Separate Ways - Requiem escrita por WofWinchester


Capítulo 11
O curioso caso dos irmãos Winchester


Notas iniciais do capítulo

Me diverti muito escrevendo esse capítulo, espero que vocês se divirtam também.



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Algumas semanas haviam se passado. Sam (graças ao Castiel fofoqueiro) havia descoberto o que realmente aconteceu, e sobre o muro instável em sua cabeça. Ele foi bem compreensível até, mais do que esperávamos. E Logo, eu venci a aposta com Bobby por aproximação, ganhando como prêmio duas horas de passeio pela cidade.

Os Winchester estavam na estrada, em diversos casos, quase não paravam mais em Sioux Falls. Bobby não era do tipo que conversa muito, e agora ele estava focado em traduzir um tipo de manual feito com pele humana que os irmãos haviam pego numa caçada a dragões. Pelo que eu ouvi, ele falava sobre uma tal de "Mãe", ou "Mãe de tudo". Sam levantou a hipótese de que era um manual para abrir a porta do purgatório e deixar algo sair, isso os deixou incrivelmente preocupados. Eu sei de um demônio que iria adorar colocar as mãos nisso, mas felizmente ele virou carvão há semanas.

Minha rotina agora se resumia em decorar o diário de John, ler alguns best-sellers de Sam, os poucos filmes de Dean (que não eram pornográficos) e encarar o teto. Como eu estava segura e trancafiada, Castiel não tinha motivos para dar o ar de sua graça, e eu também não fazia questão disso.

Levantei a cabeça em direção a porta, quando vi Bobby abri-la com uma mala nas mãos.
– Eu vou ter que ir até Rhode Island, ajudar o Rufus que conseguiu ficar preso num ninho de vampiros. Você fica aqui – ele apontou o dedo severamente pra mim – Eu volto em no máximo dez horas.
– Tudo bem, Bob... – tentei dizer que eu ficaria ali comportada e bonitinha, mas ele saiu apressado, passando a chave na fechadura. Me joguei pra trás, caindo no sofá e voltei a ler meu livro “O morro dos ventos uivantes”.

Com certeza eu adormeci enquanto lia, pois acordei com o barulho frenético do telefone. Levantei do sofá e fui tropeçando até a cozinha.
– Alô? – atendi ainda grogue.
– Esther?! Cadê o Bobby?! – chiou uma voz, estridente e desesperada. Demorei para reconhecer o timbre de Sam, que parecia mais agudo do que o normal. Franzi a testa.
– Ele teve que sair, mas...
– Sair? Ele precisa vir agora! Estamos presos em Illinois, uma bruxa nos enfeitiçou! O Dean está quase morrendo, e eu não sei quanto tempo eu vou conseguir manter a ligaç...

