Separate Ways - Requiem escrita por WofWinchester


Capítulo 8
Benção ou maldição?


Notas iniciais do capítulo

Hey babies! Mais um capítulo, não tenho muito a dizer sobre ele, pois não quero estragar as surpresas. A partir de agora vai entrar em debate e avaliação o "estranho" poder sobrenatural da Esther (que pode ser uma coisa boa ou má, ou totalmente inusitada) e o "estranho" amuleto de Rubi que parece ter caído do céu (ou surgido do inferno). Sem mais delongas, bom capítulo. Beijinhos lindas ♥
PS: Numa determinada parte eu vou citar a música "Simple Man" do "Lynyrd Skynyrd". Ela faz parte da cena, mas é opcional, vocês decidem colocar ou não.



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Crowley havia mandado me prenderem numa sala, amarrada a uma cadeira e amordaçada. Parecia um escritório, as paredes eram antigas, porém os móveis eram novos. Só podia ser o lugar onde ele ficava. Havia uma janela enorme, do tamanho de uma estante de livros, se eu talvez conseguisse me soltar, eu poderia pulá-la e tentar correr até o Impala. Mas primeiramente, eu não conseguiria me soltar fácil assim, sendo que eles haviam amarrado minhas mãos, meus pés e meu tórax na cadeira. Segundo, eu não creio que eu conseguisse correr pra muito longe antes de um demônio me alcançar, e terceiro, eu não podia deixar Dean e Sam pra trás. Em resumo: Eu estava ferrada.

Minha melhor chance era apostar que os rapazes tinham um plano, e ganhar tempo com Crowley. Eu estava há horas aqui, o sol começava a nascer. Não tive problemas em lutar contra o sono, minhas alucinações não deixaram. Por algum motivo eu podia ver e ouvir todas as almas trancadas nesse lugar, elas gritavam pra mim, pedindo ajuda. Isso nunca havia acontecido antes de eu entrar naquele maldito cemitério. Parece que eu enfiei o pé num buraco de piche lamacento e ia afundando cada vez mais. Só pode ser uma maldição.

Outra coisa que me deixava nervosa era o que Castiel havia dito; apenas anjos muito poderosos podiam sentir as almas dessa forma tão viva, mas deve haver outra explicação, eu não sou um anjo. Não posso ser, e nem quero.
– Desculpe a demora – disse Crowley, entrando pela porta – mas eu acho que você não se importou em esperar não é? Não há mais nada a fazer aí amarrada – ele riu com deboche. Caminhou em minha direção, arrancando a fita adesiva que me impedia de falar com força. Grunhi de insatisfação.
– E eu que achei que as mulheres eram acostumadas com essas coisas que grudam e arrancam pelos – comentou recostando-se na mesa e ficando de frente pra mim – Eu adoraria ficar aqui conversando com você o dia inteiro, mas eu tenho outras coisas pra fazer, pessoas pra torturar e etc. Então, vamos ao que interessa: Porque você está aqui? Uma garota simples e insignificante sem valor nenhum? Não que os Winchester não adorem perambular com esse tipo de gente pra cima e pra baixo, mas eles não arriscariam a sua vida à toa. Estou certo?

