Contagem Regressiva escrita por Beatrice


Capítulo 29
Capítulo 28: Através do fantasma


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigada a quem comentou no último capítulo, significa muito para mim! Aos novos leitores, sejam todos bem-vindos e, aos antigos, espero que também estejam gostando!

Como não sei se conseguirei postar até lá de novo, desejo desde já um feliz Ano Novo a todos e que 2016 seja um ano incrível e abençoado! Tenham uma boa leitura *-*



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A sala da casa de Carter estava quase totalmente destruída. O sofá fora virado, a mesinha de centro estava quebrada ao meio e os cacos de vidro do tampo se espalhavam pelo chão, além de outros vasos partidos e caídos.

Rebeca ajudava Carter e Evangeline a desvirar o sofá e arrumar o cômodo. Jason já estava dormindo novamente, sob o efeito de analgésicos. Rebeca havia ficado ao seu lado por um tempo, até ele começar a resmungar coisas sem sentido e, finalmente, adormecer.

— Desculpem pela bagunça — disse aos donos da casa, constrangida. — Prometo que vamos reembolsar vocês por todo o dano.

— Não tem problema — Evangeline disse, tentando aparentar tranquilidade. — Vamos só agradecer por todos estarmos vivos.

— Então... Não acha que estamos loucos agora que sabe nossa história? — Rebeca perguntou, jogando os cacos de vidro no lixo.

Evangeline suspirou.

— Bem, se vocês estão loucos, eu também estou, porque sei muito bem o que vi. Mas vamos falar disso amanhã. Hoje, só preciso jantar e de uma longa e boa noite de sono. — Ela pegou a mão de Carter e começou a andar na direção da cozinha. — Venha, amor. Você também está exausto.

Rebeca ficou um tempo parada depois que eles saíram. Olhou ao redor, pensando no dano que causaram. Até onde aquilo iria se a Fênix não reaparecesse logo? Jason quase havia morrido, e não era a primeira vez que eles se metiam em perigo. E, agora, as vidas de outras pessoas foram arriscadas também.

Balançou a cabeça. Ficar pensando naquilo não ajudava em nada. O que podia fazer, enquanto aguardavam alguma notícia, era pesquisar uma forma de prender os monstros de volta em seus respectivos mundos. Rebeca, assim como Jason, vinha fazendo pesquisas, mas a internet se provara inútil, nesse aspecto. Havia pouca informação, e a que possuíam era imprecisa.

Foi até o quintal, na intenção de espairecer. Sentou-se em uma das cadeiras de balanço que havia ali, olhando para o céu estrelado. Não demorou muito até ouvir um som suave de asas batendo, e então Gabriel estava sentado na cadeira ao seu lado.

— Vocês fizeram bem, hoje — ele falou, no tom sereno que lhe era característico. — Jason se recuperará logo.

Rebeca deu de ombros, preocupada com o estado do namorado.

— Aqueles monstros que vieram eram empousai, não eram? — decidiu por desviar o foco do assunto.

— Sim. São da mitologia grega, seguidoras de Hécate, deusa da magia e dos caminhos. São conhecidas por fazerem trabalhos para ela. Somente cães podem vê-las, por isso ouve-se latidos quando se aproximam.

— Então, devo concluir que Hécate não é um dos deuses que está do nosso lado?

— Acho que não — disse Gabriel. — Mas não sou um especialista no assunto. Meu conhecimento sobre entidades demoníacas segue outro caminho.

Rebeca deu risada, mas não respondeu. Ficou em silêncio por um momento, remexendo na tala que imobilizava seu pulso.

— Eu sei o que está se perguntando — Gabriel disse, baixo.

— Sabe, é? — Rebeca o encarou, com diversão.

— Se Deus existe — continuou Gabriel, sério. — Se eu já O vi. Se Ele está realmente lá, cuidando de todos vocês.

Rebeca balançou a cabeça, de sobrancelhas franzidas.

— Não. Essa é a questão da fé, eu acho: ela não precisa de provas. E eu não quero nenhuma. Há coisas que eu me pergunto mais do que isso — finalizou, fitando-o de forma incisiva.

