Desejo e Reparação escrita por Ella Sussuarana


Capítulo 22
III - Capítulo 20: As surpresas da noite do Baile de Inverno


Notas iniciais do capítulo

Eis que, enfim, chegou o tão esperado Baile de Inverno! Gostaria de dedicar este capítulo a todos os leitores que estão acompanhando desde o início e aos novos também, sobretudo àqueles que sempre deixam um comentário especial! Muito obrigada, vocês fazem todo o estresse de escrever e editar essa fanfic valer a pena!



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Parte III

{Uma valsa que resultou em uma queda}

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Capítulo 20: As surpresas da noite do Baile de Inverno

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Nada o preparou para o desfecho daquela noite. Não houve sequer uma advertência do acaso. Afinal, o acaso não bate na porta, ele bate na sua cara. E foi exatamente isso o que aconteceu. Literalmente.

Antes de discorrer sobre o acontecimento que fez com que Draco ganhasse mais do que uma mancha vermelha no alto da bochecha, é fundamental explicar o contexto dessa história.

Era, enfim, a noite do tão comentado e aguardado Baile de Inverno.

As garotas desfilavam com seus vestidos esvoaçantes através do Grande Salão, braços atados a companheiros, que eram mais um adorno passando quase despercebido pelas cores vibrantes, pelos tecidos finos, pelas curvas acentuadas, até então desconhecidas, delas.

Draco estava surpreso com o efeito que muita maquiagem, cabelos retorcidos em nós atrás da cabeça, belos vestidos e saltos de quase trinta centímetros de altura tinham de transmutar uma garota em forma de palito em uma mulher encantadora. Contudo, isso não funcionava para todas. Somente para uma parte considerável.

Mais de uma vez, ele sentiu inveja de Blaise, que tinha uma sorridente e bonita garota de longos cabelos dourados o seguindo por todo lado. Ela era tão bonita, que Draco até se esquecia de que ela não era uma sonserina.

Melissa era o nome dela. Cursava o quinto ano em Hogwarts. Corvinal era a sua Casa.

Quanto à parceira de Draco, ela era apenas uma menina mirrada com o nome de Pansy ao lado de Melissa.

E todos sabem o quanto Draco Malfoy detesta ficar em segundo lugar...

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Hermione estava radiante, dançando no centro do Salão, com o sonho vivo e animado de qualquer garota (e garoto) – Viktor Krum. Ele a olhava de uma forma que a fazia querer se encolher e esconder a vermelhidão de suas bochechas, e tinha aquele sorriso robusto pregado no rosto. Ele a girava, e ela ria de júbilo.

Quando os outros pares se juntaram à dança, o espaço tornou-se apertado, e era impossível que os seus peitos não se encontrassem, ou que os seus braços não se demorassem tempo demais um sobre o outro, fazendo uma carícia de tecido roçando em pele quente. Hermione respirava num ritmo descompassado, que se seguia ao pulo do seu coração, toda vez que Viktor inclinava-se para frente, como se na tentativa de encontrar os lábios dela debaixo dos seus. O cérebro dela entrava em pane. Apesar de todo o conhecimento acumulado durante esses três anos e tantos longos meses em Hogwarts, ela não sabia como agir em situações que requeriam um grau de intimidade maior do que compartilhava com os seus dois melhores amigos.

Em resumo: Hermione estava sofrendo pela antecedência de como seria o seu primeiro beijo. Estava morrendo de medo de fazer algo que não deveria e estragar tudo.

Ela respirou fundo, erguendo os olhos para o teto do Salão, de onde despencavam flocos de neve, transformando a visão numa densa nuvem branca, que parecia chorar pedaços de si mesma. Algumas velas flutuavam, dispersas, suas chamas queimando pálidas. Apesar do calor, a neve não derretia quando encontrava o fogo, ela passava pela chama como se esta fosse feita de substância imaterial.

