Hope for Us escrita por Lady Anne


Capítulo 2
Capítulo 2: As regras da Casa


Notas iniciais do capítulo

Segundo capítuloooo o/
Obrigada a Mrs Dreams dyvosa por ser a primeira a comentar e favoritar!
Capitulo onde o Carl é não tão babaca :D Porque todo mundo sabe que aquela pose só dura até ele ver um pudim de chocolate u.u
Espero que gostem e comentem o que acharam!
Beijos, tudo de melhor sempre!
Anne.

Att:
Capítulo atualizadooo, espero que gostem! Obrigada!
Anne. ♥



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– Quer ajuda com isso? – apontei para uma das bolsas pretas.

– Não precisa, obrigada. – ele negou gentilmente.

Saímos da casa indo em direção ao carro que não estava estacionado muito longe, Rick andava ao meu lado e levava as bolsas cheias como se não pesassem nada, o que me lembrou de meu pai novamente, quando não me deixava carregar coisas pesadas demais mesmo que eu insistisse. Rick também parecia muito jovem e ao mesmo tempo tão velho como ele, o tipo de homem que leva muita coisa na cabeça e nas costas.

– Então, você é um tipo de líder-barra-paizão do grupo? – eu perguntei curiosa, fazendo-o rir.

– Não exatamente. – respondeu – Nós temos um conselho, um grupo de pessoas pra tomar decisões em conjunto, como uma família deve ser.

– Então suponho que é um grupo realmente grande. – desviei os olhos dele e tentei lembrar quando havia sido a ultima vez que estivera com um número realmente grande de pessoas.

– Antes nós éramos poucos, perdemos pessoas, ganhamos aliados, e faz algum tempo que nós abrimos a prisão pra receber outros sobreviventes vindos de uma cidade. – estava explicado porque estava sendo tão receptivo e já tinha até três perguntas formuladas, uma vez que havia aceitado muitos outros no grupo.

– Cidade? – olhei pra ele incrédula.

– Woodbury. Sim, era uma cidade murada, nada de errantes, completamente normal. – havia uma sombra de riso em sua voz, como se estivesse me contando uma história engraçada – Mas eles tinham um Governador, e ele não era uma boa pessoa, estava enganando todos a sua volta, e quando descobriu que vivíamos na prisão ele tentou nos persuadir e depois nos matar para tomá-la, então nós praticamente entramos em guerra.

Aquela história era bizarra, irreal, primeiro porque onde haveria uma cidade limpa de errantes – já que eu entraria para “família”, era bom começar a usar os termos deles – e completamente normal que eu não tivesse encontrado? Segundo, um Governador? Terceiro, um homem que tem uma cidade murada e quer ferrar com um bando de pessoas que moram numa prisão? Quarto, uma guerra? Os homens definitivamente me assustavam ainda, tentando matar os vivos, guerrear com o outro quando nossa guerra diária já era com os monstros que nos perseguiam, querendo mais poder quando poder já não importava.

– Venceram a guerra, certo? – perguntei apreensivamente.

– Vencemos. – ele sorriu.

Viramos a esquina e o carro estava estacionado na frente de um antigo bar trancado por um cadeado, Carl estava encostado na porta do passageiro da esquerda batucando o teto com os dedos e rindo de alguma coisa que eu não fazia ideia do quê, mas provavelmente devia ser algo que a mulher de dreads mexendo no porta malas havia dito.

– Michonne. – Rick chamou pelo que eu achei ser o nome dela, e ela se virou – Hora de ir.

Ela era negra com um estilo diferente do que a gente costumava ver no apocalipse, uma mistura inteligente que combinava com ela e seu físico magro, mas musculoso. Havia uma katana em suas costas, o que me chamou atenção de imediato. Era bonita, mas era intimidadora, principalmente quando te fitava fixamente que foi o que fez comigo quando notou minha presença.

– Essa é a garota que não olha por onde pisa? – ela perguntou com uma voz surpreendentemente agradável para alguém com sua aparência forte.