Gabriel desviou o olhar.

— Temo que não possa lhe dar a resposta que quer. Eu sinto muito.

— Eu sei. Ouvi da primeira vez que disse isso. Mas ainda não responde por que você foi embora.

— Eu não queria ter ido. Estou sendo sincero quanto a isso.

Mas foi, Rebeca pensou. Sete anos, e aquele assunto estava de volta. O passado sempre seria uma sombra pairando sobre eles, escura e carregada, prestes a desabar em um temporal de palavras não ditas.

— Nós passamos o Natal daquele ano juntos, você lembra? — ela perguntou, de repente.

Gabriel sorriu.

— É claro que sim. Você foi para a minha casa e nós tentamos cozinhar, mas quase botamos fogo no apartamento. Então, decidimos sair para jantar fora...

— Só que ficamos presos na neve — Rebeca relembrou, rindo. — E acabamos tendo que nos contentar com alguns pacotes de salgadinhos e água, porque até sua televisão estava quebrada. Acho que anjos não foram feitos para cozinhar. — Ela parou, um pensamento lhe ocorrendo. — Espera aí, vocês sequer sentem o gosto da comida?

— Na verdade, não. Tem gosto de papelão.

— E você já experimentou papelão para saber?

— Não, mas eu sei das coisas. Estou por aí há alguns milênios.

Eles gargalharam, sentindo saudades daquele tempo. Rebeca pedira para passar o Natal com ele para ficar longe da família e de casa, e Gabriel nem hesitara ao aceitar a ideia, contente. Era uma amizade sem cobranças e cheia de companheirismo, que acabara de uma hora para outra.

Ao olhar para Gabriel novamente, porém, Rebeca sentiu como se não o conhecesse mais.

— Foi um bom ano — ela disse tranquilamente, ainda com um sorriso.

A expressão dele se transformou em confusão.

— Foi o ano em que tudo deu errado para você. As corridas de carro, a morte de seu irmão... Como pode ter sido um bom ano?

— Foi bom porque eu te conheci.

Gabriel entreabriu os lábios.

Haveria um longo momento de silêncio entre eles, mas nunca chegou a acontecer. O celular de Rebeca começou a tocar, e ela imediatamente checou o visor: Halee. Levantou-se, sem olhar para Gabriel de novo, e entrou na casa, atendendo a ligação sem pensar duas vezes no que fazia.


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Quase uma semana se passou. Jason já conseguia andar sem muitos esforços, embora suas costelas doessem de vez em quando. Carter finalmente retirou a tala do pulso de Rebeca, que estava novo em folha, e ela não esperou nem um minuto antes de pedir para que ele continuasse com as aulas de tiro. Dessa forma, alguns dias mais tarde, Jason e Rebeca haviam feito grande avanço na pontaria.

Resolveram ficar hospedados na casa de Carter e Evangeline temporariamente, apenas por precaução. O médico queria manter um olho na arritmia de Jason, e a estadia dos dois também facilitava os treinos, que aconteciam sempre que Carter tinha uma folga do hospital.

Evangeline não se envolvia mais naquele assunto. Ficava distante sempre que os via conversando sobre a Fênix ou algo parecido, e não fazia perguntas ou reclamações. Jason sentia que ela não queria tomar parte na história. Certo dia, entreouviu sem querer uma conversa entre ela e Carter, e a moça não parecia nada contente com o envolvimento dos dois, afirmando ser uma situação perigosa.

E Jason não podia discordar. Queria ir embora o quanto antes e deixá-los em paz. Só ficaria até ter a certeza de estar recuperado e ser capaz de defender Rebeca.

Era manhã quando Jason se levantou do sofá após desligar a televisão, enquanto os donos da casa trabalhavam. Já havia comprado tudo o que fora quebrado durante a luta com as empousai, mesmo com os protestos de Carter. Virou-se para ir ao banheiro, mas quase trombou com Gabriel.