A música mudou, subitamente. Viktor inclinou-se, o coração de Hermione deu três saltos olímpicos consecutivos. Ao invés de beijá-la, ele falou que iria pegar algumas bebidas. Hermione assentiu e disse que iria falar, rapidinho, com Harry e Rony, para que eles não ficassem depois reclamando que ela os ignorara completamente durante o baile.

Eles provavelmente reclamariam sobre isso pelo resto de suas longas – ou breves, se continuassem do jeito que estavam – vidas.

Enquanto se forçava para fora da multidão de corpos dançantes, ela tentava controlar o seu próprio corpo, que queria voltar-se e remexer-se na batida calorosa da música.

She loves you, yeah yeah yeah

She loves you, yeah yeah yeah

– Concede-me esta dança? – perguntou uma voz vinda da sua direita.

Hermione virou a cabeça, os olhos arregalaram-se ao se deparar com a familiar, ao mesmo tempo estranha, fisionomia de Blaise.

She loves you yeah yeah

Ela queria dizer “não”. Imagina o escândalo que seria causado se a pessoa errada os vise dançando! Provavelmente, Snape reduziria a pontuação de ambas as Casas a valores negativos por causa da ousadia, por parte dela, de tentar corromper o puro sangue dos sonserinos e por causa dos péssimos gosto e bom-senso de Blaise.

– Tudo bem – disse ela, dando de ombros de maneira casual, como se ela não estivesse assinando o seu atestado de morte decorrente de olhares venenosos e alarmados com o simples ato de verbalizar um “Tudo bem”. Como se tudo pudesse, de fato, permanecer “bem” após uma inocente dança a dois. – Eu não sei como dançar esse tipo de música.

– Da próxima vez que você sair para uma festa, faça uma pesquisa mais aprofundada – disse ele, com um meio sorriso irônico erguendo-se sobre a face. – Deixe-me ensiná-la, faça tudo o que eu fizer. – Ergueu os braços com as palmas abertas e começou a girá-las, ao mesmo tempo em que balançava a cabeça para os lados e remexia as pernas como se estivesse chutando uma pedra. – Vamos, mova-se, garota!

Hermione encarou-o, séria, mas com a boca contorcendo-se num sorriso que queria explodir numa gargalhada.

– Eu não vou dançar dessa forma, é ridículo! Onde foi que você aprendeu isso? – disse ela, rindo.

– É assim que os trouxas dançam!

– Não que eu me lembre. E, eu tenho um vasto conhecimento de campo sobre eles!

– Ok, talvez eu tenha acabado de inventar alguns passos. Pode parecer confuso agora, mas, um dia, serão um grande sucesso, eu revolucionarei o mundo!

– Eu acho que o mundo não está preparado para a sua genialidade!

– Esse é o fardo que todo grande bruxo tem que aprender a aguentar. Agora, mexa-se, a música está acabando, e nós ainda não dançamos.

Ele retornou a fazer movimentos descompassados, as mãos abrindo-se e fechando-se, a cabeça sendo jogada para frente e para trás, as pernas debatendo-se como se estivessem sendo eletrocutadas;

– Nós deveríamos dançar, não ser o motivo de chacota de toda a escola pelo resto do ano!

– Ok, ok, eu entendi – disse ele, erguendo as mãos em sinal de redenção. – Você não quer ser visto com um imundo sonserino por aí. De fato, não faz bem à sua imagem. Aconselho que evite passar por tais situações de constrangimento público.

Se ele não estivesse falando com um amplo sorriso e com um denso sarcasmo, ela poderia ter se sensibilizado com as suas palavras.

Obviamente, Hermione fez a única coisa que se deve fazer em situações como essa: revirou os olhos.

– Ao menos, você me deu uma flâmula de ilusão. Pensei que você diria “não” e sairia de nariz empinado, quando eu a pedisse, todo humilde, uma única e breve dança.

Ela resolveu entrar no jogo dele e usar-se de algum sarcasmo.

– Por que nós estamos conversando mesmo? Eu não me lembro exatamente de como chegamos a isso.

– Eu gosto de você – gritou ele acima da música e das vozes de gritinhos histéricos femininos.