– Isso mesmo, Hope. – Carl parecia já ter me apresentado, e contive o impulso de mostrar o dedo do meio.

– Sim, eu sou a Hope e normalmente olho por onde piso. – respondi com um sorriso amigável – É um prazer conhecê-la.

– Igualmente – ela sorriu sem mostrar os dentes – Não ligue para o Carl ali, sempre implica com quem ele gosta.

Pude ver Carl semicerrar os olhos, fuzilando-a por trás, e dei um breve sorriso olhando para ele, que não me correspondeu, mas não me fuzilou.

– Bela katana. – ela sorriu de verdade com esse comentário, o que tirou qualquer vestígio de intimidação que eu tinha.

– Obrigada, é uma ótima arma. – Carl observava a cena quieto enquanto Rick colocava as bolsas no carro.

– Nem me diga, perdi uma dessas quando ainda estava com o ultimo grupo. – lembrei-me da katana que havia achado numa casa em uma das buscas, então levado comigo me sentindo uma super samurai, sem saber que nossa relação não duraria muito – Ainda não perdoei aquele errante por isso.

– Um errante? – Carl perguntou levantando a sobrancelha.

– Sim. – aproveitei a oportunidade de olha-lo nos olhos – Cravei minha espada na cabeça dele e ela não quis se soltar, é o que chamo de cabeça dura até o fim.

Michonne riu abertamente, até Rick que estava caminhando para a porta do motorista riu e Carl mordeu o lábio para esconder um sorriso que eu estava esperando ver.

– Sinto muito por sua espada, garota. – ela disse ainda rindo.

– Tudo bem, prefiro tacos de beisebol agora. – dei de ombros.

Ela era a primeira pessoa da prisão que eu havia conhecido depois de Rick e Carl, e não parecia nada má também. Eu esperava que todos fossem assim, e na verdade não imaginava que alguém com uma conduta problemática pudesse conviver com um policial por muito tempo.

– Certo, vamos embora. – Rick chamou já sentado no banco do motorista, então Carl sumiu dentro do carro e pude ver quando ele destravou a outra porta para que eu entrasse, e foi o que fiz.

A viagem inicialmente foi silenciosa, fui no banco de trás com Carl calado, mas estava distraída demais com a paisagem pra ficar desconfortável. Tinha saudades de andar de carro, de poder ver a paisagem passando sem me preocupar, e pensar que não era mais uma sobrevivente andando na estrada e me perguntando quando ela acabaria era algo incrível.

Depois de um tempo Rick disse o dia estava realmente quente e eu me lembrei de que havia água na bolsa, e que anteriormente estava com sede, então tirei a mochila e a abri para pegar a garrafa. Percebi um olhar de Carl sobre mim, e um sorrisinho quando tirei duas camisetas de beisebol tentando achar a garrafa.

– O que foi? – perguntei ofendidamente – Lojas esportivas são as melhores, se quer saber.

– Eu não disse nada. – ele levantou as mãos e voltou a olhar para fora distraidamente.

Peguei a água e quase tive um ataque de felicidade quando finalmente bebi tudo o que havia nela sem culpa, mesmo que estivesse quente, mas me contive e apenas a coloquei de volta no lugar e permaneci em silencio.

– Então. – Michonne cortou o silencio, pude ver seus olhos me encarando do retrovisor – De onde você vem, moça?

– Sandy Springs, Fulton County. – respondi – Acabei chegando a Merewether depois de um bom tempo viajando, e muitos passos.

– Garota da cidade grande. – Rick disse fazendo-me rir – Fulton era um ótimo lugar.

– Era, eu amava viver lá. – lembrei-me de casa, mas não era um momento de nostalgias – E você vem de onde?

– King County. – Carl respondeu sem me olhar, eu apenas assenti, conhecia King County e mesmo tinha amigos lá, mas não comentei.