— O que aconteceu agora? — foi a primeira coisa que falou ao vê-lo.

— Nada, ainda. Mas Rebeca vai querer sair da cidade sozinha hoje, e isso é perigoso.

— O quê? Rebeca não quer sair da cida...

Jason não terminou a frase. Rebeca chegou à sala naquele momento, trajando um vestido, jaqueta jeans e coturnos, vasculhando a bolsa à procura de algo, deixando claro que pretendia sair.

— Jason, eu preciso... — Ela parou quando viu os dois no centro. — Algum problema?

— Não — Jason respondeu. — Você vai a algum lugar?

Ela mordeu o lábio.

— Na verdade, sim. Vou encontrar Halee em Kansas City. Não aguento mais ficar presa aqui sem poder falar com ela.

— Não pode ir sozinha — disse Gabriel. — É perigoso, alguém pode achá-la. Um de nós deve ir com você.

— Eu vou sozinha, sim — afirmou Rebeca. — Fica só a meia hora daqui e, sem ofensa, eu posso me cuidar sem vocês.

— Mas...

— A escolha é dela, Gabriel — Jason interrompeu antes que o anjo falasse mais. Confiava em Rebeca, e sabia que ela não gostava de ficar parada em um lugar por tanto tempo. — Tem certeza de que vai ficar bem?

— Absoluta. — Ela sorriu. — Só vou precisar das chaves do seu carro.

— Não sabia que tinha carteira.

— Não tenho.

Jason tirou as chaves do bolso da calça e estendeu a mão.

— Sabe que pode ser presa por isso.

— Só se me pegarem, o que não vai acontecer — disse Rebeca, animada. — Também posso ser presa se passar em um detector de metal por levar a adaga comigo, mas isso é o de menos.

Ela esticou a mão com a palma virada para cima para aceitar as chaves. Jason as entregou, mas apertou sua mão.

— Me ligue se acontecer qualquer coisa. Tenha cuidado.

— Pode deixar. — Rebeca devolveu o aperto e o beijou de leve nos lábios. Então, olhou para Gabriel. — Prometa que não vai me seguir nem rastrear se eu não chamar. Preciso de um tempo longe disso.

Ele apenas assentiu e desapareceu. Rebeca deu outro sorriso a Jason e saiu da casa. Destravou a porta do Volvo, sentou-se no banco do motorista e jogou a bolsa no outro banco.

Seu coração acelerou ao ligar o carro e segurar o volante. A última vez que dirigira fora há sete anos, na última corrida que participara. Desde então, mantinha-se longe dos veículos. As memórias fizeram força para retornar, mas Rebeca as afastou.

— É como andar de bicicleta — murmurou para si mesma, tentando se acalmar. Suas mãos tremiam. Finalmente, pisou no acelerador com cuidado e pôs o carro em movimento.

Foi só quando pegou o ritmo da estrada que respirou direito novamente. Prestou atenção para não ir muito rápido, com medo de exagerar, e seguiu o caminho que Halee lhe passara. Talvez não devesse ter aceitado o convite para se encontrarem, mas não aguentava mais ficar sem ver os amigos, como se estivesse excluída do mundo. Sentia uma saudade imensa de Serena e Nilza também. Entristecia-se ao lembrar que não poderia mais vê-las.

— Vejo que ainda sabe dirigir — disse uma voz.

Rebeca quase freou o carro com o susto que levou. Hermes estava no banco do carona, segurando sua bolsa, com óculos escuros e um sorriso sacana.

— Você tem que parar de aparecer assim se não quiser sofrer um acidente — Rebeca disse, recuperando-se do sobressalto. — E é claro que eu ainda sei dirigir, eu sou a melhor. — Deu um sorrisinho convencido. — Afinal, o que está fazendo aqui? Será que não consegue me deixar em paz?

— Ah, você sabe que não. Ainda tenho uma queda por você, eu te falei isso — disse Hermes com charme.

— E eu já falei pra você parar de se iludir, porque não há chance nenhuma de voltarmos a acontecer — Rebeca respondeu, a atenção na estrada.

