Separate Ways - Requiem escrita por WofWinchester


Capítulo 24
Ele é o Rake


Notas iniciais do capítulo

Olá, garotos e garotas! Um capítulo novinho para agitar a noite de sábado daqueles, que como eu vão ficar em casa.
Espero que gostem.



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Minutos depois, Dean havia gastado cerca de três rolos e meio de fita adesiva para fechar todas as frestas das portas e dutos que havia no cômodo. Sam estava sentado em cima da mesa, fitando Bobby atentamente, para que pudesse ver caso o verme saísse do corpo do caçador. Eu me acomodei numa cadeira próxima, segurando meu pulso sob meu colo, a fim de escondê-lo dos irmãos que já estavam preocupados demais com o velho Singer, mas o fato era que o pano em volta do corte já havia encharcado e o sangue começava a escorrer pela minha pele de encontro ao chão rapidamente.

– Você acha que ele vai acordar? – indagou o Winchester caçula, sem tirar os olhos de Bobby. – Não sabemos o que essa coisa faz na mente das pessoas.

– Ele vai acordar – afirmou Dean secamente e veio de encontro a nós, mas então parou de forma brusca e fitou meus pés – Droga, Esther. – olhei para o foco da sua atenção e percebi alarmada que havia uma poça de líquido vermelho se formando no piso.

– Ela já perdeu muito sangue, Dean – constatou Sam preocupado, encarando o irmão.

– E você acha que eu não sei disso? – devolveu o loiro, se agachando ao meu lado e retirando o pedaço de camiseta que envolvia meu pulso e trocando-o por um pano mais grosso.

– Gente, eu estou bem – falei baixinho, tendo plena convicção de que eu não estava conseguindo convencer nem a mim mesma, muito menos eles. Apoiei um cotovelo na mesa, sentindo que minha cabeça começava a dar voltas.

– Uma ajuda aqui seria muito bem vinda, sabia?! – exclamou o Winchester mais velho olhando para cima – Castiel!

– Alguém precisa rever a definição de “protetor” no dicionário formal – rosnou Sam segundos depois. De repente Bobby começou a se mexer na cadeira, prendendo nossa atenção. O caçador abriu os olhos e nos fitou com calma.

– Você está aí, seu herpes – resmungou Dean irritado, levantando e pegando o fio desencapado para dar um choque no pescoço do homem. Ele grunhiu de dor enquanto seu corpo era eletrocutado e um líquido verde escuro escorria do seu nariz em direção ao bigode.

– Por que você fica falando sobre herpes? – questionou o Winchester caçula com certa curiosidade, assim que o irmão afastou o objeto da pele do velho Singer.

– Eu não falei nada – desconversou o loiro.

– Falou sim – afirmei com um sorriso sarcástico.

– Calem a boca! – disse, e então se virou para Bobby com um tom ameaçador – E nem pense em escapar daqui porque nós lacramos cada fenda dessa sala. Fique à vontade.

– Eu estou à vontade, é legal aqui. – respondeu o verme dentro do corpo do caçador, com uma voz grave e vagarosa que me lembrava o “Jigsaw”, do filme “Jogos mortais”. – E vocês adoram o cara, certo? Vocês não vão querer me matar e levá-lo junto comigo. Já perderam muitos amigos hoje, não é?

– Faremos o que for preciso – devolveu Dean. – Agora nós temos umas perguntas para você.

– Perguntem. – disparou, balançando a cabeça – Eu estava esperando por isso.

– E o que significa isso? – indagou Sam.

– Que eu não tenho nada a esconder.

– O que é você? – perguntei, sentindo as extremidades do meu corpo começarem a esfriar devido a perda de sangue.

– Vocês ainda não têm nome para mim. – respondeu o verme – Eu sou nova por aqui, Eve me criou sozinha. – disse com gosto, o que irritou Dean e o fez dar outro choque no pescoço do caçador.

– E quem é essa vadia da Eve?! – exclamou furioso.

– A mãe de todos nós, e o fim de todos vocês. – revelou com um sorriso debochado – Quando ela terminar haverá mais criaturas que humanos. Vocês viverão em currais. Nós vamos chamar vocês de vitelos e servi-los aos nossos filhos.

– E qual seu papel em tudo isso? Como atacar caminhoneiros vai ajudar? – questionou Sam, tentando ficar calmo.

– Pensa que eu vim aqui para confundir caminhoneiros e professoras? – indagou retórico – Nós atraímos vocês aqui.

– Para quê? – perguntei, enquanto a ficha caia na minha cabeça. Não havia nada que ligasse as vítimas, nada a não ser... Nós. Tudo foi uma cilada desde o início e nós caímos direitinho.

– Ela tem um recado para vocês, e para a garota – disse o verme, me fitando com curiosidade.

