Hope for Us escrita por Lady Anne


Capítulo 27
Capítulo 25: Força


Notas iniciais do capítulo

OLHA QUEM CHEGOU!
Sim, eu, oi gente :)
Primeiramente boa noite, segundamente muito obrigada por todos os comentários, todo o apoio, todas as visualizações, todo o amor que vocês dedicam a mim e o tempo a essa humilde fanfic! Obrigada a Aurora, sua diva, por todos os comentários nos capítulos, você é demais ♥
Gostaria de agradecer a minha rainha, Lara Lima, por me viciar em Teen Wolf. Você lacra, viu?
Bom gente, capítulo triste de novo, mas vamos fechar por aí essa tristeza toda (por enquanto migs), capítulo 26 vai ter shipper porque sim, capítulo 27 vai ter também pelo o que tudo indica, e a partir do 28 o bicho vai pegar. Porque sim. :B
Relação HopexCarl vai amadurecer, para que os dois amadureçam individualmente dps com as mancadas da vida :')
"O bicho vai pegar, Anne?" Sim, o forninho e a casa vão cair também.
"Anne, você está postando toda sexta feira, isso é oficial?" Talvez seja, se tudo cooperar daqui para frente.
"Anne, vou te matar se sumir 5 meses de novo." Tudo bem então. :')
"Anne, não mate o Noah." Veremos.
GENTE, VOCÊS VIRAM O CHANDLER E AQUELA AMIGA DELE ESSES DIAS? BRIANNA!
Viram as fotos da season 6? Andrew e Norman com intimidades perto da Melissa? Hu-rum...
Segunda voltam as aulas, estou desestruturada T^T Vocês já voltaram?
Espero que gostem desse capítulo e chorem pelo Noahzin!
Beijo, amo vocês!
Anne. ♥



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O caminho até o bloco A não era tão curto, mas por sorte não encontrei ninguém – que pudesse me impedir – então apressei o passo e rezei para que não tivessem colocado alguém de guarda na porta. Na verdade poderia ter me tranquilizado, pois provavelmente não tínhamos ninguém para esta função.

Ao entrar no bloco, parei em frente à porta de acesso as celas para me certificar que lá dentro ninguém estava perambulando – como doente ou errante. Em vista da quietude do lugar, empurrei-a devagar temendo que fosse uma daquelas portas barulhentas, mas por sorte ela apenas estalou baixo por conta das dobradiças.

Pisei rápida, mas silenciosamente pelo andar debaixo, tentando achar Noah em uma das celas. O bloco A certamente não se parecia com o C, estava um pouco sujo ainda porque aquele bloco ficara solitário desde que o grupo original chegara, era mais escuro e algumas celas tinham sangue fresco no chão e nas paredes, o que me fez pensar se nosso numero de mortos havia aumentado de um dia para o outro. E é obvio que havia.

Os doentes dormiam – eu esperava que estivessem dormindo – e outros estavam ocupados demais vomitando sangue para me notar. Todas as celas estavam fechadas, assim se alguém morresse as coisas não poderiam sair do controle. Pelo menos não rapidamente, a vista de que nada que não deveria sair do controle sai até quando temos um plano, quando se trata da sorte atual.

Conclui que Noah não estava em uma das celas de baixo, assim subi as escadas e de longe pude avistar um par de tênis conhecido sobre a cama numa das celas do meio, logo apressei o passo até parar na frente da cela onde o sol entrava por entre as grades porque também estava trancada por fora.

Noah aparentemente dormia – sua camisa se mexia quando respirava, o que foi um alivio –, o sol conseguia atingir seu rosto mais pálido do que nunca (quase numa tonalidade verde) e eu podia ver sua franja colando na testa pelo suor – provavelmente estava queimando em febre. Nunca parecera tão frágil quanto naquele momento, e aquilo realmente me abalou. Havia um balde no pé da cama onde provavelmente ele cuspia o sangue, e a camiseta também estava suja em alguns pontos.

