Contagem Regressiva escrita por Beatrice


Capítulo 24
Capítulo 23: Aliados


Notas iniciais do capítulo

Sim, estou postando enquanto posso haha. Não quero me demorar aqui nas notas hoje, então apenas desejo uma boa leitura!



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O destino foi um pequeno hospital em alguma cidade no norte do Missouri. Já era madrugada, e Jason não conseguia mais dirigir direito. Tanto ele quanto Rebeca estavam cansados, machucados e com sono, o que os fez parar para finalmente tratar dos ferimentos feitos pelos tiros dos guardas no centro de pesquisas.

Jason estacionou perto da entrada, já que o hospital não possuía estacionamento próprio. Rebeca guardou de volta o escaravelho no bolso da calça para não se distanciarem dele, mas deixou a arma roubada no banco de trás do carro.

Na recepção quase vazia, aguardaram alguns minutos enquanto a moça fazia uma ficha com seus dados. Inventaram uma história sobre terem sido abordados por ladrões, que foi facilmente aceita para justificar os machucados. Dinheiro não foi um problema; Jason o tinha de sobra para pagar a consulta. Ele estava checando, pela centésima vez, os números de Rebeca quando uma voz familiar exclamou:

— Jason?!

Ele se virou para ver, sobressaltado. Mal pôde acreditar nos próprios olhos. Um homem mais velho, na casa dos trinta anos, encarava-o com a mesma surpresa. Tinha a pele negra, cabelos cacheados e olhos castanhos por trás de óculos redondos. Usava trajes de médico, com direito a estetoscópio e tudo, e segurava uma prancheta marrom. Tinha um daqueles sorrisos que profissionais do ramo têm, largos e calorosos, do tipo que conforta os outros e diz que está tudo bem.

— Carter? — Jason perguntou ao ser envolvido em um abraço apertado. — O que está fazendo aqui?

Carter Singleton se afastou para olhá-lo direito, ainda segurando-o pelos ombros.

— Eu é que pergunto o que você faz aqui. Será que nós só vamos nos encontrar em hospitais?

— Hã... Então, quem vai fazer as honras da apresentação? — perguntou Rebeca, sorrindo e se aproximando deles.

O rosto de Carter ficou lívido quando ele a viu, e Jason temeu que seu queixo fosse atingir o chão pelo choque. Apressando-se para disfarçar a situação, ele logo começou a falar:

— Beck, esse é Carter Singleton. Ele foi um dos médicos que... cuidou do meu caso no hospital psiquiátrico.

Fora apenas pelos últimos anos que Jason permanecera lá, mas haviam se tornado próximos. Carter, ao contrário do restante dos médicos do hospício, quis saber mais sobre o que Jason via e sonhava, por isso sabia toda a sua história, e em nenhum momento o tratara com hostilidade ou negligência, como era o comum do lugar. Mostrara interesse pelo caso, e sempre que podia tentava ajudar. Nunca dissera que acreditava piamente no que Jason lhe contava, tampouco negava o fato; era neutro nesse assunto.

Fora ele quem assinara a autorização de alta quando Lionel fizera sua última tentativa para tirar Jason de lá e permitiu que ele deixasse o hospital. Além disso, Jason também havia lhe mostrado os desenhos que fazia de Rebeca baseando-se nos sonhos.

Rebeca esticou a mão para Carter, animada.

— É um prazer te conhecer, então. Eu sou a Rebeca.

Carter apertou a mão dela, parecendo acordar de um transe. Com certeza a havia reconhecido dos desenhos. Ele lançou um olhar preocupado e, ao mesmo tempo, ansioso e compreensivo a Jason.

— O prazer é todo meu — respondeu a Rebeca.

Ela olhou de um para outro com diversão.

— Algum dos dois vai me contar o que está acontecendo ou eu preciso adivinhar? Quer dizer, eu sei que sou linda, mas percebo quando alguém está me encarando de forma estranha. Na verdade, foi assim que eu comecei a desconfiar de que o Jason estava escondendo um segredo de mim. Eu acabei descobrindo o que era, no final das contas, mas agradeceria se vocês me poupassem o trabalho de pensar mais por hoje, porque já ultrapassei minha cota do dia.