Encarei-o, ele parecia bem a parte sobre o fato de anjos e demônios estarem no meu encalço. Talvez ele não soubesse, o que era muito estranho sendo que ele era o rei do inferno. Era mais seguro pra mim se ele continuasse não sabendo, ou se eu contasse? Se Crowley achasse que eu era apenas uma garota normal, ele mandaria me matar? É provável. Já se ele soubesse que eu tinha algum valor, eu poderia ganhar tempo. Juntei alguma coragem que me restava e tentei colocar meu plano em prática.
– Você é bem ignorante sabia? – eu dei uma risada divertida. – Tente encostar um único dedo em mim e Raphael vai arrancar a sua cabeça num passe de mágica.
Ele me fitou surpreso e com certa curiosidade.
– Do que está falando?
– Ah, você não sabe? – me fiz de desentendida – Porque não pergunta pra algum dos seus capachos que deve estar me procurando por aí?
Crowley ficou mais confuso ainda.
– É bom você começar a falar agora ou...
– Ou o quê? – desafiei. – Você não pode fazer nada comigo – adverti. Não sei de onde eu havia tirado tanta segurança pra falar com o rei do inferno assim, mas eu estava falando. Ele realmente não podia fazer nada comigo? Eu esperava que não. Ele deu uma risada.
– Você fala grosso pra alguém do seu tamanho – seu tom soava como uma ameaça. Em seguida pegou um copo de uísque em cima da mesa, saboreando lentamente enquanto me fitava. – Não saia daqui, não que você realmente possa – disse indo em direção a porta. Briguei com as amarras agressivamente, fazendo a cadeira raspar no chão. O que era totalmente inútil, mas valia a pena tentar. Fiquei ali mofando durante uma meia hora, até que Crowley abriu a porta, com um sorriso triunfante, ele se aproximou rapidamente.
– O que você me disse – começou – foi de grande ajuda. Eu dei uma pesquisada por aí, torturei alguns peões e achei uma coisa que dizem pertencer a você – ele me fitou e eu franzi o cenho.
– Reconhece – Crowley tirou um objeto do bolso e balançou a minha frente, que com surpresa eu reconheci como sendo o octeto de rubi. – Isto?
Minha expressão era de total surpresa. Ele deu uma risada divertida.
– Acho que era verdade então. Mas eis a questão que me intriga – seu tom descontraído estava ficando pesado e irritadiço – O que um amuleto demoníaco e milenar está fazendo com uma garotinha tão insignificante?
– Vlad III era um demônio – murmurei pra mim mesma, conseguindo a confirmação da teoria que eu e Daniel fizemos.
– Ah, santa ignorância! – exclamou Crowley. Em seguida um barulhinho frenético começou a tocar, o demônio enfiou a mão no bolso e puxou um telefone. – Alô? – deu uma pausa – eu estou ocupado agora – mais uma pausa – tudo bem estou indo.

Ele me encarou, guardando o aparelho e em seguida passou o octeto de uma mão para outra, me fitando curiosamente. Crowley se aproximou, me encarando a centímetros do rosto.
– Eu já volto – disse, colocando o colar no meu pescoço. Ele saiu pela porta saboreando seu uísque.

Encarei o octeto que pendia sob meu peito, cintilante. O vermelho vívido da pedra era como se fosse sangue cristalizado. Me arrepiei com a ideia, mas estranhamente eu não conseguia parar de contemplar o objeto.

Apenas minutos depois, com o som do alarme de incêndio tocando, que eu desviei o olhar dele. Meg entrou correndo e tropeçando pela porta.
– Meg! – exclamei quase feliz em vê-la. A garota puxou um canivete e cortou rapidamente as cordas que prendiam meus braços, pernas e tórax.
– Depois você me agradece, precisamos voltar. Sam e Dean vão dar uma festa e eu sou a anfitriã – ela sorriu maliciosa. Tentei entender o que significava aquela frase, mas desisti. Meg parecia exausta e debilitada.
– Você está bem? – perguntei.
– Estou – ela deu de ombros, franzindo o cenho para o octeto – Onde conseguiu isso? Acho que já vi em algum lugar, é estranhamente familiar... – murmurou.
– Você não disse que precisamos voltar agora? – desviei o assunto rapidamente, se Crowley conhecia esse amuleto, outros demônios também o devem conhecer.
– Exato – Meg assentiu, indo em direção a porta. Contornamos alguns corredores, que pareciam bem menos assustadores com a luz do dia, e por fim chegamos a sala onde estavam Sam e Dean. Crowley estava parado, preso no meio de uma cilada do demônio no teto. O demônio passava as mãos despreocupadamente pelo terno.
– E então, a quem devo a honra?

