Separate Ways - Requiem escrita por WofWinchester


Capítulo 31
Ascensão


Notas iniciais do capítulo

Olá! *desvia das pedras* -q.
Antes de vocês me matarem, eu queria explicar o porquê do hiatus. Bem, algumas leitoras vieram falar comigo e me pediram para dar uma pausa na estória, pois estavam com provas finais, estudando e não sei mais o que e não queriam ficar muito longe das atualizações, e como eu também estava bem atarefada com essas coisas, dei um tempinho. Porém estou retornando com as postagens regulares a partir de hoje, peço desculpas à todas pela demora (principalmente para responder os comentários).
Mais uma vez agradecendo aos comentários e favoritos lindos e maravilhosos, e as recomendações de
Kiumme e DesertWolf H S Winchester! ♥

Sobre o capítulo: Que a emoção comece.
Espero que gostem.



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Eu não confiava nada na ideia de ter um demônio trabalhando conosco, principalmente depois de ter sido sequestrada por vários deles recentemente, porém Balthazar afirmou que era a única maneira de entrar no lugar, que tinha selos de proteção contra anjos e também símbolos para afastar caçadores.

Nós estávamos no pátio da oficina, onde o capô de um carro qualquer era usado como altar para as velas e objetos de invocação, e o chão de terra era pintado com tinta spray vermelha. Bobby estava dependurado no telefone, fazendo dezenas de ligações para ver se alguém sabia algo sobre a seita de demônios, e Balthazar estava sentado no teto da carcaça de um Fiat com um pacote gigantesco de pipocas, se divertindo muito com a situação.

— Vou repetir pela vigésima vez: Não gosto nada disso. — falei cruzando os braços e batendo o pé no chão, impaciente.

— Temos que recuperar o amuleto, e ter a segunda parte da placa é imprescindível — ressaltou Castiel logo ao meu lado, na mesma posição que eu.

— E qual a garantia de que vai haver algo naquela pedra que possa reverter ou parar a profecia? — indaguei com dúvida.

— E qual a garantia que não há? — rebateu o anjo, me deixando sem resposta.

— E como vocês sabem que ela vai nos ajudar, e o mais importante, como vocês sabem que ela é confiável? — perguntei arqueando as sobrancelhas.

— Por que nós temos uma faca que mata demônios — falou Dean, girando sob os calcanhares para me fitar — E se isso não der certo, o Cass chama ela para um canto, aí a Meg fica bem mansinha e faz o que a gente quiser — brincou com um tom malicioso, fazendo o irmão revirar os olhos.

— Eu não entendi — Castiel franziu a testa por um momento.

— Ah, que novidade — o loiro fez uma expressão de tédio — Eu quis dizer que a demônia é apaixonadinha por você, e isso pode ser um ponto ao nosso favor. Chega junto e chama para comer uma pizza, entendeu?

— Pelo amor de Deus, Dean, cala essa boca — resmunguei um tanto revoltada com aquele assunto. O anjo ficou alguns segundos em silêncio, encarando algum ponto fixo no chão com seriedade.

— Ela não é apaixonadinha por mim, e eu não quero comer uma pizza. — decretou depois da pausa, com a típica cara de quem não entendeu nada.

— Esse não tem salvação. — o Winchester mais velho jogou os braços para cima, arrancando uma risada de Sam.

— Ok, ninguém vai comer pizza com ninguém. Voltemos ao assunto principal, que não é “as dez maneiras de conquistar uma demônia”. — imitei o gesto do loiro, dando alguns passos para ficar entre os dois.

— Alguém ficou com ciúmes... — murmurou Balthazar, me fazendo lançar um olhar mortal na direção do anjo que começou a tossir, se engasgando com as pipocas.

— Certo, se a faca não meter medo nela e nem o exorcismo, a gente tem isso aqui — começou o Winchester caçula, apontando para uma sacola de pano encardida que jazia no chão, próximo aos pés de Castiel — Os ossos dela, o ponto cego de qualquer demônio.

— E não foi fácil de conseguir, agradeçam a mim — falou Balthazar novamente, gesticulando para os restos e em seguida para o próprio peito. E a julgar pelos dez minutos que ele havia demorado para se desmaterializar e voltar com aquilo, não deveria ter sido fácil mesmo.

— Obrigado, ó magnífico — debochou Dean, com uma reverência sarcástica — E quanto às alucinações? — questionou mudando de assunto, virando-se para mim e estreitando os olhos para os raios de sol que vinham diretamente contra seu rosto.

— Quando eu acho que estou começando a ver lagartas cor-de-rosa gigantescas e voadoras, o Cass me traz de volta com os dedos mágicos — expliquei com o tom divertido, que fez o loiro soltar uma risada baixa.

