Separate Ways - Requiem escrita por WofWinchester


Capítulo 48
Brincando de bonecas, part II


Notas iniciais do capítulo

Capítulo mais complicado, pois é mais corrido.



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Admito que passar pela segurança do aeroporto carregando um arsenal em uma mala foi um desafio impossível que se tornou extremamente fácil graças aos poderes de Maison, que distorceu a realidade na mente dos seguranças. O mais difícil até agora tinha sido arrastar Dean Winchester — o homem que já esteve no inferno, mas tinha medo de avião — para o portão de embarque e controlar meu medo de ser pega em flagrante ao usar documentos falsos descaradamente.

O voo de aproximadamente dezesseis horas até a Argentina prometia ser longo e claustrofóbico, já que a classe econômica estava completamente abarrotada de pessoas, parte delas irritadas por dividir um espaço tão pequeno com estranhos e outra parte tagarelando com amigos e parentes. Subimos a escada de metal barulhento, passando pela aeromoça loira sorridente que nos recebia — os cabelos encaracolados e curtos batiam na altura do peito, logo acima do crachá escrito “Simone” que estava preso no uniforme azul marinho. Encarei a minha passagem, procurando a minha poltrona ao lado da janela e percebendo que eu me sentaria com um garoto de aproximadamente quinze anos, o mesmo tinha um vídeo game portátil em mãos e os ouvidos tampados pelo fone que bagunçava os cabelos pretos e rebeldes.

— Nossos lugares são separados — Sam franziu a testa ao constatar que nós ficaríamos espalhados, ajeitando a mala no ombro direito.

— Nós demos sorte de achar vagas nesse voo, o próximo seria só amanhã de manhã. — gesticulou Maison, olhando de soslaio para Dean, que estava mudo feito uma criança de fralda cheia, o semblante visivelmente apreensivo. Para quem via de fora, era até engraçado que ele tivesse medo, já que acontecem mais acidentes de carro do que de avião no mundo inteiro.

— Acho que nos vemos assim que pousarmos. — sibilou o Winchester caçula, acenando levemente para mim e passando por Castiel enquanto se afastava para procurar seu assento. Em seguida foi a vez da loira e do caçador. Fitei o anjo a minha frente, enfiando os dedos pelo seu sobretudo para que ele me puxasse para um abraço.

— Você vai ficar bem? Não quer que eu convença o garoto viciado em jogos ao meu lado para trocar de lugar com você? — questionei com um biquinho.

— Algo me diz que ele está muito confortável onde está. — murmurou com um sorriso cabisbaixo, a expressão cansada ainda era facilmente percebida, embora ele tentasse esconder. Eu não queria fazer alarde, mas sabia que Castiel não estava bem desde manhã, uma preocupação que só se agravou quando o mesmo teve sérios problemas em se materializar.

— Todos em seus lugares, por favor. — interrompeu outra aeromoça, passando por nós assim que as portas do avião começaram a se fechar. Suspirei, abraçando-o com mais força e recebendo um olhar desaprovador de uma senhora que estava sentada logo ao lado de onde estávamos. Não demorou mais do que dois segundos para que a mesma soltasse um pigarro, desviando o olhar conservador dissimuladamente para uma revista que tinha em mãos.

Afastei-me e o anjo passou o polegar pela minha bochecha, afagando de leve.

— Te vejo quando pousarmos. — murmurei ao depositar um beijo rápido no canto da sua boca, me afastando de maneira relutante. Então caminhei até a minha poltrona, conseguindo me espremer entre as pernas do garoto e o recosto do assento da frente para passar. Olhei para trás e percebi que Castiel já havia encontrado o seu lugar, Maison estava do outro lado, Dean mexendo os dedos de maneira nervosa um pouco mais a frente e Sam se destacava pelo tronco alto em meio a um casal de idosos nas fileiras centrais. Voltei-me novamente e prendi o cinto de segurança, fitando a janela redonda enquanto a aeromoça tentava ser ouvida em meio ao burburinho que tomava conta do local, pedindo a todos que desligassem seus notebooks. Senti o avião começar a se mexer, ganhando velocidade e de repente perdendo um pouco de altura, causando um frio na barriga e instantes de pânico até estabilizar o voo. Expirei o ar que não sabia que havia trancado e olhei ao redor, os mesmos rostos apáticos centrados em si mesmos e o garoto ainda vidrado no videogame que soltava alguns sinais luminosos nas laterais.

Tudo que eu podia fazer para não deixar a viagem longa se tornar absurdamente interminável era tentar dormir um pouco.

A lua prateada no céu escuro parecia estar tão perto que eu tinha a sensação de que podia tocá-la se estendesse meu braço. Seu brilho hipnotizador banhava o topo das colinas no horizonte, tão pálido e triste como se estivesse morrendo. Percebi as pontas do vestido branco de seda dançarem com a brisa gelada que afagava minha pele e jogava meus cabelos em diversas direções. Era irrefutável que aquilo se tratava de um sonho, mas mesmo sabendo disso, eu sentia que precisava chegar a algum lugar em muito pouco tempo, pois minha vida dependia disso. Segurei o tecido longo com as mãos para que pudesse andar depressa no caminho de terra, indo de encontro à lua como se realmente pudesse alcançá-la.

Mas então meus ouvidos captaram um som aterrorizando que vinha das minhas costas e ao me virar uma rajada de vento me atingiu, fazendo com que eu recuasse alguns passos — até mesmo as copas das árvores pelo caminho já percorrido se inclinando tamanha a força. Continuei observando aquele ponto escuro do céu com a testa franzida, meus instintos me dizendo para correr, porém eu estava naquela condição de sonho em que ficamos completamente imóveis, sem poder mover um músculo sequer. E de repente uma sombra surgiu, avançando rapidamente até mim. Era enorme — seu comprimento podia ser facilmente comparado ao de um navio porta aviões —, a velocidade com que suas asas se movimentavam cortava o ar como uma lâmina afiada.

Shadow.

Eu permaneci petrificada enquanto a criatura pousava a minha frente, suas escamas brancas — aparentando ser tão fortes quanto a mais impermeável armadura — não eram nada comparadas aos olhos vermelhos e aterrorizantes fixados exclusivamente em mim. Em um movimento que eu não pude controlar, avancei um passo, erguendo a vão vagarosamente até ele, que aguardava como se estivesse esperando por isso. Mas logo que meus dedos tocaram sua pele rija e fria, o dragão arqueou as costas para trás com um som gutural e feroz saindo das profundezas de sua garganta, a boca se abrindo e labaredas negras saindo por ela de encontro a mim. Caí para trás, rolando na terra com meu corpo queimando de uma maneira insuportável, porém o fogo cuspido por Shadow era frio como o mais rigoroso inverno, congelando meus músculos e os derretendo de fora para dentro.