Dean se virou pra mim com uma expressão de alivio e eu me coloquei logo atrás dele, Meg caminhou triunfante até o rei do inferno.
Crowley – pronunciou-se.
Vadia – respondeu ele, com ar divertido.
– Quer saber? – continuou Meg, ignorando o insulto. Ela levantou a mão e fez um movimento como se estivesse agarrando alguma coisa no ar e puxando pra baixo. Nesse momento Crowley se dobrou e vomitou sangue no chão – os melhores torturadores não sujam as mãos. Sam quer falar com você.
– O que eu posso fazer por você, Sam? – perguntou ainda tossindo e se recompondo.
– Você sabe muito bem. Eu quero a minha alma de volta.
– E eu que pensei que você fosse machão, Sam – comentou Meg. Dava pra ver na cara dela que ela estava adorando ver Crowley naquele estado.
– Não – respondeu ele, sem expressão.
– Meg? – chamou Dean. Ela se aproximou, fazendo o mesmo movimento de antes e o rei do inferno caiu de joelhos e vomitou mais sangue. Desviei o olhar começando a enjoar um pouco.
– Não posso – grunhiu rapidamente.
– Não pode ou não quer? – disparou Sam, ficando irritado.
– Se eu disse que não posso é porque não posso, seu grande idiota! – ele ficou de joelhos – Eu tive sorte de conseguir tanto de vocês. Voltar lá só pra me ferrar? Sem essa! Eu sou bom, mas aqueles dois lá? Esqueça.
– E como eu vou saber que não é mentira? – perguntou o moreno, impaciente.
– Não vai. Mas isso não muda nada. Eu estou dizendo. – Crowley fez uma pausa – Sam, porque você quer a coisa de volta? Satã agora tem uma bela fonte de entretenimento lá. Eu prefiro limpar o chão de um banheiro com um farrapo a pegar sua alma. A menos que você queira virar uma baba nojenta.
– Sam, eu odeio dizer, mas ele tem razão – comentou Meg, olhando de soslaio para o moreno.
– Certo, entendi. Valeu – ele levantou as mãos, contrariado. – É todo seu.
– Você pirou? – se meteu o irmão mais velho – Ele é só o que nos resta.
– Dean, você ouviu. Ele não pode pegar a minha alma. Ele é inútil.

Contragosto, o loiro assentiu, indo até Meg e entregando a faca para ela, que esperava ansiosamente. Em seguida a garota sorriu para Crowley, que estava parecendo muito nervoso. Ela caminhou até onde ele estava.
– Isso é por Lúcifer, seu idiota pomposo... – sua frase foi interrompida quando o demônio segurou suas mãos no ar e passou uma rasteira nela, derrubando-a. Ele se levantou e jogou a faca pra cima, onde estava desenhada a armadilha, inutilizando-a.
– Assim é melhor – comentou estalando os dedos. Como num passe de mágica, Sam e Dean voaram em paredes opostas. Meg se levantou do chão pronta para lutar, quando Crowley fez a faca cair do teto e parar graciosamente em sua mão, apontando a mesma para a garota.
– Você não sabe nada de tortura, seu inseto – vociferou com o objeto a centímetros da garganta dela. E você – ele se voltou para mim (que a essa altura já estava procurando pra que lado correr) sem descuidar de Meg – Espero que tenha aproveitado o passeio até aqui, pois foi o seu último. Tchauzinho.

Crowley puxou um pequeno canivete dourado do bolso com a mão que estava livre e lançou em minha direção. Coloquei os braços em frente ao corpo e fechei os olhos, esperando pelo momento em que o objeto fosse me acertar, ao invés disso, ele foi desviado, batendo contra a parede ao meu lado. Abri os olhos e vi Castiel a minha frente, de costas pra mim.
– Deixe-os em paz – falou baixo e ameaçador.
– Castiel. Não vejo você há algum tempo, está na cavalaria agora? – a voz de Crowley era divertida.
– Largue a faca – ordenou o anjo, se referindo ao objeto afiado que estava próximo a garganta de Meg.
– Você é mandão assim no céu? – perguntou o demônio – Está perdendo para Raphael. O caso todo faz o Vietnã parecer café com leite – ele riu debochado – Ei, o que tem na sacola?

