Contagem Regressiva escrita por Beatrice


Capítulo 32
Bônus: Reads Mental Health Care


Notas iniciais do capítulo

Oi oi, como vocês estão?
*me escondendo das pedras* É... Então, estou aqui mais uma vez para pedir desculpas por demorar quase dois meses para postar de novo. Não imaginei que o bônus levaria esse tempo para ser escrito. Espero que ainda estejam aqui comigo ^^

Avisos importantes:
— Por ser um bônus, ele não contém nenhuma informação realmente nova, então sua leitura não interfere no rumo da história. Se quiser pular, não há problema algum;
— Há um relato de suicídio, então, se isso é algum tipo de gatilho para você ou você se sente desconfortável lendo, seria melhor pular, sinto muito :c
— Só lembrando que o Jason saiu do hospital há pouco mais de dois anos.

É isso, gente! Uma ótima leitura a todos!



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Cinco anos atrás

 

            O Reads Mental Health Care não era um lugar feliz.

            Não apenas pela aparência, com suas paredes de gesso pintadas em tons de cinza, branco e azul-claro que passavam a sensação de frio onde quer que estivesse, ou as janelas que possuíam grades e sempre pareciam pequenas demais para um ambiente daquele tamanho. Nem mesmo o jardim do lado de fora – um caminho de pedras artificiais que levava a um pequeno campo gramado com uma fonte no centro – ajudava a erguer e acalmar os ânimos.

            A infelicidade presente em todos os corredores do hospital psiquiátrico de Chicago se encontrava no ar. Era quase possível sentir a dor dos pacientes e, pior ainda, era olhar. Todos ali davam a impressão de estarem perdidos de alguma forma. Alguns mantinham o olhar fixo no nada o dia inteiro, outros tinham crises e alucinações tão fortes que precisavam ser sedados.

            Jason presenciou isso pela milésima vez ao ser guiado pelos corredores por dois médicos de volta ao próprio quarto, após mais uma sessão de choque. Os médicos tiveram de sustentá-lo, pois não sentia as próprias pernas. Quando foi deixado deitado na cama, Jason fechou os olhos, mas não dormiu.

            A cabeça pesava e estava leve ao mesmo tempo; sua garganta estava seca e as têmporas, onde os fios eram conectados, ardiam. Sabia que estavam vermelhas e irritadas, vira no reflexo de uma das janelas. Jason deixou a mente vazia enquanto ficava ali, parado, com um zumbido nos ouvidos, incapaz de realizar qualquer movimento.

            Mal registrou o som da porta sendo aberta novamente.

            — Jason Kent? — disse uma voz masculina.

            Jason entreabriu os olhos, apenas para mostrar que estava acordado. O homem que entrara já havia fechado a porta mais uma vez, e vestia roupas típicas de médico, embora Jason não o conhecesse.

            — Eu sou Carter Singleton — o doutor se apresentou, cauteloso, como se não tivesse certeza de que Jason estava ouvindo. Tinha olhos castanhos gentis por trás de óculos grossos, e a pele e o cabelo eram negros. — Gostaria de conversar um pouco com você, se não se importar.

            Jason engoliu em seco e fez força para se sentar. Não queria, mas estava acostumado a obedecer ordens ali; era quase automático fazer o que os outros falavam.

            — Não se esforce — o médico recomendou. Puxou uma cadeira para a frente de Jason e se sentou, apoiando a maleta na mesinha de cabeceira. Era um quarto pequeno, que comportava o suficiente: uma cama, uma mesa e uma cadeira onde Jason fazia as refeições e uma cômoda com, no máximo, três trocas de roupa dadas pelo hospital.

            Carter retirou uma pomada da maleta e se aproximou de Jason para passar em suas têmporas machucadas. Jason se afastou por instinto. Não confiava em médicos, não depois de tanto tempo ali.

            — Vai aliviar a dor — explicou Carter. Suas sobrancelhas se franziram ao ver o estado de Jason, em uma expressão de reprovação pelos métodos utilizados.

            Jason se resignou. Quando terminou de aplicar a pomada, Carter apanhou um estetoscópio e o passou pelo peito e pelas costas de Jason. Disse que queria conversar, não me examinar, o garoto pensou, emburrado.

            Carter pareceu preocupado ao ouvir seu coração, mas não disse nada. Estava claro que aquele ritmo não era natural ou saudável, assim como não o eram a respiração acelerada e os tremores. Ele guardou o aparelho na maleta e se voltou para Jason, cruzando as mãos sobre o colo.