O telefone ficou mudo.
Encarei o aparelho, sentindo a gravidade da situação me causar pânico. Tentei retornar a ligação, mas dizia que o número não existia. Tentei ligar para todos os números de Bobby, mas só dava caixa postal. Arrastei as mãos pelo rosto, sabendo que cada minuto que eu perdia tentando arrumar uma solução era vital para eles. Então eu corri e me prostrei no meio da sala, começando a fazer algo totalmente estúpido: Falar com as paredes.
– Castiel, se você está me ouvindo, por favor desça o seu traseiro mágico e teleportador aqui embaixo por um instante.
Esperei, e nada aconteceu.
– CASTIEL O RAPHAEL TÁ ARROMBANDO A PORTA E VAI ME ESGANAR! – berrei com todo meu talento dramático. Não deu nem meio segundo e o anjo apareceu esbaforido no meio da sala, caminhando apressado em minha direção, a expressão apavorada.
– Cadê ele?! – indagou. Eu não contive o riso. Ele demorou pra entender o porquê da risada, então me encarou com os olhos apertados.
– Eu estava no meio de uma batalha, não tenho tempo para os seus caprichos! – exclamou agressivo. Notei que a manga do seu sobretudo estava manchada de sangue e com alguns respingos na altura do peito - Onde está Bobby?
– Teve que sair. Ei, você está bem? – tentei tocar seu braço, mas ele recuou bruscamente.
– Ele supostamente devia estar de olho em você. - comentou repreensivo - Por que me chamou, afinal?
– Sam ligou, ele estava desesperado. Disse que uma bruxa os enfeitiçou. Você precisa resgatá-los! – disse rapidamente, me atrapalhando com as palavras. Castiel ponderou a situação.
– Certo. Nós vamos.
– Como assim nós? - perguntei, temendo que ele estivesse cogitando a possibilidade de que eu fosse a tira colo. - Você me ouviu dizer bruxa? Eu não gosto de bruxas! Nem pensar!
– Não posso te deixar sozinha, Esther. É perigoso – explicou com ar de poucos amigos.
– E aí você vai me levar pra tomar café com uma bruxa? Desde quando isso é menos perigoso do que ficar algumas horas sozinha?
– Não vamos tomar café - comentou Castiel confuso, indiferente as minhas ironias. Inspirei e soltei o ar lentamente pelo nariz.
– Olha, você vai pega cada um por um braço e trás pra cá. Vai levar o quê? Uns dois minutos? - propus com um sorriso nervoso.
– Se eles estão sob encantamento, provavelmente eu vou precisar matar a bruxa. Preciso encontrá-la e pode demorar - disse andando em minha direção. Eu recuei. Nem a pau eu ia ir com ele. Já bastava o incidente com Crowley, nunca mais eu daria a minha de metida.
– Nem pensar! - exclamei, sentindo a mesa de Bobby me impedir de recuar mais. O anjo parou a centímetros de mim.
– Não me faça te deixar inconsciente, Esther - ameaçou Castiel. Qual o problema dele hoje? TPM? Que droga. Suspirei lentamente, organizando meus pensamentos, e então armei uma tática que tinha 80% de chances de funcionar. Eu só tinha que conseguir algum tempo sozinha no banheiro e redesenhar aquele símbolo antianjos que os Winchester nunca acertavam, se é que eu me lembrava direito como se fazia aquilo.
– Ok – levantei as mãos pra cima – Vamos então, eu só preciso ir no banh... – tentei dar um passo para o lado, mas fui interrompida quando Castiel agarrou meu braço. Isso não estava nos meus planos, e lá se foi minha estratégia mal feita pro brejo.

Senti minha cabeça zunir, a sensação era igual a de andar por vários minutos naquela roda giratória do parquinho. Você fica muito tonto. Assim que meus pés tocaram o chão, eu não consegui mantê-los firmes e cedi, caindo sob o meu joelho esquerdo numa grama fofa. Levei a mão a boca, na tentativa de conter o enjôo.
– Você é louco?! – praguejei procurando Castiel, que estava logo acima de mim. Levantei a cabeça para fitá-lo, o anjo estava contra o sol o que fazia a sombra encobrir parte do seu rosto, mas eu sabia que ele estava retorcido de irritação.
– Você exagera - sibilou, provavelmente se referindo ao fato de eu enjoar, ficar tonta e quase morrer quando ele me teleportava.
– Talvez seja sua culpa, já te disseram que você é um péssimo motorista? - falei, sentindo a acidez nas minhas palavras.
– Precisamos nos apressar - ordenou o anjo, assim que ficou sem resposta.

Resisti ao impulso de mandá-lo para um lugar bem impróprio, pois estávamos no meio da rua. Levantei e olhei em volta. Calçadas, árvores, casinhas bonitas, parecia uma cidade do The Sims. Respirei até sentir meus pulmões se encherem de ar. No fim, era bom pegar um sol depois de ficar semanas trancafiada. Minha cabeça ainda estava zonza, e a visão rodava um pouco. Castiel agarrou meu braço me puxando do chão.
– O que deu em você? Ataque de rabujisse? – falei me desvencilhando e massageando o pulso. Dei uma pausa antes de continuar - Como vamos encontrá-los afinal, gênio?
– Eu tenho uma forte conexão com Dean, se eu me concentrar posso encontrá-lo facilmente - revelou.
– Nossa, vocês são tão gays– observei franzindo a testa. O anjo então ficou imóvel, olhando aparentemente para o nada. Em seguida se virou para mim, me encarando por vários segundos, então sua expressão se suavizou, ficando confusa.
– Eu não consigo – murmurou observando as próprias mãos.
– O quê? Se teleportar? – questionei, confusa também.
– Meus poderes. Tem algo nessa cidade que os está bloqueando.
– Que legal, você é inútil - comentei irônica, jogando as mãos pra cima - Vamos morrer! - Castiel apertou os olhos pra mim. Virei as costas e comecei a caminhar apressadamente, ouvi os passos dele me seguindo.
– Você é irritante – grunhiu.
– E você é metido – rebati.
– Inconsequente.
– Eu sou inconsequente? Você me trouxe pra uma cidade cheia de bruxas, perde seus poderes de power ranger de Deus e eu sou inconsequente? Imbecil! Eu sei que você está assustado por que o seu traseiro angelical está na reta se acontecer alguma coisa comigo, mas dessa vez precisa admitir, você foi o inconsequente aqui! - vociferei, apontando para o seu peito.
– Estou tentando te proteger. Você é um perigo pra si mesma! - devolveu ele, cheio de razão.
– Eu sei me cuidar, seu idiota.
– Você é tão infantil.
– Babaca.