Michonne não respondeu, e não insisti. Quando Rick informou que estávamos chegando foi a primeira vez em que me perguntei como eles haviam conseguido tomar uma prisão antes, mas não me pronunciei, guardando a pergunta para outro momento que fosse mais adequado. Eles ainda conversaram um pouco e fizeram outras perguntas relevantes.

Preparei-me psicologicamente pra encarar muitas pessoas quando chegássemos, porque afinal, eu era a sobrevivente novata – mesmo que me sentisse veterana no novo mundo –, a pirralha estranha que usava uma camiseta do Texas Rangers no meio do apocalipse. Mas falando sério, lojas de artigos esportivos nunca foram tão adoradas.

Quando pude avistar a prisão eu me sentei perto de Carl disfarçadamente para olhar na janela, ele trocou um olhar rápido comigo antes de se virar de novo. O lugar era realmente enorme e perguntei-me se tudo ali estava realmente livre das pragas, havia muros e grades em volta por todos os lados – isso foi uma visão extremamente reconfortante –, e onde não havia grades havia muito, muito verde. Estranhei quando passamos o primeiro portão, uma garota alta de cabelo curto precisou arrasta-lo para que entrássemos, parecia que ele tinha sido arrancado de lá e depois colocado de volta.

– O que aconteceu com o portão? – perguntei baixinho para Carl.

– Derrubado. – respondeu, finalmente notando o quão perto eu estava.

– Por quê? – perguntei, tentando não encara-lo nos olhos.

– O Governador. – foi só o que ele disse, e eu pude compreender.

– Venceram a guerra, certo? – perguntei apreensivamente.

– Vencemos. – ele sorriu.”

Eu realmente estava curiosa para saber mais sobre o Governador, o jeito como o citavam me fazia imagina-lo como um vilão dos quadrinhos, mas me contentaria só com uma descrição oral, definitivamente não queria que ele nos fizesse uma visita.

Quando avançamos mais pude notar que apesar de seguro, o lugar tinha um punhado de errantes nas grades que outras pessoas estavam eliminando, atravessando suas cabeças com vigas, facas e outras armas brancas, e provavelmente o portão quebrado fora vantagem para que eles chegassem tão perto. Era como se estivessem fazendo uma tarefa domestica, removendo pragas como alguém que corta ervas daninhas.

Do lado de fora dos portões ainda haviam estacas de madeira cravadas no chão, varias cruzadas e armadilhas, eu não entendi pra que serviam até que o segundo portão foi aberto e os errantes avançaram para o carro. Apenas tentaram, porque ficaram presos de forma tão estupidamente fácil que eu quase ri.

– Brilhante. – comentei e vi Carl dar um sorrisinho de canto.

Estacionamos perto de outros carros na grama – e uma moto muito, muito maneira – e desci do carro em um salto. Antes que Rick pudesse chegar ao porta-malas, a mesma garota de cabelo curto que abrira o portão veio ao nosso encontro. Ela me analisava curiosa, e imaginei que receberia muitos olhares como aqueles no dia. Sorri para ela, que me sorriu de volta amigavelmente.

– Maggie, essa é a Hope. – Rick nos apresentou – Nós a encontramos na cidade.

– Como vai, Hope? – ela estendeu a mão, eu apertei.

– Bem melhor agora. – ela parecia ser legal, e bem jovem.

– Tenho certeza que sim. – respondeu, então olhou para Rick – Parece que para cada um que derrubamos aparece mais dois, Rick.

– Eu já estou indo lá. – Maggie assentiu e correu de volta a tarefa – Preciso levar você e essas coisas para o bloco antes.

Ele sorriu e abriu o porta-malas, tirando as bolsas pretas de lá. Carl e Michonne também já estavam fora do carro com as bolsas nos ombros, e estendi uma mão para Rick me passar uma das dele, insistindo quando ele negou uma vez, então finalmente cedendo.

–Duvido você chegar antes de mim. – Carl apostou com Michonne como se fossem melhores amigos.

– Aposto que você tropeça no caminho. – ela disse convencidamente – Agora! – eles saíram correndo como crianças e eu não pude evitar rir com essa cena.