            — Bem, Jason, eu queria me apresentar. Houve uma troca, e eu sou o novo médico responsável por... você.

            Jason não falou nada.

            — Vim aqui para conhecê-lo um pouco — continuou o Dr. Singleton. — Poderia me contar sobre o que você vê?

            — Está tudo na minha ficha — disse Jason. Por que está falando comigo? Por que não pode me deixar em paz?

            — Gostaria de ouvir de você — pediu Carter, que parecia já antever uma resposta como aquela.

            — Por quê? Você vai achar que estou mentindo ou que sou louco do mesmo jeito. Não faz diferença.

            Carter hesitou e se recostou na cadeira. Jason desviou o olhar. Não gostava quando os outros o olhavam daquela forma, principalmente médicos. Já havia repetido a história sobre os números dezenas de vezes, e nada havia mudado. Continuava preso ali.

            — Jason, eu realmente gostaria de conhecê-lo. Talvez, se você falasse com alguém...

            — Pensei que fosse médico, não psicólogo.

            E eu falo com alguém, completou em pensamento. Falo com Sean.

            — Ainda preciso entender o que está acontecendo para conseguir ajudar — disse Carter, sem se abalar. — Eu não sou seu inimigo, Jason. Não estou aqui para piorar as coisas. — Ele fez uma pausa. — Li alguns relatórios, e acho importante fazer exames sérios em relação ao seu coração. Falarei com os outros médicos para evitar os tratamentos de choque. Na sua ficha consta...

            E Carter prosseguiu falando, mas Jason não queria ouvir mais nada. Sabia o que estava na ficha, sabia que tinha alguma coisa errada consigo. Era o que ouvia sua vida inteira.

            Ele levou as mãos aos ouvidos, como se isso fosse bloquear o som. Chacoalhou a cabeça e fechou os olhos de novo, para evitar ver os números laranja acima da testa do médico.

            — Será que dá pra parar de falar? — explodiu. — Eu não quero ouvir, me deixe em paz!

            Carter parou. Jason sentiu seu olhar, e podia imaginar a pena em seu rosto. Parecia que isso era tudo que as pessoas podiam sentir por ele: pena.

            — Jason — Carter começou, calmo —, você sabia que seu avô está tentando tirá-lo daqui? Ele vem pedindo sua alta há algum tempo.

            Jason ergueu a cabeça, os olhos arregalados. O coração disparou, mas dessa vez a sensação foi boa. Alguém ainda tinha fé nele. Seu avô não tinha desistido.

            Carter pareceu ver a esperança em seu olhar tão claramente quanto veria o fundo de um rio de águas cristalinas.

            — Como novo médico responsável pelo caso, eu estou trabalhando nos documentos — disse suavemente, esperando uma reação. — Só preciso da autorização do hospital.

            Jason o encarava sem acreditar.

            — É verdade? Não... não está mentindo para mim? — perguntou. — Meu avô... Ele se lembra de mim? Quer me tirar mesmo daqui?

            Carter assentiu.

            — Sim. O único problema é a burocracia, mas não quero preocupá-lo com isso. Darei um jeito — ele garantiu, dando um pequeno sorriso. Então, voltou a ficar sério. Jason viu que Carter Singleton tinha aquele jeito que algumas pessoas têm, de passar a impressão de estar sempre centrado e controlado, como se estivesse ali para servir de âncora a quem estava à deriva. — Não espero que confie em mim imediatamente. Seria pedir demais. Mas... seria bom ter a sua versão da história. Eu posso ajudar, se quiser ser ajudado.

            Jason ficou quieto por uns momentos, ainda pensando sobre o avô e a possibilidade de sair do hospício. Aquela pequena menção a Lionel fez algo se agitar dentro dele, algo que não sentia há muito tempo.

            Talvez fosse esperança.

            — Você sabe sobre os números — falou.

            — Pode me explicar? Você começou a vê-los após um acidente, não foi?

            — Sim. Eles... mostram o tempo restante até as pessoas morrerem. Dão dor de cabeça.

            Jason narrou brevemente a forma como descobrira o que eles significavam, depois de ver uma senhora morrer na UTI de um hospital. Carter apenas ouviu, sem dar a entender se acreditava ou não.

            — Havia algo mais na sua ficha — disse o médico. — Uma menção a sonhos. — Carter o fitou com atenção enquanto Jason se sentia empalidecer. — Pode falar sobre eles?