– À cada segundo que se passa, essa conversa faz menos sentido – falou ela, ainda em tom de piada interna.

– É verdade, Hermione.

– Ninguém o está refutando, Zabini. Com licença, eu tenha que encontrar os meus amigos antes que Viktor volte e suponho que você tem que encontrar os seus e terminar de beber o seu quinto copo com cerveja amanteigada.

– Ninguém consegue ficar bêbado com cerveja amanteigada, Hermione.

– Eu tenho certeza que você já tentou, certo? – Quando ele sorriu, ela também devolveu-lhe um sorriso de diversão. – Não me chame de Hermione, é estranho e desconfortável.

– Por quê? – Ergueu as sobrancelhas, um gesto de inocência e de confusão.

– Porque você é um sonserino, e eu não apenas pertenço à Casa da Grifinória, como também sou a melhor amiga de Harry Potter, o garoto que os pais de vocês desejam que tivesse morrido há quatorze anos.

– Você tem um ponto! Mas, eu realmente não me importo, eu já lhe disse.

– Eu pensei que você tivesse mudado... Porque nunca mais falou comigo...

– Eu preciso continuar a fingir que eu sou idiota como eles, ou eles arrancaram meus olhos enquanto durmo.

Hermione contorceu o nariz ao imaginar a cena.

– Outra razão pela qual não deveria me chamar pelo meu primeiro nome.

– E como eu deveria chamá-la? – falou em tom de desafio.

– Granger – disse e virou-se, a saia de seu vestido seguiu o movimento em forma de arco, jogando-se para o lado e voando.

As últimas palavras deles foram diluídas pela canção, que se aproximava do fim.

– Isso significa nada para mim!

You know it's up to you

I think it's only fair

Pride can hurt you too

Apologize to her

Hermione encontrou Harry e Rony sentados, emburrados, de braços cruzados. No momento, ela estava tão extasiada, que riu bobamente, girando o seu corpo, os olhos fechados, um som crescendo do fundo do seu ser repetindo as letras da canção.

Yes, she loves you

Estava tão absorta envolta por sua frágil bolha de fragilidade, que não percebeu o mau-humor dos amigos, e, se percebeu, decidiu fingir que não o viu. Mas, o que ela definitivamente não percebeu foram dois pares de olhos seguindo os seus movimentos com interesse incomum, com faíscas de desejo e de raiva guerreando na escuridão de seus âmagos.

Um deles era de um azul gélido, mas ardente; o outro era da cor do breu.

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– Por que você estava dançando com a Granger? – questionou Draco, puxando Blaise para o canto do Salão, distante do aglomerado de pessoas dançando no seu centro ao som de uma música que machucava os ouvidos do loiro. Ela era tão adocicada, que ele poderia, a qualquer momento, ter que se dobrar, com as mãos nos joelhos, e vomitá-la para fora de si.

– Porque eu quis – respondeu Blaise, dando de ombros, como se estivesse falando sobre um assunto trivial, não sobre o seu atestado de morte. Outra vez. Algumas pessoas, de fato, não tinham a menor noção do perigo.

– Mas, ela é uma sangue-ruim – disse Draco em tom de acusação. – E você é um de nós, um sange-puro.

– Eu sinto que deveria haver uma lição de moral por aqui, em algum lugar, mas não consigo entender o seu ponto – disse, sarcástico.

– Você é um sonserino, e ela é da Grifinória!

– E?

– Nossas Casas são inimigas. Além disso, ela é imunda e impura!

– Eu não sou seu inimigo, e ela nunca fez nada que me ofendesse. – Ergueu a mão fechada em punho e, subitamente, socou o lado esquerdo do rosto de Draco, abaixo do olho. Aconteceu tão rápido, que o loiro somente processou o ocorrido, quando a ação chegou ao fim. Blaise segurou a mão direita dentro da esquerda, massageando-a, ela também estava avermelhada e dolorida. – Você é o único imundo aqui, Malfoy! Você é um idiota que não tem respeito por nada!