– Ah, é? E qual é?

– Vocês todos vão morrer. – falou devagar – Ela está furiosa, ela está aqui. E a Mãe não gosta de concorrência, principalmente de anjos.

– O que isso quer dizer? – perguntou Sam, visivelmente confuso.

– Quer dizer que Eve não gosta da ideia de Lúcifer andando pela terra dos filhos dela, então a graça dele será caçada por cada criatura que ouvir seu chamado – respondeu. Nós nos entreolhamos percebendo a gravidade da situação.

– Segura a minha resposta aí – disse Dean, encostando o fio na pele de Bobby novamente, mantendo o choque por quase cinco segundos e então Sam se levantou da mesa rapidamente, intervindo.

– Quanto tempo mais acha que ele pode aguentar? – questionou o moreno.

– Vocês não podem me matar, não sem matá-lo junto comigo – advertiu o verme com satisfação.

– Teremos que fazer o que Bobby ia querer que fizéssemos. – sentenciou Dean com determinação. Levantei da cadeira e puxei o braço dos irmãos para que se voltassem na minha direção.

– Vocês enlouqueceram? – indaguei controlando a voz.

– Não podemos deixar essa coisa nele, e nem que ela saia viva daqui – esclareceu o Winchester caçula, passando os braços pela minha cintura e me guiando até a mesa para que me apoiasse na mesma. Então pegou a fita que estava em cima do móvel e foi até o velho Singer, passando o adesivo em volta da sua boca de modo que tampasse os ouvidos também.

– Não tem saída agora, sua lesma – avisou Dean, se inclinando em direção ao caçador, então fitou Sam que assentiu brevemente – Bobby, é melhor você aguentar firme aí – e dizendo isso ele colocou o fio no pescoço dele, eletrocutando-o sem parar. O líquido verde escuro começou a sair em grandes quantidades pelas narinas e canais auditivos do velho Singer, enquanto seu corpo se sacudia em espasmos na cadeira. Sam virou de costas e segurou minha mão, enquanto eu optei por colocar o braço em frente ao rosto para não ver aquela cena.

Quase doze segundos depois, quando o barulho do choque cessou, eu olhei preocupada para o corpo de Bobby. Sangue começava a escorrer, junto com a gosma, e pingar na roupa. Dean, que antes estava com os olhos fechados, observou-o por um instante e rapidamente desligou a serra da tomada.

– Bobby?

– Ele... – Sam se virou apreensivo e correu até a cadeira, se inclinando em direção ao velho Singer e sacudindo seu rosto – Ei, ei! Bobby? – ele começou a retirar as fitas adesivas, e logo o verme saiu do canal auditivo do caçador, torrado, caindo no chão encurvado.

– Bobby! – chamei indo na direção dele, sentindo uma tontura forte, e me agachando próxima ao seu joelho. Esse velho ranzinza não podia morrer, ele não podia nos deixar. Sacudi sua perna tentando inutilmente reanimá-lo.

– Ele não está respirando. – constatou Sam, olhando para mim e para Dean, que permanecia estático.

– Bobby! – exclamou o loiro.

Nós estávamos no cemitério local de Davenport, havia acabado de amanhecer e a brisa da madrugada ainda era úmida e gelada. Dean e Sam estavam ao meu lado, com as mãos nos bolsos enquanto encaravam o túmulo recém fechado a nossa frente. Observei as folhas secas de outono rodopiarem com o vento, e algumas gotas de uma chuva fraca começarem a cair. Dei um passo para o lado quando percebi Bobby chegar por trás de mim com uma garrafa dentro de uma sacola de papel pardo.

– Eu tenho que dizer, eu nunca achei que Rufus fosse religioso – comentou Dean com os olhos baixos para o túmulo.

– Ele não era fanático. – o velho Singer deu de ombros – Ele vinha com um lance de não poder trabalhar no sábado quando tinha que enterrar um corpo... – ficamos segundos em silêncio e então ele começou – Sabe, eu era só um caso. Joe, o mecânico. Aí minha mulher ficou possessa, veio para cima de mim. Eu a esfaqueei, mas isso não a parou. De repente entra aquele cara detonando, joga água benta nela e manda o demônio de volta para o inferno. Eu ia ser preso por homicídio, mas Rufus resolveu tudo. E me ensinou umas coisinhas sobre a realidade da vida. Logo nós começamos a trabalhar juntos, e ficamos assim por anos. Tipo vocês dois, seus patetas.

– Então, o que aconteceu? – perguntei com curiosidade.

– Foi em Omaha. Foi minha culpa, e ele nunca me perdoou.

– Pois deveria – afirmou o Winchester mais velho.

– Você não sabe o que eu fiz, Dean – murmurou com a voz embargada.

