Presos no Walmart escrita por Lua


Capítulo 1
A culpa é dela!


Notas iniciais do capítulo

Primeiro seddie, baseado no meu sonho de ficar presa em um hipermercado. Boa leitura.



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Quando as notícias começaram a se espalhar, eu realmente não acreditei. Quer dizer, ninguém acreditou realmente. Essas histórias de cometa cair na terra, calendário asteca (ou inca sei lá), fim do mundo e tudo o mais não me impressionavam. Eu estava no meu recém comprado apartamento, preparando o único tipo de alimento que eu ainda tinha na geladeira. Bacon. Pelo menos não recebo visitas, porque a Shay está em algum lugar do mar com o pai dela, o Spencer em alguma exposição pela Europa, e o Benson... Bem, em Harvard cursando alguma coisa relacionada à tecnologia.

Nos últimos meses eu havia me concentrado em não pensar neles por um tempo. Carly e a Zebra Humana. Eu amo minha amiga de verdade, ainda a considero uma irmã, mas desde aquele beijo de despedida eu tenho uma conversa pendente com ela. Precisava ter se despedido beijando a boca do MEU nerd? Certo, nós havíamos terminado, mas ninguém esquece um amor assim tão depressa. Consideração mandou lembranças! E quanto ao Freddalupe? Eu só não usei a minha meia de manteiga nele porque estava triste demais por estar vendo minha melhor amiga e meio mãe indo embora. Mas porra, no mesmo dia em que ele “comemorou” por ter beijado a Carly, ele havia ligado pra mim e questionado se eu queria voltar com ele. Óbvio que eu queria. Mas ele tinha que perguntar por telefone? Tava pensando que eu era atendente de telemarketing?

Enfim, eu não pensava muito em ninguém. Depois que a Carlotta foi embora, eu acho que fiquei meio perturbada e até tentei substituir ela por uma retardada. Porém, numa belíssima manhã de sol enquanto Cat cantava no chuveiro, eu percebi a idiotice que eu estava fazendo. A ruiva não era uma das pessoas com quem eu faria amizade, eu bateria nela por ter a voz irritante e se fantasiar de unicórnio e espalhar purpurina por aí. Não nego, tivemos momentos muito divertidos, mas, qual é? Eu sou Sam Puckett! Não uma Barbie Butterfly. Voltei para Seattle e arranjei um bom emprego no melhor restaurante local, e em menos de um ano, eu estava quase promovida à gerente, iniciando um curso administrativo. Sem ter muito com o que gastar, exceto com comida, faculdade e algumas saídas ocasionais, eu investi no meu apartamento.

Eu havia me mudado há pouco tempo, questão de dois dias, mas a preguiça me impedia de arrumar as minhas coisas. Os móveis estavam cada qual no seu devido lugar, mas o que deveria estar ocupando os móveis continuava dentro das caixas de papelão espalhadas pela minha sala de estar. Fritando meu bacon, vestindo um short curto e camisa de manga comprida e capuz da PearPhone, descalça, os cabelos num coque frouxo, eu ouvia os noticiários da TV quando a reportagem sobre um veterinário bem intencionado foi interrompido a TV emudeceu. Apagando o fogo no ponto certo, deixei meu bacon douradinho sobre a mesa e fui verificar o eletrônico. A tela estava escura, e da parte inferior começaram a subir letras, como créditos.

‘Estados Unidos da América, sentindo-nos esmagados por ameaças que o governo tenta ocultar, o lado oculto da América do Norte mostra-lhe a face vingativa. Contemple o esplendor da morte perante seu patriotismo falso que incentiva a nossa juventude a morrer por suas causas sem ganhar as suas próprias; observe nossa resposta às suas armas bélicas e veja o resultado delas, por nossas mãos. Para sentir em seu sangue o medo com que coage seus subordinados, e conhecer na pele clara o peso do preconceito contra as demais cores. Por ostentar-se potência a custo de muitas mortes, assista sua queda por seus próprios braços. A principal base militar, onde estavam encerrados os seus piores armamentos, foi salteada ontem à noite. E seus brinquedos já estão sendo colocados em diversos pontos do seu solo tão precioso. A bomba de Hiroshima será apenas um ponto na história comparado à festa que teremos a partir do meio dia. Aprecie suas últimas horas de glória, e para melhor aproveitar, estaremos cortando todas as comunicações e inutilizando seus satélites. Em uma hora, será cada um por si. Tenham um bom dia.’