— Sei, sei. Jason. — Hermes fez um gesto com a mão, como se aquilo não tivesse importância. — Mande lembranças a ele por mim de novo. Sinto pelo que aconteceu com as empousai.

— Tá, mas diga logo por que está aqui.

Hermes suspirou, entediado, e começou a remexer na bolsa de Rebeca.

— Bom, eu nem sei se deveria mesmo estar aqui para dizer uma coisa que pode ser usada contra mim, mas você sabe que não me controlo quando o assunto envolve ajudar meu passarinho.

— Eu não sou seu passarinho, ajudar é uma das coisas que você menos faz e pare de mexer nas minhas coisas!

Ele continuou procurando algo na bolsa.

— Assim você fere meus sentimentos, Beca — lamentou, sem nenhum resquício de mágoa na voz. — A questão é que eu estou aqui para ajudar, por mais incrível que pareça. Posso até estar me arriscando por você. De qualquer forma, vim deixar um recado. Um pequeno feitiço, para ser mais exato. Ele foi banido há muito tempo, proibido de ser dito pela última Fênix por causar muita discórdia, mas, considerando o caos em que estamos mergulhados, não faz muita diferença.

Hermes achou a adaga que Gabriel lhe dera e fez uma careta.

— Ei! Guarde isso — exclamou Rebeca, temendo que alguém visse a lâmina. Estava interessada no que Hermes tinha a dizer, e odiava quando ele ficava enrolando. — Parta logo para o ponto principal.

Ele deu de ombros e guardou a adaga, mas não parou até encontrar um bloco de papel e caneta decentes.

— Até que em fim achei! Honestamente, tem mais papel de bala aqui do que numa loja de doces. — Ele balançou a cabeça, fingindo decepção, e começou a escrever no bloquinho. — Retomando, o feitiço que vou te passar é perigoso, então pense bastante antes de usá-lo. Só para casos extremos, ouça o que estou dizendo.

Hermes ficou sério em um de seus raros momentos. Rebeca tentou espiar o que ele escrevia, mas tudo que pôde ver foram rabiscos.

— O feitiço serve para banir por um tempo alguma entidade divina, sejam anjos ou deuses — Hermes explicou, concentrado. — Por isso é tão perigoso e foi banido. Os que tinham conhecimento dele o usavam para benefício próprio, e a desordem que se instalou foi enorme. Os deuses e anjos começaram a competir entre si para ver quem ficava mais tempo no poder, sem contar as feiticeiras que também queriam ascender.

Rebeca engoliu em seco.

— E eu posso saber como você encontrou esse feitiço?

Hermes sorriu, enigmático.

— Não, não pode. Basta saber que tenho meus contatos. Ser o deus das estradas me permite ter olhos e ouvidos por muitas partes do mundo. Enfim, eu estou te dando o feitiço porque já deve estar claro, a essa altura, que você tem muitos inimigos por aí. E boa parte deles se encaixa entre as divindades. Para lançá-lo, precisa desenhar um desses símbolos com sangue, dependendo a qual mitologia a divindade que quer banir pertença. Então, diga as palavras em uma dessas línguas, seguindo o mesmo raciocínio e acrescentando o nome. Reforço a ideia de não usar o feitiço frequentemente. Ele foi feito para ser lançado por gente poderosa, embora tenha efeito nas mãos de humanos. Isso significa que consome muita energia.

Hermes guardou o bloco de papel e a caneta em um canto da bolsa e fechou o zíper. Em seguida, sorriu de novo para Rebeca.

— Eu ficaria muito feliz se não o usasse em mim. Afinal, estou te fazendo um favor.

Rebeca estava nervosa com aquela informação. Queria ver o que tinha no papel agora mesmo, mas se conteve.

— Vou pensar no caso.

— Eu confio em você, Beca — Hermes declarou, colocando a mão por cima da dela sobre a marcha. — Você é minha maior aposta para a Fênix. Por isso estou te dando esse poder. Sei que vai fazer a coisa certa.