– Não importa – o loiro deu de ombros.

– Como assim não importa?

– No final das contas vocês dois são família. A vida é curta, e a nossa é menor que a da maioria. Vamos passar o resto dela nos lamentando? – questionou seriamente, balançando a cabeça para os lados – Alguma coisa vai nos pegar, eventualmente. E quando arrancarem minhas tripas, só pra vocês saberem, tudo bem. Vamos considerar perdoadas todas as besteiras que fizemos pelo caminho.

– Alguns de nós fizemos muita besteira, Dean – se pronunciou Sam, com o tom baixo.

– É, estaca zero – finalizou o Winchester mais velho. Bobby tirou a garrafa do saco de papel e derramou sobre o túmulo. Sam me puxou delicadamente pelo cotovelo, enquanto os irmãos se afastavam silenciosamente. Bobby precisava de um tempo para se despedir do amigo. Caminhamos até o Impala na entrada do cemitério, Dean se recostou no capô do carro e eu parei logo ao seu lado com as mãos nos bolsos.

– Sabe, aquilo que você disse lá foi muito bonito – comentei, apertando os olhos para o céu nublado.

– Eu só disse a verdade, ou melhor, a verdade para os caçadores – suspirou o loiro.

– Sinto que tem um “mas”...

– Você viu o que aconteceu com Rufus, não viu? Essa vida é assim, uma hora você está vivo e na outra está morto. Você foi corajosa lá dentro, isso eu não posso negar, mas também poderia ter morrido. – disse de forma sombria, apontando para o meu pulso recém suturado por Bobby – Eu não quero nem pensar se você não tivesse conseguido desviar daquele tiro, ou de Samuel, ou daquele verme...

– Você tem que parar de ser pessimista – sibilei pesadamente.

– Você não vai ser caçadora, tudo isso é temporário.

– O pai sempre dizia que era temporário – comentou Sam, vindo de recostar do meu outro lado, imitando nossa posição.

– Você apoia isso, Sam? – questionou Dean, incrédulo.

– Claro que não, mas você precisa parar de dar chilique – o moreno deu de ombros.

– Ela quase morreu! Três vezes! – exclamou o irmão, abrindo os braços.

– Dean... – chamei tentando interceptar a discussão que eu sabia que iria começar ali.

– Esther não é uma criancinha, às vezes parece que você quer carregar ela no colo para lá e para cá. Eu me preocupo tanto quanto você, mas isso já é exagero. – Sam aumentou o tom de voz, defendendo sua posição.

– Não é exagero! – o loiro apontou para o irmão, trincando os dentes.

– Calem a boca bitch e jerk! – vociferei, fazendo-os ficarem quietos no mesmo instante e me fitarem surpresos – Eu já falei uma vez e vou falar de novo: Eu não pretendo ser caçadora. Mas agora os padrões mudaram, ok? Vocês podem fingir o quanto quiserem, mas eu sei que estão assustados por causa da porcaria do meu passado, vocês viram tudo que eu vi e eu não consigo dormir a noite! Eu sou uma droga de uma abominação sendo disputada pelo céu e pelo inferno e é tão claro quanto a água que isso vai acabar de uma maneira trágica.

– Esther... – Dean tentou me interromper, mas eu gesticulei para que se calasse.

– Esther nada! Cala a boca e ouça: Parem de mentir para mim e parem de mentir para si mesmos achando que nós vamos encontrar uma maneira milagrosa de acabar com tudo isso e eu vou poder voltar a ser apenas uma garota normal porque eu não vou. Eu aceitei isso, agora aceitem vocês também! Eu estou tão enfiada nessa droga quanto todos aqui. Não sou a garotinha indefesa então parem de me tratar como a tal!

Terminei de falar e era como se um peso fosse tirado dos meus ombros, encarei o chão sentindo os pingos de chuva penetrar pela minha roupa e me obrigar a semicerrar os olhos. Dean e Sam permaneciam calados, recostados contra o capô do Impala, mas eu sabia que finalmente havia caído a ficha para eles. Eu não era mais a garotinha indefesa protegida pelos Winchester, eu era a criatura amigável que convivia com eles e que talvez um dia eles teriam que exterminar.

Cerca de duas semanas haviam se passado desde que Rufus havia morrido, e Bobby estava mais rabugento e deprimido do que nunca. Jimmy e Maison fizeram uma ou duas aparições breves, e pelo que eu pude bisbilhotar eles estavam no rastro de alguma coisa grande. Meu irmão continuava sem saber puxar assunto, mas devo dizer que nosso relacionamento melhorou bastante nesses dias, só quem não parecia gostar muito disso era Dean, acho que ele via Jimmy como um concorrente para o prêmio de “irmão mais velho do ano” ou algo assim.