Olhei para baixo, notando que Castiel estava segurando uma espécie de sacola velha, com um grande volume dentro. Ele enfiou a mão dentro e puxou um... Crânio.
Engoli em seco. O anjo largou a sacola no chão e se virou para Crowley.
– Você – revelou com certa satisfação.
– Não é possível... – o demônio que estava triunfante e sorridente ficou perplexo.
– Você não escondeu seus ossos como deveria – disparou Castiel. O rei do inferno fez uma cara azeda e então colocou a faca embaixo do braço, deixando as duas mãos livres para começar a bater palmas.
– Parabéns pra você – debochou. Mesmo com a cabeça numa bandeja parecia que Crowley nunca perdia o senso de humor. Castiel se virou pra mim, fitando minha expressão apavorada.
– Você está bem? – perguntou preocupado. Estou ótima, quase morri. Eu teria respondido com todo o sarcasmo que eu conhecia, porém estava com certo receio do crânio que ele segurava a centímetros de mim, então apenas assenti veemente.
– Afinal, você é uma mulher ou um rato? – debochou Crowley, espichando a cabeça para me ver – Eu nunca vi alguém tão medrosa. Chega a me dar calafrios! - ele se tremeu pra enfatizar.
– Adoro concordar, é verdade – se meteu Meg onde não foi chamada.
Olhei feio pros dois, Castiel continuava me fitando, alheio aos comentários, os olhos fixos no amuleto que pendia no meu pescoço.
– O amuleto de Vlad III – murmurou – Como conseguiu?
Crowley – apontei para o mesmo que fez uma cara feia.
Fofoqueira – sibilou. Castiel se voltou para ele.
– Como conseguiu isso?
– Por que eu te contaria?
O anjo segurou o crânio apertado entre as mãos, pequenas faíscas saíram dele.
– Tá bom! Tá bom! Para! – o demônio implorou vergonhosamente. - Parece que tem uma pequena facção criminosa metida em meio ao meu governo – falou o rei do inferno, relutante.
– Explique.
– Eu torturei um dos meus homens e ele disse que é um grupo fiel a Lúcifer, eles estão caçando a sua garota. Surpreendi eles fazendo um ritual de localização com o octeto. Não faço ideia do que seja. – ele levantou as mãos. Meus olhos foram diretamente para Meg que estava perplexa.
– Parece que seu papai não confiava em você tanto assim, docinho. Buá, buá. – disparou Crowley. Ela apertou os olhos pra mim.
– Eu não entendo... – murmurou. Eu me encolhi atrás do anjo.
– Ei, Cass! Dá pra dar uma força aqui? – a voz de Dean veio da parede. Os Winchester ainda estavam lá, presos e esquecidos.
– Você pode restaurar a alma do Sam ou não? – continuou Castiel, depois de uma pausa. O demônio estalou os dedos, soltando os irmãos. Eles caíram no chão, tossindo.
– Se eu puder ajudar de outra maneira...
– Responda a ele! – esbravejou Dean, se levantando.
– Eu não posso – admitiu Crowley.

No mesmo segundo Castiel esticou a mão em direção a sacola de ossos e a mesma pegou fogo, juntamente com o demônio que virou uma pilha de cinzas diante de nossos olhos. Levantei o olhar e Meg estava me encarando, eu não sabia ao certo se ela me fitava com surpresa, irritação ou desprezo. Em seguida Sam se lançou a pilha de cinzas, juntando a faca e a demônia desapareceu.
– Ela é esperta. Não posso negar – falou Dean, quase como um elogio – Eu ia matá-la também. – o loiro se virou para Castiel que estava pensativo, os olhos fixos no octeto. – É claro que eu teria dado a você uma hora com ela antes. – Fiz uma cara feia pra Dean que fez uma expressão confusa.
– Porque eu ia querer isso? – perguntou o anjo, sem desviar os olhos.
– Então esse é o famoso amuleto de Elisabeth Bathory – comentou Sam, se aproximando.
– É – afirmei – ele estava no túmulo e depois apareceu comigo. Crowley disse que estava com os demônios. Eles devem ter pegado na noite em que invadiram a funerária.
– Ele disse que estavam fazendo um feitiço de localização? – perguntou Sam – Isso significa que eles podem localizar você por esse amuleto?

Nós nos encaramos, isso não era nada bom.
– Não acho que eles estejam tentando localizar a Esther com ele, e sim outra coisa – disse Castiel, por fim, se voltando para Dean.
– Outra coisa? – dissemos eu e Sam em coro. Que outra coisa haveria de ser?