— Acorde! — exclamou a voz baixa e desconhecida enquanto sacudiam meus ombros. Sobressaltei-me na poltrona e em um ato instintivo, segurei o garoto ao meu lado pelo pescoço, prendendo-o ao recosto. Ele arregalou os olhos escuros — Calma! Você estava sonhando, eu acordei você. Por favor, não me machuca! — pediu o mesmo e eu imediatamente o soltei, passando as mãos pelo rosto e notando que eu estava molhada de suor frio. Respirei fundo, sentindo meu peito subir e descer rapidamente. Então fitei o garoto que me encarava assustado, como se eu fosse louca e, de fato, ele tinha motivos para pensar assim. Abri o cinto e passei por cima de suas pernas, andando até o final do corredor em buscar de um lugar onde pudesse respirar aliviada.

Aquele fora o sonho mais aterrorizante que eu já tive em todos esses meses. Não pelo fato de ser um dragão, mas sim pela dor e pelo medo que ele me infligiu. Nem demônios, criaturas, Raphael ou até mesmo Lúcifer haviam conseguido me deixar em um estado tão sufocante e agonizante como aquele. Eu estava aterrorizada. E antes que pudesse me dar conta, senti uma mão me puxar pelo antebraço até o outro lado da cortina que separava a área onde as aeromoças preparavam lanches e bebidas aos passageiros. Ainda com os sentidos em alerta, minha primeira reação foi levantar o punho e desferir um soco.

Dean se dobrou para frente, segurando o nariz enquanto dava um gemido abafado.

— Me desculpa! — repeti com remorso diversas vezes, indo até a mesinha com copos e térmicas para pegar alguns guardanapos e estendê-los para o caçador — Você me assustou.

— Me lembre de nunca mais fazer isso — murmurou pressionando o papel contra as narinas e levantando a cabeça para cima a fim de estancar o pequeno sangramento. Ele se apoiou em uma parede e eu na outra, logo a sua frente. O avião estava tão silencioso que era possível ouvir o barulho das turbinas do mesmo.

— O que está fazendo acordado? — perguntei um pouco mais calma.

— Eu nunca durmo dentro de um avião. — respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo, bem, para ele deveria ser — E você?

— Tive um pesadelo com aquele maldito dragão. — sibilei fechando os olhos por um instante e conseguindo lembrar perfeitamente do brilho vermelho dos olhos da criatura, algo que me ocasionou um arrepio.

— Shadow? É só uma história para assustar. — o loiro deu de ombros, fungando algumas vezes e caminhando até a pequena lixeira para se livrar do papel ensanguentado — Só existe um tipo dessas criaturas e eu já matei dois deles. — apontou de maneira positiva.

— Queria que você estivesse certo. — devolvi com um suspiro pessimista. Era verdade que existiam dragões do tipo de gostavam de ouro, virgens e essas coisas, mas Shadow fazia parte de uma mitologia poderosa e desconhecida. Parte de mim sabia que nem mesmo anjos seriam capazes de detê-lo se fosse libertado, o que estava por um fio. — Qual era o número da poltrona do Castiel? — indaguei querendo imediatamente achá-lo para que ele me dissesse que tudo iria ficar bem, algo pouco provável, mas que me tranquilizaria por agora.

— Sugiro que você não vá lá. — Dean apontou um dedo e eu o fitei — Ele está dormindo. — emendou comprimindo os lábios ligeiramente.

— Mas... — comecei confusa, logo me lembrando que quando um anjo perde a graça, ele vai se tornando humano aos poucos, algo que definitivamente não deveria acontecer nas leis da profecia, onde o anjo passa a se tornar caído, porém Castiel tinha se rebelado e sido cortado da matriz, algo que afetou brutalmente esse sentido. Com um baque, meus pensamentos foram interrompidos quando o avião se inclinou para o lado, fazendo com que eu fosse jogada para a parede. Bati com o ombro na mesma, sentindo o caçador ser lançado por cima de mim, me espremendo com seu peso devido ao impacto rude, logo cedendo ao piso áspero do carpete marrom.

— Senhores passageiros, nós estamos passando por uma turbulência. Por favor, fiquem em suas poltronas e em caso de emergência máscaras de oxigênio caíram ao seu alcance. — explicou a voz do piloto nas caixas de som enquanto eu segurava meu braço e tentava levantar do chão. Fiquei de pé e puxei Dean comigo, o mesmo permanecia imóvel, como um boneco inanimado e alheio as minhas tentativas.

— Dean, nós temos que voltar para nossos lugares. — avisei ao segurá-lo pela mão, porém outra turbulência ocorreu, fazendo o piso sob nossos pés balançar. Ele apertou os dedos no meu antebraço, se apoiando em mim para não sermos lançados novamente até a parede oposta.

— O avião vai cair. — murmurou apavorado enquanto eu me segurava em seus ombros. Os olhos verdes fitavam o nada a nossa frente, como se ele pudesse entrar em estado de pânico a qualquer minuto.

— Não vai cair! — disse parando a sua frente e sentindo que o mesmo apertava mais forte conforme o avião parecia ficar mais descontrolado, em poucos segundos era possível ouvir as pessoas nervosas e um alarme baixo ecoando da direção da cabine de controle — Vem logo! — tentei puxá-lo, mas o caçador estava petrificado ali.

— Não posso... — sussurrou ao me encarar apreensivo. E pela primeira vez eu vi Dean Winchester realmente assustado e não era algo engraçado, estava me causando pânico também. Eu não havia me dado conta antes, mas eu estava captando suas emoções negativas, exatamente como fazia quando possuía o octeto de rubi. Só que agora não havia imagens, eram apenas sensações e vozes. O caçador olhava em meus olhos e eu sentia, através do toque firme em meu braço, tudo aquilo que o assombrava toda vez que repousava a cabeça no travesseiro para dormir. Os gritos de Mary na noite em que foi queimada e o choro do bebê Sam Winchester enquanto corriam para o lado de fora da casa em chamas. O apego ao irmão e a promessa de cuidar dele com a própria vida, vê-lo morrer e sentir dentro de si mesmo que não havia sido forte o suficiente, que não havia sido corajoso o suficiente, que não havia sido o suficiente. Lembrar de John e seu sacrifício — selando um pacto com Azazel para trazer o filho de volta —, o momento em que viu seu corpo sem vida e espelhar suas atitudes, seguindo seus passos até o túmulo. O ressoar do relógio na noite em que o acordo acabava, os cães do inferno invadindo a casa, puxando, mordendo e rasgando sua pele, arrastando-o para baixo. O frio ao descer, o inferno sangrento e escuro, as torturas de Alaistar. Cada dia era como um século, cada dia era a mesma pergunta, sabendo que não iria aguentar por muito tempo.