Toquei a trava manual da porta, mas me detive na duvida ao observa-lo por mais alguns segundos. Valia apenas acorda-lo de um cochilo que provavelmente o estava livrando do que sentia fisicamente? Mesmo depois de tudo o que havia arriscado. Escorreguei a mão da trava pronta para sentar no chão e ficar olhando-o por mais algum tempo, mas para minha surpresa ele abriu os olhos.

Não me sobressaltei ou tive alguma reação evidente, fiquei imóvel enquanto ele piscava algumas vezes tentando assimilar a ideia de que sua irmã estava ali vestindo um lenço preto no rosto, olhando-o do modo mais afetado que eu já deveria ter feito.

Hope? – ele perguntou numa voz fraca.

Seus olhos estavam turvos, o verde só conseguiria brilhar de alguma forma por que ele estava lacrimejando, como se a íris fosse uma pedra preciosa brilhando num lago.

– Desculpe por acorda-lo. – falei antes de qualquer outra explicação.

– Não deveria estar aqui. – ele passou a mão na testa para afastar os cabelos – O jardineiro não conseguiu segurar o segredo?

– Hershel me disse. – revirei os olhos – Um segredo impossível de esconder, aliás.

Porque uma hora ou outra eu iria descobrir, por simplesmente não vê-lo com as outras crianças ou Carl não aguentaria guardar o segredo, ou alguma outra pessoa me contaria, como Mika.

Noah queria se levantar, e até chegou a apoiar a mão nos lados da cama, mas logo desistiu e fechou os olhos com frustração e cansaço.

– Eu confiava naquele velhinho, também. – levei a mão à trava da cela de novo, fazendo-o abrir os olhos – Você precisa ir embora, aqui tem um monte de vírus e bactérias do demônio que você não quer chegar perto.

– Não agora, depois de passar por cima de Carl. – então abri a trava e entrei, ele levou a mão ao rosto e balançou a cabeça como se pensasse “essa teimosia acaba comigo” – Bactérias do demônio é uma descrição bem peculiar.

– Precisamos de um exorcista. – ele concluiu olhando para o teto, e eu sabia o que queria dizer, porque ele nunca imaginara que podia se sentir tão ruim assim. E eu nunca havia visto alguém tão ruim assim, na verdade.

Ele não queria que eu ficasse doente, mas certamente não queria tanto que eu fosse embora porque eu sabia o quanto Noah podia ser mais teimoso que eu até nas circunstancias atuais, e naquele momento ele estava aceitando minha entrada. Não passei o trinco de novo, apenas encostei a porta e afastei o balde de sangue de modo que eu pudesse sentar no chão ao lado da cama.

– Como ninguém te impediu? – perguntou mais baixo, me olhando direito agora que estávamos no mesmo nível.

– O conselho decidiu colocar as crianças, incluindo eu e Carl, no prédio administrativo, então estamos perto. – expliquei, ele assentiu.

– O lenço. – ele murmurou com um sorrisinho – Combina com você, é irado.

Toquei o pano preto com desenhos que cobria meu nariz, por baixo eu também mantinha um sorriso, pois até naquele momento ele era capaz de comentar coisas reles como aquela. Não havia percebido antes, mas havia uma foto ao lado do travesseiro dele. Noah percebeu que eu estava olhando e a pegou.

– Lembra-se disso? – virou a foto e eu pude ver ele, mamãe e Harry, na foto que eu havia dado numa das conversas na torre de vigia.

– Lembro até do momento em que a tirei. – falei, relembrando o dia em que sentamos no jardim e a cena em família fora tão adorável (principalmente porque Noah vestia uma pequena camiseta de beisebol) que não pude me conter e pedi para clica-los, dando uma copia da foto para Harry e mamãe depois.

– Eu a coloquei no bolso esta manha. – ele parou para observa-la alguns segundos – Já acordei me sentindo um pedaço de carne em mal estado.

– Não diga isso. – o empurrei de leve – Você continua adorável.

– Não posso fugir disso, você sabe. – ele disse, me fazendo rir um pouco.