Draco levou a mão à sua bochecha, sentindo a pele frágil e quente.

– Eu pensei que nós poderíamos ser amigos, mas eu não posso ser amigo de pessoas com merda na cabeça como você!

– Com quem você pensa que está falando? – Draco falou mais alto do que deveria, mas não alto o bastante para causar distúrbio.

A massa de corpos em tecidos coloridos e brilhosos, alguns felpudos, outros de seda suave, continuavam a dançar e a ser comprimida na região central, repetindo as letras de uma canção acompanhada pelos acordes das guitarras e pelas batidas ferozes da bateria.

Draco deu um passo para frente, com o punho erguido, vermelho de cólera.

– Vamos, Draco, bata-me! – incitou Blaise, dando leves tapas na sua bochecha direita. Quando Draco hesitou, o medo pareceu relampejar em seus olhos, o que fez com que Blaise abrisse um largo e odioso sorriso. – Você não pode me machucar, Malfoy! Você é um medroso patético que ataca garotas para confortar o seu ego...

Blaise foi silenciado por um soco na lateral da sua cabeça. Ele cambaleou para trás, tonto.

Após isso, não foi necessária outra troca de xingamentos para que os dois garotos se jogassem um em cima do outro. Blaise deu uma cotovelada no peito de Draco, que arfou e revidou com um chute bem calculado no joelho dele e, sem perder tempo para vangloriar-se, deu um murro no seu estômago. Blaise contorceu-se de dor.

Draco afastou-se um passo para trás, sorrindo triunfante. Estava se preparando para dizer algo maldoso, quando Blaise deu uma cabeçada, literalmente falando, no estômago dele. As costas de Draco encontraram matéria sólida com força, e sua cabeça chocou-se nela, a visão tornando-se, momentaneamente, embaçada.

– Seu pedaço de defecação de elfos! – gritou Draco, laçando o braço de forma deliberada em arco na direção onde julgava estar o pescoço de Blaise.

– Isso deveria ser um insulto? – Blaise gargalhou, havia uma ponta de dor no som.

– Você tem que admitir que esse é um dos bons que guardo para casos especiais! Nem ao Potter eu dei essa honra! – riu-se, mas no som, também, havia muito pouco de real humor.

Findado o momento de descontração, algo fundamental em momentos de elevada tensão e dor, eles retornaram a chutar e a esmurrar um ao outro, até que os dois fossem parar no chão, rolando, as suas roupas luxuosas sendo reduzidas a trapos sujos e empoeirados, tão desgastados quanto os trajes que os fantasmas de Hogwarts vestiam desde que, bem, viraram fantasmas, o que, para alguns, já faz muito, muito tempo.

Não demorou mais de três segundos para que as primeiras cabeças voltam-se na direção dos gritos de fúria dos garotos. Demorou menos ainda para que Minerva suspirasse alto, erguesse a cabeça para o teto como se perguntasse a Merlin o que havia feito para merecer ter que aguentar tantos sonserinos idiotas e irresponsáveis, e caminhasse a passos duros em direção à roda de pessoas vibrando e repassando apostas no canto do Salão.

Infelizmente, nenhum dos integrantes do Trio Maravilha estava presente para ver o pânico deixar pálido os dois garotos, quando Minerva puxou cada um pela gola de sua camisa social, que um dia fora brancas, e o levou para fora do Salão. Essa era outra cena da qual somente ouviriam falar e, exatamente por isso, se arrependeriam pelo resto das suas vidas por terem brigado e se retirado do lugar, os três chateados, Harry e Rony para o dormitório, Hermione para a escadaria em frente ao Salão, onde ficou chorando até que não lhe houvesse mais lágrimas, e mesmo depois disso. Esta última ainda teve o breve relance da imagem de dois meninos andando cabisbaixos à frente de Minerva, que retraía os lábios, a face contorcida de desgosto.