E Castiel havia desaparecido por completo, riscado do mapa. Era como se a terra o tivesse sugado para dentro. Várias vezes eu havia me pegado prestes a olhar para as paredes e rezar para que ele aparecesse, mas não o fiz. Depois de todas aquelas memórias, o vínculo que nós tínhamos se apagou por completo, e eu sentia que se ele pudesse ir para Júpiter só para não correr o risco de olhar na minha cara novamente, ele iria. Em parte, eu entendia o lado dele.

Se uma coisa havia ficado bem clara naquelas lembranças era que Elisabeth e Castiel tiveram uma história de amor bem conturbada, e reviver tudo aquilo deveria ser doloroso para ele, assim como foi para mim. Mas por outro lado eu tinha tantas dúvidas, tantas perguntas que só aquele anjo poderia responder, eu me sentia tão confusa que havia momentos em que eu não sabia quem eu realmente era.

Outra coisa que eu percebi nesse meio tempo era que havia algo de errado com o octeto de rubi. Parecia que o amuleto não estava mais fazendo tanto efeito como antes, era como se coisas estivessem me rodeando e algumas vezes elas conseguiam “encostar” em mim, causando uma sensação de pânico. Eu tinha medo que ele parasse de funcionar, de alguma forma, e aí eu estaria condenada a loucura de algo que eu não podia controlar. E mais uma vez o único que poderia me ajudar era Castiel.

Já era de madrugada quando eu decidi dormir, levantei da cadeira onde estava lendo algumas páginas do diário de John e passei pelo sofá, onde Sam dormia com um livro em frente ao rosto. Tirei o objeto dele e peguei uma manta xadrez, colocando por cima do grandão e então subi as escadas indo para o meu quarto. Assim que deitei na cama, não demorei muito para pegar no sono.

Acordei com uma respiração quente e arrastada no meu rosto, de início pensei ser o cachorro, mas nós não tínhamos cachorro. Abri os olhos imediatamente e me deparei com uma figura horrenda na beirada da minha cama. Era uma espécie de homem esquelético de pele acinzentada, com corpo torto e desfigurado, como se tivesse sido atropelado. Ele me encarava fixamente e seus olhos eram negros e brilhantes no escuro.

Não me contive mais que dois segundos para me jogar para fora da cama com um grito pavoroso. A criatura saiu correndo corcunda de uma maneira bizarra pelo corredor, me encolhi contra a parede tremendo e com as mãos em frente a boca. Menos de um minuto depois, ouvi passos acelerados em direção ao quarto, e Dean entrou empunhando uma arma e acendendo a luz.

— O que houve? — perguntou o loiro afoito. Logo atrás dele vieram Bobby e Sam, os dois também armados.

— Havia uma criatura aqui! — gritei apavorada — Eu acordei e ela estava na beirada da minha cama me olhando dormir!

— Certo, calma. — pediu o Winchester mais velho, cruzando o quarto com passos largos e me abraçando enquanto olhava pela janela.

— Mas a casa é protegida contra a maioria das criaturas que conhecemos! — protestou Bobby, alterando a voz inconformado.

— Com o que se parecia? — indagou Sam, andando e procurando sinais de enxofre ou algum tipo de indício pelo chão.

— Eu não sei, era todo torto e tinha olhos negros — respondi me recuperando do susto.

— Como um demônio? — o moreno arregalou os olhos, alarmado.

— Não se parecia com um.

— Certo, coloquem sal em todas as entradas. Quero ver essa coisa entrar aqui de novo — ordenou Dean, ainda investigando a janela.

Havia se passado horas desde o incidente, e já tinha até amanhecido, mas eu não consegui dormir de novo. Quando não eram os pesadelos, era algum bicho esquisito me olhando dormir. Só podia ser brincadeira com a minha cara. Arrastei as mãos pelo rosto, enquanto Dean voltava da cozinha com uma cerveja e se jogava no sofá.

— Nada no diário do pai bate com a descrição — grunhiu Sam, sentado ao lado da mesa de Bobby.

— Não bate com nada que eu já tenha visto antes, ou ouvido falar. Tem certeza que você não teve um pesadelo? — indagou o Winchester mais velho.

— Não foi um pesadelo, foi real — rosnei.

— Tudo bem — ele gesticulou com as mãos — Não precisa me bater.

Ouvi a porta se abrir e logo me virei para ver quem estava entrando, inconscientemente rezando para que não fosse nada sobrenatural querendo dar um alô. Maison apareceu trajando uma regata cinza, e Jimmy logo atrás dela, com uma camiseta de mangas compridas azul marinho.

— Quem é vivo sempre aparece — cumprimentou Bobby, tirando os olhos do livro por um breve instante.