A apresentação voltou ao normal depois disso, mas eu estava boquiaberta com uma espátula na mão, sem conseguir mover um músculo. Isso não pode estar acontecendo. Quer dizer, deve ser uma brincadeira de mau gosto. Olhei no relógio, eram oito e meia da manhã e meu estômago roncando por alimento me fez fazer o caminho para a cozinha automaticamente. Comi como um robô, meio em choque, a cabeça em branco e os olhos desfocados. Mas meu celular começou a reproduzir Breaking the Habit de Linkin Park e sacudindo a cabeça eu atendi sem olhar o número. Era meu chefe, me avisando para ficar em casa, não abriríamos hoje por precaução. Recomendou que eu procurasse algum abrigo de bombardeio, mas eu nem sei onde encontrar um. Desliguei o celular e a música recomeçou instantaneamente. Olhei o visor, e a palavra Nerd me deu um tapa de realidade que me impediu de atender o celular. Estávamos com uma ameaça terrorista nas costas e se fosse verdade tudo estaria um caos nas próximas horas. O celular recomeçou sua ladainha e eu atendi logo.

-Sam, onde você está? – Ele berrava ao telefone para ser ouvido, pois o local onde ele se encontrava estava extremamente barulhento.

-No meu apartamento. – Respondi confusa.

-Não saia daí, acabei de desembarcar no aeroporto. Estou vindo de Cambridge para passar as férias aqui, e estava buscando minhas malas quando vi o anúncio na televisão. Estou indo praí. – Despejou o nerd com voz autoritária.

-Ô, ô Benson, escuta! – Falei revoltada. – Primeiro: não sabemos se isso é ou não um blefe; segundo: no meu apartamento não tem abrigo contra bombas nucleares, procure a sua mãe para se proteger; terceiro: você pensa que é quem pra aparecer do nada e vir me dando ordens?

-Samantha, estamos sob ataque terrorista! – Ele berrou, a voz alta e meio ofegante, parecia estar correndo. – Entenda a situação! Nós podemos morrer em algumas horas. Carly está consideravelmente mais protegida que nós por estar algumas milhas abaixo d’água, eu estou indo aí pra te buscar pra irmos pra casa da minha mãe, que sim, tem um abrigo revestido de chumbo, e eu mesmo arquitetei o sistema de refrigeração e todo o essencial. Fica mais afastado da cidade, mas podemos chegar lá antes do meio dia.

-N-Nós... Acha que estamos mesmo prestes a morrer, Freddie? – Perguntei sentindo o peso da situação.

-Espero que não, Sammy. – Ele me respondeu incerto.

-Eu preciso ir ao supermercado. – Falei sentindo o pânico tomar de conta.

-Não. Não! Sam, pelo amor de Deus! – Freddie se desesperou do outro lado da linha. – Pra quê?

-Comprar comida! – Falei como se fosse óbvio, já pulando da cadeira e indo pro quarto. – Estou sem nada para estocar até isso acabar ou até... EU PRECISO DE PRESUNTO, OK?? – Gritei histérica.

-NÃO DESLIGA AINDA! – Ele berrou mais alto. – Vou te buscar no supermercado, estou alugando um carro. Mas talvez já estejamos sem comunicação até lá, então me diz qual loja e eu vou até lá.

-O Wallmart do centro. – Falei correndo, esvaziando minha mochila ao mesmo tempo que eu procurava por outra roupa. Ouvi o Mané conversando com alguém sobre a papelada do carro alugado. – Ei, Benson?

-Que foi, Sam?

-Prometa que vai estar lá. – Pedi com medo.

-Prometo. – Ele respondeu sério. – Preciso desligar agora. Ah, Sam... – Um segundo de hesitação. – Senti sua falta.

Não precisei responder porque ele encerrou a ligação. E eu fiquei segurando minha jaqueta preta, a mochila, e o celular com uma sensação incomodamente satisfatória no peito. Respirei fundo algumas vezes, já que meu estômago parecia ter saído do lugar. E embora a sessão de acontecimentos e frases dos últimos quinze minutos tivesse me causado um grande enjôo, a última coisa que eu faria seria vomitar o bacon comido de café da manhã.