— Mas isso drena muita energia e logo vai se tornar complicado de fazer — esclareceu Castiel com um suspiro, desviando o olhar para o lado momentaneamente.

— Por que a graça de Lúcifer é como um vírus no seu corpo, e a cada vacina da realidade, ela vai se tornando mais forte — explicou o anjo, enfiando várias pipocas na boca — E, além disso, Cassie está com problemas com o pó mágico angelical que está cada vez mais escasso.

— O processo da queda? — questionou Sam.

— Sim. — suspirou Castiel novamente. E a maneira como seu rosto estava tenso denotava um pânico contido, o que me fazia sentir um aperto no peito. Ele acabaria caindo por minha causa, e isso era a última coisa que eu desejava que acontecesse. — E não falta muito tempo para que meus poderes terminem a mutação.

— Quanto tempo? — indagou o Winchester caçula, sacudindo a lata de spray e preparando-se para traçar as linhas da chave de Salomão no espaço de terra.

— Em breve — falou o anjo seriamente, fazendo nós nos entreolharmos com expressões preocupadas.

— Então temos que dar um jeito nisso o mais rápido possível. — assentiu o Winchester mais velho, pegando uma faca do bolso do casaco e passando a lâmina rapidamente na mão, deixando várias gotas vermelhas escorrerem no recipiente do ritual, o que chamou minha atenção de imediato.

Percebi as mesmas caindo lentamente, os pingos pareciam pequenos rubis brilhantes, e quando finalmente chegaram ao fundo do objeto, meus pés começaram a afundar. Olhei para baixo com alarde e vi que eu estava presa até os joelhos por uma poça de sangue gigantesca e pegajosa, mas antes que eu pudesse sequer pensar em mais alguma coisa, senti Castiel tocar a minha bochecha e fazer aquela visão desaparecer.

— Monstros ou demônios? — questionou com um sorriso de lado, fechando os olhos por um segundo. Aquilo era exaustivo para ele, e a única coisa que eu poderia fazer era tentar me controlar o máximo possível, o que nem sempre funcionava.

— Lagoas de sangue — sorri de volta, abaixando o rosto com certo constrangimento. Notei que o anjo ainda mantinha o braço erguido na minha direção, as pontas dos dedos roçando suavemente a minha pele.

— Essa é nova — comentou assim que eu fiz contato visual novamente, o vento vinha das minhas costas e jogava meu cabelo para frente. Ficamos nos encarando por segundos, até que ouvi Dean soltar um sonoro pigarro. Desviei o olhar e vi os irmãos com caretas surpresas para nós, o que me fez ficar vermelha de vergonha.

— O amor é lindo — debochou Balthazar com uma risada anasalada.

— Certo, vamos chamar a Meg — juntei as palmas das mãos, ignorando o anjo andando até o capô onde estavam os objetos de invocação.

Após Sam terminar de fazer os riscos da armadilha usada para aprisionar o demônio, Dean jogou o fósforo queimando dentro da tigela com ervas e sangue, enquanto puxava um pano para estancar a hemorragia no corte. Nós nos encaramos em silêncio, e foram cerca de seis segundos de espera no meio do ferro velho até que ela aparecesse.

— E lá vem os Winchester de novo... — murmurou a garota, revirando os olhos dentro do símbolo. O cabelo preto com várias ondas desgrenhadas balançava sob os ombros.

— Oi, vadia — Dean deu um sorriso satisfeito.

— Isso é jeito de tratar uma velha amiga? — resmungou sarcástica, apontando para a armadilha com irritação e percorrendo nossos rostos demoradamente com o olhar.

— Queremos te pedir um favor. — esclareceu Sam, se aproximando da mesma e parando logo a minha frente.

— Vulgo “ameaçar” — se meteu Balthazar, de boca cheia.

— É mais um acordo, você nos ajuda e nós não matamos você. — acrescentou o Winchester mais velho, apertando o pano na mão.

— Sério? Que piada ótima. — repetiu Meg incrédula, começando a rir alto por vários segundos. Então percebeu que todos permaneciam sérios e logo desfez a expressão debochada. — Ok, não é piada.

— Não mesmo. — concordou o loiro.

— E por que infernos vocês acham que eu os ajudaria em alguma coisa? — chiou a demônia, andando impaciente até os limites da chave de Salomão com os punhos fechados.

— Por que nós estamos pedindo com jeitinho? — desafiou Dean com o tom sarcástico.

— E por que nós temos isso — falou Castiel, apontando para o saco de ossos, e no mesmo instante o rosto de Meg ficou tenso.

