Grifinória, no Grande Salão, até Harry resolver que era tempo de eles terem uma conversa realmente séria.

Ele cutucou a amiga. Hermione entreabriu os olhos e murmurou algo incompreensível, ela nem ao mesmo se deu ao trabalho de erguer-se e endireitar-se no banco.

– Você deveria dormir, Mione, sua cara está terrível – falou Harry, da forma mais sensível que podia.

– O que você acha que eu passei o dia inteiro tentando fazer? – disse ela, mal humorada, revirando a cabeça para esconder os olhos da claridade do Salão. – Eu não consigo dormir.

– Você tem pesadelos ou visões?

– Eles são a mesma coisa!

E todos eles pareciam ser sobre o Malfoy. Mais recentemente, sua mente estivera repleta de imagens sobre o excesso de pele exposta do sonserino, enquanto o seu peito continuava ardendo em fúria pela forma como ele a fez se sentir naquele dia, mais cedo. Humilhada.

– Hermione...

– Eu não quero falar sobre isso!

– Você não pode continuar desse jeito. Eu pensei que, depois de ter assumido o que está acontecendo, você passaria a confiar mais em mim e Rony sobre isso. Se não soubermos o que está se passando na sua cabeça, como poderemos ajudá-la?

Hermione usou suas últimas forças para erguer-se, piscando os olhos repetidas vezes. Havia lágrimas neles, mas não eram as típicas de tristeza profunda do âmago. A luz forte fazia os seus olhos arderem. Debaixo das lágrimas, ela não podia ver com clareza, o mundo estava disforme, inundado de luz.

Ela olhou para um ponto atrás de Harry, onde havia um movimento indistinto. Limpou as lágrimas dos olhos com as costas das mãos. O movimento cessou, em seu lugar havia um garoto loiro que parecia ter pouco mais de treze anos, ele estava parado na extremidade do Salão, encarando-a com olhos tristes, desolados.

– Por favor, deixe-me ajudá-la...

– Hermione – não foi a voz de Harry que falou nem a de Rony, não foi a voz de Gina que escutou nem a de nenhum outro membro da Grifinória. Ela conhecia aquela voz, mas não aquele tom que usava.

Diante dos seus olhos, o garoto desapareceu.

Harry a encarava com uma expressão de pura dor. Ele não aguentava vê-la daquela forma, tão frágil e instável, como se, a qualquer momento, ela fosse se romper em bilhões de fragmentos de si mesma e de todas as possibilidades do que poderia ser.

Ele segurou o rosto dela entre as suas mãos, forçando-a, delicadamente, a virar-se na direção dele. Ela tremia, quando se puxou do aperto dele, a cabeça virando em todas as direções, procurando algo que não queria ser encontrado.

– Hermione – disse Harry.

– Hermione – disse a voz na cabeça dela.

Ela viu Draco entrando no Grande Salão com o braço na cintura de uma garota. Ele não havia comparecido a nenhuma das aulas naquela tarde. Ela não sabia se realmente estava usando sapatos e meias nos dois pés, mas havia notado isso, esse estúpido e insignificante detalhe.

A garota parecia triunfante nos braços dele.

– O que está acontecendo? – Harry segurou-a pelos ombros, forçando-a a encará-lo, sem delicadeza dessa vez. Rony, que acabara de chegar, permanecia em pé, olhando de uma cabeleira curta e preta para uma longa e rebelde, tentando desvendar um mistério. Ao seu lado, Gina falava algo como “E vocês falaram que nada estava acontecendo, não é?! Seus dois idiotas!”.

Neville virou-se na cadeira, as conversas ao redor logo se silenciaram, enquanto todos encaravam Harry encarando Hermione. Ela parecia terrível, de fato, como se tivesse acabado de ver um fantasma ou escutado um.

– Eu preciso dormir – balbuciou Hermione, erguendo-se do assento. Harry levantou-se e Rony colocou comida em seu prato, preparando-se para seguir os amigos para os confins do mundo.

Os três saíram do Grande Salão, seguidos de perto por Gina e por vários pares de olhos curiosos.

– Você sabe que eu não a deixarei sozinha até que diga a verdade. – Harry afirmou o óbvio.

Gina parou alguns passos atrás do trio. Estava preocupada com a amiga, mas sabia que, qualquer que fosse o problema, isso era algo que precisava ser resolvido entre os três primeiro.

– Olhe para mim, Harry! – vociferou Hermione, exasperada. – Eu estou muito cansada porque não durmo direito, esta é toda a verdade! Agora, eu estou indo para o dormitório para tentar dormir pelas próximas duas horas, antes de ter que me encontrar com aquela fuinha imperativa que é incapaz de manter suas roupas no seu corpo!

Harry, Rony e Gina piscaram surpresos. Eles observaram Hermione se afastar, incapazes de reagir.

– Eu escutei o que penso que escutei? – sussurrou Rony para o amigo.

– Nada mais faz sentindo – sussurrou Harry de volta.

– Bem – disse Gina, aproximando-se dos garotos –, vocês querem me explicar o que está acontecendo?

– Quando descobrirmos, você será a primeira a saber – falou Rony, mordiscando um pedaço do que parecia ser torta de abóbora.

– Nós deveríamos falar com o Malfoy – disse Harry, sentindo-se completamente inútil.

– E você acha, sinceramente, que ele será mais cooperativo do que a Hermione? Sério?

– Não custa nada tentar... – Ele se sentia tão péssimo com a ideia quanto Rony, mas sacrifícios precisam ser feitos para o bem da saúde mental de uma amiga.

Rony suspirou.

– Pressinto que a Grifinória está indo perder alguns pontos...

Harry concordou.

Quando eles retornaram ao Grande Salão, no entanto, Draco não estava em lugar algum para ser visto.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado e que pulem logo pro próximo capítulo, porque ele está maravilhoso (sim, finalmente uma cena dramione com direito a beijos e um pouco mais :D).
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Obrigada por todos os comentários, eu teria desistido fácil dessa história (como já fiz com várias outras), se não fosse pela persistência de vocês em continuarem a acompanhá-la, mesmo que não entendessem muito bem o que estava acontecendo e para onde toda essa loucura estava se encaminhando. Bem, espero que eu consiga sempre superar as suas expectativas e entretê-los ^^
Beijão para todos :*



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