— Oi Bobby, oi Sam, oi Esther — retribuiu Jimmy vindo se sentar ao meu lado, me dando um abraço apertado.

— Eu não ganho “oi” não? — questionou Dean, sarcástico.

— Não. — devolveu o nefilim.

— Não faço questão mesmo — o loiro deu de ombros e então se virou para Maison — Não vai se sentar boneca? Pode sentar até no meu colo se quiser.

— Pode ir parando, Dean. Não sou suas negas — rebateu ela e o Winchester fez uma careta confusa, olhando para todos na sala, que também não haviam entendido a piada. Jimmy começou a rir.

— Maison é meio obcecada pelo Brasil e suas gírias — esclareceu o garoto.

— Brasil é? Ouvi dizer que os biquínis lá são bem pequenos — Dean deu um sorriso malicioso, fazendo a loira revirar os olhos e ir se sentar nos degraus da escada.

— O que vieram fazer aqui? — perguntei olhando de um para o outro — Achei que estivessem caçando alguma coisa.

— Na verdade estamos — respondeu Maison — Só que vamos precisar de ajuda dessa vez.

— E o que é? — questionou Sam, fechando o diário e fitando-os.

— Não é “o que” e sim “quem” — continuou a garota.

— Anastácia era a líder da seita de demônios que está atrás de Esther, e vocês a mataram. Só que ela deixou um encarregado — revelou Jimmy, com uma careta de insatisfação.

— Ótimo, mais demônios — disse jogando as mãos para cima.

— Ele não é um demônio, é um garoto. — esclareceu o nefilim.

— Espera aí. Um garoto está trabalhando para um demônio? — repetiu Bobby, incrédulo — Onde esse mundo vai parar?!

— Esse garoto se chama Scott Danvers, e ele está se mostrando muito empenhado. — enfatizou Maison com uma expressão séria.

— Vocês precisam de ajuda para pegar um garoto? — duvidou Dean.

— Ele é protegido por vários demônios e cobre muito bem os rastros — devolveu Jimmy, gesticulando com os dedos.

— Estamos dentro, assim que descobrirem alguma pista do moleque, nos avisem. — assentiu o loiro, tomando um gole da cerveja e então piscando para o nefilim — Vamos mostrar como o s caçadores de verdade fazem.

— E isso não inclui você, lógico. — meu irmão rolou os olhos e fitou o Winchester mais velho, que o encarou de volta.

— Dá para parar vocês dois? Parecem dois pitbulls brigando — protestei abrindo os braços e deixando-os cair sob o colo. Eles deram um grunhido e então pararam, Dean observando a garrafa e Jimmy mexendo nas mangas do meu moletom. Bocejei, encostando a cabeça no ombro dele e fechei os olhos por um momento.

— É impressão minha ou ninguém dormiu? — questionou Maison, provavelmente observando as caras sonolentas.

— Uma criatura invadiu a casa à noite — revelou Sam.

— Que criatura? — indagou Jimmy.

— Uma coisa feia e esquelética estava sentada na beirada da minha cama me olhando dormir — disse ainda sem abrir os olhos.

— Isso me soa familiar... — comentou o nefilim, me sacudindo de uma maneira irritante. Fitei-o com uma carranca e ele sorriu divertido.

— Estamos lidando com a hipótese de demônio, pois tinha os olhos pretos — falou Bobby.

— Mas nem tudo que tem olho preto é demônio — discordou Maison.

— Só a maioria — observou Dean.

— Olha, se você souber alguma coisa, me conte, por que não estou achando nada parecido — pediu o velho Singer à loira, que retorceu os lábios, pensando.

— Acho que eu li em algum lugar, mas vou tentar lembrar — disse Jimmy intrigado.

Meu irmão decidiu ajudar Sam com as pesquisas, e os dois começaram a discutir quais tipos de criaturas se enquadravam naquele padrão. Bobby acabou indo tirar um cochilo no quarto, e Dean estava quase dormindo abraçado na garrafa de cerveja. Levantei e fui dar uma volta em frente à oficina para tentar me livrar um pouco do sono, sentei no capô no Impala e observei o céu ensolarado.

Alguns minutos depois Maison saiu pela porta e veio se sentar ao meu lado, imitando minha posição com as mãos juntas entre os joelhos.

— Dean começou a fazer cantadas e eu tive que sair de lá para não dar um soco nele — falou a garota enquanto o vento jogava o cabelo loiro contra seu rosto.

— É, não seria o Dean se não fizesse isso — disse com uma risada — Então, Maison?

— Sim?

— Como é lá em cima? —perguntei, e nessa hora percebi que eu tinha que parar de culpar Jimmy por não saber puxar assunto, eu também não tinha esse dom.

— Você pergunta isso para todos os anjos que conhece? — devolveu com seriedade, mas eu senti uma nota de ironia na sua voz.