Sabendo que nunca fora um filho bom o suficiente — embora tentasse ser —, nunca fora irmão o suficiente, nunca fora caçador o suficiente. Era o tipo de dor constante que não diminuía com o tempo, só aumentava e consumia por dentro.

Sacudi a cabeça, apertando os olhos marejados e de repente fomos arremessados para trás. A mesa de lanches entrou em movimento e veio por cima de nós com tudo e eu a desviei com o pé por pouco. Dean estava ao meu lado, ainda perplexo, pois havia revivido tudo aquilo comigo em uma fração de segundos. Eu ainda tentava limpar minha mente daquele turbilhão de coisas quando algo chamou minha atenção na parede ao lado, havia uma frase escrita na mesma, escrita com sangue.

“O jogo começou”. Arfei em descrença, imediatamente me virando para o Winchester.

— Dean! Que tipo de criatura sobrenatural pode controlar um avião? — questionei, e ao constatar que ele ainda estava fora do ar, eu o puxei pela camisa e dei um tapa em seu rosto para que recobrasse os sentidos — Dean! — insisti e o caçador me encarou, piscando repetidas vezes.

— Um anjo ou uma bruxa. — falou ainda atordoado, o estado de choque finalmente começando a deixar suas feições.

— O que está havendo? — indagou Sam, entrando pela cortina com Maison e Castiel, ambos confusos pelo fato do avião estar sacolejando como um pedaço de feno ao vento.

— Temos companhia. — respondeu a loira ao fitar a parede.

— Não sabemos exatamente o que é, mas por via das dúvidas vamos agir contra os dois. — começou o Winchester mais velho, se apoiando em mim enquanto ficava de pé e me puxava junto — Façam sigilos antianjos e nós vamos espalhar sacos de feitiços em todos os cantos. — ordenou virando-se para mim. Assenti e imediatamente todos se colocaram a disposição em suas respectivas tarefas, passei por Castiel e apertei sua mão gentilmente, o mesmo retribuindo o gesto encorajador que dizia sem palavras um “vai ficar tudo bem”.

Segui o caçador para fora da cortina, o mesmo marchando com dificuldade até a poltrona de Sam e vasculhando sua mala, por fim retirando vários saquinhos de tecido e me estendendo quatro. As pessoas estavam tão nervosas com aquela situação que mal ligavam para os dois estranhos andando por entre elas e se apoiando nos assentos enquanto jogavam alguma coisa por debaixo dos mesmos. Senti o piso do avião se inclinar para cima, me derrubando para trás e me fazendo deslizar junto com várias bolsas que caiam para o chão, segurei firme o último saco de feitiço que tinha enquanto Dean agarrava meu pulso para me ajudar a andar até a outra ponta, onde Simone — uma das aeromoças — estava agachada no canto direito, o rosto borrado de lágrimas e as feições assustadas.

— Precisamos entrar na cabine — disse para a mesma, que começou a balançar a cabeça em negação — Simone, nós podemos ajudar. Por favor. — insisti e ela puxou um cartão do bolso do uniforme, estendendo com a mão trêmula na minha direção. Rapidamente eu o segurei e tratei de usar no leitor luminoso, destrancando e passando pela entrada.

— Cadê o piloto? — o loiro perguntou assim que entramos e não vimos ninguém à frente do painel. Observei melhor, dando uma volta rápida e percebendo com pavor onde o mesmo estava.

— Serve aquele? — apontei para o homem desacordado no chão logo atrás da porta. Dean fechou os olhos, suspirando nervoso e se voltou para fora do local a passos largos.

— Senhores e senhoras, desculpem o transtorno, mas... — começou a exclamar com os passageiros que já estavam tensos e logo eu o puxei pelo braço.

— O que está fazendo?

— Tem alguém aqui que saiba pilotar um avião? — finalizou se desvencilhando de mim e todos que estavam sentados começaram a gritar. Levei as mãos até a cabeça, inconformada com a delicadeza que ele teve em não causar pânico. De repente um braço foi erguido no ar.

— Eu sei pilotar em simuladores. — disse o garoto que estava sentado ao meu lado durante a viagem.

— Vai ter que servir. Qual seu nome? — falou o loiro, gesticulando para que o mesmo viesse até nós.

— Baker. — respondeu rapidamente, parando de pé ao meu lado e me fazendo constatar que ele era alguns centímetros de altura menor que eu.

— Vai lá para dentro, moleque — sentenciou o Winchester e eu me virei para ele quando Baker passou por nós.

— Você colocou um garoto de dezesseis anos para dirigir um avião com cento e três pessoas? — chiei incrédula.

— Que outra opção eu tenho? — devolveu no mesmo tom. Bufei, me equilibrando ao sentir outra turbulência violenta que gerou uma sessão de gritos e até algumas orações de fundo — Esther... — Dean me puxou pelos ombros, virando-me para ele como se tivesse algo importante para dizer, porém acabou ficando mudo. Meus pés logo se firmaram melhor no piso e eu pude perceber quando um vulto passou rapidamente pelas minhas costas.

— Está estabilizando... Os feitiços funcionaram! — vibrei me desvencilhando do loiro e me voltando novamente para a cabine, onde as duas aeromoças estavam aflitas obstruindo a passagem.

— Conseguimos. — assentiu Sam ao lado de Baker e em frente ao painel de controle, um suspiro aliviado me fazendo recostar na parede e escorregar até o piso.

Saímos do avião em direção ao aeroporto de Buenos Aires. Ainda estávamos atônitos por tudo que havia acontecido durante o voo, passageiros traumatizados tentavam escapar da imprensa e de vários curiosos que se aglomeravam nos limites dos portões de embarque. Policiais e paramédicos eram visíveis atendendo os poucos feridos e interrogando as pessoas aturdidas, principalmente o adolescente herói que tinha pousado a aeronave quando o piloto desmaiou por razões desconhecidas até então. E com esse tumulto nós aproveitamos para passar despercebidos.