Saímos daquele inferno e eu agradeci pelos fantasmas darem um tempo com todo aquele negócio de ficar me fazendo ter visões. Estranhamente me passou pela cabeça que talvez pudesse ser por causa do amuleto, no momento em que eu comecei a usá-lo, parece que ele bloqueou os fantasmas. Apenas uma teoria, mas se estava funcionando eu não iria parar de usá-lo. Castiel desapareceu logo depois que saímos do manicômio abandonado. Dean e Sam tiveram uma pequena discussão sobre pegar a alma do caçula de volta e então Sam foi embora sozinho. Dean e eu decidimos voltar pra Sioux Falls, e eu tive uma pontada de certeza que Bobby me receberia com um sermão daqueles (sem contar que eu dei sumiço numa caminhonete que ficou jazindo pra sempre no meio do mato).
– Você sabe que foi imprudente o que fez, não sabe? – perguntou-me Dean.
– Sim, eu sei – afirmei, assentindo com a cabeça.
– E você sabe que Bobby vai tentar te estrangular, não é?
– Sim, eu sei.
Dean deu uma risada.
– O que é tão engraçado? – perguntei avulsa.
– Nada, é que você se parece comigo às vezes. Imprudente, irresponsável, a não ser pelo fato de ser uma tremenda de uma medrosa.
– Eu não sou medrosa! – protestei – Só porque eu não me atiro de cabeça com uma arma pra cima de um demônio ou porque eu tenho receio de coisas “sobrenaturais” não quer dizer que eu seja medrosa – argumentei. Dean arqueou as sobrancelhas.
– Tem razão. Mas você vai acabar se acostumando – disse tirando a mão do volante para colocá-la na minha cabeça e me descabelar. Eu empurrei sua mão.
– Ei!
– Que bonitinha! Parece um leãozinho – brincou ele, morrendo de rir do meu cabelo ruim, armado e agora bagunçado. Bufei, mas não pude deixar de rir também. Ele ligou o rádio, e de cara eu reconheci a música Simple Man, do Lynyrd Skynyrd.

O sol forte da manhã me cegava um pouco, mas mesmo assim o dia parecia lindo. Árvores passavam correndo por nós, os raios de sol aqueciam minhas pernas através da calça jeans. Eu me senti bem, pela primeira vez depois de muito tempo. Afundei o dedo no botão do volume, até o carro começar a vibrar com o som. Dean me olhou, aprovando minha atitude. Seus olhos verdes pareciam estar mais verdes em contraste com a luz da manhã. Ele me encarou com um sorriso quando a primeira estrofe da música começou, num impulso eu comecei a cantar e em seguida Dean me acompanhou. Nós cantávamos a plenos pulmões, como se estivéssemos em um lugar cheio de pessoas e queríamos que elas nos ouvissem.

A viagem de volta foi toda assim.

Quando chegamos a Sioux Falls, Bobby nos recebeu com uma cara emburrada e depois me fuzilou com um olhar, seguido de um sermão de meia hora sobre como eu fui irresponsável, terminando com ele se dirigindo para a cozinha para buscar uma cerveja. Sam chegou algumas horas depois, não falou com ninguém e se trancou no quarto. Dean estava nervoso e preocupado enquanto conversava com Bobby sobre alguma maneira de pegar a alma do Sam de volta.
– O problema é que ela está presa justamente numa jaula com Miguel e Lúcifer, e não há nenhum ser em sã consciência que queira barganhar entrar lá. Eu não culpo Crowley diretamente. Ele não tem poder pra isso. – falava o velho. Dean colocou as mãos no rosto, cansado, de repente ele se levantou num pulo, os olhos brilhando.
– Eu sei de alguém que pode trazer a alma do Sam de volta, como eu não pensei nisso antes? – dizendo isso ele pegou o antigo caderno de John que continha anotações sobre vários seres sobrenaturais e copiou um endereço num pedaço de papel. – Eu volto quando der.
Dizendo isso o loiro saiu pela porta. Bobby e eu nos encaramos, perplexos.
– O que ele vai fazer? – perguntei preocupada. Dean era cabeça dura, e faria qualquer coisa pelo irmão, inclusive vender a alma para um demônio, como ele disse que já havia feito antes.
– Eu não faço ideia, mas pelo endereço que ele pegou, não deve ser boa coisa – comentou Bobby, encarando a porta entre aberta

Olhei para cima, encostando a cabeça na parede.