Se não estivesse tão triste e culpada por ter tratado com tamanha rudeza seus amigos, teria notado que as roupas deles estavam destruídas, que os cabelos deles estavam cobertos por uma densa camada de sujeira preta e pedaços de bolo, deixando quase invisível os fios louros de um deles.

x.x.x.x

A sala estava escura, mas não tão escura, de modo que os garotos não conseguiriam se fundir ao breu. Ela era larga, mas não o bastante para acomodar o orgulho deles e o desprezo da professora Minerva.

– O que, exatamente, aconteceu? – perguntou a mulher, erguendo o nariz fino mais alto que os deles.

Como das duas outras vezes em que tentara fazer com que lhe explicassem qualquer coisa lógica, os garotos abriram a boca e, dela, palavras jorraram descontroladas, misturando-se, até virarem uma confusão.

Minerva suspirou, balançando a cabeça.

– Calem-se – ordenou ela. O quarto retornou ao silêncio. Os garotos entreolharam-se, desconfiados de que o pior havia, enfim, chegado. Ao se lembrarem de que estavam brigados e de que, agora, eram inimigos até o fim de seus dias, viraram a cara, cada um para um lado, cruzando os braços firmes sobre o peito. – Vocês estão me dando dor de cabeça – massageou as têmporas. – Já que nenhum de vocês dois é capaz de me explicar o que aconteceu, terei que retirar cem pontos da Sonserina.

– Mas, professora... – gritaram os dois ao mesmo tempo.

Minerva ergueu uma mão, e a boca deles foram fechadas, como por mágica. A verdade é que o temor do que a professora poderia fazer foi o motivo de eles terem acatado a ordem dela rapidamente.

– Agora, peçam desculpas um ao outro!

– Eu não me sinto culpado pelo que fiz – disse Blaise, olhando de soslaio para Draco.

Draco devolveu o olhar de desprezo.

– Muito menos eu, Zabini!

– Muito bem, então. Tenho certeza que Snape e outros professores precisam de auxílio para limpar e organizar as suas salas. Vocês ficaram de castigo até o fim do ano, encontrem-me, todos os dias, depois do final das aulas, para cumprir as tarefas que eu escolher. Algum trabalho duro fará bem para o orgulho de vocês. Estão dispensados.

Draco e Blaise murmuraram algo inteligível e viraram-se para sair.

– Mais uma coisa: estão proibidos de curarem ou de permitirem que terceiros curem os seus ferimentos. Eles servirão para lembrá-los que humilharam a imagem da nossa escola, nesta noite.

Eles saíram da sala, sem sentirem resquício de culpa.

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Hermione estava sentada no parapeito de uma janela cortada na rocha, no corredor do quarto andar. Observava o movimento quase inexistente das árvores ao longe, para dentro da Floresta da Proibida. Apesar do vento forte, a tamanha distância, o mundo inteiro parecia ter sido submerso numa onda feita de escuridão – as árvores nuas perderam o som característico de calmaria do farfalhar de folhas, por isso os seus troncos eram difíceis de serem diferenciados do vácuo da noite.

Parou de chorar, eventualmente. Mas, o seu rosto estava marcado com os traços de lágrimas secas. Ela estava tão infeliz, que nem tinha forças para sentir-se agradecida por ter feito a maquiagem com um pouco de mágica, caso contrário o seu rosto teria se transformado em arte contemporânea – um conjunto de cores jogadas sobre o quadro em branco.

Ao longe, havia o murmúrio de dezenas de passos e a batida rítmica de instrumentos. Ela não poderia distinguir um som do outro, pois eles eram um só prolongamento instável, que crescia e decrescia, como se estivesse correndo em sua direção e, então, sendo arrastado por uma força impossível para o início da partida.

A garota não escutou passos se aproximando, primeiro fortes, depois tímidos.

– Granger! – disse uma familiar voz.

Ela virou o rosto, quase de forma involuntária. Ao ver a face de Draco, por nenhum motivo lógico, ela assustou-se, soltou um grito fino e perdeu o equilíbrio. As pernas debateram-se no ar, as unhas tentaram encontrar suporte, mas só havia ar.