Troquei de roupa, colocando uma confortável e esportiva, tênis e joguei mais uma peça de roupa na mochila. Carteira, meia de manteiga, um canivete, estojo de roubo (nunca se sabe), uma foto do ICarly e tudo pronto. O resto eu arranjo no Wallmart. Saí a pé, pois o hipermercado é perto do meu apartamento, mas encontrei uma multidão voltando da entrada reclamando e insultando o dono ou quem quer que fosse. Preferi verificar por mim mesma, contudo, a multidão me atrasou no mínimo uns cinco minutos, quando finalmente pude vislumbrar as grandes portas de vidro. Olhei as horas no celular e eram nove e quinze. Dois homens e uma mulher fechavam as portas do estabelecimento, mas um grupo de arruaceiros que provavelmente queria comprar bebidas, causou uma pequena confusão e eu me vali disso para me esgueirar. Estava quase entrando quando senti uma mão agarrar meu pulso. Praguejando mentalmente por ter deixado o canivete na mochila e não à mão, me virei puxando o pulso, mas quem estava segurando veio junto e a queda foi inevitável.

-Sam, o que tá fazendo? – Levantei a cabeça assustada e vi Freddie me olhando como se eu fosse louca. – Eles estão fechando.

-Exato. – Retorqui. – Ainda não fecharam, se formos rápidos dá tempo de pegar alguma coisa e a gente paga na saída, vem!

Eu não pensei muito quando agarrei na mão do nerd e o arrastei para trás de uma prateleira. E sabendo que não iria me fazer mudar de ideia, ele somente levantou e me puxou na direção certa. O departamento alimentício. Nós pegamos o que deu, os dois nervosos. Foi meio estranho, sem diálogo. Olhei no relógio ao mesmo tempo que Freddie atendeu o celular. Eram nove e vinte e nove e o número logo mudou, fazendo com que o celular do nerd silenciasse. Nos sentenciando a um desespero que nos fez correr urgentemente para fora, afim de alcançar o carro de Freddie.

***

E aqui estamos, de frente para as portas de vidro à prova de bala do Wallmart, que mostram as grades de ferro de segurança que as revestem pelo lado de fora. Mais uma vez estou controlando a ânsia de vomitar. O pânico crescente me fazendo andar de um lado para o outro sem encarar Freddie com medo da reação dele. Contudo, ele apenas se largou num sofá – o departamento de estofados é o primeiro da loja – e pôs a cabeça nas mãos.

-Também senti sua falta nerd. – Falei entre a histeria e o receio.

Ele sorriu de canto e me olhou nos olhos, levando naquele olhar metade do meu medo e me inundando de paz.

-Senta aqui. – Convidou ele com a voz serena e eu fiz o que ele pediu, descansando a cabeça no encosto do estofado e fechando os olhos.

-Desculpa, Benson. A culpa é minha, eu devia ter esperado você em casa.

-Ninguém está contradizendo isso, Sam. – Brinca o moreno ao meu lado, ganhando um soco no braço por isso. – Já se acalmou? – Perguntou ele rindo, me fazendo afirmar com a cabeça com um leve sorriso.

-O que fazemos agora? – Perguntei tirando um presunto e o canivete da mochila.

-Tentamos sair daqui, devem ter outras saídas.

-E o que te faz pensar que não estarão trancadas? – Perguntei rasgando um pedaço do presunto e comendo.

-A esperança é a última que morre. Vem, precisamos procurar uma saída ou o depósito, são as nossas melhores chances. – Disse o nerd se levantando.

Fui atrás agarrada ao meu presunto tentando não surtar. Enquanto passávamos por vários departamentos do imenso Wallmart, eu imaginava Carly naquela situação. Ela com certeza estaria histérica e eu estaria mais calma porque ela se desespera por nós duas. Sorri com o pensamento e o garoto a minha frente me deu uma rápida olhada. Dei de ombros e continuamos caminhando até parar diante de duas grandes portas com uma placa fosca que informava que por detrás daquelas portas estaria o depósito. Seguindo a lógica que o nerd provavelmente já calculou, o depósito deve ter entrada para caminhões o que pode significar uma saída. Mas as portas estavam bem trancadas pelo lado do depósito, o que as tornava inutilizáveis.

-Vamos seguir o perímetro das paredes, se houver uma porta, uma saída de incêndio ou algo assim, vamos poder usar. – Sugere Freddie e eu reviro os olhos achando uma perda de tempo.

