Malditos Cromossomos escrita por Felipe Arruda


Capítulo 11
Do começo


Notas iniciais do capítulo

Bem meu caro leitor, se você achou que o começo dessa loucura havia começado quando Samuel encontrou Bruno graças a um esbarrão numa pequena cafeteria, sou obrigado a lhes dizer que não foi bem assim que tudo começou. Na verdade tudo começou há sei meses quando Caio descobriu quem era e o mais importante: o que era.
Acompanhe a história do início, até ao ponto onde todos os universos de Malditos Cromossomos finalmente se encontram.



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SEIS MESES ANTES

            As janelas do quarto de Caio estavam fechadas e as cortinas fechadas bloqueavam os raios de sol. O ambiente cheirava a suor, cerveja e fumaça de cigarro. Em cima de uma cadeira estofada e de rodinhas, havia duas carreiras de cocaína. Caio encarava as fileiras há meio minuto. Seus cabelos louros estilo Kurt Cobain estavam caídos na frente de seu rosto, seu pescoço estava sujo de batom roxo e suas roupas estavam jogadas pelo chão do quarto bagunçado.

            O garoto esperou Diana, a dona do batom roxo, cheirar a primeira carreira, a final, ele era um cavalheiro.

            Diana, que usava apenas uma calcinha preta, voltou para a cama desarrumada e encarou o teto. Caio levantou e se sentiu um pouco tonto. Seus pulmões pareciam não querer bombear o ar ultimamente e ele logo entrou numa crise de tosse bastante rotineira.

 – Você está bem? – Perguntou Diana levantando os ombros seus cabelos negros e lisos cobriam parcialmente os seios.

Caio fechou os olhos e respirou fundo.

— Sim – disse ele tentando retomar o controle do seu corpo. Ele andou até a cama e deitou ao lado de Diana. Ambos encararam o teto por alguns segundo, até que Caio quebrou o silêncio.       

— Você precisa ir – disse ele – meus pais devem chegar logo e eles não gostam de você.

Diana riu e subiu em cima de Caio dando alguns beijinhos em seu pescoço e mordidinhas em sua orelha.

— Será que ainda dá tempo da gente fazer mais uma vez? – Disse ela provocando-o.

Caio riu.

— Você sabe que não... – disse ele.

Diana o encarou.

— Não é isso que esse volume na sua cueca está dizendo...

Caio riu e a virou na cama ficando por cima dela. Quando eles estavam drogados faziam o melhor sexo da vida, mas ele tinha coisas a resolver e seus pais realmente fariam uma cena se encontrassem a morena naquela casa.

— É sério – disse ele beijando-a. Caio saiu de cima dela e procurou sua calça Jean. – Você sabe que a gente sempre pode repetir isso, não é?

Diana se deu por vencida e pegou sua camiseta do Green Day fazendo biquinho, em seguida colocou seu short jeans desfiado e calçou as botas. Ela andou até Caio, já dentro de seu jeans, e colocou seus braços ao redor do pescoço dele e o beijou.

— Eu sei o caminho – disse ela pegando a bolsa preta de franjas ao lado do pé da cama. – Te vejo depois.

Caio sorriu e assim que Diana sumiu pelo corredor ele sentou na cama e cobriu o rosto com as mãos.

♦♦♦

Meia hora depois, Caio desceu as escadas da casa onde morava de banho tomado e roupa limpa. Sua mãe, Olga, estava na cozinha americana recém-reformada tirando as compras da sacola e as colocando sobre a bancada.

— Vai sair filho? – Disse ela assim que o viu – eu pensei em fazer um cozido de legumes... – ela pareceu triste e cautelosa – daquele jeito que você gosta.

Caio permaneceu inexpressivo.

— Ele já chegou? – Perguntou.

Olga parou o que estava fazendo e se aproximou do filho. Ela usava uma saia social preta, uma blusa nova e sapatos caros.

— Ele é seu pai – disse ela arrumando o cabelo dele. – Não o trate dessa forma. Isso é complicado para todos nós.

Caio encarou a mãe. Eles diferentes fisicamente. Seus cabelos eram negros e longos e no momento estavam presos num coque no centro da cabeça. Seus olhos eram castanhos e o nariz estreito. A testa pequena e a boca carnuda eram completamente diferentes das dele. Ele nunca havia questionado a diferença na aparência deles, já que Caio se considerava mais parecido com o próprio pai.

­ – Não é tão complicado assim – disse ele. – Eu tenho câncer, não estou com vontade alguma de começar um tratamento e tudo o que eu queria saber antes de morrer é: Quem são meus pais verdadeiros?!

Olga suspirou.

— Eu realmente não sei nada sobre isso – disse ela. – Foi seu pai que apareceu com você e eu concordei com as coisas naquela época... – Ela o encarou. – Por que isso importa agora? Você realmente quer saber quem foi que te abandonou? Quer revirar uma história que pode nem valer a pena?

Caio saiu de perto da mãe.

— É minha história! E então é claro que eu quero saber!

Olga voltou para a cozinha e se escorou na pia ficando de costas para o filho. A cozinha não era muito grande, mas era moderna e sofisticada. As paredes brancas exibiam uma pintura nova e as persianas nas grandes janelas de vidro estavam abertas e tinham vista para um gramado bem aparado e um grande muro. Caio olhou pela janela e encarou o céu entardecido por alguns segundos.