– Eles são uma piada – Rick balançava a cabeça rindo também – Vamos, já perdemos a aposta.

Caminhei ao lado dele de vagar, passávamos pelas pessoas no caminho que o cumprimentavam sorrindo e me olhavam curiosamente, então eu também levantava uma mão em cumprimento tímido.

– Você é algum tipo de herói, certo? – perguntei, divertindo-o.

– Herói é novidade. – ele respondeu – Sou só um fazendeiro agora

– Fazendeiro? – levantei uma sobrancelha, então ele parou e apontou um lugar ao longe.

Não entendi de primeira, mas logo pude enxergar um espaço na grama depois do primeiro portão onde cresciam folhagens, flores e vegetais, e pensei ver alguns porcos e cavalos também, o que me surpreendeu. Talvez ele fosse só um fazendeiro ali, mas para mim era oficialmente o herói.

– Uma vida vegetariana depois do fim do mundo. – comentei com um sorrisinho – Parar de fugir dessas coisas para fugir do colesterol.

– Nem tanto, Daryl caça coelhos, esquilos, veados, e têm os porcos, bacon ainda faz parte do café da manha. – a palavra “bacon” saiu como musica dos lábios dele.

– Quem é Daryl? – perguntei.

– O dono da moto. – olhei a Harley Davidson preta de novo – Vai conhecê-lo mais tarde.

Assenti, e tentei imaginar que tipo de cara pilotava aquela belezinha, e se ele era tão legal quanto ela. Seguia Rick sem saber onde estávamos indo, mas com certeza era para um dos blocos grandes logo na frente do pátio.

– Esse é só o Bloco C, do lado de lá ainda tem o A, B e o D aqui desse lado. – apontou o prédio da direta – Todos ocupados.

– Quando você falou em grupo grande nem eu imaginei que era tudo isso. – arregalei os olhos.

– Ainda é só a metade. – disse, me surpreendendo de novo – Eu deixaria você escolher, mas acho que quer ficar no C, eu e Carl ficamos aqui, e Maggie.

– Vocês são os únicos que conheço, acho que vai ser melhor. – conclui, agradecida por ele pensar da mesma forma.

– Vai sim, e Carl pode te fazer companhia e te mostrar as coisas por aqui. – estava ok com isso também, mas não sabia se o Clint ficaria feliz, então apenas continuei calada.

Ao entrarmos no bloco, já avistei Carl e Michonne tirando os suprimentos da bolsa e arrumando num armário no canto da sala como um tipo de dispensa, já havia muitas coisas e tudo estava organizado, poderiam sobreviver por algum tempo ainda. Surpreendi-me por ver algumas latas de formula para bebês numa estante separada, e até comidinhas próprias para eles.

Eu e Rick colocamos nossas sacolas no chão perto do armário e ele puxou a manga da camisa de Carl.

– A arma. – disse simplesmente, e vi quando Carl, de forma relutante, entregou sua pistola.

– Sem armas de fogo? – questionei-o com certo alivio, mas um pouco relutante também de levar a mão ao coldre, Rick fez que sim.

– Não precisa delas aqui. – respondeu gentilmente – Mas ficam bem guardadas, não se preocupe.

– Tudo bem. – ele e Carl me encaram enquanto eu pegava a arma calibre 45 e checava o carregador, onde ficava a única bala – Bem, eu me dou melhor com as armas brancas.

Entreguei a arma para ele e esperei, porque talvez houvesse mais alguma regra da qual eu deveria saber, mas ele se dirigiu a Carl.

– Eu preciso resolver o problema da cerca, você pode ajudar ela a se instalar? – o rapaz olhou pra mim e assentiu – Obrigado, filho. Fique à vontade Hope, agora a casa também é sua, eu preciso cuidar do terreno, afinal eu sou o fazendeiro, Carl vai te ajudar.

– Tudo bem, boa sorte com as pragas domesticas. – ele sorriu.

– Obrigado, gostaria que essas morressem com inseticida também. – ele se dirigiu a escada, pronto para partir – Carl, seja educado.