— Que mania feia de mexer nos restos dos outros, Clarence — desaprovou com receio — Onde achou isso?

— Demônios têm que aprender a esconder suas coisas nojentas melhor. — comentei com uma careta irônica, recebendo como resposta uma olhar de raiva.

— O que vocês querem? — disparou a mesma.

— Que nos coloque dentro de um lugar que só demônios podem entrar. — revelou Sam.

— E onde seria isso?

— É um necrotério desabilitado no sul de Chicago, e os demônios estão dando uma festinha por lá. — respondeu Balthazar seriamente.

— A ideia é que você entre e apague os símbolos de proteção angelical e distração de humanos, assim podemos entrar — observou Castiel, fazendo-a estreitar os olhos por longos segundos.

— Não posso. — sentenciou a demônia depois de uma pausa.

— Como assim “não pode”? — enfatizou Dean.

— Depois do incidente com o Crowley, eu andei dando as minhas investigadas, e esses demônios da festinha são uma seita muito forte, se me pegam, me matam. — esclareceu Meg apreensiva.

— E eu que achei que ela fosse durona. — comentou o loiro, virando-se para o irmão com os cantos dos lábios puxados para baixo de uma maneira sarcástica.

— Cale a sua boca! — latiu a garota, trincando os dentes.

— Certo. Todos calmos. — interveio Sam, se aproximando do círculo com passos rápidos, retirando a faca do bolso e alisando-a sugestivamente na direção dela — Meg, você não está entendendo. Somos nós que você tem que ter medo aqui, porque somos nós que temos os seus ossos e meios de te torturar, então sugiro que coopere.

— Como é que eu vou saber que vocês não vão me matar depois que eu os colocar lá? — desconfiou, encarando o moreno fixamente com a expressão de dúvida.

— Você tem a minha palavra. — prometeu Castiel solenemente, o que a fez se virar para ele dentro do círculo.

— Se você diz... — falou com um sorriso malicioso na direção do anjo, então se voltou para os irmãos novamente — Agora me soltem. — ordenou impaciente.

— Ótimo! Tudo resolvido! — vibrou Balthazar, saltando do carro e vindo até meu lado, segurando o pacote de pipocas embaixo do braço e retirando um pedaço de papel dobrado do bolso esquerdo, colocando-o apressadamente em minhas mãos — Aqui o endereço e boa sorte.

— Espera aí, você não vai? — questionei rapidamente.

— E arriscar o meu pescoço? — o anjo deu uma risada longa — Tá me achando com cara de idiota? Eu, hein. — ele revirou os olhos, desaparecendo da minha frente.

— Ele é bem medroso para um anjo — suspirou Dean com os olhos apertados.

— Se eu estivesse na condição dele, acho que também seria — comentou Sam, olhando para o local onde o mesmo desapareceu.

— Tá concordando com ele? — questionou o loiro incrédulo.

— Não — disparou o moreno rapidamente — Eu só digo que se eu fosse um anjo caçado eu teria o mínimo de cuidado, e você não pode negar que Balthazar nos ajudou muito ultimamente e isso deve fazer Raphael ter ficado furioso com ele.

O Winchester mais velho observou o irmão por um momento, ficando sem palavras. De fato era verdade que o anjo estava nos ajudando bastante, algo que nenhum de nós esperava. E de certa forma, Balthazar estava indiretamente se tornando um amigo.

Bitch — resmungou Dean, passando por Sam e indo em direção a casa.

Jerk — devolveu o mesmo, revirando os olhos e seguindo seus passos.

Minutos depois, os irmãos estavam terminando de arrumar a bolsa de armas e ouvindo as últimas instruções de Bobby, que foi votado para ficar e mandar apoio, caso algo desse errado. Meg andava de um lado para o outro, quase fazendo um buraco no chão de tanta impaciência.

Estávamos no meio da tarde e o sol brilhava no alto com força, mas o vento úmido incessante me fez optar por levar um casaco. Subi as escadas enquanto todos estavam distraídos e entrei no quarto, escavando o meu guarda roupas.

— Eu não quero que você vá — ouvi a voz de Castiel logo as minhas costas, me fazendo dar um pulo e bater a cabeça na porta do móvel.

— Acho que não temos escolha, sendo que eles precisam de você lá e eu preciso de você aqui — falei esfregando o ponto dolorido com uma careta.

— Mas é perigoso demais, deve ter cerca de cinquenta demônios naquele lugar e eu não sei se tenho poder suficiente para lutar com todos eles se for preciso. — esclareceu o anjo com a expressão apreensiva. — Você fica e eu fico aqui com você.