Jason deu risada, tanto do monólogo e da indiscrição de Rebeca quanto da expressão meio assustada que Carter fez. Era fácil se surpreender com o jeito dela nos primeiros minutos de amizade.

— Bem, erhm... — Carter gaguejou. — Vamos para a minha sala, podemos conversar mais à vontade lá enquanto eu cuido desses machucados.

Eles o seguiram até um cômodo no segundo andar, que possuía uma maca para consultas e uma mesa no meio de duas cadeiras a um canto, além de alguns instrumentos e remédios. Era totalmente branca e esterilizada, incomodamente parecida com as saletas do centro de pesquisas arqueológicas.

Jason explicou toda a situação a Rebeca enquanto Carter limpava e suturava o corte na lateral de seu corpo. Para terminar – e depois de pingar um líquido que queimava horrivelmente –, ele cobriu o ferimento com gaze.

— Parece que eu sou quase famosa nesse mundo — comentou Rebeca. — Vou começar a distribuir autógrafos, o que vocês acham?

— Acho que primeiro tenho de cuidar desse ombro — opinou Carter, preparando outro curativo.

— Serve isso também. — Rebeca ocupou o lugar de Jason na maca. Ela estava com uma blusa regata roxa, o que dava livre acesso ao ferimento sem que ela precisasse tirar a roupa, e Jason ficou agradecido por isso. Mesmo que Carter fosse seu amigo e um médico, não lhe agradava a ideia de que visse sua namorada só de sutiã.

— É inacreditável — murmurou Carter após um tempo. Jason também havia lhe segredado todo o contexto da Fênix. Talvez fosse precipitado, mas estava acostumado a contar tudo para ele; era praticamente natural. Quem sabe pudesse ajudar? Além disso, Gabriel nada havia falado sobre manter aquilo em segredo. — Estão me dizendo que tudo isso é real? Não é possível. Os números e os sonhos eu posso até relevar, Jason, mas as mitologias...

— É, eu sei — Jason concordou. — Pelo menos você não pode me achar mais maluco do que já achava, não é?

— Não se preocupe — Rebeca quis tranquilizar o doutor. — Se o momento de negação não passar logo, nós vamos embora de qualquer jeito, aí é só esquecer que um dia te contamos tudo isso.

— Não acho que será tão fácil assim — Carter disse, finalizando o curativo. — Vocês assaltaram uma instituição por um artefato que dizem ser mágico a mando de um anjo. Nem na minha época de policial eu ouvi coisas parecidas.

— Você já foi um policial? — Rebeca perguntou. — Isso é incrível. Por que resolveu mudar de profissão?

Essa era uma pergunta que nem Jason fizera até agora. Ele se sentiu mal por não ter feito o questionamento. Carter se virou de costas, guardando os instrumentos de volta em seus devidos lugares, e parecia um pouco triste ao responder:

— Eu me tornei policial para ajudar as pessoas. Para salvá-las. Mas, quando elas estavam caídas, feridas, eu não podia fazer nada; não sabia o que fazer. Tinha de esperar uma ambulância chegar, e muitos morriam antes disso. Sempre achei que a sensação de impotência é a pior para o ser humano. Foi então que eu entendi onde realmente poderia salvar vidas.

— Uau, isso é lindo — Rebeca falou o que Jason pensava. — E muito altruísta da sua parte.

Carter soltou uma risada.

— Não, são só sonhos grandes demais — disse com modéstia.

— Bom, para fazer as coisas, primeiro precisamos sonhar com elas — Rebeca disse para animá-lo. — E, onde você está, já é mais do que meio caminho andado.

— Falando nisso, como você saiu de Chicago e veio parar no Missouri? — Jason perguntou, curioso.

— Minha família era daqui. Saí do hospital psiquiátrico no mesmo ano que você e decidi voltar para cá e iniciar um novo trabalho aqui. Estava cansado de lá. Eu perguntaria como você está, mas acho que já tive a resposta além do esperado.

— Falando em respostas — disse Rebeca, saltando da maca —, precisamos falar com Gabriel para saber o que fazer agora com o escaravelho. Ele não pode entrar aqui enquanto estivermos com o artefato, então um de nós deveria ir lá fora e chamá-lo.