Fui até o banheiro — que por sorte estava vazio — dobrando as mangas da camiseta para cima e lavando o rosto com água fria. Era inegável para nós que a turbulência do avião tinha sido causada por algo sobrenatural e juntando isso com o meu sonho apavorante, as impressões absorvidas de Dean e as demais peculiaridades que estavam acontecendo ao nosso redor, eu podia dizer que minha cabeça estava prestes a explodir. Escorei os cotovelos na pia, fechando os olhos por alguns segundos e inspirando profundamente várias vezes. Abri as pálpebras e pisquei ao constatar que o espelho estava começando a embaçar, e para meu total terror, letras estavam surgindo.

“E o jogo continua”, foi a frase que havia se formado. Antes que eu pudesse processar a informação completamente, uma sirene ensurdecedora ecoou por todo o prédio do aeroporto. Corri até a porta e de cara já fui quase derrubada por um bando de pessoas que se dirigiam para fora do local as pressas, levando tudo pelo caminho.

— O que houve? — indaguei quase esbarrando com Maison que também vinha diretamente para mim.

— Alguém ligou e disse que tem uma bomba dentro do aeroporto e que ela vai explodir em quinze minutos! — elucidou Sam.

— Estamos sofrendo um atentado terrorista? — perguntei e eles se entreolharam.

— Eu não acho que seja por aí. Vamos sair daqui. — falou Castiel com a expressão preocupada, me puxando delicadamente pelo braço para que nós fôssemos ao sentido da multidão. Corri de encontro à saída, mal conseguindo sentir a luz do sol alcançar meu rosto quando um baque forte me jogou para trás com violência. O mesmo acontecendo com Maison e Sam que estavam logo atrás de mim. Observei as últimas pessoas deixando o prédio sem qualquer problema e fiquei de pé, tocando o local onde havia sido interceptada, sentindo uma barreira invisível tão forte quanto tijolos maciços.

— Mas que diabos... — começou Dean, que havia sido esperto o suficiente, junto com Castiel, para parar antes de dar de cara e voar longe. Aquele tipo de feitiço me lembrava o que Brawian havia usado para me prender dentro do apartamento, só que era uma abordagem um tanto diferente, no caso. Porém a lembrança logo me despertou uma teoria trágica.

Sons de palmas preencheram o ar e eu me virei, encontrando um homem alto e de cabelos castanhos. O mesmo usava um terno social e tinha as feições sérias, enquanto a garota ligeiramente mais baixa ao seu lado demonstrava certo divertimento.

— Dimitri. — adivinhei e ele assentiu, confirmando minha hipótese.

— Em outras circunstâncias eu diria que teria sido um prazer conhecer você, Esther. — falou com um leve sotaque que eu não consegui identificar como sendo alemão ou russo.

— Ele é o vampiro manda chuva dos Caçadores de Sombras? Não parece assustador, na verdade é patético. — debochou Dean, cruzando os braços e a garota ameaçou dar um passo na direção do loiro, sendo interceptada por Dimitri antes que o fizesse.

— Nós só viemos conversar. — elucidou o vampiro, fazendo com que ela parasse e apenas lançasse uma cara feia para nós.

— Ela causou a turbulência no avião. — adivinhou Castiel, se colocando a minha frente de maneira sutil.

— Amara é uma bruxa talentosa, a melhor que eu já conheci. — o mesmo deu de ombros, esticando o pescoço para me fitar — Suponho que tenha recebido o meu recado.

— Vocês estão mexendo com os meus sonhos? — questionei.

— Não é tão fácil quanto parece, mas possível. — revelou a bruxa triunfante.

— O que você quer exatamente? — devolvi.

— Quero que você diga ao seu irmão para parar de fugir de nós. Se não pudermos fazer com que ele jure por bem, faremos que jure por mal. — apontou o vampiro.

— Jimmy nunca vai se juntar a vocês. — disse Maison.

— E quem vai impedir? Vocês? — Dimitri deu uma risada breve e rouca — Só para deixar claro: Seis anjos ao redor de uma casa não seriam capazes de me impedir de entrar, se eu quisesse. Você está segura por enquanto, sua hora não chegou ainda. — garantiu, piscando na minha direção.

— O que quer dizer? — dei um passo em sua direção, mas o mesmo se virou e continuou a caminhar para longe. Amara ergueu uma das mãos sobre ele e o mesmo sumiu em frente aos nossos olhos, em seguida dando um sorriso mordaz enquanto estalava os dedos e um ruído podia ser ouvido nos corredores dos banheiros.

— Um presentinho de despedida — gesticulou mandando um beijo no ar e sumindo no ar, assim como aconteceu com Dimitri. Passos estrondosos ecoaram se movendo-se cada vez mais rápido até praticamente correrem até nós. E de repente uma criatura com cerca de três metros apareceu. Ela tinha a pele completamente desfigurada, seis olhos negros dispostos pelo rosto e braços com garras afiadas. Embora fosse bípede e remetesse as formas humanas, eu nunca a colocaria em tal categoria.

— O que é essa coisa? — questionou Sam pausadamente, instintivamente dando um passo para trás.

— Eu não sei se eu quero descobrir... — Dean engoliu em seco — Corre! — ordenou e nós imediatamente o fizemos, nos separando em frente à recepção quando o Winchester mais velho teve a ideia de agarrar a bolsa de armas e retirar uma pistola, começando uma sequência de tiros contra o monstro que só pareceu ficar mais irado. Castiel me colocou as suas costas, sacando a lâmina dos anjos e jogando certeiramente contra o mesmo, que desviou quando suas garras se expandiram, dando um urro que estremeceu as paredes do prédio.

Rapidamente eu o puxei comigo para subirmos a escada rolante, a criatura vindo logo ao nosso encalço e desferindo um golpe que a cortou em dois. Gritei e o anjo segurou minha mão no exato momento em que meus pés não encontraram mais o chão, me erguendo para cima até atingirmos o topo, porém o monstro foi mais rápido e deu um pulo de dois metros até o segundo andar, parando a nossa frente. Começamos a andar para trás, Castiel se colocando de escudo entre mim e a criatura sedenta de sangue. Um raio cortou o céu e a luz vacilou por um momento, a sombra de asas surgindo no piso, como um leão que emite um rugido para defender seu território. Porém ele estava sem seus poderes e uma luta corpo a corpo com certeza o mataria em segundos.

E antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa para nos tirar dessa situação mortal, nós fomos encurralados contra a parede e uma máquina de refrigerantes. Então o monstro ergueu o braço no ar e eu fechei os olhos, abraçando o anjo por trás e esperando pelo golpe fatal.

— Ei, coisa feia! — gritou a voz de Maison e ele voltou sua atenção para a loira, que se jogou para frente no exato momento em que Sam aparecia as suas costas para arremessar a lâmina angelical que acertou o peito da criatura, a mesma se desfazendo em uma explosão de cinzas pelo ar. Castiel expirou, nós dois respirando aliviados pela segunda vez no dia.

O carro recentemente roubado parou em frente a uma casa grande e luxuosa. Finalmente havíamos chegado ao nosso destino principal, e depois de quase sermos mortais duas vezes consecutivas, os ânimos estavam mais tensos do que de costume. Passamos pelo portão de ferro arrombando a tranca e indo em direção a casa, Sam e Dean fazendo questão de neutralizar os guardas e poucos empregados pelo caminho com um pano encharcado com certa solução que os fazia desmaiar.

Lá dentro tudo estava silencioso.

— Suponho que ele devia estar aqui, mas isso está aparentemente vazio. — comentou Maison, passando os dedos pela mobília lustrada.

— Vou olhar os quartos. — instruí rapidamente, indo para a escada e Castiel me seguindo. Tudo que eu queria no momento era achar as garotas e sumir daqui para colocar meus pensamentos em ordem, mas uma sensação estranha me dizia que as coisas não seriam tão fáceis. Passamos pelo corredor, optando por curiosidade pela porta que estava entreaberta. Observei o cômodo, a cama de casal e as cortinas de veludo.

— Impecável. — comentou o anjo.

— Até demais. — murmurei me voltando para o guarda roupas espelhado, tão grande que refletia quase o quarto inteiro, dando a impressão de que era muito maior do que parecia. E em contraste com isso havia um pequeno na parede ao lado, do tamanho de um porta retratos — Por que alguém teria um espelho tão pequeno em um quarto que tem um guarda-roupas espelhado gigantesco? — questionei observando o objeto. Castiel me encarou com curiosidade e então o puxou dali, revelando um botão embutido na parede. Ele o apertou e de repente a mesma começou a mover-se para o lado, revelando um cômodo paralelo.

Arqueei as sobrancelhas. O quarto vermelho tinha traços em couro, câmeras, chicotes e outros apetrechos que eu desconhecia o nome — e não fazia muita questão de saber. Mas a coisa que mais chamava atenção eram as bonecas dependuradas no teto, sobre a cama e em cadeiras de balanço, eram cerca de dez, todas extremamente e morbidamente realistas.

— O cara tem fetiche por marionetes? Isso é bizarro. — grunhi com uma careta de nojo, passando os dedos pelo cabelo longo de uma japonesa que estava de cabeça para baixo perto da entrada.

— Esther... — murmurou Castiel alarmado, segurando meu cotovelo antes que eu pudesse dar mais um passo.

— O quê?

— Não são marionetes. — continuou e sua expressão tinha traços de pânico e surpresa. Encarei novamente as bonecas, meus olhos parando sobre uma em especial, a que estava solitária na cadeira. Os cabelos lisos e escuros desciam sobre a pele alva que contrastava com a lingerie vermelha, mas foi quando foquei seus olhos que o ar que estava em meus pulmões foi retirado com um soco de realidade.

— Rebbeca? — sussurrei com descrença e pavor, me desvencilhando das mãos dele e dando passos receosos até a mesma. Agachei-me em frente à cadeira e percebi suas íris me acompanharem quando toquei seu rosto, imediatamente a mesma sensação que eu havia sentido com Dean no avião começou mais uma vez. E como antes, era igual quando eu conseguia absorver as memórias dolorosas quando não usava o octeto de rubi, como fiz com Agatha na primeira vez que o incidente ocorreu. Mas agora era como se uma nuvem de poeira densa estivesse entre mim e as imagens que passavam pelos meus olhos rapidamente, deixando apenas o rastro físico de violência e crueldade. Mesmo sem conseguir ver o que acontecia, os ruídos e sensações ainda eram tão reais quanto possível. A incapacidade de lutar, de gritar, de revidar, ter seu corpo usado como um brinquedo, torturado.

Eu me sentia suja apenas de compartilhar aquelas memórias.

— Que diabos é esse lugar e essas bonecas? — perguntou Dean enquanto marchava quarto adentro. Percebi que Castiel estava puxando meus pulsos para longe de Rebbeca, me erguendo pelos ombros devagar. Eu estava embasbacada, aflita e enojada. Afastei-me das mãos do anjo, ainda sentindo rastros das memórias percorrerem o meu corpo e me voltei para o caçador.

— São as garotas! Esse psicopata doente fez isso com elas, Dean!

— Você está dizendo que... — começou olhando ao redor, suas feições se tornando duras e incrédulas — Como é possível? — sussurrou. Trinquei os dentes e andei até a cama, o anjo me parando antes que eu pudesse fazer o que pretendia, que era começar a tirar todas elas dali.

— O que vai fazer?

— Não podemos deixá-las, estão vivas. — apontei um dedo, desviando do mesmo que segurou meu braço.

— Esther! Nós não podemos ajudá-las, seria preciso uma quantidade de poder muito grande para restaurar todas essas garotas. Sem contar que...

— Sem contar que o quê? — interrompi alterada.

— Às vezes os seres humanos cometem atos violentos tão cruéis que marcam a alma permanentemente. — revelou Maison, entrando pela porta acompanhada de Sam — Mesmo se pudéssemos, elas nunca seriam felizes, nada de bom aconteceria com elas porque suas almas foram mutiladas. É como um ímã que atrai mais dor. — a loira apertou os lábios.

— Eu sinto muito. — murmurou Castiel enquanto eu arrastava as mãos pelos cabelos.

— Tem de haver uma forma. São garotinhas! — ralhou o Winchester caçula.

— Elas parecem garotinhas para você? Foram mutiladas como animais! — exclamou a loira — Eu consigo sentir a dor que sai da aura de cada uma, tão esfolada e escura que é pior que lixo tóxico. — sussurrou com um sibilo baixo. Soltei um grunhido baixo e de repente uma figura surgiu pela porta, o telefone no ouvido e o semblante despreocupado denotava que estava completamente alheio ao que tinha acontecido pela casa.

Erik deitou o aparelho cair no chão e arregalou os olhos para nós.