            Lentamente, Jason balançou a cabeça de forma negativa.

            Carter pareceu decepcionado.

            — Diga-me, Jason — pediu —, você tem ideia do que quer fazer uma vez que sair daqui? Você será livre. Tem algo em mente?

            — Não parei para pensar nisso. — Jason baixou o olhar e murmurou: — Nunca achei que fosse sair.

            — Sabe há quanto tempo está aqui? — Carter perguntou.

            Jason negou. O tempo passava estranho, ali. Todos os dias eram iguais, e sempre melancólicos, tristes e sombrios. Os anos se arrastavam sem mudanças ou conversas. Jason sabia que muito havia se passado desde que fora internado, mas não conseguia precisar a data.

            Carter lhe lançou um olhar triste.

            — Ontem foi seu aniversário de dezenove anos — informou. Se esperava alguma reação, não recebeu nenhuma. Jason só o encarava, sem expressão. — É importante fazer planos, Jason. Eles nos ajudam a continuar lutando, a seguir em frente. Não é tarde para recomeçar a viver.

            O brilho de uma ideia passou pela mente do garoto, e ele disse, subitamente alerta:

            — Onde fica Yale?

            — Yale? — indagou Carter. — A universidade? Fica em New Haven, Connecticut. Por que pergunta? Tem algum curso que queira fazer?

            — Não. Eu... — Ele parou. Se fosse qualquer outra pessoa, não teria feito o que fez em seguida, mas aquela pontinha de esperança havia despertado uma cadeia de pensamentos e emoções. Afinal, o que um desconhecido poderia dizer que não tinha ouvido antes? Então, ele se levantou, buscou um caderno na gaveta da cômoda e retornou à cama. Esticou o caderno a Carter. — Os sonhos. Estão aí.

            Hesitante, Carter apanhou o objeto e folheou as primeiras páginas. Seus olhos se arregalaram quase imperceptivelmente.

            — Você é muito talentoso, Jason — comentou, provavelmente para não ser tão direto, mas seu tom dizia que estava impressionado. Ergueu os olhos das folhas. — Disse que esses são seus sonhos?

            — Essa garota aparece todas as vezes e — Jason engoliu em seco, contendo o tremor na voz — é assassinada. Da última vez, ela estava em frente a um lugar com o nome Yale.

            — Você quer saber se ela é real.

            — Ela pode ser, não pode? Digo, Yale é uma pista. Se eu conseguir ir até lá, posso descobrir. Eu preciso descobrir. Se ela for real, posso saber o que há de errado comigo. Eu não sonharia com algo que não sei que existe, certo? Não tinha ouvido falar de Yale antes.

            Carter fechou o caderno de desenhos.

            — É um começo, de fato. Talvez você deva ir até Yale, então.

            Carter viu o rosto de Jason se iluminar, mesmo que tenha sido apenas um relance – um relance que fez uma diferença enorme no rosto de um menino tão maltratado. Olhando para ele naquele momento, querendo tanto acreditar que havia uma saída, Carter Singleton tomou para si a responsabilidade de ajudar aquele garoto a ser feliz novamente.


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            — Sean, você já pensou no que vai fazer? — Jason perguntou no dia seguinte, enquanto caminhava com o amigo sob o sol da tarde no jardim.

            Sean pareceu acordar de algum devaneio.

            — Como assim?

            — Quando sair daqui. Você já pensou nisso?

            — O que te faz pensar que vamos sair?

            Jason fez o melhor para ficar calmo, mas a pergunta o incomodou. Aquela esperança ainda era tão frágil que não estava pronta para ser testada. Tudo que o impedira de se tornar vazio como tantos outros era a possibilidade de, um dia, saber se a garota dos sonhos era real, e agora havia uma chance palpável de isso acontecer.

            — Talvez a gente saia — disse. — Não podem nos manter aqui para sempre. — Como Sean ficou em silêncio, ele continuou. — Um novo médico disse que devíamos fazer algum plano. Sabe, para ter um objetivo.

            Os olhos de Sean tinham perdido o restante do brilho desde que Jason o conhecera. Por isso, Sean era, na verdade, o único motivo pelo qual Jason se esforçava para sair do quarto. Não gostava de andar pelo hospital, pois isso o fazia ser obrigado a ver todos aqueles números e presenciar os diferentes casos. Pessoas, no geral, lhe causavam ansiedade. Mas Sean sempre parecia um pouco melhor quando estavam juntos, então ele às vezes fazia as refeições no refeitório e, sempre que podia, caminhava com ele pelo jardim.