Os armários, Pia e fogão formavam um L na cor branca com detalhes em preto e prata. No final do L havia uma bancada com mesa e cadeiras para possíveis refeições. A geladeira era grande e as luminárias eram chiques e modernas. Tudo estava limpo e organizado, do jeito que Olga gostava.

Caio encarou a cesta de frutas em cima da bancada e respirou com um pouco de dificuldade.

— Eu posso ter irmãos! – Disse ele. – Talvez um irmão gêmeo que cresceu abandonado num orfanato e que precisou morar na rua e esmolar para sobreviver! – Olga virou para encará-lo. – Um irmão que não teve a mesma sorte que eu tive ou as mesmas oportunidades!

— Da onde você tirou uma coisa dessas? – Perguntou Olga.

Caio parou e tentou sugar o ar para dentro de seus pulmões.

— É uma possibilidade – disse ele mais calmo. – Mais eu nunca vou saber por que ele – Caio enfatizou a última palavra – não quer contar nada sobre as minhas origens.

Cansado daquela discussão sem fundamento, o garoto virou as costas e saiu de casa deixando que o ar quente do fim de tarde de Cascavel o atingisse em cheio.

♦♦♦

O taxi deixou Caio a duas quadras de distancia de onde ele queria ir. Ele conhecia bem as regras para poder estar ali e mesmo odiando o fato de ter que andar por ruas cheias de becos escuros e pessoas bem mal encaradas, ele sabia que era um mal necessário.

Ninguém nunca havia implicado com ele por ali. Talvez sua aparência ajudasse. O jeans rasgado era velho, o All-Star vermelho já estava descorado e a camiseta do Nirvana era “comum de mais” para alguém querê-la. Caio não levava o celular quando ia aquela parte da cidade e o pouco de dinheiro que tinha estava escondido na meia. Ele carregava sacolas do mercado na mão direita como sempre fazia quando ia aquele local.

Caio andou as duas quadras até chegar aos fundos de um prédio abandonado onde encontrou um trailer de viagens velho e sujo. Ele bateu na porta de lata três vezes como o combinado.

— Prata é a minha cor preferida – disse ele encarando o mato alto em volta do trailer.

Caio escutou uma rápida movimentação do lado de dento do trailer e em seguida alguém falou.

— Veio a pé?

— Sim – respondeu Caio.

— Alguém te seguiu?

— Não. – respondeu ele. Caio sempre cuidava para não ser seguido até ali por ninguém.

— Celular? – Perguntou a voz do outro lado da porta.

— Em casa – respondeu Caio escorando o braço esquerdo na lateral de metal enferrujada.

Um breve momento de silêncio até que a voz perguntou:

— Passou no mercado?

Caio riu.

— Sim – disse ele. – E paguei em dinheiro, nada no cartão.

A porta se abriu depois de um clique. Caio ergueu a sacola.

— Tem pastel de pizza – disse ele – seu preferido.

— Você me conhece tão bem – disse o garoto ainda parado na porta. Ele usava um jeans velho e uma camiseta preta sem estampa alguma. Os sapatos em seus pés estavam já gastos de mais. Ele era alto e muito magro. Por mais que Caio sempre levasse comida para aquele garoto, sabia que ele não se alimentava direito. Seu rosto era fundo por conta disse o que o deixava com uma aparência sinistra.

Caio encarou o rosto daquele rapaz como se fosse a primeira vez que o visse. A cicatriz, os olhos tristes e o cabelo castanho claro sem corte. Era como se ele estivesse olhando num espelho e vendo seu próprio reflexo.

— E então Demétrio – disse ele – até quando eu vou ter que ficar parado aqui do lado de fora?

Demétrio deu passagem para Caio passar, que entrou no pequeno trailer que possuía uma mesa com duas cadeiras, embaixo do armário de madeira. Um sofá velho e rasgado perto da porta e uma cortina encardida que separava aquele ambiente do outro com um velho colchão no chão. O teto era baixo, mas ambos conseguiam ficar de pé ali dentro.

Caio colocou as sacolas na mesa e sentou no sofá enquanto Demétrio atacou as sacolas. O local era iluminado por uma lamparina no canto da mesa e tudo cheirava a mofo. Na pequena pia no canto, embaixo de uma janela coberta por madeira, havia uma torneira quebrada e como Caio já imaginava, não havia água ali.

— Você conseguiu mais alguma informação? – Disse Demétrio sentado na cadeira atacando o pastel. Ele abriu uma lata de Coca-Cola e deu um longo gole.

— Não. – Disse Caio desanimado. – Meu pai não fala nada e minha mãe já falou tudo o que sabe. – O sofá era desconfortável. – Nasci numa clínica chamada Progênese e meu pai cuidou do restante dos papeis da adoção.

Demétrio partia para o segundo pastel.

— Quer um pedaço? – Disse ele de boca cheia. Caio riu e fez que não com a cabeça.

— Eu já comi – ele levantou – na realidade eu só vim ver como você estava mesmo... Eu vou a uma festa agora, você devia ir junto...

Demétrio não respondeu e caio sabia que aquilo significava um não. Ele não gostava de ver Demétrio tão solitário, o garoto já havia sofrido muito e levava as marcas disso junto com ele, como a cicatriz em seu rosto.

Caio colocou a mão sobre o ombro de Demétrio e disse:

— Eu vou descobrir em que loucura nós estamos metidos e vou te tirar dessa... – Demétrio continuou mastigando, mas repousou a cabeça na mão do garoto que era idêntico a ele. – Eu vou tirar a gente dessa...


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! Deixe sua opinião nos comentários! Beijão :D



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