— Nem pensar! — descartei imediatamente — Sam e Dean não vão entrar lá sozinhos, e principalmente com a Meg, que eu não confio nem um pouco. Nós vamos todos juntos e ponto final, e se caso alguma coisa der errado, você nos tira de lá com amuleto ou sem.

— Mas e se...

— Não vai acontecer nada, ok? — interrompi colocando as mãos em seu rosto, sentindo as mesmas se aquecerem imediatamente. Castiel me encarou com os olhos baixos, segurando meus pulsos delicadamente. — Eu confio em você. — murmurei fitando seus olhos fixamente, e a imensidão azul que estava turbulenta e agitada, pareceu se suavizar instantaneamente.

O anjo se aproximou vagarosamente, inclinando o corpo na minha direção. Fiquei imóvel, sentindo meu coração acelerar tanto quanto possível e o frio na barriga era tão intenso que fazia minhas pernas tremerem. Fechei os olhos ao sentir sua respiração contra meus lábios e o calor que emanava do seu corpo em direção ao meu. E foi aí que eu ouvi a última voz que queria escutar naquele momento.

— Que bonito — comentou Meg, colocando uma mão no meu ombro e outra no de Castiel, nos afastando um para cada lado com uma expressão de tédio.

— O que você quer no meu quarto? — chiei com raiva por ela ter estragado meu momento perfeito e também com uma sensação de constrangimento pós quase-beijo.

— Nós estamos prontos, só esperando vocês dois — esclareceu a garota, então se aproximou de Castiel, se enfiando ao seu lado e puxando seu braço para que caísse sob seu ombro — Vamos, meu anjo? — questionou dando ênfase no pronome possessivo e me fazendo apertar os olhos mortalmente em sua direção.

— Ah... Eu... — o anjo olhava dela para mim sem saber o que fazer ou falar e aquilo só me deixava com mais raiva.

— Não seja tímido, Clarence. — incentivou Meg, deslizando uma das mãos para suas costas o que fez o mesmo se sobressaltar com um possível aperto indiscreto.

— Dá para parar? — questionei com os dentes trincados, então a garota me lançou um olhar interrogativo, andando lentamente até mim.

— Vai fazer alguma coisa ou vai gritar para o Dean ou o Sam vir te ajudar? — debochou com um sorriso ferino no rosto.

— Exorcizamus te... — comecei seriamente, o que a fez recuar dois passos com uma rapidez sobre-humana.

— Não se atreva! — exclamou com a expressão ameaçadora.

— Omnis immundus spiritus — continuei e Meg logo deixou os olhos negros, marchando na minha direção com raiva, porém foi interceptada por Castiel, que segurou seu braço.

— Tente alguma coisa e você morre antes de começar — decretou o anjo com a voz baixa.

— Dois contra um? Que covardia. — comentou a garota, sarcástica. E logo se desvencilhou do anjo, caminhando até a porta — Isso ainda não acabou. — decretou com uma última olhada para mim, e então desapareceu.

Horas mais tarde, nós estávamos na entrada do necrotério. O grande muro de reboco tinha fios de alta tensão desabilitados, alguns cortados e caindo para os lados. O portão de metal caía para a esquerda, e o prédio cercado por mato na altura dos joelhos parecia não receber visitas há décadas.

— Eu não gosto nada disso... — murmurei, sentindo as pontas dos dedos estremecerem de repente.

— Os pêlos do meu braço se arrepiam quando eu olho para esse lugar. — concordou Dean com a expressão de desaprovação.

— Deu para ficar medrosinha agora, Winchester? — debochou Meg, recostada na lateral do Impala, com os braços cruzados. De vez em quando a mesma dava algumas olhadas feias para mim, mas era esperta o suficiente para que só eu percebesse isso.

— Calada, demônio. — o loiro apontou um dedo na direção da mesma.

— Eu não vejo nada de diferente, tem certeza de que é protegido contra humanos também? — questionou Sam, virando-se para Castiel com uma expressão interrogativa no rosto.

— Eu não sei o que vocês estão vendo, mas tem uma porta enorme de metal com símbolos pintados com sangue ao redor e cabeças de cadáveres formando uma cruz invertida — revelou Meg com um meio sorriso sádico.

— Só de imaginar já me dá vontade de colocar para fora o que eu comi na semana passada — comentou Dean, levando a mão até a boca.

— O local é completamente cercado e vigiado, você tem poucos segundos para desfazer os símbolos de proteção. — advertiu Castiel, virando-se para a garota rapidamente.

— Acho que é o suficiente, e depois eu caio fora — proferiu, dando uma pausa em que todos assentiram — Mas eu preciso de uma coisa. — disse inclinando a cabeça para o lado de modo sugestivo.