– Eu sempre sou. – disse de forma arrogante.

– Rick? – chamei antes que ele desaparecesse – Obrigada de novo.

– De nada. – respondeu um pouco afetado pelo agradecimento inesperado – Até depois, crianças.

Observamos ele sair em silencio, então me virei de volta a fim de ajudar com os suprimentos, me agachando ao lado de Michonne e abrindo a outra bolsa.

– Obrigada. – ela agradeceu quando passei uma lata de fórmula para ela – Esta tudo bem, pode deixar isso ai, você também Carl.

Ele parou com uma lata de picles nas mãos, encarando-a sem entender, então pareceu se lembrar da ordem de Rick e passou a lata para ela, se levantando do chão.

– Eu posso ajudar, sério. – falei animadamente – Não tem mais nada na minha agenda hoje.

Ela riu, e Carl estendeu uma mão para me ajudar a levantar que neguei de primeira, mas depois aceitei quando Michonne disse que dava conta de alguns picles e milho enlatado.

– Vá, dê atenção à garota. – disse a Carl e sorriu de um jeito malicioso.

– Certo. – ele revirou os olhos – Vem comigo, garota.

Eu me permiti revirar os olhos também, porque ele parecia relutante em me chamar pelo nome só para implicar e decidi que se ele queria desse jeito, seria desse jeito então, Cowboy. Comecei a segui-lo, e entramos no bloco de celas – aquilo era a cadeia, mas parecia um lugar tão agradável naquele momento que duvidei – estava iluminada pela luz do dia que entrava por grandes janelas com grades. Carl ainda andava como se o mundo fosse seu, mas sem a arma ele se tornava menos desafiador.

– Bem vinda ao Bloco C – ele se virou pra mim e parou de andar quase me fazendo tromba-lo – Aqui é onde ficam as celas, quartos, como preferir chamar. Têm duas celas vazias desse lado, uma lá em cima, e uma aqui em baixo, você pode escolher.

Pensei rapidamente, procurando prós e contras de uma e outra, mas sinceramente estava me lixando, ter um lugar para dormir só para mim já era algo tão formidável que não importava onde.

– A de baixo. – ele assentiu e recomeçou a andar, parando na frente de uma cela no fundo do bloco.

– Toda sua – ele abriu as grades e indicou pra que eu entrasse – Vizinha.

Passei os olhos pelo pequeno espaço – sem ligar que era pequeno –, tinha um beliche – Deus sabe qual foi a explosão de sentimentos felizes quando vi um colchão aparentemente fofinho me esperando sobre a cama – e uma cômoda de madeira pequena no canto da parede oposta. Era mais do que uma cela, era o lugar perfeito.

Sentei-me na cama de baixo e joguei a mochila no chão, ficando simplesmente parada olhando tudo e mordendo os lábios para conter o sorriso realmente grande que surgiu em meu rosto, Carl estava encostado na entrada da cela olhando de forma intrigada alguma coisa no chão, então cortou o silencio:

Batman? – perguntou e eu o encarei confusa, então segui seu olhar.

Tinha uma revista em quadrinhos do Batman enrolada, saindo do bolso da frente da minha mochila. Peguei-a e desamassei, passando para ele que a apanhou com um olhar diferente dos que eu já havia visto.

– Foi a ultima eu consegui, mas eu prefiro as do Homem-Aranha. – ele levantou as sobrancelhas, surpreso, mas sorriu.

Aquele fora o primeiro sorriso real, dado apenas para mim por causa de um comentário sobre o Homem-Aranha, o que foi muito surpreendente porque era tão bonito sorrindo quanto eu pensava, e isso o tornava tão mais idiota.

– Eu tenho algumas que a Michonne conseguiu. – agora sim ele estava falando como se tivesse quinze anos, e isso me soava muito bem – Prefiro os Vingadores.

– Eu gosto deles também, principalmente do Homem de Ferro. – indiquei o peito como se houvesse um reator ARC brilhando ali – Ele tem estilo.