Subitamente Noah começou a tossir e apontou o balde que eu havia afastado, então eu o puxei e ele cuspiu um pouco de sangue, o que me assustou o bastante para não dar nenhum nojo. Ele limpou a boca com um pano que eu não havia visto antes, mas também tinha sangue, então voltou a deitar com a cabeça no canto da cama para ficar perto de mim.

– Isso é normal. – ele se sentiu na obrigação de explicar – Sinto que a qualquer momento vou jogar um alienígena para fora e voltarei a me sentir melhor.

– Nem isso, nem vomitar alienígenas são coisas normais. – falei depois de um suspiro, então levei minha mão até os cabelos dele que só estavam mais úmidos na franja mesmo.

– Odeio ficar doente. – ele disse, depois de expirar fundo e fechar os olhos de novo quando comecei a afagar seu cabelo devagar – Nem posso ficar de olho no Carl agora.

Abri um sorriso, mas não foi realmente o que eu queria ter feito, porque vê-lo naquela situação estava fazendo um nó se formar em minha garganta. E pior do que vê-lo doente, era ver que estava começando a perder o animo que sempre fora inabalável, até quando pegara sarampo.

– Ei, vai ficar tudo bem. – disse, querendo acreditar tanto quanto ele nas minhas palavras – A gente já passou por muita coisa...

– Para morrer para essa merda agora. – ele concluiu com palavras sinceras o que eu iria dizer mais gentilmente – Sei como pareço.

– Pode calar a boca? – revirei os olhos fazendo-o rir – Noah, os remédios vão chegar logo...

– Ou eu vou vomitar um alienígena. – ele me interrompeu com sarcasmo.

– É, e isso vai acabar, e ai vai poder conspirar contra o Carl o quanto quiser.

Eu esperava que tivéssemos tempo suficiente para Carl e Noah se aceitarem e perceber o quão irritantemente parecidos eram. Poderiam ser bons amigos e se compreender, mas imagino que mesmo assim ainda iriam se engalfinhar por quase tudo.

– Há mais alguma criança aqui? – perguntei, porque não havia nenhuma embaixo e não parei para observar as celas de cima – Talvez você não precise ficar sozinho o tempo todo.

– Lizzie também adoeceu, mas prefiro ficar sozinho. – o encarei com uma expressão brava – Vou me sentir melhor sem conversas sobre errantes e suas atividade favoritas, porque com certeza ela sabe todas.

– Que bobagem. – ele revirou os olhos – Lizzie não é assim.

– Fale por você. – não sabia de que lado Noah havia puxado tal gênio – Não se preocupe, estou bem assim, ficar sozinho não me perturba.

– Enquanto a Mika? – perguntei com uma sobrancelha erguida, e ele ergueu uma também mesmo que os olhos estivessem entreabertos.

– O que tem ela? – perguntou com curiosidade.

– Ela lhe desejou melhoras, parecia preocupada. – falei com um tom misterioso que fez Noah me olhar com mau humor.

Dava para perceber que ele gostava de Mika significativamente, mas ela parecia não ligar muito para o fato – pelo menos antes da morte de Patrick. Mas Noah não era o tipo que admitia sentimentos e coisas to tipo (lembra-me muito outro alguém) então não havia se aproximado de Mika como o desejado.

– Agradeça a ela. – disse simplesmente – Ela é legal, mas isso não quer dizer que falarei com a irmã dela.

Suspirei e desisti de convencê-lo que Lizzie não era uma pequena psicopata, porque só o cansaria mais – até falar parecia exigir dele –, então ficamos em silencio, o que me deu chance de acalmar os nervos enquanto me ocupava de brincar com o cabelo anormalmente escuro e liso que ele havia herdado de Harry.

– Hope? – murmurei em resposta – Eu não quero que você fique triste, ou algo assim, tudo bem?

Aquelas palavras haviam me pegado de surpresa, mas antes de questiona-lo pensei no que ele estava se referindo, sobre não ficar triste por ele estar doente agora, ou sobre não ficar triste se algo acontecesse depois. Mas ignorei a segunda alternativa – o que não a tornava invalida, infelizmente.