— É, mais ou menos — afirmei, abaixando a cabeça e fitando minhas mãos. O corte feito pelo verme de Eve já estava cicatrizando no meu pulso, apenas uma marca arroxeada em relevo era visível agora.

— É... — ela pensou por alguns segundos, procurando as palavras — Pacífico.

Assenti com um sorriso, lembrando do outro anjo que havia me falado algo parecido. Como eu sentia falta de Daniel, das suas brincadeiras idiotas e do jeito como ele cuidava de mim. Embora eu tivesse aceitado a morte do meu melhor amigo, eu acho que jamais me conformaria quanto as circunstâncias dela. Fiquei algum tempo em silêncio e então uma curiosidade me veio de repente.

— Como você caiu? — indaguei, receosa de que a garota não se sentisse a vontade para falar sobre aquilo. Esperei e como a resposta não veio, constatei que não deveria ter aberto a boca — Desculpe.

— É complicado, mas eu desobedeci uma ordem. — explicou ela em seguida, sem me encarar — Disseram que eu teria que executar uma criatura, e de imediato fui até onde ela estava. Só que eu não sabia que se tratava de um bebê.

— Um bebê? — repeti franzindo a testa. Por que anjos iriam querer a morte de uma criança?

— Não exatamente um bebê humano, mas sim era um bebê.

— Certo, estou confusa. Se não era humano...

— Anticristo. — Maison me interrompeu, girando a cabeça para me olhar — Filho de um demônio com uma humana, mais poderoso que as duas raças, e inclusive anjos.

— Tipo, o filho de Lúcifer? — indaguei de queixo caído.

— Não, um demônio qualquer pode gerar um anticristo. — ela deu de ombros, enquanto eu processava a informação nova, e então continuou —Eu cheguei lá logo depois que a mãe havia dado a luz, eu só deveria matar ela e o bebê e voltar, mas não pude.

— Por quê?

— Eu não sei, Esther. — murmurou sacudindo a cabeça para os lados — Eu passei tempo demais na terra, talvez eu tenha me apegado demais aos humanos e seus sentimentos confusos — ela sorriu fraco, mas dessa vez de uma maneira triste — Então eu apenas exorcizei o demônio que estava no corpo da mãe sem que ela percebesse minha presença e fui embora. Quando voltei ao céu, Zacharias estava me esperando junto com meu superior.

— Seu superior? — questionei, imaginando os anjos como um pelotão do exército por um momento.

— Sim, nós temos uma cadeia de ordem lá em cima, geralmente cada anjo avançado tem dois ou três subordinados. A minha dupla na época era Uriel, mas isso não vem ao caso. — esclareceu Maison — Eu fui rendida antes que pudesse pestanejar, e então Zacharias perguntou se ele concordava com a punição de ter as asas arrancadas. Meu superior poderia ter intervido ao meu favor, nós éramos próximos, mas ele não fez. Apenas disse que eu estava perdida, pois havia aprendido a ignorar ordens.

— Seu superior... — comecei ao me lembrar de algo que havia ouvido há algum tempo, no dia em que Jimmy e Balthazar selaram o pacto de sangue.

— Era Castiel. — disse solenemente, me encarando com olhos fixos. Ficamos em silêncio, e naquele momento eu percebi o quanto eu não conhecia Castiel realmente. E por algum motivo isso me fez sentir mal.

— Esther, naquele tempo ele não havia se afeiçoado aos humanos, mas ele sempre vai seguir as ordens no final. — falou a loira quando percebeu que eu havia ficado muda, e eu sabia o significado daquela frase — Você sabe.

— Prefiro achar que isso não vai acontecer. — devolvi um tanto ríspida, eu preferia acreditar que não iríamos terminar daquela maneira tão trágica e estúpida, mas eu também sabia que isso era enganar a mim mesma.

— Humanos e essa mania de mentirem para si mesmos. — retrucou Maison.

— Essa profecia, eu não entendo — comecei — Como ele terá que me matar se ao mesmo tempo tem que me proteger? Não faz sentido.

— Castiel tem que proteger a integridade da graça de qualquer criatura que se aproximar, caso não fizer isso, ele morre. Mas depois que você corromper sua alma por completo, somente ele é capaz de matá-la, entende? — ela me fitou com uma sobrancelha arqueada.

— E se ele não fizer? — questionei.

— Lúcifer sai livre, e todos morrem. Você sabe disso. — enfatizou a garota — Mas ele vai fazer.

— Isso é tão mórbido, é tão sádico — disse com repulsa. — Por que não me matar de uma vez então?

— Por que a profecia diz que você só morre quando chegar a hora.

— Uma profecia bem estúpida — grunhi com uma careta.