Seus olhos castanho-claros a fitavam com intensidade, tanta que Rebeca ficou desconfortável. Hermes era outra peça inesquecível do passado, e estava ali trazendo recordações. Gabriel e Hermes eram os fantasmas através dos quais vivia. Quando olhava para trás, só podia ver uma cidade de cinzas cobrindo os três.

Ela afastou a mão, pigarreando.

— Tem alguma coisa que você quer me dizer?

O humor retornou ao deus.

— Não, eu não. Eu fico por aqui. Faça boa viagem.

Ele sumiu. Sem barulho, sem fumaça, sem nada. Simplesmente não estava mais ali, e a bolsa de Rebeca caiu no banco de novo.

Ainda era cedo. Rebeca e Halee haviam marcado de almoçar em um restaurante perto do centro da cidade. Rebeca estacionou alguns minutos depois, sem se dar conta do tempo passar. Halee já a esperava numa mesa do lado de fora.

— Beca! — ela gritou e veio correndo abraçá-la.

Rebeca retribuiu o abraço com força, prestes a erguê-la do chão.

— Halee, que saudades! — disse quando se separaram.

— Eu que digo isso! — ela disse, acusatória. — Não fui eu que ficou semanas sem dar notícias depois de sumir de New Haven! Você ficou louca? Por onde andou? Por que não atendeu minhas ligações?

— Vamos sentar, aí eu conto tudo. — Rebeca a puxou para a mesa. O garçom se aproximou, e elas fizeram os pedidos antes de começar a conversa.

— E então, o que está acontecendo? — Halee pressionou.

— Primeiro, antes que me mate, eu sinto muito por não ter te respondido até agora. Sei que fui uma péssima amiga, a pior das piores, e você tem toda a razão em me odiar...

— Ah, eu sempre adorei o seu drama — Halee riu, e Rebeca a acompanhou.

— Eu saí de repente de New Haven porque Jason e eu quisemos viajar pelo país — Rebeca mentiu. Não havia inventado uma desculpa inteira, portanto optou pela meia verdade. — Não avisei porque foi uma decisão de última hora.

— Isso não justifica! — Halee rebateu. — Você nunca esconde as coisas de mim. Podia ter, pelo menos, mandado uma mensagem. A única coisa que recebi, durante quase um mês que você esteve fora, foi um “Estou viva, não se preocupe”. Acha que isso é o bastante?

Rebeca baixou os olhos.

— Não, não acho. Não seria o bastante para mim. Desculpe, eu não queria te magoar.

— Sei que não. — Halee segurou a mão dela. — Nós tínhamos tantos planos para depois da formatura, Beca! Você sumiu. E está diferente. Essa história de viajar pelo país não me convence.

— Mas é a verdade!

— Pode até ser, mas não a verdade completa. — Halee cruzou os braços, com aquela expressão que Rebeca conhecia muito bem. — Sabe que não pode mentir para mim.

Rebeca bufou.

— Talvez eu não possa. Mas será que você pode, pelo menos por enquanto, fingir que não estou escondendo nada e mudar de assunto?

Halee franziu os olhos para ela, em dúvida.

— Contanto que você prometa me contar em alguma hora.

— Um dia, sim. — Rebeca sorriu abertamente. — Agora, me fale de você! Está morando com seus pais de novo, por isso voltou para cá?

— Só temporariamente. Já estou procurando um cafofo só para mim, porque adivinhe! Uma empresa da região me contratou como arquiteta!

— Não acredito! — Rebeca exclamou. — Isso é maravilhoso, meus parabéns! Você merece!

— Obrigada! E tem mais... — Halee fez tom de segredo, e Rebeca sentiu sua felicidade de longe. — Phillip se mudou junto comigo. Vamos começar uma nova vida aqui. Ele está apenas terminando de organizar a mudança de New Haven.

Rebeca ficou emocionada pela amiga. Era tudo o que sempre quis para Halee, e vê-la feliz era o suficiente.

— Halee, isso é demais — disse, sincera.

Halee deu um de seus sorrisos mais bonitos, e não eram poucos.