E carne para afundar as suas unhas.

Estava segurando o braço de Draco, ou melhor, Draco moveu-se para segurá-la antes que atingisse o solo.

Hermione agarrou-se a ele com toda a sua força, mas o seu corpo continuava a se debater desesperadamente, o que fazia as mãos dele perderem o aperto por micro frações de segundos, nos quais a garota quase tivera um ataque cardíaco.

– Não ouse me soltar, Malfoy – gritou Hermione.

Draco não a retrucou, estranhamente.

– Quando eu a puxar, você terá que se impulsionar para cima também, ou nós dois iremos cair – disse Draco, a sua voz firme. – Agora!

Draco a puxou. Hermione fixou os sapatos contra a pedra e impulsionou-se para cima, usando os braços do garoto como apoio, porém, com o pânico ainda latente, as pernas dela debateram-se ao encontrar, novamente, o ar e o seu salto ficou preso numa fenda aberta no tecido delicado do vestido. Quando as mãos dela conseguiram alcançar o parapeito da janela, Draco jogou-se para trás, para que o peso dos dois somados acarretasse na queda deles para dentro do castelo, não para fora. Durante a queda, o joelho de Hermione bateu com força no parapeito, fazendo com que as lágrimas, que segurava, despencasem.

Ela caiu por cima de uma superfície macia, mas rígida e suja. Não pensou duas vezes antes de agarrá-la com força e permitir-se respirar com dificuldade. Ela tremia e suava frio, da mesma forma que Draco, apesar de o motivo de ele estar instável ser completamente diferente do dela.

Ele sentia a oscilação bruta do corpo dela sobre o seu e unhas afundando-se nas suas vestes, procurando por carne para despedaçar. Não entendia o que acabara de acontecer, o seu corpo simplesmente movera-se, deixando a razão esquecida para trás.

Havia salvado Hermione Granger, a sangue ruim amiga do Potter.

Por quê?, queria gritar à sua razão. Ele deveria ter a deixado cair e ter assistido tudo de camarote, com um pouco de pipoca caramelizada na mão.

Contudo, ali estava ele: caído no chão, num corredor de Hogwarts, suando, mastigando o sabor do sangue e do desgosto na boca, com a criatura mais desprezível do mundo sobre o seu corpo, envolvendo-o, abraçando-o como se ele fosse uma espécie de porto seguro. Não podia aguentar mais dessa idiotice!

Subitamente, ele a empurrou para o lado, com a típica gentileza de um ogro, e levantou-se.

Hermione, enfim, pareceu despertar de um sonho. Ela piscou repetidas vezes e sentou-se sobre os joelhos, usando as mãos fixadas no chão para manter-se firme. Ainda respirava pausadamente, alto e arrastado, como se o ar arranhasse a sua traqueia e machucasse os seus pulmões.

Com muita dificuldade, ela conseguiu segurar a respiração para verbalizar o indizível.

– Vo...Você me... salvou – sussurrou ela, encarando-o, surpresa. – Ob... Obriga...

– Não me agradeça, Granger! – disse, rispidamente, Draco.

Hermione levantou-se apressada, porém se esqueceu de que o seu sapato ainda estava preso no vestido. Conclusão: ela caiu novamente, os joelhos e os braços encontraram o chão com um baque surdo e cruel. Ela gemeu e encolheu-se.

Draco esforçou-se para soltar uma risadinha cruel, antes de partir, desaparecendo nas sombras do Castelo. Para Hermione, parecia que ele estava fundindo-se a elas.


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Notas finais do capítulo

Esse é um capítulo mais longo que o usual, mas, bem, ele é um especial para vocês! ^^
Espero que tenham gostado e se divertido tanto quanto eu na hora de escrever a briga entre o Blaise e o Draco! kkkk Adorei a cena!
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Quem esperava ver mais da amizade deles, não fiquem decepcionados! A história ainda guarda muitas surpresas ;)
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Beijão para todos!