— Eu posso ir — Jason se ofereceu. Acreditava que Rebeca ficaria mais segura dentro do hospital, junto a Carter. — Você já fez demais por hoje.

— Tem certeza? — ela perguntou, desconfiada. — Eu estou bem, podemos deixar o escaravelho aqui e...

— Tudo bem, Beck, eu cuido disso. Será rápido.

Ela ainda estava pensando se discutiria ou não quando ele a beijou e depois saiu da sala. Jason voltou para o primeiro andar e saiu do hospital, parando em frente à entrada. Olhou ao redor para se certificar de que ninguém estava por perto – não seria bom se alguém visse um anjo aparecendo completamente do nada.

— Gabriel! — chamou, alto, olhando para cima na direção do céu. Ninguém veio. — Gabriel! — ele disse mais uma vez.

Quando, novamente, ficou no silêncio, ocorreu-lhe que talvez o anjo não pudesse ir até ele pois não sabia onde estava. O colar protegia sua localização e a de Rebeca, e eles haviam se locomovido sem avisar a Gabriel aonde iriam. Jason verificou o nome do hospital e chamou de novo, agora dizendo o endereço.

— Gabr...

— Estou aqui.

Jason se virou. Gabriel tinha uma mania muito constrangedora de aparecer perto demais dele, ao que parecia. Ele deu alguns passos atrás por precaução. Uma pena não ter nenhum abajur para usar como bastão dessa vez.

— Nós pegamos o escaravelho — Jason informou.

— Eu sei — disse Gabriel. — E enfrentaram alguns problemas, pelo que eu soube. Uma das câmeras de segurança capturou os rostos de vocês, mas eu já alterei as imagens. Vocês dois estão bem?

Jason assentiu. Não gostava nem queria admitir aquilo, mas ficava aliviado na presença de Gabriel. Nenhum número brilhava acima de sua cabeça, o que tirava uma preocupação constante enorme de seus ombros. Podia se concentrar na conversa ao invés de pensar em quanto tempo a pessoa ainda tinha de vida. Além disso, Gabriel tinha uma aura de calma e tranquilidade que irradiava, engolfando-o. É isso o que os anjos fazem com as pessoas?

Contudo, Jason notou que havia algo errado. O corpo de Gabriel tremeluzia, como se não fosse totalmente físico e pudesse desaparecer a qualquer momento. Seus olhos azuis estavam com um brilho intenso.

— Qual é o problema? — perguntou Jason.

— Nenhum — Gabriel apressou-se em dizer, balançando a cabeça, o que fez sua imagem tremular ainda mais. — É só a proximidade do escaravelho. A energia dos egípcios não me quer por perto. Guarde-o nesta caixa, ela vai impedir que sua magia se manifeste a não ser que seja permitida.

Ele lhe entregou uma pequena urna retangular, de cor marrom-escuro, quase vinho, adornada com símbolos em alto relevo feitos de bronze. Hieróglifos, a linguagem antiga do Egito, Jason deduziu ao segurá-la, admirando o fecho belamente trabalhado. A caixa esquentou em suas mãos, como se reconhecesse seu toque.

— Mantenha o escaravelho seguro — aconselhou Gabriel, entregando também uma chave da mesma cor da urna. — Sem que os quatro artefatos estejam reunidos, a Fênix não renascerá. Vocês não podem perdê-lo.

— Certo — Jason consentiu, mas uma dúvida brotou em sua mente. — Mas como exatamente a Fênix vai escolher o corpo para reencarnar?

— A Fênix tem características e significados muito particulares: ressurreição, esperança, virtude, felicidade, força, liberdade e inteligência. Ela escolherá aquele que se encaixa mais dentro desses traços.

Jason estava prestes a perguntar mais alguma coisa. Porém, antes que o fizesse, ouviu um barulho estranho dentro do hospital, como vidro quebrando, e olhou naquela direção. Gabriel endireitou-se de repente, completamente alerta.

— Você tem que ir, agora — avisou com urgência. — Rebeca está em perigo.

— O quê? Quem está aqui?

