Amizade Colorida escrita por Juh Nasch


Capítulo 13
Jennifer 3.2




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Eu saio bufando de raiva da casa de Leo. Vontade de dar uns socos naquele garoto até ele ficar desacordado. Desde quando ele tinha se tornado tão idiota? Tão ferino com suas palavras? A palavra falsa não saia da minha mente. Parecia que eu tinha levado um tapa.

Abro a porta da sala com força e a bato. Depois me xingo mentalmente, pois sei que minha mãe odeia barulho. Estou aguardando ela gritar ou algo assim. Franzo a testa ao perceber que tudo permanece em silêncio.

—Mãe? —digo adentrando. Olho na cozinha. Nada. Na sala também não tem ninguém.

Subo as escadas. Ela não está no meu quarto, nem no dela. A cada segundo vou gritando mãe pela casa inteira, mas ninguém mais responde. Até que resolvo olhar no banheiro e vejo uma cena que me assombraria pelo resto da minha vida.

Minha mãe está dentro da banheira. Seus olhos estão brilhantes e suas bochechas cobertas de lágrimas. O mais assustador é a cor da água. Vermelha. Vermelha como o sangue dela. Seus braços tem cortes por toda a parte. Eu grito. Grito muito alto, a ponto de pensar que minhas cordas vocais vão estourar. Ela então move os olhos em minha direção, muito lentamente. Ela ainda está viva. Pego o telefone e ligo pra emergência o mais rápido possível.

—Envie uma ambulância agora. É um caso de tentativa de suicídio. Não faça muitas perguntas. —digo rapidamente. Eles tinham que ser rápidos. A vida dela dependia disso. Passei o endereço e eles disseram que em breve estariam ali. Fui para perto da banheira e me ajoelhei ao seu lado. Senti uma fisgada no joelho e vi que tinha me cortado com a ponta de uma navalha. A mesma que ela teria usado.

—Mãe, fica comigo. Olha pra mim. Não durma tá legal? Você tem que ficar acordada. —digo. Repito aquilo mil vezes. E mais mil vezes. Ela não poderia me deixar assim. Não mesmo.

***

Já estou impaciente no corredor. Ando de um lado para o outro. Passo a mão pelo cabelo. Eles levaram minha mãe a cerca de uma hora para dentro daquela sala. Enfermeiras já vieram aqui centenas de vezes, perguntando se elas poderiam me ajudar. Não, não poderiam. Ninguém poderia me ajudar.

Tinham enfaixado meu joelho, e agora eu nem sentia mais dor. Por que ela tinha feito isso? Como poderia ter pensado em me deixar? Quem ela achava que era? Como podia ser tão egoísta? A vida era dela... Mas e eu? Ela não pensou em mim? As lágrimas desciam sem interrupções. Era a melhor forma de desabafar. Minha mente estava tão absorta de pensamentos, que eles já se confundiam na minha mente.

—Jennifer? —escuto uma voz me chamar no fim do corredor.

Me viro e vejo que é Leo, com cara de preocupação, e praticamente correndo em minha direção. Legal! Meu dia agora estava completo.

—O que aconteceu? O que houve? Eu cheguei em casa e disseram que tinha uma ambulância lá. Que você e sua mãe vieram para o hospital. —ele perguntou tudo de uma vez. Algo em sua voz indicava que ela preocupação era sincera.

—Você pode me dizer qual é o seu problema? —pergunto.

—O quê?

—Você me chama de falsa. Me descarta da forma mais dolorosa possível e agora vem aqui, como se nada tivesse mudado? Minha mãe tentou se matar Leo, foi isso que aconteceu. —digo sentando no banco e colocando a cabeça entre as mãos.

Qual era a dele? Ele tava brincando comigo?

Ele se senta ao meu lado e coloca a mão sobre meu ombro. Ele me puxa devagar e quando vejo, já estou em seus braços, molhando sua camiseta com minhas lágrimas.

—Eu sinto muito Jennifer. Vai ficar tudo bem. —ele diz acariciando meus cabelos.