            Fazer Sean se sentir melhor não era o que estava acontecendo agora, no entanto. Ele andava mais fechado do que o habitual nos últimos dias, e o assunto, ao invés de alegrá-lo, como Jason queria, pareceu piorar a situação.

            — Você fez algum plano? — Sean perguntou, baixo, sem olhá-lo diretamente.

            — Acho que sim — respondeu Jason, incerto. — Pode ser bom para nós. Podemos pensar em algo juntos.

            — Não. Não tenho para onde ir. Meus pais estão mortos, então também não tenho ninguém.

            — Sean...

            — Esquece isso, Jason. — Sean se afastou e foi na direção das portas interiores. — Eu quero ficar sozinho um pouco. Depois falo com você.

            — Sean, espera, eu não queria... — Jason tentou, mas ele já tinha entrado.


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            Jason desmaiou mais tarde quando retornou ao quarto após uma nova sessão de choque. O coração disparou e respirar se tornou difícil, então a visão escureceu até perder a consciência.

            Foi acordado repentinamente por Carter. O médico o sacudia com cuidado, mas de forma firme, e sua expressão estava abatida. Jason teve um péssimo pressentimento.

            — Jason, desculpe acordá-lo assim, mas é urgente — Carter falou. — Consegue se levantar? Preciso que venha comigo até um lugar.

            — O que aconteceu? — ele perguntou enquanto Carter o ajudava a se erguer. Jason teve de se apoiar nele quando uma tontura o abateu.

            Carter o segurou firme pelo braço e começou a guiá-lo para a porta.

            — Seu amigo, Sean. Ele está chamando por você.

            Chamando por mim? O medo cresceu no peito de Jason. Ele quase tropeçou no corredor, e teve de ser amparado.

            — O que tem o Sean? O que ele tem, doutor?

            Havia apressado o passo na direção que sabia em que o quarto de Sean ficava, e Carter o parou antes que caísse, cambaleante como estava.

            — Jason, tenha calma, está bem? Ele... Sean tentou se matar — disse de uma vez, e as pernas de Jason amoleceram ainda mais. — Ele tentou se enforcar com o lençol, mas o encontraram antes. Está recebendo os devidos cuidados agora mesmo, mas não para de chamar por você. Está muito perturbado. Achamos que talvez você pudesse acalmá-lo.

            Jason fez que sim com a cabeça, sem encontrar a voz. Seus olhos arderam enquanto Carter o levava até o quarto de Sean. Ele engoliu as lágrimas antes de entrar; de nada adiantaria se o amigo o visse assim.

            Sean estava deitado na cama, e havia três médicos ao redor dele. Seu pescoço estava arroxeado, e ele tinha dificuldade em respirar. Emitia ruídos com a garganta, como se quisesse dizer alguma coisa e, com um susto, Jason ouviu que era o seu nome.

            — Saiam de perto dele — disse Jason, aproximando-se da cama e afastando os médicos. — Saiam de perto dele!

            A respiração de Sean se estabilizou quando ele o viu. Os médicos protestaram contra a invasão, mas Carter os manteve longe e Jason pôde se ajoelhar ao lado da cama.

            — Jason — arfou Sean.

            — Estou aqui. — Ele segurou sua mão, o aperto mais forte do que o necessário. Sean estava pálido e, de perto, as marcas no pescoço eram muito piores. — Estou aqui. Você vai ficar bem. Eu sinto muito...

            Ele apertou a mão de Jason com mais força. Em um gesto involuntário, Jason levou a outra mão até os cabelos de Sean para tirá-los da testa.

            — Você v-vai me ajudar? — Sean perguntou, engasgando.

            — É claro que vou — ele afirmou na mesma hora.

            — Promete que não vai me deixar — falou Sean. — Promete que não vai embora.

            Ele sequer pensou em outra resposta.

            — Eu prometo, Sean — disse Jason, sem saber que aquela era uma promessa que não poderia cumprir.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado de saber um pouco mais sobre o tempo do Jason no manicômio. Ficou mais curto do que o normal e do que tinha planejado, mas quem sabe eu não faça outro bônus, se vocês quiserem? É só dizer :3 E não apenas do Jason, estou aberta a sugestões! Não deixem de comentar, significa muito para mim *-*

Beijos e até mais o/



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