— Carregadores. Fazem parte da mitologia egípcia; provavelmente foram atraídos pela presença do escaravelho. Eles pegam alguém, espancam-no até deixá-lo inconsciente, jogam dentro de um caixão e o levam para seu mestre. Nunca perdem a vítima de vista e nunca desistem.

— Como eu os mato? — Jason perguntou, e mal teve tempo de assustar-se com a frieza com a qual a pergunta saiu. Não deixaria ninguém tocar em Rebeca.

— Com qualquer coisa. — Gabriel ficou transparente por um segundo, então estabilizou-se o suficiente para dizer: — Eles são mais humanos do que monstros.

Então, desapareceu por completo.

Jason correu hospital adentro atrás dos carregadores.


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A conversa com Carter estava indo bem até o estrondo de uma porta sendo lançada aos ares no corredor.

Rebeca havia simpatizado com o médico. Ele era uma pessoa de conversa fácil e bem centrado, e ela estava cheia de perguntas sobre suas duas profissões. Ele estava quase começando a compreender toda a história da Fênix e pensar na possibilidade de aquilo ser real após os relatos dela quando ouviram o barulho.

Saíram apressados da sala e foram espiar o corredor. Os outros quartos do hospital estavam vazios, portanto somente eles estavam ali.

— Cadê o Jason? — ralhou Rebeca, baixo, num tom preocupado.

— Onde está? — uma terceira voz falou, espantando-os. Eles viram, saindo de uma porta próxima, dois homens vestindo apenas saiotes com tiras de couro e calçando sandálias. A pele era acobreada, como se fosse metálica. O corpo era bem definido, cheio de músculos firmes, e as cabeças eram raspadas.

— O escaravelho, onde está? — um deles repetiu a pergunta enquanto eles se aproximavam a passos lentos. — Entreguem-no a nós e venham conosco.

— Ah, não — choramingou Rebeca, sentindo o peito afundar com o alarme de “INIMIGO!” ressoando dentro de si. Ela trocou um olhar com Carter. — Volte para sua sala e tranque-a, não saia de lá.

— Mas e você? — ele quis saber, arregalando os olhos.

— Deixa comigo, eu me viro — Rebeca garantiu, embora não tivesse a mínima ideia do que fazer. Sequer sabia o que aqueles caras de saiote eram, quanto mais como se livrar deles sem dar o que queriam ou acabar bem machucada.

— O escaravelho — insistiu o que falara primeiro. — Dê-o para nós.

Rebeca deu um passo a frente de Carter, vendo que eles estavam cada vez mais perto.

— Desculpa, gente. Não vai rolar. Eu não faço acordos com caras seminus. É um código de honra que criei para mim.

— Nosso mestre quer o escaravelho. Não descansaremos até recuperá-lo. Ele não pertence a nenhum de vocês.

Rebeca refreou o impulso de levar as mãos até o bolso da calça para proteger o pequeno objeto. Precisava enrolar até achar uma maneira de sair dali ilesa.

— Mestre? Quem ele é? Aposto que não é meu fã.

— Chega de conversa. Queremos o escaravelho agora.

Eles avançaram, e Rebeca empurrou Carter para dentro de sua sala. Ela começou a andar de costas para trás para não perdê-los de vista, com o coração palpitando de medo. Não podia entregar o escaravelho. Como o conseguiriam de volta assim? Seria todo um esforço jogado no lixo, se bem que era melhor isso do que uma possível morte. Mas isso vai ajudar a Fênix, Rebeca pensou. Não posso entregar.

— Ei! É isso aqui que vocês querem? Então venham pegar, seus palhaços.

Rebeca ficou dividida entre agradecer, rir ou se irritar ao ver Jason do outro lado dos homens de saiote, perto das escadas. Ele balançava uma caixa nas mãos, como se nela estivesse o tão desejado artefato. Rebeca imaginou se “palhaços” era o pior xingamento em que seu namorado poderia pensar; se sim, ela tinha uma lista com palavras melhores que poderiam ser usadas num momento como esse.