Aquela sensação de d’javu me atingiu de uma forma tão inesperada que pareceu que eu tinha levado um choque. Leo estava novamente me consolando, dizendo as mesmas palavras que disse quando eu tive o coração destruído por meu ex-namorado. Isso fez com que eu se lembrasse de como tudo tinha mudado, e talvez nunca mais voltasse a ser o mesmo. Parecia ter acontecido há anos.

—Eu sinto muito Leo. Não sei o que você viu aquele dia, mas Diego me agarrou e me arrastou até ali. Eu estava tonta quando ele começou a me beijar. Eu tentava me desvencilhar. Mas... Eu sinto muito. —digo soluçando e despejando todas as palavras. Não importava se ele acreditaria ou não.

—Jennifer. Quem tem que sentir muito aqui é eu. Eu fui um idiota por não ter te ouvido. Um infantil por não ter dado a chance de você se explicar. Eu realmente sinto muito por isso e espero que você me perdoe por todas as besteiras que falei. Pode me xingar a vontade agora. Eu deixo. —ele diz.

—Você realmente foi um idiota, um imbecil, um infantil, um mesquinho, um... —ele me interrompe.

—Tá legal. Acho que já esgotamos a lista por hoje. —nós dois sorrimos. Lembro-me então o porquê de estarmos ali e meu sorriso se desmancha.

—Por que ela fez isso?

—Você não me explicou direito o porquê da sua mãe está aqui. Como assim ela tentou se matar?

Explico para ele tudo o que tinha acontecido depois que sai de sua casa.

—Ah, parece que eu já vi isso antes. —ele diz em voz baixa.

—Como assim? —franzo a testa.

—Assim que meu pai e minha mãe se separaram, minha mãe tentou fazer algo semelhante. Mas não teve coragem o suficiente. Quando cheguei em casa, ela estava sozinha. Chorando com uma faca de cozinha na mão. Dizia que ela era insignificante. Que o mundo sem ela seria melhor. Que eu já era um homem crescido e poderia muito bem cuidar de minha irmã. Ela não tinha mais motivos para viver. —o rosto dele se contorce. —Eu tenho pesadelos com isso até hoje. Ver minha mãe chorar já me deixava em desespero, vê-la dizer isso então? Eu conversei com ela. Disse que não era nada daquilo. Que ela era maravilhosa, e que mesmo crescido eu precisaria dela. Depois de alguns minutos ela me entregou a faca e me abraçou chorando.

—Nossa! Você nunca me contou isso. —eu digo pasma.

—Ela pediu para que eu não comentasse com ninguém. Nem mesmo com a Letícia. —ele diz olhando para o chão.

Ficamos os dois num longo silêncio por um tempo.

—E então... Você não vai me contar o que tem feito ultimamente? —pergunto.

—Não é nada de interessante.

—Então por que tem chegado em casa tão tarde?

—Vejo que a conversa hoje mais cedo rendeu em?

—Sua mãe e irmã estão preocupadas com você.

—Depois da festa eu fui para casa aquele dia. Alguns dias depois eu comecei a ficar com aquela garota, a Patrícia. Era principalmente para passar o tempo e esquecer outra pessoa. —ele me olha. —Hum, mas ela adorava festas e com minha mãe me enchendo a paciência a cada segundo e meu pai que insistia em me procurar, eu evitava ficar em casa o máximo possível. Chegava em casa tarde, e muitas vezes bebia. Fazia parte da diversão, como dizia Patrícia. —ele para olhando para o chão e respirando fundo antes de prosseguir. —Mas fiquei sabendo que eles faziam algumas coisas erradas, como fumar e até mesmo furtar pequenas coisas, tudo por diversão. Hoje mais cedo, depois da escola, fui até a casa dela para acabar com tudo. Ela fez um escândalo, dizendo que me amava e que eu não poderia fazer isso com ela. Mas eis que fiz, e quando chego em casa me deparo com você na minha cozinha. —ele sorri.

—E como já estava estressadinho, tratou de descontar o resto da raiva que sentia na ex-melhor amiga?

—Ah, você não é minha ex-melhor amiga. Quando vira melhor amiga, é para sempre melhor amiga. Mesmo se eu virar um delinquente sem causa.

—Então ainda somos amigos?

—Uhum. —ele diz.

Eu o abraço com força. Eu poderia me contentar apenas com sua amizade, como era antes. O problema é que nada era mais como antes.


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