Certo, vamos a atualização diária da minha vida: Um, eu continuava sendo procurada por anjos e alguma facção secreta de demônios leais a Lúcifer (Como Crowley recentemente havia revelado, algo que até mesmo ele não tinha conhecimento). Dois, eu tinha uma espécie de poder que Raphael queria, e então provavelmente ia fazer de tudo pra me pegar viva, pelo menos à parte do “viva” era um pouco reconfortante. Três, eu estava com o estranho amuleto novamente. Um octeto que pertenceu a Vlad III, e supostamente foi passado para Elisabeth Bathory. Eu não fazia ideia do que esse objeto era capaz de fazer, se tinha algum poder maligno, ou real ligação com alguma coisa, mas ele estava aqui e estranhamente me causava sensação de nostalgia.

E por último e não menos importante; o que Castiel havia me falado (e ainda não esclarecido) sobre eu ser capaz de sentir coisas que apenas anjos muito poderosos conseguem. Essas dúvidas estavam me matando, então eu levantei e decidi fazer algo.
– Eu vou pro meu quarto – avisei. Bobby levantou a cabeça e me encarou.
– Da última vez que eu ouvi isso você trancou a porta, roubou uma caminhonete que eu tenho certeza que nunca mais vou ver e foi atrás do Dean.
Ele me encarava, emburrado.
– Eu só vou pro meu quarto, prometo – disse juntando os dois dedos e os beijando. Como as crianças fazem.
– Só pra você saber: Eu coloquei barras nas janelas – falou por fim, voltando-se para os livros. É, era bom saber que eu não poderia mais fugir usando as janelas.

Subi as escadas lentamente, sentindo minhas pernas pesarem como se tivessem uma tonelada cada uma. Quando abri a porta do meu quarto, fiquei surpresa ao ver Castiel sentado na cama. O queixo apoiado nas mãos, pensativo. Fechei a porta suavemente e ele levantou os olhos para mim.
– Precisamos conversar – avisou baixinho.
– Você leu meus pensamentos – falei sarcástica. Ele entortou a cabeça pro lado, como um gatinho. O gesto me deu uma vontade involuntária de sorrir.
– Não sou capaz disso.
Rolei os olhos.
– Alô, sarcasmo. – entoei, Castiel olhou para o chão, fitando algum ponto imaginário ao alcance dos meus pés. – Então, você precisa esclarecer melhor aquela história sobre eu poder ver coisas que apenas anjos podem ver.
– Eu estou preocupado, Esther – revelou – Quando você caiu, eu pude sentir que você estava se esvaindo, desaparecendo, talvez sendo tragada para outra realidade. Isso é perigoso, eu precisei te puxar e quase não consegui te trazer de volta – ele me olhou, os olhos azuis preocupados. Engoli em seco. Eu me lembrava muito bem de ver Dean e Sam “desaparecerem” aos poucos, ficando transparentes.
– E como eu evito isso? – perguntei rapidamente.
– Não tem como evitar. Eu acho que é por causa do seu poder, você não o controla e por isso ele traga coisas. Entende?
– Não muito bem. – eu balancei a cabeça. Eu sempre fui uma criança assustada, nervosa. Mas isso provavelmente era por causa do lugar onde eu morava, uma funerária. Era uma explicação lógica. - Mas assim que eu coloquei o octeto, as visões e sensações pararam. Aparentemente. Isso é bom não é?
Castiel passou as mãos no rosto, pensativo.
– Isso é bom, não é? – repeti nervosa.
– Eu não sei – respondeu ele, levantando da cama e vindo em minha direção. O anjo puxou as mangas para cima, deixando a pele do seu braço amostra, juntamente com a marca de guardião – Quero que me deixe tentar uma coisa – pediu suavemente, mas seus olhos estavam duros.
– Exatamente o quê? – segurei o instinto de recuar pra trás.

Castiel se aproximou mais de mim, me puxando para si com um braço, enquanto me olhava diretamente nos olhos. Eu estava totalmente encostada nele, podia sentir o calor que emanava de seu corpo, e o aroma de eucaliptos frescos.
– Isso é perigoso – murmurou. Ah, e como é perigoso... Esther! Para, calma, respira. - Esteja receptiva ou não vai funcionar – Observei surpresa e indignada quando ele colocou a mão por baixo da minha blusa, fixando-a no meu abdômen.