– Concordo. – ele riu distraidamente, folheando a revista – Sempre me perguntei o que eles fariam agora.

– Stark ficaria na torre, ele tem tudo lá, para que descer? – Carl riu de novo, e seus olhos sorriram exatamente os de Rick. – Vocês estão aqui há muito tempo?

– Não contei, mas já são alguns meses. – ele deu de ombros, então me estendeu a revista – Vamos, vou mostrar o resto para você.

– Tudo bem, mas você pode ficar com ela. – empurrei delicadamente a revista de volta.

– Valeu. – respondeu, surpreso – Vamos.

Levantei-me e voltei a segui-lo pela prisão, me perguntando se a breve conversa sobre quadrinhos que havíamos tido poderia ser o começo de uma aliança.

Nós andamos por algum tempo, ele me explicou onde ficava tudo e como funcionavam, coisas como racionamento de água, onde cozinhavam e onde era o refeitório, e eu conheci muita gente pelo caminho, Carl estava cansado de dizer “Esta é a Hope, encontramos ela na cidade” .

– Você já conheceu a maior parte daqui, ainda tem lá fora. – ele andava com as mãos nos bolsos e a cabeça baixa.

– Seu pai me mostrou a horta. – comentei – Bem legal, tem até cavalos.

– Sim, e as flores, animais, vegetais. – disse sem entusiasmo.

– E porcos. – completei, e aproveitei a oportunidade para tentar fazê-lo rir – Codinome Bacon.

Ele soltou uma risada mais alta que o normal, e eu ri junto, feliz por ter atingido meu objetivo. Fizemos mais alguns trocadilhos com porcos depois disso, ele disse que me apresentaria a Violet, mas eu realmente pensei se queria conhecer o jantar enquanto ainda estivesse vivo. Pobres porquinhos.

Quando ele me apresentou o lugar onde lavavam roupa, do lado de fora, percebi que havia vários bodys de bebê e fraldinhas estendidas num varal improvisado. Parei e toquei em uma peça que já estava seca, notando também que a maioria das coisas era rosa. Carl me olhou curiosamente, e eu expliquei o que estava pensando.

– Tem um bebê aqui, não tem? – perguntei, indicando a roupa.

– Judith. – ele sorriu – Minha irmã.

– Quanto tempo ela tem? – perguntei, e essa era só uma das mil perguntas que se passavam na minha cabeça.

– Deve estar prestes há completar um ano. – deu de ombros.

– Eu não vi a sua mãe, ela não sai com vocês para cuidar da Judith? – perguntei inocentemente, me arrependendo logo.

Carl ficou em silencio, e seu semblante endureceu um pouco. Logo entendi o que havia acontecido. Sua mãe estava morta, e provavelmente não há muito tempo, já que Judith iria ainda completar um ano. Sua ferida estava praticamente aberta e eu havia a cutucado sem dó.

– Eu sinto muito. – desculpe-me prontamente – Não fazia ideia.

– Tudo bem. – ele desviou os olhos – Vamos continuar.

Pensei se aquilo teria sido a mancada oficial que acabaria com os laços de amantes de quadrinhos que havíamos criado antes, mas ele provavelmente estava acostumado em ter que explicar essa história – e me perguntei quando ele se sentiria apto a me conta-la –, ou fingir que não o machucava, porque logo voltou a falar comigo como se nada tivesse acontecido.

– Posso perguntar uma coisa? – balancei a cabeça, permitindo – Lá na casa, quando eu te encontrei, o que teria feito se eu fosse alguém ruim?

– Atiraria em mim mesma. – respondi prontamente, surpreendendo-o – Eu não teria ninguém, então porque continuar lutando quando estava claro que eu perderia essa batalha?

– Perderia? – ele arqueou as sobrancelhas.

– Você tinha um facão e uma pistola carregada, eu tinha uma bala e uma faca média, sem chances. – revirei os olhos.