— E como você está? — perguntou, rondando. — Não precisa dar detalhes, relaxa. Só quero saber se você e Jason estão bem.

— Estamos ótimos. As coisas só estão bem... corridas.

A comida chegou. Elas continuaram conversando amenidades, e Halee contou tudo que havia feito desde a graduação em Yale. Depois do almoço, ela levou Rebeca para visitar a cidade. Foram ao teatro e passaram a tarde no Museu Kemper de Arte Contemporânea, já que ambas eram apaixonadas por arte.

Somente quando estava anoitecendo foi que Rebeca teve de ir embora. Não queria deixar Jason sozinho por muito mais tempo. Ela e Halee se abraçaram mais uma vez do lado de fora do museu.

— Não desapareça de novo, me mantenha informada, ok? — Halee pediu.

— Certo, eu vou me certificar de deixar o celular sempre por perto — garantiu Rebeca. — Até mais, Halee.

— Tchau, Beca.

Rebeca tomou o caminho até o estacionamento para buscar o carro. Andou distraída, abrindo a bolsa para pegar o celular, e sem querer esbarrou com alguém quando virou à direita.

— Desculpe — disse e tentou continuar o caminho, mas a pessoa a interceptou de propósito.

Rebeca a encarou, contrariada. Era uma mulher muito bonita. Alta, de cabelos vermelhos e lábios cheios, com olhos rubros, uma cor que nunca vira antes.

— Hã, com licença, por favor — Rebeca falou, dando um passo a frente, mas foi impedida.

— Ainda não, Rebeca — a mulher falou, sorrindo. — Precisamos ter uma conversa antes. Eu sou a Sloan.

Rebeca empalideceu.

Antes que pudesse reagir, Sloan agarrou seu braço e o mundo se transformou em um borrão confuso. No segundo seguinte, Rebeca se viu, cambaleante, de pé no corredor de uma igreja fechada. Sloan ainda a sustentava pelo cotovelo em um aperto dolorido.

— Eu pensei que seria mais esperta do que usar o celular. Só precisei rastrear o sinal da sua querida amiga por uns dias e voilà!, encontrei quem eu queria.

— O que quer comigo? — Rebeca perguntou, tentando se livrar.

O riso de Sloan foi frio.

— Vejo que já sabe quem eu sou. Gabriel a mantém bem informada, não é? — Ela torceu o rosto em desdém. — Ao menos quanto ao que lhe convém.

Sloan arremessou Rebeca com uma força impressionante. Ela caiu de lado na escada para o altar de mármore, perdendo o fôlego e sentindo uma dor insuportável nas costelas. Sua bolsa voou para longe, meio aberta.

— Já faz um tempo que eu quero te conhecer — disse Sloan, aproximando-se lentamente. — A preciosa Rebeca. Quem todo mundo quer proteger. Aquela que a maioria acredita ser a Fênix. Por que você? — Ela a ergueu pelos cabelos, arrancando um gemido como resposta. — Eu queria acabar com você agora mesmo...

— Não pode me matar — Rebeca disse com dificuldade. — Vocês não podem interferir diretamente.

— Não podemos, de fato. — Sloan intensificou o aperto. — Mas isso não significa que não posso mandar outros para fazer o trabalho, como mandei os serpopardos.

Tornou a jogá-la ao chão com violência. Rebeca se apoiou nos braços para levantar, na intenção de alcançar a adaga, mas ela estava longe, atrás de Sloan. Ficou olhando para o brilho dourado da lâmina, pensando no que faria para escapar. Mesmo que Sloan não pudesse matá-la, Rebeca tinha certeza de que havia muitas opções.

— Não podemos interferir diretamente... — Sloan repetiu, baixo, falando consigo mesma. — Não, não, só Gabriel... Ele pôde cometer um erro e ser perdoado, ganhar uma segunda chance e com você, ainda por cima. — Ela gargalhou, lembrando-se de alguma ironia que Rebeca não entendeu. — Ah, mas isso não vai ficar barato. Essa é a minha vez de ganhar, e Gabriel vai se arrepender de trapacear.