— Nem pensar, a última vez que você pegou essa faca ela sumiu por meses — falou Sam, descartando a possibilidade.

— Não quero a sua faca, estou visando algo melhor. — esclareceu com ar de tédio, se voltando para Castiel — Quero a sua lâmina emprestada. — pediu estendendo a mão e dando passos na direção do mesmo.

— Com licença — me coloquei a frente do anjo no momento em que a garota parou a centímetros dele, tirando o objeto do seu bolso e estendendo-o para a mesma com um sorriso irônico — Pode pegar.

— Hoje a crise de ciúmes tá feia, hein — comentou segurando a lâmina com um sorriso debochado. Franzi a testa, sentindo meu rosto ficar vermelho.

Cristo. — provoquei pausadamente, lembrando da anotação no diário de John que demônios ficavam desconfortáveis ao ouvirem orações ou sinônimos referentes a Deus. Meg sacudiu a cabeça, os olhos negros e os dentes trincados.

— Desgraçada. — chiou com raiva.

— Ok, garotas! — começou Dean, se aproximando e ficando entre nós, abrindo uma distância segura — Eu ia adorar ver as duas numa luta livre só de biquíni no óleo, mas...

— Você é nojento, até para mim. — interrompeu a demônia com uma careta — Vamos lá. — disse se virando em direção ao necrotério e desaparecendo no mesmo instante.

Ficamos vários segundos em silêncio, sentindo o vento de final de tarde passar por entre o capim seco, fazendo um barulho que só nos deixava mais tensos. Olhei para os Winchester e o anjo, que se mantinham alerta enquanto eu me preparava internamente para o que viria a seguir. O plano era achar os artefatos e correr, mas qualquer coisa podia acontecer pelo caminho.

— Ela conseguiu, podemos entrar. — avisou Castiel, virando-se para nós, a expressão dura.

— Todos prontos? — questionou Sam.

— Eu nasci pronto, maninho — brincou Dean estalando os dedos de forma sugestiva, mas seu rosto estava apreensivo. Dei uma última olhada para Castiel e assenti brevemente, o anjo então colocou as mãos em nós, e em menos de um segundo não estávamos mais ali.

Assim que senti meus pés tocarem o chão novamente, me preparei psicologicamente para correr, porém permaneci estática ao notar o lugar vazio. Estávamos numa grande sala repleta de nada, a escada ao meu lado e um amplo e curto corredor dava para outra ala escura.

— Isso não deveria estar lotado de demônios? — indagou o Winchester mais velho depois de alguns segundos.

— Acho que deveria. — concordei, fitando momentaneamente as expressões confusas.

— Ao menos que... — começou o Winchester caçula com o tom alarmado, e então um som de palmas encheu o ar. Girei o corpo em direção a escada, dando de cara com Alexis em frente à porta, juntamente com outros vários demônios, um deles segurava Meg pelos braços.

— Como ratos na ratoeira. — a loira sorriu com satisfação, e logo eu percebi que outros homens apareciam de diversas direções, nos cercando por completo.

— Filha da mãe! — exclamou Dean, olhando de soslaio para Sam e eu com a cara óbvia de “acerte quantos puder, e tente não ser morta” respectivamente nessa ordem. Castiel estava logo atrás de mim, e no momento em que ele fez um primeiro movimento, Alexis desceu dois degraus rapidamente, com o braço erguido na sua direção.

— Parado! — gritou a demônia no mesmo instante que um dos seus capangas colocava a mão num símbolo de banimento feito com sangue num dos degraus da escada. Uma luz encheu o local, me cegando, e então o anjo desapareceu. Olhei incrédula para o espaço vazio, sabendo que mais enrascados que agora, era quase impossível.

— Eu quero arrancar a sua cabeça! — gritou Dean, esperneando enquanto um dos demônios segurava seus braços e outro arrastava Sam pelo chão.

— Tirem eles da minha frente e tragam a garota, vamos começar o ritual. — ordenou Alexis com um sorriso vitorioso, e logo eu senti mãos me agarrarem com brutalidade.

Eu estava amarrada pelos pulsos, pés e cintura em uma maca de metal, numa sala velha. E apesar do necrotério estar abandonado há anos, eu não entendia o porquê de haver corpos frescos ali, cerca de cinco, todos estrategicamente ao meu redor. O cheiro de enxofre e morfina era absurdamente forte, e um leve odor de decomposição começava a se misturar no ar.