– Por que eu ficaria triste? – falei, mas sabia o que ele queria dizer com aquele tom – Conhece meu modo de encarar as coisas.

– Conheço, mas eu sei que não é assim que está encarando agora. – fechei os olhos e encostei a cabeça na parede – Sei como olha para mim, sei o que imagina.

– Eu estou preocupada, vê-lo desse jeito me perturba. – ele me fitava, mas mantive meu olhar no chão.

Preocupada não era o que descrevia com melhor precisão, mas usei do adjetivo que seria incontestável, pois eu estava evitando os olhos dele justamente pelo fato de que nunca os havia visto daquela forma, tão cabisbaixos, e isso me tirava às palavras que seriam substituídas por algumas lagrimas se eu não fosse forte o suficiente.

– Me perturba também. – ele admitiu – Mas não pode ficar triste.

Ri sem humor e olhei-o nos olhos ao responder:

– Eu sou a esperança, certo? – mostrei a língua para ele, que sorriu.

– Precisam de você agora. – assenti – Você é boa com crianças, Rick deve te achar madura e Carl... Não faz nada direito sem você.

– Você é tão sábio. – ele riu, provavelmente queria gargalhar, mas teve que se conter porque ia acabar tossindo se o fizesse.

– Ele gosta de você, sabia? – não me surpreendi – Estava começando a aceitar isso e pensar em maneiras de inferniza-lo.

Já não era novidade para mim ou qualquer outra pessoa na prisão o que Carl sentia, mesmo quando estávamos brigando, nos espetando com objetos pontiagudos ou nem se falando. Porque logo estávamos lá de mãos dadas, ou próximos demais para parecer só amigos. Mas não queria falar sobre isso agora com Noah, eu tinha pouco tempo e não poderia gastá-lo assim.

– Pare de falar no pretérito imperfeito. – queria dar alguns tapas nele para simplesmente parar de ser tão dramático, mas talvez ele se sentisse assim, não fosse realmente culpa dele – Quer que eu seja otimista, mas está me descrevendo seu testamento.

Gostaria de deixar minha irmã mais velha para Rick Grimes e Daryl Dixon, porque eles são irados. – revirei os olhos.

– Agora sou um bem repartível? – perguntei com uma sobrancelha arqueada.

– Não, mas é tudo o que eu tenho, então preciso deixar em boas mãos. – meus olhos se umedeceram, mas não deixei que ele percebesse.

Noah parecia pequeno demais para entender assuntos complexos ou sentimentais, mas ele aparentemente tratava dessas coisas melhor que eu. De fato, ele só tinha a mim e eu só tinha a ele – tirando a família apocalíptica que havíamos conquistado –, e não estava nos meus planos perde-lo, do jeito que fosse. Não porque não queria ficar sozinha, mas porque era meu dever estar com ele até que pudesse continuar sem mim, então morrer também não era uma opção valida para mim.

– E você é tudo o que tenho também, moleque. – bati na testa dele superficialmente, para disfarçar meus reais sentimentos – Por isso, é bom aguentar firme porque não vou aceitar ser repartida.

Ele me encarou e sorriu, desta vez não desviei os olhos e sorri também. Queria abraça-lo, ficar vigiando-o até que parecesse melhor, mas isso só mostraria o quão fraca eu estava sendo num momento que deveria parecer a melhor pessoa para se apoiar e com quem fazer piadas negras sobre si mesmo.

– Se eu sobreviver, eu nunca mais vou deixa-la ir embora sem mim. – ele disse de repente, e o nó se apertou na minha garganta.

Lembrei-me da primeira conversa na torre, quando ele ainda pensava que eu os havia abandonado friamente e me acusou de tal, com razão, pois ele tinha direito de receber uma explicação. Mas ao ouvi-lo falar assim, imaginei que ele pensava que eu poderia fazer novamente a escolha de deixa-lo sem mesmo dizer adeus.