O toque morno começou a esquentar, e por incrível que pareça eu vi quando Castiel enfiou o braço inteiro dentro de mim. Por fora minha pele estava pegando fogo, e por dentro era uma sensação de estar sendo invadida, algo extremamente agonizante. Tinha alguma coisa guardada em mim, e eu quase podia sentir concretamente quando barreiras se levantaram, como muros de proteção. Encostei a testa em seu peito, minha cabeça começava a latejar, enquanto minhas mãos agarravam seu sobretudo na altura dos ombros. Eu resistia contra a vontade de me desvencilhar imediatamente.
– Você deveria estar gritando – constatou o anjo surpreso, franzindo um pouco a testa - Geralmente isso é muito doloroso para os humanos. O que você sente?
– Um braço dentro de mim? - ironizei - É uma sensação de incômodo tão forte que é agonizante. Já conseguiu o que queria?
– Não. Você não está receptiva.
– Porque isso dói, experimenta deixar alguém enfiar a mão dentro de você pra ver como dói – protestei, trincando os dentes.
– Você precisa me deixar entrar, eu não consigo sentir a sua alma – rebateu – Confie em mim – sussurrou no meu ouvido, causando um pequeno arrepio involuntário. Respirei fundo e contei até três, tentando enviar comandos ao meu cérebro pra que desfizesse o muro, mas não estava surtindo efeito.
Confie – repetiu.

Senti as barreiras desmoronarem lentamente e uma sensação de exaustão tomar conta do meu corpo. Castiel continuava me encarando, quando minhas pernas bambolearam e eu o senti me segurar.
– Esther! – ele me pegou no colo, me colocando na cama e segurando as minhas mãos. A expressão aflita.
– Anjo...

Como se um grande tubo de ar me puxasse, eu fui arrancada dali.

Com dificuldade me encontrei deitada em um gramado úmido. Sentei-me olhando ao redor, não parecia com nenhum lugar onde eu já estivesse estado. Havia um castelo de pedra enorme, cercado por uma floresta. As árvores se mexiam violentamente com o vento. Passei as mãos geladas contra meus braços nus.
– Onde eu estou?

Levantei-me, dando alguns passos, notei estar vestida apenas com uma fina camisola de algodão e meus pés estavam descalços. De repente vi uma figura se esgueirar entre as árvores, ela estava distante, mas eu pude notar seus traços. Era uma garota. Seus cabelos negros estavam presos num coque no alto da cabeça, e ela usava um vestido vermelho muito bonito. Por um momento a garota se virou para trás, olhando diretamente para mim, com seus olhos castanhos profundos. Era como me olhar no espelho. Ela era muito parecida comigo.
– Ei, espera! – gritei, mas a garota se virou novamente e começou a andar apressada. Corri em direção as árvores, me desviando dos galhos que me arranhavam os braços. Quando eu finalmente consegui alcançá-la, a garota havia parado, encarando o céu.
– Você sabe onde eu estou? – perguntei me aproximando. Ela não respondeu. Tentei cutucar seu braço, mas minha mão passou direto, como se eu fosse uma camada de ar. Encarei meus dedos. Isso é apenas um sonho?

Olhei em volta, o céu estava tempestuoso, relâmpagos o iluminavam de cinco em cinco segundos. Eu estava quase na beirada de um precipício que dava para o mar, as ondas violentas batiam contra as pedras raivosamente. O ar frio da noite causava uma sensação absurdamente congelante. A garota olhou para mim novamente, não exatamente para mim, mas através de mim e sorriu.
– Você veio – murmurou com um sorriso.

Tentei me virar para olhar na direção em que ela fitava, mas tudo ficou em câmera lenta. Com a visão desfocada eu apenas pude ver uma lâmina idêntica a que Raphael usou para matar Daniel, só que era dourada. Quem quer que a estivesse segurando, deixou-a escapar e segurou com mais determinação enquanto meu corpo ficava dormente, logo uma sequência de imagens passavam pelos meus olhos.

Uma garota correndo. Um precipício. Um cadáver pendurado num lustre pingava sangue no carpete marfim. Um grito ensurdecedor. Fogo. Uma cidade em chamas. Um velório na chuva. Um anjo ajoelhado em frente a um túmulo com as asas abertas. Ele chorava, mas não havia lágrimas. Ele gritava, mas não havia som.


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