— Como assim? — Rebeca perguntou, mesmo não querendo cair na lábia de Sloan. Estava aterrorizada e sem saída. Precisava arrumar um jeito de sair dali. — O que Gabriel fez?

Sloan olhou para ela, os olhos brilhando vermelhos.

— Você nem sabe toda a verdade, que lamentável. — Fez um tsc, tsc, balançando a cabeça. — É claro que ele não contaria...

Está mentindo, Rebeca queria dizer, mas a frase ficou presa em sua garganta. Não confiava em Sloan, de modo algum, porém... Gabriel escondia alguma coisa, não escondia? O motivo pelo qual havia partido há sete anos sem dizer nada. Algo havia acontecido e ele não queria que ela soubesse o quê.

Rebeca afastou os pensamentos. Aproveitou a distração de Sloan em seu próprio rancor e correu na direção da bolsa caída, pronta para pegar a adaga.

Contudo, Sloan foi mais rápida. Fez um gesto com a mão, e Rebeca agarrou o ar. Sua bolsa apareceu ainda mais distante e, pior, a adaga estava nas mãos de Sloan, que a admirava com ironia.

— Que presente bonito Gabriel lhe deu — comentou. — Acho que Ygor vai gostar dela.

— Não... — Rebeca pulou para pegar a adaga, mas era tarde demais. A arma desapareceu em um piscar de olhos, e tudo o que conseguiu foi ter a nuca apertada novamente por Sloan, que a forçou a olhar para a cruz na parede do altar, onde havia uma estátua de Cristo com os braços abertos.

— Olhe para isso — Sloan exigiu, quase rosnando na orelha de Rebeca. — Você não é digna de ser um símbolo para a ressurreição dEle. Não é digna de ser a Fênix. Vou me assegurar de que não seja.

— Sloan, me matar não fará Ygor ser melhor — Rebeca grunhiu com a dor na cabeça e no tronco pela pancada no mármore. — Isso não é uma competição. Você ainda é um anjo.

Sloan a virou para ela, seus rostos se colando pela proximidade. Rebeca viu um relampejo maligno em seus olhos.

— É uma competição, sim — afirmou em um sussurro. — E vocês vão começar a perder hoje. Isso — ela indicou a igreja com um gesto — é só uma distração. O verdadeiro perigo está indo para a casa do médico nesse exato instante. Você deve conhecê-lo. O nome é Ares.

Sloan sorriu, fazendo o sangue de Rebeca gelar nas veias. O medo a paralisou completamente.

— Até breve, Rebeca.

Asas vermelhas surgiram de suas costas, e um bater delas foi o bastante para levar o anjo embora.

Rebeca caiu de joelhos no chão, apavorada. Então, correu para o celular e para fora da igreja, tentando evitar uma tragédia.


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Notas finais do capítulo

O capítulo ficou bem maior do que o normal, então peço desculpas a quem se incomoda, mas, se eu o dividisse, ele ficaria uma coisinha miúda e ainda mais parada haha. Espero que tenham gostado das interações, principalmente do primeiro encontro entre Sloan e Rebeca. O que acharam de tudo e o que esperam que aconteça agora? Contem-me através do comentário, eu vou adorar saber *-* Críticas e sugestões são muito bem-vindas.

Então, sempre me pediram para mostrar flashbacks do Jason no hospital psiquiátrico, e eu só consegui mostrar beeem poucos até agora, embora tenha muita vontade de mostrar mais. Uma leitora, a Sially, deu a ideia de fazer um capítulo bônus do Jason contando uma parte de como era lá. E aí, o que vocês acham? Gostariam de ler?

Por último, só queria dizer que vou tentar postar outro capítulo no sábado (02/01) porque é meu aniversário hihi. Só não prometo nada ainda. De qualquer forma, se quiserem me deixar comentários e/ou recomendações de presente, eu vou amar *v*

É isso por hoje. Obrigada por ler e feliz ano novo a todos! Até o próximo o/



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