– Eu não vou a lugar algum sem você. – garanti com a voz afetada – Nunca mais.

– É bom mesmo. – ri do tom autoritário dele e uma lagrima acabou escapando, o que me pegou de surpresa – Mesmo que você não precise de ninguém te protegendo por ai, porque é a mutiladora N°1 de errantes com tacos de beisebol.

– Esse parece um titulo de orgulho. – falei, rindo nervosamente por conta das lagrimas que se acumulavam perigosamente em meus olhos.

Ele concordou, então pareceu pensar um pouco e se virou para me fitar de novo tentando ignorar pelas lagrimas rebeldes que eu secava rapidamente antes que tocassem o lenço.

– Depois que eu for exorcizado – revirei os olhos –, pode me ensinar a usar uma arma? – perguntou inocentemente.

Provavelmente Carol só os havia ensinado a mexer com armas brancas e menores até então, e acho que Noah não tinha tanto apresso por elas porque não poderia estraçalhar errantes como o Wolverine ou corta-los ao meio como fazia Michonne. Como eu ainda estava calada pensando numa resposta digna, ele se explicou:

– Tenho metade da altura de um errante, não os alcanço. – soltei uma risada curta, fazendo-o me dirigir um olhar mau humorado.

– Certo, você me parece mais sensato que Carl para usar uma arma. – ensina-lo não seria um problema, porque uma hora ou outra ele precisaria aprender – Veremos.

Pressenti que ele faria uma piadinha sobre Carl, mas antes que qualquer dos dois falasse, ouvi a porta do bloco sendo aberta e me sobressaltei.

– Precisa ir, agora. – ele murmurou – Não devia ter ficado tanto tempo.

Ele parecia se sentir culpado por ter permitido que eu ficasse, mesmo que não tenha sido nem quinze minutos, seu semblante era doentiamente preocupado.

– Devia, sim. – antes de me levantar beijei o topo de sua cabeça rapidamente – Vai melhorar logo, tudo bem?

– Não se preocupe comigo. – era impossível acatar aquele pedido, mas assenti porque não havia alternativa – Anda, sua fora da lei.

Ri por conta do comentário e afastei-me dele. Sai da cela a passos rápidos, logo a trancando da forma mais silenciosa que pude. Antes de continuar minha “fuga”, olhei uma ultima vez para dentro da cela e sorri para o garoto que sorria para mim também, o sol iluminando seu rosto pálido e seus olhos verdes que agora já não expressavam tanta vivacidade. E eu gostaria de ter dito aquelas duas palavrinhas que não costumamos dizer normalmente – mas sentimos o tempo todo –, mas preferi acreditar que teria tempo para dizê-las depois.

Eu não sabia naquele momento, mas de certo modo aquela não havia sido uma boa escolha.

Enfim me afastei das grades e olhei para baixo, onde o visitante inesperado deveria estar, mas não havia ninguém – pelo menos no campo de vista. Desci a escada à passos rápidos, mas silenciosos, então me detive no andar debaixo e analisei o espaço, que aparentemente não havia ninguém além dos doentes e eu. Mas fui surpreendida por Hershel saindo da porta que levava ao corredor, ele tinha um maço de folhas nas mãos e uma caneca grande, mas não expressou reação ao ver-me.

– Ele está bem? – perguntou, então eu soube que não estava bravo, e não me delataria.

– Está vivo. – respondi – Obrigada por me contar.

– Não era minha intenção, mas de nada. – ele deu um breve sorriso, que eu correspondi – Volte para lá, as crianças precisam de você.

Ao julgar pelo o que Hershel tinha nas mãos, deduzi que ele estava ali para ficar como um médico, coisa que deveria estar fazendo sem o consentimento de Rick – ou de Maggie –, mas eu podia ver nos olhos dele que queria estar ali, que estava fazendo a coisa certa.

– Sim, farei isso. – assenti, mas não me virei para sair – Pode fazer algo por mim?

– Vou fazer o que puder por ele, querida. – ele adivinhou, com um olhar compreensivo – Não se preocupe.