— Quem são vocês?! Como entraram aqui? — esbravejou de maneira autoritária quando percebeu que havíamos invadido seu cômodo secreto.

— Você! Sua barata nojenta! — apontei para ele, partindo em sua direção e sendo barrada por Sam, que me segurou antes que eu tentasse distribuir uma boa sequência de socos.

— Calma! — pediu o moreno ao mesmo tempo em que o homem se virou para correr, porém Dean foi mais rápido e acertou uma coronhada com a pistola, desacordando-o imediatamente.

— Esticado e prontinho para o interrogatório. — sorriu em deboche.

Depois que Maison terminou de amarrar Erik em uma cadeira no centro do quarto, Dean entrou com um balde de água, despejando-o sobre o homem que acordou aturdido. Cruzei os braços, me recostando na parede próxima para observar a cena, tentando controlar a vontade que eu estava de bater com a cabeça dele no chão.

— Há mais garotas? — começou o Winchester caçula imediatamente, recebendo um olhar frio como resposta.

— Você nunca irá saber.

— Por que fazer isso? — questionou Maison.

— Não é óbvio? Quantos homens vocês acham que pagariam para ter uma bela garotinha como seu fantoche sexual? Muitos! — exclamou com uma risada arrogante.

— Você é um maldito bastardo doente. —cuspi com nojo até de olhar para o rosto dele.

— E você daria uma ótima boneca. Sem falar, ouvir, se mexer e sequer pensar. Apenas imóvel e pronta para ser fodida... — o mesmo foi interrompido quando Castiel retirou a lâmina dos anjos e fincou a ponta no ombro de Erik com displicência, o mesmo dando um grito de dor e encarando o anjo com descrença e medo.

— Eu teria cuidado com as palavras. — sugeriu, a voz autoritária e o olhar ameaçador.

— Se me matarem nunca terão a chance de descobrir onde elas estão. — elucidou o homem, um princípio de barganha facilmente sendo detectado.

— Então há mais delas? — reiterou a loira.

— Algumas dezenas sendo fabricadas nesse exato momento. — revelou — Eu só vou falar quando entrar em contato com meu advogado, não respondo para policiais.

— Acha que somos do FBI? — começou Dean com uma risada sarcástica, parando logo a frente do homem e se inclinando para o olhar fixamente — Nós não trabalhamos para ninguém e isso quer dizer que eu não vou hesitar em pegar essa faca e enfiar no seu olho caso não coopere. — o mesmo retirou o objeto afiado da cintura e colocou bem próximo a íris dele, que tentou recuar o máximo que podia estando amarrado.

— Desse jeito eu nunca vou falar. — teimou o mesmo e eu arranquei a lâmina das mãos de Castiel, enfiando-a na coxa daquele psicopata com ímpeto.

— Onde elas estão?! — gritei e Erik trincou os dentes conforme a dor percorria seu corpo, inclinando a cabeça de maneira relutante para a mesinha onde havia um notebook preto. Sam percebeu o gesto e logo foi até o computador, abrindo-o diretamente em uma página na DeepWeb, onde a notificação de um vídeo apareceu para ser exibido.

Observamos a tela, conforme passava de totalmente preta para a gravação do próprio senhor Grimsem falando:

“Eu crio brinquedos escravos, ou seja, transformo jovens em brinquedos sexuais gerenciáveis. As meninas não podem ir embora, não podem resistir, não podem dizer nada, pois elas estão lá apenas para sua diversão. Eu sou um cirurgião, vou até países na periferia onde a maioria vive na rua ou principalmente em orfanatos. Algumas garotas são muito jovens e tem sorte de serem adotadas, já as outras, com oito ou nove anos de idades, já são muito velhas. As meninas mais bonitas são vendidas para a prostituição, você poderia considerar isso de sorte também para elas, em vez de desaparecer lentamente no meio da sujeira e pobreza. E algumas meninas eu compro. Geralmente escolho as mais jovens, no início da puberdade. O orfanato é muito cooperativo, eles estão felizes de terem uma boca a menos para alimentar, um novo lugar para preencher. Eles também aceitam de bom grado minhas doações para as meninas, nunca perguntam e eu nunca iria falar sobre o que acontece. Você pode encomendar um brinquedo se quiser, mas eles não são baratos, eu cobro entre trinta e quarenta mil dólares por cada. Mas você terá uma Lolita escrava que lhe dará satisfação por anos, ela é como uma boneca, mas ela é uma boneca viva.

Agora me deixe dizer como eu as transformo: Ela chega nua, amarrada e de olhos vendados. Depois de uma breve inspeção e uma rápida verificação médica, levo-a para minha clínica especial em minha casa. Primeiro vou limpá-la muito bem — essas meninas realmente cheiram mal e são imundas — elas tomam um banho e quando estiver finalmente limpa, eu a coloco em uma cama de hospital e dou-lhe uma injeção para fazê-la dormir. Na manhã seguinte é o dia da grande operação. Eu a coloco na mesa de operações e administro anestésicos, logo vou amputar os braços bem acima dos cotovelos e as pernas bem acima dos joelhos. Fácil, né? Essa garota nunca vai ficar longe de você. Para uma menina é um processo um tanto pesado, mas a maioria sobrevive.

Não pensei que eu estou deixando as meninas apenas com tocos, vou anexar uma barra de metal de cinco centímetros bem firme ao osso antes de costurar as feridas. A outra extremidade da barra tem uma rosca de parafuso, onde é possível anexar uma junta. No começo tem que cuidar das feridas nos tocos para evitar inflamações. Uma vez curada, vou colocar uma capa de silicone sobre o toco. A parte externa da tampa é coberta com veludo branco e isso realmente parece muito doce, apesar de cruel. Depois de alguns meses, você pode colocar pressão sobre as barras, um exemplo é pendurá-las no teto, é uma forma interessante de decoração em seu quarto e é muito bom para usar sua boca quando ela está dessa forma. Em seguida também corto suas cordas vocais, por isso ela não pode mais falar e fazer ruídos, e também retiro os dentes de sua boca. Depois de removidos, eu implanto uma camada de silicone em suas mandíbulas, ela ainda será perfeitamente capaz de praticar sexo oral, porém não poderá mordê-lo — mas é realmente muito bom quando ela tenta morder, pois a camada superior macia em sua boca fará uma espécie de massagem. Uma vez que a ferida estiver cicatrizada, é hora de o treinamento começar.