Ele consentiu e calou, e andamos em silencio de volta a minha cela, e eu notei que ainda não tinha feito uma pergunta, mas hesitei porque eu poderia não ser intima o suficiente, sendo algo pessoal dele.

– Carl? – ele parou de andar e me encarou – Por que não me queria no grupo?

– Não é simplesmente porque era você. – respondeu bruscamente, então se controlou e prosseguiu – Tem muita gente boa aqui, mas não é garantia que tenha mais lá fora, então é difícil confiar.

Finalmente eu tinha respostas, e eu podia compreendê-lo, porque ele não estava sendo um idiota de todo, estava apenas tendo uma postura defensiva completamente comum para aquele mundo. Mas ainda era um idiota, sem duvida nenhuma.

– Entendo. – respondi – Eu pensei que você era mais babaca do que realmente é.

Ele levantou uma sobrancelha e refez a carranca, o que me fez rir sem vergonha alguma, fazendo-o corar um pouco.

– Não sou nada babaca. – respondeu, revirando os olhos.

– Às vezes é. – Michonne apareceu atrás dele sorrindo, ele fingiu ficar ofendido – Eu sou sincera, você sabe.

– Até você? – ele perguntou, deixando de lado a braveza e rindo – Não aceito isso.

Percebi de imediato que o humor de Carl podia ser influenciado por Michonne, os dois realmente se gostavam e era perceptível. Perguntei-me o que fora capaz de uni-los daquela forma, porque sempre existe algo a mais para criar laços com alguém depois do fim do mundo, algo que normalmente envolve sangue ou coisas arriscadas.

– Rick está te procurando. – ela avisou – Terá que deixar sua garota.

– Ela não é minha garota. – corou de novo e deu um soquinho no braço de Michonne – Eu vou atrás dele, a gente vê Texas. – ele levantou o chapéu como um Xerife e saiu andando.

Michonne e eu observamos enquanto ele se distanciava, e provavelmente ela estava pensando o mesmo que eu sobre o modo como ele andava e agia como um pequeno otário, mas continuava sendo uma gracinha em todas essas ações.

– Ele ainda é um babaca. – balancei a cabeça quando ele desapareceu.

– Você descobriu isso sem passar nem um dia com ele, é um recorde. – rimos juntas – Mas Carl é assim, é coisa dele.

– É o jeito que ele encontrou de se defender, não é? – lembrei-me de seu semblante quando toquei no assunto de sua mãe – Acho que todo mundo tem um.

– Qual o seu? – ela perguntou de sobrancelhas erguidas, eu hesitei.

– Otimismo. – dei de ombros – Acho que nem tudo precisa piorar, como agora.

– Não é um dos piores jeitos. – ela comentou – Mas Carl é diferente, você ainda precisa saber de muita coisa.

– Eu sei, os olhos dele não são só bonitos. – lembrei-me do modo como ele me encarara quando nos encontramos – São tristes.

Eu havia acabado de chegar à prisão, conhecia quatro pessoas no total e havia ouvido falar de muitas outras. Havia descoberto bacon, um bebê e um trauma de Carl Grimes. Havia muito que descobrir ainda sobre eles, e havia muito sobre mim que eles não sabiam, mas que por sorte não era nada ruim. Aquelas pessoas eram melhores do que eu imaginara, e aquele lugar não se parecia mais com uma prisão.

Depois que Michonne se foi eu voltei a sentar na cama, e por vários minutos encarei minha mochila preta, sem saber como começar. Eu estava na estrada por muito tempo, eu aprendera a viver sob o sentimento constante de medo e sob o instinto de sobrevivência, e então havia sido salva e estava num lugar seguro onde eu não precisava se quer da faca média em meu cinto.

Eu fora salva, tinha uma cela para colocar minhas fotos – codinome casa –, tinha pessoas boas ao meu redor fazendo coisas praticamente normais, tinha um policial gentil e até mesmo um garoto bonito que implicava comigo e lia quadrinhos. Meus tempos de sobrevivente haviam oficialmente acabado?

Eu era otimista, mas seria uma tola se não pensasse: até quando?


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