— Moças, podem vir aqui um instante? — chamou Sam, colocando metade do corpo para fora da porta. Desci do capô do Impala e fui em direção a casa.

— Ah, Esther. Posso te dar um conselho? — chamou Maison, me fazendo virar para olhá-la contra o sol.

— Qual? — questionei. A garota sorriu, olhando ao redor, e então me fitou divertida.

Não se apaixone por um anjo, é o pior erro que você pode cometer. Ouvi sua voz ressoar contra as paredes da minha cabeça, e percebi que ela estava falando comigo por telepatia. Devia ser alguma espécie de poder de anjo caído, assim como o de Daniel para “convencer” as pessoas. Ele foi criado para ser um soldado. Para matar, não para amar. Emendou a garota com seriedade na expressão.

Dei as costas para a loira e continuei andando, mas dessa vez com raiva. Me apaixonar por Castiel? De onde ela havia tirado tamanha estupidez? Apaixonar-me... Essa é boa, realmente, a piada do ano. Dei um grunhido de irritação e arrastei as mãos pelo rosto, ouvi Maison gargalhar logo atrás de mim e entrei pela porta.

— Agora eu quero ver se essa coisa vai entrar aqui de novo — dizia Dean enquanto terminava de colocar sal na janela do meu quarto, e Sam desenhava uma chave de salomão na entrada.

Eles haviam colocado armadilhas para demônios por toda a casa durante o dia, o que havia dado um trabalho danado. Jimmy havia ido numa biblioteca pegar um livro que Bobby pediu, e Maison havia ido comprar pizza e torta, depois de muita insistência do Winchester mais velho.

— Tem certeza que vai dar certo? — perguntei receosa, enquanto me sentava na cama.

— Se for um demônio, é claro que vai. — devolveu Sam — Eles ficam presos dentro desse símbolo — esclareceu enquanto terminava de riscar um último traço e observava o trabalho feito.

— Se for um demônio — enfatizei, e então fitei as expressões exaustas de ambos com tristeza — E eu me sinto mal em dormir e deixar vocês acordados.

— Você que está sendo visitada a noite, então você deve ser a isca — o loiro deu uma piscadela na minha direção e saiu do cômodo junto com Sam, deixando a porta entreaberta e apagando a luz — Boa noite — disseram os dois e desapareceram pelo corredor. Bati no travesseiro macio e me ajeitei na cama, puxando o cobertor por cima. Fechei as pálpebras e foi quase como desmaiar instantaneamente.

Parecia que eu havia dormido por cinco minutos quando acordei com um grito vindo do andar de baixo. Levantei aos tropeços e corri me apoiando nos móveis, descendo as escadas. Sam e Bobby já estavam andando de um lado para o outro, enquanto Dean estava espremido contra a parede, respirando fundo diversas vezes.

— O que houve?! — exclamei apreensiva.

— Eu vi a coisa, eu vi! — dizia o Winchester mais velho aos berros — Eu cochilei no sofá e acordei com uma respiração forte no meu rosto, quando abri os olhos estava lá... Aquele bicho feio do satanás, me olhando!

— As linhas de sal estão intactas — revelou Maison saindo da cozinha.

— Não tem sinal de enxofre pela casa — disse Jimmy, aparecendo pela porta que dava para o porão.

— Então agora temos a confirmação de que não é um demônio — constatou Bobby.

— Então o que diabos é isso? — indaguei, abrindo os braços.

— Eu preciso mostrar uma coisa para vocês — começou Sam, indo até a mesa e abrindo notebook — No começo a ideia parecia meia insana, mas a questão é que bate perfeitamente.

— Do que você está falando, Sammy? — questionou Dean, acalmando a respiração.

— Nós achamos uma coisa, e é aquilo que eu estava tentando me lembrar — comentou Jimmy, sentando-se ao lado do Winchester caçula.

— Ouçam isso — disse o nefilim, enquanto o moreno abria uma página e começava a ler em voz alta — “Durante o verão de 2003, eventos no nordeste dos Estados Unidos envolvendo uma criatura estranha e humanoide provocaram um breve interesse da mídia local. Focados principalmente na zona rural do estado de Nova York, auto proclamadas testemunhas contaram histórias sobre uma criatura de origem desconhecida. Emoções variaram de níveis extremamente traumáticos de medo e desconforto, a um sentimento quase infantil de diversão e curiosidade. Enquanto suas versões publicadas não estão mais no registro, as memórias permaneceram poderosas. Pouca coisa ou quase nada se sabe sobre o caso, apenas algumas especulações e muita teoria não provada circulam na internet.”

— Não estou entendendo nada — disparou Bobby.

— Calma, já chego lá — gesticulou o moreno e então foi Jimmy que continuou.