-O sistema anti-incêndio desse lugar é tão fantástico que os bombeiros estariam aqui antes que alguém pudesse gritar ‘fogo’ Fredwardo. – Explico pra ele o que sei porque quase moro aqui. – Não vai ter outra saída além do depósito e os portões da frente e você sabe que eles são quase triplos. É mais fácil quebrar uma parede, mas eles não vendem máquinas que poderiam fazer isso aqui.

Ergui uma sobrancelha desafiando-o a dar mais alguma dica.

-Seu otimismo é contagiante, Sam. – Ele resmunga passando a mão pelo cabelo.

Depois de se descabelar, virou-se de costas pra mim e ficou calado durante alguns minutos. Me sentindo mais cheia, joguei o resto do presunto dentro de um vaso decorativo e limpei as mãos na calça.

-Alguma ideia? – Perguntou Freddie.

-Você já ficou preso numa loja de departamentos, Freddie? – Perguntei retoricamente, pensando em todas as coisas que poderia fazer naquele wallmart.

-Quando eu tinha seis anos, eu me perdi da minha mãe e fiquei preso numa loja de revistas em quadrinhos e foi uma das piores sensações da minha vida. – O panaca respondeu. – Tá logo abaixo de te conhecer.

-Na minha lista, beijar você tá em primeiro, acho que eu sou melhor em organizar prioridades. – Respondi sorrindo debochada e caminhando para o setor de artigos esportivos sem esperar pelo Freddie.

Sorri maliciosa e quando estava prestes a pegar um taco de beiseball lindo, todo preto e com uma linha dourada, Freedie me abraçou por trás afundando o rosto na minha nuca e me tirando do chão. A sensação foi estranhamente boa e esse foi o defeito. Cutuvelei o idiota na altura das costelas e caímos ambos no chão. Mas ele, com falta de ar. Eu ia pegar o taco e terminar a surra quando percebi que ele estava demorando demais a recuperar o fôlego.

-Freddie, se isso for brincadeira não tem graça. – Me ajoelhei do seu lado e toquei seu rosto fazendo-o olhar pra mim e seus olhos estavam em pânico. – Freddie! Freddie calma, respira devagar.

Ele apertava minha blusa com uma das mãos e eu pensei que fosse rasgá-la.

-Freddie, olha pra mim. Olha pra mim, caramba! – Gritei ganhando sua atenção. Seus lábios estavam ficando azulados. – Olha pra mim e respira no meu ritmo. Coloquei a mão que antes puxava minha camisa na altura do meu abdômen e ele foi regulando sua respiração no compasso da minha.

Um minuto depois ele se sentou, respirando com dificuldade, mas pelo menos respirando e levantou a camisa. Havia um hematoma de cores variadas na região que atingi e a culpa me fez engolir em seco.

-Você tá bem? – Perguntei baixinho e ele apenas acenou que sim. Porém eu havia percebido que a respiração já tinha normalizado e pulei em cima dele abraçando-o.

Ele ficou surpreso. Até eu estava surpresa. Bem, nem tanto.

-VOCÊ tá bem? – Perguntou ele sarcástico enquanto me abraçava de volta e se encostava na prateleira.

-Idiota. – Respondi. – Não sei pra você, mas pra mim isso tá bem confortável.

Senti sua risada reverberar pelo seu peito onde eu estava encostada e ele segurou um dos meus cachos entre os dedos.

-Dolorido, mas confortável. Eu só ia impedir você de pegar o taco, Sam. Você poderia destruir toda a loja com ele.

-Estamos presos aqui por tempo indeterminado, você acha que eu destruiria o lugar por quê? – Ironizei.

-Presos aqui. – Ele divagou sério, começando um carinho nos meus cabelos. – Não vai servir de abrigo anti-bombas caso um dos lugares visados pelos terroristas esteja aqui perto. O que vamos fazer, Sam?

-Não sei, Freddie. – Aperto sua roupa de leve sentindo seu cheiro me deixar leve. – Mas se é pra gente morrer, espero que demore. Se houver um jeito de resolverem isso, então que façam logo.

-O que vamos fazer até que uma dessas coisas aconteça? – Perguntou Benson.

-O que der vontade. Só se vive uma vez, Freddie. Então, o que quer fazer?


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Notas finais do capítulo

Comentem anjinhos. Me incentivem, acabei de mudar o gênero e espero agradá-los. Até o próximo cap. Costumo postar nos fins de semana. Beijos da Lua.