Ela franziu o cenho, finalmente optando por irritada com a aparição dele. O que é que ele fazia ali, afinal? Queria acabar morto também? Quem ele achava que era para se meter em perigo? Jason tem que parar de dar uma de herói. Se ele se ferisse ali por uma estupidez, seria ela mesma quem daria uma lição nele.

Rebeca o fuzilou com o olhar. Jason deu de ombros.

Os homens olharam de um para outro, claramente indecisos sobre em quem confiar. A energia que emanava do escaravelho havia aumentado com a proximidade deles, e vinha do bolso de Rebeca. Contudo, os colares deveriam servir para mascarar sua fonte exata, e eles hesitaram.

— Não há tempo para isso — um dos egípcios falou, virando-se para Jason. — Pegaremos o escaravelho de um jeito ou de outro e levaremos os dois conosco para o mestre.

Ambos dispararam, cada um atrás de um dos jovens, numa velocidade muito maior do que se esperaria de caras enormes e pesados. Rebeca deixou que suas pernas tomassem o controle e fugiu dali, correndo até o fim do corredor, pensando que tinha uma sorte gigantesca por estar, mais uma vez, em um caminho sem saída.

Ela era rápida, mas, aparentemente, não tanto quanto um homem treinado para perseguir pessoas. Ele a agarrou pelo braço e a puxou com tanta força que ela escorregou e se desequilibrou por um instante, com a certeza de que ficaria com um hematoma onde ele apertava.

Ele jogou Rebeca contra a parede com violência, fazendo sua cabeça rodar. Deve ter dito mais uma vez a palavra “escaravelho” em tom de ordem, mas ela ouviu apenas grunhidos. Quando ele se aproximou de novo, pronto para espancá-la, Rebeca reagiu no instinto: ergueu o joelho e o acertou na virilha.

Ao que tudo indicava, ele também sentia dor como um humano qualquer, pois dobrou-se sobre o próprio corpo e ficou gemendo. Rebeca aproveitou a deixa e correu para dentro da primeira sala a sua direita, logo em seguida barrando-a com um pequeno armário de utensílios médicos que arrastou. Parou para respirar, vasculhando a sala em busca de algo para se defender. Entrara no que parecia ser um depósito para os equipamentos e produtos do hospital. Havia inúmeras prateleiras e armários, sem contar algumas mesas de metal, tudo cheio com os objetos necessários.

Rebeca acendeu a luz para procurar. O armário não aguentaria muito tempo segurando a porta. O homem já começava a socá-la para abrir, fazendo-a chacoalhar por inteira. Rebeca não era páreo para uma luta corpo a corpo; tirando o fato de ser menor e mais magra, não tinha experiência em combates e nem a força necessária. Não poderia chutar as bolas do homem até ele desmaiar.

Rebeca correu até a prateleira do lado oposto da sala, com uma ideia insana em mente; porém, era tudo o que tinha. Apanhou uma seringa e caçou desesperadamente o que precisava em um armário.

A porta cedeu, caindo com armário e tudo. O homem entrou e foi direto até Rebeca. As mãos dela tremiam loucamente enquanto tentava encaixar a seringa na dose com o líquido que precisava. Tinha acabado de colocá-lo na seringa quando o egípcio a agarrou novamente e a prensou na mesa de metal, onde bateu as costas com um baque dolorido.

— O escaravelho! — berrou.

Rebeca tentou acertar a agulha em seu braço. Ele segurou seu pulso e o torceu até se ouvir um estalo, e ela gritou de dor. A seringa escapou de sua mão, mas ela a pegou com a mão esquerda e injetou toda a dose de K+ no braço do homem. Forçou a agulha quando sentiu a carne resistindo e pressionou a ampola.

Ele estancou imediatamente. Parou onde estava, paralisado, e soltou Rebeca. Ela se afastou o quanto pôde enquanto ele caía, com apenas uma leve convulsão. Depois, ficou imóvel, com os olhos escuros abertos.

Rebeca deixou escapar um soluço acompanhado de lágrimas. Aninhou o pulso direito no peito e sentou no chão, sem forças para levantar. E se, realmente, ele fosse apenas um humano? Poderia servir um mestre egípcio e ter a pele mais resistente e de cor diferente, mas nada o diferenciava de uma pessoa de verdade. Ela havia acabado de matar alguém com uma injeção de Potássio.