Logo a minha frente tinha um pequeno altar, e nele estava um pedaço desproporcional de pedra, que eu logo reconheci como sendo a segunda parte da placa da revelação. E ao meu lado, havia uma banheira de mármore branca, onde os demônios estavam despejando litros de barro e quase um esqueleto completo de ossos.

— O que vocês vão fazer? — indaguei para Alexis, que estava andando de um lado para o outro, supervisionando tudo.

— Esse ritual é uma prática muito antiga, realizada por bruxos necromantes. — esclareceu a mesma sem me fitar.

— Necromancia? — questionei atônita, impulsionando meu corpo para frente e sentindo as amarras me forçarem para trás. Pelo que eu sabia aquela era uma arte derivada da magia negra, usada para controlar e se comunicar com os mortos.

— Exatamente. — assentiu a loira, puxando uma tesoura de dentro de uma caixa de madeira e andando até mim.

— O que diabos vocês querem comigo? — perguntei tentando inutilmente me afastar conforme ela segurava o tecido da minha blusa aproximava a ponta do objeto contra a minha barriga.

— Você nos entende tão mal... — murmurou com um suspiro, cortando minha roupa de baixo para cima até que se abrisse, me deixando apenas de sutiã.

— Já ouvi essa ladainha duas vezes, dá para ir direto ao ponto? — pedi com os dentes trincados.

— Você vai nos liderar. — falou Alexis de supetão, me fazendo olhá-la com descrença por vários segundos. Mas a julgar pela sua expressão, a garota não estava de brincadeira. Ela havia enlouquecido?

— Eu sou humana. — disse seriamente, uma parte iludida de mim querendo que ela estivesse cometendo um tremendo equivoco e então me soltasse ao saber disso.

— São apenas detalhes. — Alexis revirou os olhos, descendo a tesoura para a minha cintura e enfiando o tecido da minha calça entre as pontas — Acontece que Lúcifer criou os demônios, e você tem grande parte do poder dele aí dentro.

— Isso me faz o quê? Mãe de vocês? — perguntei com sarcasmo enquanto a mesma cortava a peça, me deixando apenas de roupas íntimas. — Pois eu ordeno que matem.

— Você ainda não está capacitada para dar ordens. — debochou a garota, deslizando a parte cortante e fria do objeto com força contra a minha barriga, fazendo um corte vertical e dolorido. Mordi a boca com raiva, contendo o grito, e logo senti o sangue escorrer timidamente pela minha pele.

— E para mutilar a sua cara, eu estou? — devolvi com uma risada de escárnio.

— Quando estiver completa não vai pensar assim.

— Completa? — repeti em dúvida, vendo a mesma jogar minhas roupas num canto da sala.

— Sua parte morta é o que nos interessa não você. — esclareceu seriamente, e antes que eu pudesse questionar mais alguma coisa, uma voz masculina se fez presente no recinto.

— A arte de lidar com os mortos. — falou a figura de um senhor idoso de longos cabelos brancos vestindo um manto negro.

— Quem é você? — perguntei com receio, me inclinando o máximo possível para fitá-lo.

— Alfred, mas acho que irá relacionar melhor os fatos se eu disser que sou descendente de Ana Darvúlia. — revelou o homem com um sorriso educado. Deixei meu queixo cair, todas as palavras pareciam ter se perdido. Ele era da família da mais fiel cúmplice de Elisabeth, a mesma mulher que foi imprisionada em sue lugar por vontade própria.

— Impossível... — murmurei incrédula enquanto o mesmo se aproximava.

— A bruxaria está na nossa linhagem há séculos, e foi passada para mim desde os tempos da minha tataravó, que você já deve ter ouvido falar. — explicou sem deixar o sorriso desaparecer, então eu notei que o mesmo tinha uma caixa escura nas mãos, alguns símbolos estranhos pintados com tinta nas laterais.

Ele a colocou em cima da maca, próximo aos meus pés, abrindo a mesma e retirando o octeto de rubi. Apertei os olhos e percebi uma marca incrustada na pedra vermelha, uma marca que não existia ali antes. Era uma espécie de “V” com um “X” por cima. E algo me dizia que aquilo era alguma forma de alterar o poder do objeto.

— O que você vai fazer? — questionei ao vê-lo assentir para Alexis, que permanecia imóvel ao meu lado, como se isso demonstrasse respeito perante o bruxo. E no mesmo instante a garota segurou firme a tesoura e aprofundou o corte na minha barriga, o atrito da lâmina contra a ferida ardia como fogo, e dessa vez não foi possível segurar o grito.

Ela deixou o objeto ao lado da maca e pegou uma tigela de porcelana branca, colocando abaixo do meu corpo e aparando o sangue que escorria abundante. Quando o recipiente finalmente se encheu, ela o despejou na banheira ao meu lado, murmurando algumas palavras numa língua desconhecida.