Ela não é mais uma garota comum, tornou-se um brinquedo, há um monte de coisas que precisa aprender. Já que a garota não tem mais dentes, não pode comer, precisa ser alimentada como um bebê. Aconselho alimentá-las uma vez por dia com fórmula infantil, pois contém todos os minerais e vitaminas necessários. A comida e bebida são retornáveis, então você tem que colocá-la no banheiro algumas vezes por dia e como ela não pode se mover, você precisa levá-la e trazê-la. Embora a garota não possa mais falar, eu ainda posso me comunicar com ela para lhe ensinar algumas coisas elementares. Eu a ensino como ser uma escrava, chicoteando todos os dias — principalmente em combinação com vibradores — de modo que a mesma em algum ponto não saiba ser capaz de discernir entre dor e prazer. Vou colocar grampos e pinos em suas partes sensíveis, esticar, espetar com agulhas, cera quente, eletrocutar, costurar. Qualquer tipo de tortura ela terá que ser capaz de suportar antes de chegar ao próximo passo.

Nessa fase eu cuido para que a garota veja e perceba como eu a torturo. Tenho uma câmera funcionando a maior parte do tempo e ela terá que ver as cenas, além de mais alguns filmes realmente fortes. Até agora a menina ainda era capaz de ver e ouvir, ela não estava completamente privada dos sentidos. A verdadeira escrava não é capaz de nada.

Antes de privá-la dos últimos sentidos, vou dar-lhe um anestésico. Então coloco fones em seus ouvidos e coloco por várias horas ruídos extremamente altos nos fones. Isso será suficiente para danificar sua audição e ela não será capaz de ouvir mais. Como toque final trato seus olhos com laser. A menina não vai ser completamente cega, ainda irá reagir a luzes fortes e sombras tênues, no entanto, eu as vendo a maior parte do tempo — mas isso porque gosto de garotas vendadas. Elas são completamente entorpecidas, nem sequer fazem barulho quando você as tortura. Só posso ver a partir das reações do seu corpo, o aumento da velocidade de respiração e a expressão em seu rosto. Ela está sofrendo, sentindo dor.

Os brinquedos escravos que estão à venda são ainda virgens e entrando na puberdade, mas elas são bem treinadas para sexo oral, são torturadas e abusadas pesadamente. As garotas podem ficar grávidas, então anticoncepção é aconselhável — a não ser que você queira ter um brinquedo grávida.

Apenas me deixe saber se você quiser encomendar uma. “

A gravação terminou e no lugar do vídeo se abriu uma janela de inscrição online. Depois de ouvir tanta sujeira e me lembrar do que havia visto nas memórias de Rebbeca, eu só conseguia sentir um desprezo tão grande que a minha vontade era de gritar. Encarei as expressões tão perplexas quanta a minha, Sam tinha o rosto virado para o lado — provavelmente incapaz de continuar presenciando aquela situação — e Maison parecia se controlar para não avançar no pescoço de Erik. Marchei até a mesa e peguei o notebook, indo até o homem e acertando seu rosto com o equipamento que teve a tela trincada com o impacto.

— Você me dá nojo. — proferi as palavras largando o computador no chão e arrastando a mão pelo rosto.

— Eu as salvei! Eu as tirei da imundície e da miséria em que iam desaparecer! — latiu de volta, um filete de sangue escorrendo da testa. De repente a história que Rosely havia contado, sobre o elfo que procurava garotas para se tornarem fadas na floresta encantada, a história que Erik contava às crianças. Será que, no fundo, ele acreditava que isso que fazia era uma versão distorcida desse conto? Uma versão doente e desprezível?

— Transformando-as em marionetes sexuais? — esbravejou Sam — Em que mundo isso é salvar alguém? Você é um monstro! — o moreno trincou os dentes.

— No vídeo diz que há uma área hospitalar na casa. — elucidou Maison.

— E no que isso ajudaria? Encontrá-las ou não? É irreversível. — falou Erik.

— Onde está Melanie? — questionei me voltando para o mesmo — Ela tinha seis anos de idade! — gritei de frente para seu rosto.

Eu vendi. — cuspiu com sarcasmo. A onda de raiva que passou pelo meu corpo foi tão forte que eu já não controlava meu braço quando o mesmo levantava no ar para acertar um soco nele, porém minha mão foi impedida por Erik, que a segurou no momento em que conseguiu se soltar. O homem rapidamente ficou de pé, usando de um movimento sagaz para enfiar um objeto afiado no meu ombro. Caí para trás com um grito de dor enquanto o mesmo saia correndo pela porta.

— Ele tinha um canivete, desgraçado! — exclamei puxando a ponta que havia ficado para fora com força, sangue escorria pela blusa, manchando o tecido. Castiel se agachou ao meu lado, juntamente com Dean e Maison.

— Você precisa estancar esse sangramento.

— Eu preciso pegar esse filho da mãe — interrompi me colocando de joelhos e em seguida de pé, indo para fora do quarto.

— Auto detonação em três minutos. — se pronunciou a voz robótica de maneira pausada. Nos entreolhamos alarmados, percebendo que a televisão embutida na parede acabara de se acender, na tela Erik nos dava um sorriso debochado.

— Acho que o jogo virou, não é mesmo? Essa casa, e todas as provas, vão virar pedacinhos daqui há... — ele encarou o relógio no pulso — Dois minutos e quarenta e sete segundos. Vocês podem sair correndo, feito ratos covardes, ou salvar a garotinha. — opcionou, virando a câmera para o lado e mostrando Melanie, que estava com as mãos e pés amarrados em frente a uma parede branca com um quadro da bandeira dos EUA — Mas eu duvido que a encontrem a tempo. Eu adoraria ficar para ver o desfecho dessa adorável aventura, mas tenho um jatinho para pegar. E então, salvar a vida dela ou a de vocês? — o mesmo deu uma risada alta e divertida.

Antes que qualquer um pudesse dizer alguma coisa, nós já sabíamos o que fazer. Sam e Dean correram pelo segundo andar, entrando nos quartos ainda inexplorados enquanto Maison, Castiel e eu descíamos as escadas com pressa para fazer o mesmo. Nós tínhamos dois minutos para revirar uma casa gigantesca — com possíveis cômodos escondidos — para achar uma garotinha. Era quase uma missão suicida, mas nenhum de nós cogitaria a possibilidade de sair daqui sem tentar.

Fui em direção a biblioteca, reparando que havia uma porta ao lado da estante. Experimentei girar a maçaneta, porém estava trancada.