– Se algo der errado... – falei mais baixo com voz sufocada, com medo de que Noah pudesse ouvir – Avise-me, por favor.

Sussurrei a palavra por favor mais algumas vezes, para que ele entendesse o quão imperativo aquilo era. Então ele assentiu enfaticamente e sorriu novamente, para me tranquilizar – o que não deu certo.

Assim, dei meia volta e deixei o bloco A quase correndo, receosa de que encontrasse alguém no caminho da volta. Afastei o lenço do rosto para que não me tornasse mais suspeita – e também porque o lenço já dificultava minha respiração, depois de ter que controla-la por conta das lagrimas que reprimi.

Mas antes de chegar ao prédio administrativo, me deparei com uma figura loira enrolada numa manta se aproximando lentamente – não de mim, mas provavelmente do bloco A. Reconheci como Pat, que por ter sido exposta aos meus riscos que Noah também deveria ter pegado a gripe. Resolvi diminuir a velocidade para ver se ela estava melhor que ele, ou se precisava de ajuda.

– Pat? – ao me notar há alguns passos de distancia, levantou a cabeça e me olhou fracamente (não com desprezo, não indiferente, pela primeira vez).

Hope. – ela abriu um sorriso breve que me pegou de surpresa – Soube do Noah, certo?

– Sim, fui a ultima por mais estranho que pareça. – dei de ombros – Precisa de ajuda?

– Acho que não. – ela balançou a cabeça negativamente – Mas obrigada.

Dirigiu-me mais um sorriso e continuou andando, mas resolvi chama-la porque não havíamos tido oportunidade de conversar até então. Bem, não havíamos exatamente tentado.

– Sinto muito. – ela desviou os olhos para o chão – Sua mãe, eu não tive chance de agradecê-la por tudo o que vocês fizeram pelo Noah.

– Não precisa agradecer. – ela disse com sinceridade – Ele nunca foi um fardo, era até mais útil que eu.

Não soube o que replicar com a inesperada honestidade com que ela admitia aquilo. Não parecia chateada, apesar de tudo.

– Noah é um garoto bem diferente. – ela assentiu – Mas mesmo assim, obrigada.

Sorri para ela, não por cortesia, mas porque finalmente eu podia enxergá-la de verdade, porque ela havia baixado a guarda. Fui assolada por uma pontada de desapontamento comigo mesma, porque Patrícia sempre esteve ali mesmo que se fechasse para mim, e eu não havia tentado ao menos entendê-la. E eu não era assim. Ela parecia estar ruminando sobre a mesma coisa, quando disse:

– Espero que tenhamos chance de nos conhecer melhor, quando isso passar. – assenti.

– Eu também, e espero que isso passe logo. – demos um ultimo sorriso uma a outra, e deixei que ela continuasse a caminhada.

Pensei comigo que talvez, por causa da morte de Ângela, Pat tivesse finalmente se deixado sentir alguma coisa, porque agora parecia ela mesma. Situações extremas mudam as pessoas, isso era uma coisa da qual eu não poderia duvidar mais – e, era uma coisa da qual eu provaria por mim mesma mais cedo ou mais tarde. Naquele momento não imaginava o quão cedo iria ser.

Ao entrar no prédio a porta fez mais barulho do que o esperado, fazendo com que eu me assustasse e logo depois Carl aparecesse correndo com a arma já em mãos e um semblante preocupado. Ao me reconhecer ele soltou o ar que deveria ter segurado pelo susto, então guardou a arma e esperou que eu me aproximasse.

– E então? – perguntou com uma sobrancelha levantada – Noah?

– Está aguentando firme. – respondi com pesar – Não está bem, mas... Ele se esforça para parecer melhor.

– Claro, é como você. – sorri, concordando – Ele ficará bem, Hershel acabou de sair para...

– Ajuda-los, eu o encontrei. – lembrei-me da planta que havia em suas mãos – Vai fazer algum remédio com aquelas folhas, não vai?

– Aparentemente.