— Nota de uma testemunha: “Eu tinha acabado de voltar de uma viagem de Niágara Falls com a minha família para o 4 de julho. Estávamos todos muito exaustos depois de dirigir o dia todo, o meu marido e eu colocamos as crianças para dormir assim que chegamos. Por volta das 04:00, acordei pensando que o meu marido tinha se levantado para usar o banheiro, mas então percebi que o mesmo continuava a dormir ao meu lado. De repente ele se virou para mim, ofegou e puxou seus pés do fim da cama tão rapidamente que quase me derrubou com uma joelhada. Após ajustar meus olhos para o escuro por meio segundo, eu fui capaz de ver o que causou a reação estranha.

Ao pé da cama, sentado e de costas para nós, havia algo que parecia ser um homem nu, ou um cão de grande porte sem pelos. Mas o mais perturbador era a posição do corpo, curvado, como se tivesse sido atropelado por um carro ou algo do tipo. Por alguma razão, eu não estava instantaneamente com medo da criatura, mas preocupada quanto à sua condição. Em um movimento rápido, a coisa colocou a mão em seu joelho e foi em direção ao corredor, direto para os quartos das crianças.

Eu gritei e corri para acender a lâmpada, planejando pará-la antes de ela machucar meus filhos. Quando cheguei ao corredor, a luz do quarto foi o suficiente para vê-la agachada e debruçada sobre a cama. Ela se virou e olhou diretamente para mim, coberta de sangue. Eu virei o interruptor na parede e vi minha filha Clara. A criatura desceu as escadas, enquanto meu marido e eu corríamos para ajudar a nossa filha, ela estava gravemente ferida e falou apenas mais uma vez em sua curta vida. Ela murmurou: ‘Ele é o Rake’.

Meu marido pegou o carro e levou Clara para o hospital, mas por algum motivo, sofreu um acidente e não sobreviveu. Sendo uma cidade pequena, a notícia se espalhou rapidamente. A polícia foi útil no começo, e o jornal local teve muito interesse também, no entanto, a história nunca foi publicada. Durante vários meses, meu filho Justin e eu nos hospedamos em um hotel perto da casa dos meus pais, depois que decidi voltar para casa, comecei a procurar respostas e finalmente localizei um homem na cidade mais próxima que tinha uma história semelhante.

Entramos em contato e começamos a falar sobre as nossas experiências, ele sabia de outras duas pessoas em Nova York que tinham visto a criatura, agora referido como Rake. Por ideia dele, coloquei um gravador digital perto da minha cama e deixei ligado a noite toda, todas as noites, durante duas semanas.

No primeiro dia da terceira semana, eu pensei ter ouvido algo diferente. E o que eu encontrei foi uma voz estridente, foi o Rake. Eu não vi a criatura desde que ela arruinou a minha vida, mas sei que ela foi no meu quarto enquanto eu dormia. Eu sei e temo que uma noite eu vou acordar para vê-la olhando para mim.”

— Ok, agora eu estou com medo — declarei, olhando para todos na sala que tinham a mesma expressão que eu naquele momento: Pavor.

— De onde você tirou isso? — questionou Dean, cruzando a sala e virando o notebook para ele.

— É uma lenda que circula na internet, é insano, mas bate direitinho — explicou Sam.

— E como a internet diz que eu mato essa coisa? — o loiro se inclinou sob o irmão, rolando a página para baixo rapidamente.

— Não diz — respondeu o moreno com uma careta.

— Que ótimo, vou encher de chumbo então — disse o Winchester mais velho.

— Espera, considerando a hipótese que seja mesmo esse tal de Rake, vocês dois já tiveram o primeiro contato com ele. — começou Bobby — Quantos contatos as vítimas têm antes de morrer?

— Segundo alguns comentários e outras teorias... — começou Jimmy, puxando o notebook para averiguar algo rapidamente — Uns dizem que são dois, outros três.

— Maison, você é um anjo, o que sabe sobre essa coisa? — questionou Dean, se virando para a loira.

— Existem milhares de criaturas espalhadas por aí, não é como se eu tivesse um livro decorado sobre como matá-las na minha cabeça — devolveu a garota.

— Ele só vem quando a pessoa dorme, certo? — perguntei, andando até o amontoado que havia se formado em frente ao computador.

— Aparentemente, sim — respondeu Jimmy.

— Então não podemos dormir até descobrir como matar o Rake — sentenciei apreensiva.


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Notas finais do capítulo

Então... O Rake é uma creepypasta que circula pela internet (e eu tenho um certo medo dela) e eu decidi fazer um capítulo sobre isso, pois achei legal. Deu medo? Cuidado ao acordarem à noite, hein... Ok, parei de assustar vocês. Como será que isso vai se desenrolar?
Próximo capítulo entre três ou cinco dias!



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