— O que você vai fazer?! — repeti com raiva, forçando novamente as amarras. O homem permaneceu em silêncio, segurando o octeto com uma mão, e então se abaixou ao meu lado, molhando os dedos no líquido pegajoso de sangue e barro, vindo até mim e tocando minha testa no formato de uma cruz invertida.

— Vamos trazer o seu “eu” do passado de volta. — murmurou com um sorriso diabólico, me fazendo engolir em seco com um pânico iminente.

— Quando você diz... — comecei, sentindo as palavras engasgarem na minha boca.

— A única versão de você que chegou tão próxima de Lúcifer que estava prestes a iniciar o apocalipse. — esclareceu Alfred, colocando o amuleto no meu pescoço.

— Você não pode fazer isso, é impossível! — gritei tentando me debater e sentindo a maca ranger abaixo de mim.

— Nós temos você, o ritual, o poder do octeto de rubi e um necromante poderoso. — listou Alexis, levantando um dedo para cada item — E daqui a alguns minutos teremos uma líder que nos ascenderá para a vitória!

— Você não sabe o que vai acontecer se fizer isso! — exclamei para Alfred — Você é um bruxo, não um demônio, o que vai ganhar com tudo isso?!

— Vou estar do lado que ganhar essa guerra no final — decretou o mesmo, andando até o fim da sala e voltando com a metade da placa da revelação. — Aqui tem um feitiço muito poderoso, capaz de trazer de volta todas as memórias de todas as suas vidas passadas. Assim que terminar o ritual, eu vou começar o feitiço em enoquiano para que a lembrança que vier se fixe a sua alma.

— E o que vai acontecer comigo? — perguntei apreensiva, minha mente em pânico mal conseguia pensar direito.

— Você vai desaparecer. — respondeu o bruxo calmamente, me fazendo engasgar novamente.

— Não faça essa cara, nós duas sabemos que você é descartável, em todos os sentidos da palavra. — acrescentou Alexis com um sorriso irônico.

Testor potestate tenebrarum, quaeso, qui de virtute animae et catenis vinctum inter velum mortis inferno. Anima requiro, et captus, et hoc est corpus aprisiono, acorrento. — começou Alfred.

— Não! — gritei, tentando freneticamente me soltar das amarras sem sucesso. A voz dele soava mórbida e logo ia se afastando, como se fosse sugada dali, meus ouvidos começaram a captar uma espécie de apito que ia se tornando cada vez mais insuportável.

Quaero filia inanis et acorrento, aprisiono et custodiunt illud est corpus. A vi omnes animas quae sunt hic et nunc, et in virtute vim qui corrodit exit, inter mortuos, te invoco et te acorrento corpus inânime.

— Está funcionando! — vibrou Alexis, enquanto meu corpo parecia ser atingido por uma descarga elétrica de fogo. Cada osso por baixo da minha pele queimava de uma forma que me fazia retorcer sob a maca, o amuleto brilhava sob o meu peito e eu logo comecei a sentir sangue quente saindo pelo meu nariz, boca e olhos.

— Alexis! — gritou outra voz, alarmada e esbaforida.

— O que houve?

— Os Winchester, eles escaparam! — revelou a mesma.

— Detenham-nos! — latiu a garota gesticulando para os lados — Não podemos ser interrompidos agora.

I aprisiono acorrento te, et tu, ego efficiam aprisiono acorento. I aprisiono acorrento te, et tu, ego efficiam aprisiono acorento. I aprisiono acorrento te, et tu, ego efficiam aprisiono acorento! — o homem ia falando cada vez mais alto, porém suas palavras eram abafadas por outras vozes, sons e imagens que pareciam ser jogadas contra o meu rosto. Eu não conseguia discernir entre elas, era como se algo estivesse se prendendo dentro de mim, como uma segunda parte independente que eu não podia controlar.

— Esther! — ouvi a voz de Dean, que logo foi interrompida por uma explosão e então tudo ficou em silêncio. Todas as cenas na minha mente pararam, como um filme que trava pela metade, e as palavras de Alfred soaram quase como uma ordem.

Aperi oculos tuos, Erzebet. — disse o bruxo, e no mesmo instante eu abri os olhos para ver o Winchester mais velho chegar com a arma por trás dele e o derrubar no chão com uma coronhada. Mas parecia que eu estava assistindo tudo de fora, e cada vez mais eu perdia os movimentos do meu corpo.

— Cara, como eu odeio bruxos. — murmurou o loiro, colocando o mesmo desacordado no chão e se aproximando de mim, tocando meu rosto com preocupação e abrindo as amarras apressadamente.

