Imagens do Inconsciente escrita por Marcela Melo


Capítulo 3
Capítulo 03




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Já passava das dez e fazia muito calor quando Samantha acordou. Por ordens da Sra. Carrara ninguém a despertou e, depois de longas horas de sono, ela sentia-se descansada. Vestiu-se com sua habitual saia pregueada e a blusa branca de mangas longas, calçou as meias que iam até seus joelhos e os sapatos colegial. Sentiu-se abafada naquela roupa, mas havia anos que se vestia sempre igual, com o uniforme do colégio. Trançou os cabelos divididos em dois pelo meio e desceu para solicitar a Sra. Lurdes algo para comer.

Ao ver a menina, Lurdes achou estranho que ela estivesse tão bem arrumada, com as roupas bem alinhadas, embora sabia estar muito calor para que estivesse tão vestida. Era setembro e, no Rio de Janeiro, fazia um calor de quase 40 graus. A governanta serviu Samantha um desjejum com frutas, bolo, suco e leite, que agradeceu com um sorriso encantador e, após se alimentar, saiu para olhar mais de perto o quintal.

O jardineiro, Sr. Geraldo, explicou a Samantha, que ouvia com atenção, o nome de todas as flores e árvores que haviam ali, ela perguntava empolgada sobre as cores e o perfume de todas as espécies e, mesmo sem nenhuma prática, gostou de pôr a mão na terra e manusear as sementes, orientada pelo Sr. Geraldo. Embora estivesse sentindo muito calor, sentia-se muito bem e não percebeu que já era hora do almoço.

Samantha havia sentido falta da sua tia, mas não ousou perguntar por ela. Não queria se intrometer nem atrapalhar a rotina do pessoal da casa. Após tomar um banho e almoçar, perguntou a Sra. Lurdes onde havia um serviço de postagem, pois queria enviar uma carta para sua amiga, Amanda, na Alemanha.

— Daqui uma hora eu irei ao mercado, se você quiser, pode vir comigo. Assim passamos pelo correio e você posta sua carta.

— Tudo bem, senhora, desde que eu não vá atrapalhar.

— De forma alguma! Assim você conhece um pouco da cidade, apesar de sua tia estar planejando te levar para um passeio em alguns lugares por aqui.

— Sim senhora. Estarei na biblioteca, quando sair me avise por favor.

Apesar de ser alemã, Samantha falava muito bem o português por influência de sua mãe brasileira. Não tinha dificuldade alguma em articular as palavras e comunicar-se com as pessoas na casa e, mesmo falando com seu sotaque carregado, alemão, pronunciava devagar e se fazia entender claramente.

Enquanto aguardava pela governanta, Samantha aproveitou para conhecer a biblioteca. Se encantou com o lugar bem arejado com iluminação suave e aconchegante. Soube que havia ar condicionado no local, pois sentiu-se confortável com a brusca queda de temperatura. Ela percorreu pelas estantes e viu muitos títulos clássicos que já havia lido, mas também tinha muitos outros que despertou sua atenção e já se programou para ficar no local algumas horas por dia, para desfrutar de todos aqueles livros.

Pouco tempo depois, a Sra. Lurdes apareceu à porta e chamou por Samantha que atendeu prontamente. Pegando o envelope em seu quarto, ambas saíram em uma conversa formal, mas divertida. Passaram no mercado para Lurdes comprar o que necessitava, Samantha divertia-se com o sotaque carioca dos feirantes, que falavam rápido e ao mesmo tempo. Estava muito quente, Samantha sentiu inveja das garotas que estavam em roupas curtas e biquíni na rua, mas por outro lado, corou-se só de imaginar vestida dessa forma. Lurdes a mostrou onde era o correio, ensinou-a como se fazia a postagem, e endereçaram então a carta para Amanda.

Voltaram pra casa, Samantha sentia tanto calor que foi direto para o quarto tomar um banho, nem viu que sua tia já havia chegado. Enquanto tomava banho, pensou se o Brasil inteiro era tão quente e decidiu que só poderia sair de casa se fosse bem de manhã, enquanto o sol ainda estivesse fraco. Ao olhar-se no espelho, percebeu seu rosto vermelho e áspero e, apesar de ter se divertido e se sentido mais livre que em toda sua vida, lamentou-se ter saído sob o sol.

Após se vestir, foi direto para a biblioteca, retirou um livro de José de Alencar da prateleira e sentou-se em uma aconchegante poltrona. Estava entretida com a leitura, fascinada com a literatura quando assustou-se com a figura de Leonardo parada em sua frente.

Leonardo observou Samantha sentada, absorta na leitura, com o rosto corado e os olhos azuis ressaltados pela iluminação do local. Depois se deteve nas roupas e nas tranças de Samantha, percebeu que ela não tem nenhum atrativo, vestida feito uma colegial de doze anos, com os cabelos louros trançados em par. Resolveu ir direto ao assunto:

— Samantha, posso falar com você?

— Sim.

— Olha, não me leve a mal, mas eu não estava preparado para ganhar uma prima estrangeira e... bom, meus pais querem que sejamos amigos, mas eu não vejo como isso pode acontecer. Eu gostaria que você falasse para minha mãe que não gostou dos meus amigos e me achou um saco, apesar de eu ter me esforçado, e não quer sair conosco.

— Como? É para eu dizer que te achei o quê?

— Ah! Um saco, quer dizer uma pessoa chata, desagradável.

— Ah sim. Entendi. Tudo bem. Eu digo a ela.

Samantha voltou a ler sem dar mais atenção à Leonardo que fez menção de sair da biblioteca pensando ter sido mais fácil do que pensara, mas a indiferença de sua prima o incomodou.

— Samantha, está tudo bem? Você entendeu o que eu quis dizer?

— Sim, Leonardo, entendi perfeitamente. Não se preocupe que ficarei longe do seu caminho e farei com que seus pais não o incomode mais com essas questões. Se era apenas isso, posso voltar a ler?

— Sim, claro.

Leonardo saiu da biblioteca um pouco equivocado. Samantha não fez perguntas, não quis saber porque ele não a queria por perto sem nem a conhecer, apenas ouviu o “recado” e continuou sua leitura, como se nada tivesse acontecido.


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Notas finais do capítulo

Revisado em 03/08/14



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