— Trancada! — exclamei e Maison logo me puxou pelo braço, abrindo espaço para dar um empurrão contra a entrada. Em seguida desferiu um chute para quebrar as dobradiças.

— É uma sala vazia! — protestou a loira quando demos de cara com as paredes brancas. Pisquei algumas vezes em confusão, o som do relógio e os avisos constantes de detonação da voz robótica não me deixavam pensar direito. Percebi que em algum momento Castiel havia se separado de nós, provavelmente procurando em outros cômodos, e isso era uma coisa boa para o que eu tinha em mente no momento. Se eu conseguia sentir as energias quando usava meus poderes, deveria ser capaz de sentir uma pessoa, certo? Fechei os olhos e esperei, a ansiedade não ajudando em nada a me concentrar. Demorou cerca de dez segundos até meus sentidos começarem a ficar aguçados, meus ouvidos captando batimentos cardíacos ao longe, junto com vibrações quentes de uma aura humana.

— Aquela parede — apontei ao me virar de costas de repente, então Maison foi até o local, batendo algumas vezes contra a superfície que emitia ruídos ocos, em seguida a forçando e só então tendo a ideia de arrastar para o lado, revelando um cômodo. Entramos de supetão quando Erik terminava de fechar as portas de um elevador — Tira a Melanie daqui! — ordenei para a loira enquanto a mesma corria para a garotinha presa e assustada na cadeira.

— Aonde você vai? — indagou enquanto eu apertava os botões do painel freneticamente e esperava o mesmo subir.

— Aquele cretino não vai escapar!

— Esther! — gritou no momento em que eu entrei no elevador. Saí em um corredor estreito e escuro, subindo uma escada de metal até um segundo nível, chegando a tempo de ver o homem fechar uma porta automática com um sorriso triunfante no rosto, logo atrás dele dava para ver um helicóptero e o teto da casa de abrindo para que o veículo pudesse sair. Inconformada com o fato de aquele monstro poder escapar impune, eu concentrei minha energia novamente, dessa vez me lembrando das instruções que Lúcifer havia me dado para que eu pudesse controlar dezenas de demônios de uma vez só. Então eu consegui sentir a barreira inanimada que era o metal grosso da porta, enviando uma onda feroz até a mesma que foi arrancada com um baque seco.

O homem se voltou para mim com os olhos arregalados.

— Você é um rato e vai morrer como um. — sentenciei e ele tentou correr em direção ao helicóptero, mas eu o mantive preso, aproveitando que já estava com meus poderes concentrados e engatilhados. Conectar-me a um objeto inanimado, como um carro, era parecido com lançar um elástico e prendê-lo a um barbante do outro lado, assim conseguindo movê-lo como uma marionete. Mas me conectar a um ser humano era mais complicado, pois exigia que eu lançasse diversos elásticos para conseguir, por fim, controlá-los.

Quando senti que Erik estava completamente envolto, ergui a mão no ar, consciente da ligação que eu estava exercendo sobre ele no momento, e então comecei a forçar o punho. A expressão de dor em seu rosto era evidente e só não havia gritos, pois eu o estava impedindo de tal. De fato, eu sabia que poderia simplesmente desacordá-lo e deixar que a justiça fosse feita pela polícia, mas uma parte de mim estava se divertindo com isso, estava se sentindo vingada, uma parte de mim sabia que ele merecia. Mantive a pressão, elevando-a rapidamente até que eu pude ouvir os ossos se quebrando lentamente por baixo da pele, os globos oculares ficando cada vez mais salientes. Era como espremer um pedaço de carne com as mãos. Senti uma pontada do lado inferior da cabeça, de repente liberando uma onda feroz de energia que atingiu Erik, jogando-o contra o helicóptero como se fosse um boneco de borracha, destroçado e sem vida.

Um filete de sangue escorreu pelo meu nariz, evidenciando que eu havia forçado os limites para mim mesma.

— Diga que você teve que fazer isso. — murmurou Castiel logo atrás de mim, os olhos azuis tinham um misto de alarde e decepção. Então meus ouvidos captaram uma faísca no ar e no segundo seguinte o anjo me puxou para baixo. O veículo havia explodido dentro do cômodo que agora pegava fogo em cada centímetro quadrado dele.

— O que está havendo? — questionei ao perceber que aquelas chamas não eram normais, elas se alastravam pelas paredes e percorriam ao redor como serpentes.

— Temos que sair daqui! — exclamou o mesmo, sua voz quase sendo abafada pelo som das explosões e do sistema anti incêndio que emitia um alarme ensurdecedor, juntamente com as válvulas presas no teto que jogavam água sobre nós.

— Onde estão os outros?

— Do lado de fora com a Melanie. — falou o anjo, me puxando de lado no segundo em que uma porta voou na nossa direção. A água já era o suficiente no chão para nos fazer deslizar por ele e ensopar as roupas. Descemos dois lances de escadas, que fora mais rápido que usar o elevador, chegando ao local onde a garota estava presa, porém os cálculos mentais que eu fazia rapidamente não estavam sendo nada positivos.

— Auto detonação em três, dois... — começou a voz robótica, fazendo sua última contagem regressiva. Castiel me encarou apavorado. Era a terceira vez que nós estávamos de frente para a morte naquele dia, e era a segunda vez que ele segurava a minha mão firme entre seus dedos e eu fechava os olhos esperando pelo pior. Só que agora ninguém apareceria para nos salvar.

Acabou.


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Notas finais do capítulo

Ufa! Quanta coisa, não é mesmo? Essa história sobre "bonecas sexuais" circula há um tempo pela internet, principalmente alguns vídeos disso pela DeepWeb (lugar que desaconselho vocês a visitarem, tem coisas lá que são beem fortes...). Então resolvi colocar isso na estória, tanto pelo impacto quando pelo fato de abrir um pouco os olhos das pessoas para esse tipo de coisa que acontece (não sei se realmente é verdade todos esses procedimentos macabros, mas o tráfico de mulheres e crianças é real).

Agora, sobre o resto:
▬ Gente, eu imagino o Dimitri como o Christian Grey HAUSHAUSHAU.
▬ A Esther tá ficando poderosa...Isso não é uma coisa boa.
▬ Spoiler: O próximo capítulo é um dos mais esperados da fanfic inteira. E só pra vocês terem uma ideia do que vai acontecer, lhes deixo o título "Pegando fogo".

Próximo em breve! Obrigada a todas pelos comentários e favoritos! ♥



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