Eu não conseguia me mexer, me sentia parada no espaço, como se observasse tudo de uma tela fria de cinema. Olhei para baixo por um instante e percebi o amuleto reluzindo, a marca incrustada brilhava diabólica e fria. Então um surto de realidade me atingiu, o ritual havia sido finalizado e já estava acontecendo, eu tinha que dar um jeito de pará-lo, e a única coisa que estava agindo como amplificador de poder era o octeto. Movi minha mão no ar, arrancando o objeto do meu pescoço e o jogando para frente, fazendo-o cair na banheira, e foi aí que tudo tremeu.

Caí no chão, me soltando da maca e rolando para o lado, instantes antes dela vir por cima de mim. O prédio inteiro vibrava, como um terremoto, as janelas começaram a estourar e as paredes se abriam com rachaduras até o teto. Coloquei as mãos nos ouvidos, tentando abafar o barulho ensurdecedor.

— Funcionou! — gritou Alexis por cima da cacofonia, segundos antes de Castiel aparecer por trás da demônia, colocando a mão na cabeça da mesma que se iluminou, caindo no piso com as órbitas queimadas.

— Sinto em dizer que vamos ter que adiar a festinha, eles chamaram reforços! — disse Meg, aparecendo pela porta escancarada.

Minha cabeça ainda rodava com a pancada interna e meus ouvidos estavam ressoando o som de apito devido ao barulho ensurdecedor da explosão. Apoiei as mãos no piso gelado, levantando a cabeça para fitar a minha frente, e de repente, eu percebi pela primeira vez o espelho gigantesco que estava ali.

Nele meus olhos estavam fixos e confusos, meu peito subia e descia rapidamente, e parecia estar mais difícil de respirar do que realmente estava. Os cabelos negros e volumosos estavam desgrenhados, emoldurando o rosto pálido com ondas desfeitas, e os lábios tremiam tanto como se fosse o dia mais frio do ano. Notei com alarde que meu corpo estava completamente banhado no barro escuro, despido de qualquer tecido de roupa. Meus olhos desceram pelo reflexo do meu braço, acompanhando o levantar vagaroso em direção a superfície espelhada.

E o grito ficou preso na garganta quando meus dedos tocaram algo frio e macio a minha frente, e embora fosse gélido, não era nem de perto parecido com o material de um espelho. Fitei surpresa e sem ar quando o reflexo a minha frente se colocou de joelhos e olhou ao redor com pânico.

— Mas o quê... — ouvi a voz de Dean num sussurro baixo próximo a mim, e a expressão dele era tão desconcertada quanto a minha e a de todos no lugar. Todos menos Castiel, que estava estático como uma estátua de mármore que não parecia nem respirar.

— Castiel? — perguntou o reflexo com a voz idêntica a minha, embora embargada e aliviada ao mesmo tempo, então num movimento lento, caminhou até o anjo, passando os braços ao redor dele, que tinha agora tinha o rosto num estado de choque tão evidente que eu duvido que estivesse raciocinando alguma coisa. Ninguém ali estava.

— Elisabeth... — murmurou num fio de voz.

E naquele momento foi como se vidros se estilhaçassem a minha frente. Sam, Dean e até mesmo Meg estavam pasmos perante aquela cena. Meus olhos não acreditavam no que eu estava acontecendo, meu coração estava tão assustado que parecia bater uma vez por minuto. E naquele lugar que exalava o cheiro de morte por todos os lados, havia ocorrido um inexplicável milagre, ou uma fatídica tragédia: A ascensão da Condessa de sangue.


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Notas finais do capítulo

Ufa! Nossa, hein? Elisabeth voltou, agora a coisa vai pegar fogo. Como será que Esthiel vai ficar com isso?
Até o próximo!
—_____________________

A tradução do ritual (para quem ficou curioso)
"Eu chamo a testemunhar o poder das trevas, aqueles que estão presos em correntes. Entre o véu da morte, da virtude, da alma e do inferno. Eu busco a alma das trevas, e este é o corpo que eu te ordeno. Te aprisiono, acorrento. Eu pergunto à filha do vazio e do mal, acorrento e aprisiono a esse corpo. Pela força de todas as almas que estão aqui e agora, e apodrecem no poder da energia que sai entre os mortos, eu chamo sobre ti e te acorrento a um corpo morto. Aprisiono e acorrento você! Eu aprisiono e acorrento! Aprisiono e acorrento você! Eu aprisiono e acorrento! Aprisiono e acorrento você! Eu aprisiono e acorrento!
Abra os olhos, Erzebet."



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