Senti-me mais tranquila por saber que Hershel estaria lá, visto que Noah simpatizava com ele de alguma forma, e o remédio que iria fazer provavelmente faria meu irmão se sentir melhor, e o mais importante: iria fazer com que ele resistisse por tempo suficiente para que os remédios de verdade chegassem.

– Estou feliz por termos ele, poucas pessoas se arriscariam assim. – ele assentiu.

Levei a mão ao lenço em meu pescoço para desatá-lo e devolver a Carl, mas ele fez um gesto para que eu parasse.

– Pode ficar com ele. – lembre-me de Noah elogiando o acessório que deveria me proteger ao invés de me deixar irada – Combina com você.

– Obrigada. – dei de ombros.

Teríamos entrado em um silencio constrangedor se uma das crianças – Charlie, o garotinho mais novo da prisão –, não tivesse aparecido no corredor e pegado Carl pela manga da camisa o puxado até a biblioteca novamente.

– Certo, eu já entendi. – ele disse, rindo da autoridade mínima de Charlie.

Tomei a liberdade de rir daquela cena completamente inusitada, então me encaminhei primeiro até a sala onde ficaríamos, que para minha surpresa já estava organizada de modo que poderíamos colocar os sacos de dormir. Ao entrar levei um pequeno susto quando avistei Mika sentada em uma cadeira no canto da sala, completamente sozinha.

– Que susto, Hope. – ela disse, ao me notar ali a observando – Como está o Noah?

Ela estava com uma expressão triste quando eu havia entrado, mas assim que me viu foi como se colocasse uma mascara. Encarei-a por alguns instantes antes de responder.

– Não está tão ruim. – “bem” não se encaixava no status atual de Noah em nenhuma forma – Enquanto a você?

– Eu estou bem, não estou doente. – afirmou, mas pareceu entender perfeitamente do que eu estava falando ao hesitar antes de responder.

– Não é disso que falo. – ela abaixou a cabeça ao perceber que não poderia fugir de mim – Porque não está com as crianças? Não me diga que Carl não notou que você está aqui.

– Não pense isso, ele insistiu para que eu fosse, mas eu quero ficar aqui um pouco. – explicou rapidamente, provavelmente com receio de que eu me chateasse com Carl.

Sozinha? – perguntei com gentileza.

O pai de Mika e Lizzie havia sido um dos mortos, e isso provavelmente tinha haver com o repentino desejo de solidão. Ela apenas balançou a cabeça em resposta, e seus olhos estavam um pouco úmidos, o que a fazia evitar meu olhar enquanto pudesse.

– Sinto muito pelo seu pai. – falei, porque sabia que era o que ela queria ouvir.

– Obrigada. – sussurrou – Também sinto pelo seu.

Talvez a relação dela com o pai não fosse como a que eu havia tido com o meu pai, mas eu sabia como ela se sentia naquele momento, e sabia que nenhuma palavra de consolo podia aplacar a dor.

– Você é forte, isso vai passar logo. – afirmei, fazendo-a abrir um pequeno sorriso – Sei como se sente.

– Forte como você. – assenti, mas me perguntei se realmente era tão forte assim.

– Precisamos ser. – percebi que era melhor deixa-la por algum tempo, ela lidaria bem com a dor sem ajuda. Provavelmente, lidaria melhor do que lidei no começo.

Ser forte já não era uma escolha, era uma forma de vida necessária. Ao pensar nisso percebi que do contrario, eu já estaria morta. Mas naquele momento, depois de ver meu irmão fraco o bastante para não conseguir andar e outras pessoas no mesmo estado, além de sentir em cada brisa o luto que havíamos adquirido em menos de um dia e ver que nossos esforços para afastar os errantes não estavam sendo obstantes, me perguntei o quão forte eu ainda poderia ser uma vez que já havia esquecido como era isso há meses.


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Notas finais do capítulo

QUÃO FORTE NOSSA ROUPE PODE SER??? HORA DE TESTAR.
Gente, sim, é meio que desse jeito que imagino a Hope, COMO VOCÊS IMAGINAM ELA??