O chiado do corpo se transformando em areia vermelha, como acontecera de forma semelhante com os serpopardos, a despertou. Rebeca se apoiou no braço esquerdo para levantar, cambaleante, e saiu da sala, passando por cima da porta rebentada. Caminhou a passos lentos até a sala de Carter. O médico estava saindo quando ela o alcançou. Jason vinha pelas escadas ao seu encontro. Tinha um corte que sangrava no supercílio e um olho roxo, mas parecia bem.

— Rebeca! — ele exclamou e correu até ela, ainda com a caixa de antes nas mãos. Abraçou-a com força, e Rebeca quis retribuir, mas seu pulso latejou mais forte, arrancando-lhe um lamento. Jason se afastou. — Você está bem? O que aconteceu? Onde está o outro carregador?

Rebeca não perguntou como ele sabia que os homens eram carregadores e nem o que aquilo significava.

— Eu... — Engoliu em seco. — Estou bem, sim. Só meu pulso, acho que está quebrado. Você está bem?

Jason meneou a cabeça em afirmação, atento ao ponto em cima de sua testa. Rebeca sabia que ele estava vendo seus números. Ela enxugou as lágrimas e respirou fundo.

— Venham, vou ver como seu pulso está — disse Carter, guiando-os para dentro da sala pela segunda vez na madrugada. — Acho que a polícia está a caminho com todo o barulho que aqueles homens causaram.

Ele fez outro curativo no rosto de Jason e passou uma pomada em seu olho roxo, depois tirou uma chapa do pulso de Rebeca. Jason contou sua breve conversa com Gabriel sobre os carregadores e a caixa. Eles trancaram o escaravelho dentro da urna de madeira escura. Os hieróglifos encrustados nela acenderam com uma luz dourada, que apagou-se segundos mais tarde.

— Não se preocupe, não está quebrado — disse Carter, analisando o raio-X do pulso. — Foi só uma torção. Precisará ficar com ele imóvel durante, no mínimo, dez dias.

Rebeca queria reclamar sobre não poder ficar dez dias sem mexer a mão direita com tudo o que estava acontecendo, mas simplesmente aquiesceu. Não estava com vontade de falar, o que era uma perspectiva assustadora até para si. Ficou calada enquanto Carter enfaixava e imobilizava seu pulso com cuidado após dar alguns remédios anti-inflamatórios e que aliviavam a dor e o inchaço.

Jason notou que algo estava errado e foi até ela, passando um braço ao redor de sua cintura. Ela encostou a cabeça no peito dele, de olhos fechados. Jason nunca fora muito bom em consolar os outros, mas queria mostrar que estava ali para Rebeca a todo custo.

— Quem você acha que é o mestre dos carregadores? — ela perguntou em voz baixa, ainda sem se afastar.

— Não sei. Mas não precisamos pensar nisso agora. Vamos apenas descansar hoje e amanhã continuamos.

Rebeca concordou.

— Conheço um bom hotel perto daqui onde podem passar a noite — disse Carter, esticando um papel com dois endereços. — Amanhã à noite vou estar de folga. Gostaria que passassem na minha casa nesse horário.

Jason aceitou o papel.

— Mas por quê?

— Parece que essa história é real, afinal de contas. — Carter suspirou, o olhar sério. — E vocês estão precisando lutar. Ainda me lembro do treinamento dos anos de policial e fiquei sabendo que têm uma arma. Vou ensiná-los a atirar.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado *-* Me deixem um comentário me contando o que acharam! É realmente muito importante saber o que vocês estão achando da história, dá um incentivo enorme para continuar escrevendo. Sugestões, expectativas, críticas construtivas, fiquem à vontade para me dizer o que quiserem! Não tenham medo, eu adoro conversar e interagir e todos os reviews são bem-vindos :3

Obrigada a todos que leram! Beijos o/

*Uma injeção de Potássio pode, realmente, matar alguém na mesma hora, dessa vez eu não inventei nada haha. Só não tentem testar nos coleguinhas, ok? Acreditem em mim, qualquer alteração nos níveis de K+ no corpo é fatal ;)



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