Seguimos por vários minutos trocando todo tipo de ofensas. Eu procurava placas de hotéis, albergues ou a imagem do Impala estacionado em algum lugar, mas parece que dessa vez Dean e Sam se esconderam muito bem. O sol estava no alto do céu, não era um dia quente, mas andar sem parar estava começando a me deixar com calor. Tirei o moletom, amarrando-o na cintura.

Reparei que Castiel vestia roupas extremamente quentes e não parecia nem um pouco desconfortável.
– Você não sente calor? – perguntei, me virando para ele e andando de costas.
– Não. Nem fome, nem sono. Mas como estou sem meus poderes, logo vou começar a sentir. – respondeu olhando ao redor. Assoviei.
Robocop em seus melhores dias.
– Não entendi.
– Que novidade... – parei abruptamente quando uma cena me fez engasgar de terror.

Do outro lado da rua, em frente a uma casa de tijolos a vista, o Impala estava estacionado.
E dentro dele tinha um homem gordo, que mal cabia dentro do carro. Junto dele estavam mais quatro caras espremidos ali como sardinha dentro da lata. O pobre Chevy estava enlameado e fumaça de cigarro subia das janelas.
– O Dean vai ter um ataque – dissemos Castiel e eu em uníssono. Só Deus (talvez nem ele) sabia o quanto o Winchester amava aquele carro mais que a própria vida, e essa cena era deplorável.
– O que vamos fazer? - indaguei. O anjo fitou o veículo por mais alguns segundos.
– Eles podem saber onde Sam e Dean estão. Vamos interrogá-los.
– E o que você pretende? Chegar lá e dizer "Eu sou o anjo do Senhor. Me deem respostas"? - ironizei, mas Castiel já estava caminhando em direção ao carro. Droga de anjo! Marchei em direção ao Impala, o rádio estava ligado tocando algum tipo de rap barulhento e cheio de gírias. O homem dançava no ritmo da música, o que fazia o veículo balançar pra frente e pra trás.
– Onde achou esse carro? – perguntava Castiel, parando ao lado da porta do motorista. Me prostrei logo ao seu lado, enquanto vi os cinco homens nos observarem. Em seguida uma voz se virou para mim.
– Gostou da caranga, meu amor? Quer dar uma voltinha? – convidou um loiro magrelo, espremido lá atrás.
– Não, eu passo. – dispensei – Só queremos saber onde vocês conseguiram o carro.
O motorista tragou o cigarro e soltou a fumaça na minha direção, desaforado.
– Tava abandonado perto de um galpão, lá no morro – confessou. - Portas abertas, chave no painel. É um carro clássico e bem cuidado.
– Só ainda não conseguimos abrir o porta malas, já que o Rick não quer que a gente dê umas marteladas na caranga dele - disse o homem dentuço no banco do carona.
– Ótimo... - agradeci, pronta pra puxar Castiel pra longe da gangue do mal, mas fui interrompida.
– Ótimo. Agora saiam do carro. - ordenou o anjo. Engasguei, arregalando os olhos.
– Como é? – perguntou Rick com uma expressão de deboche.
Como é?!– perguntei me virando pro anjo do senhor metido a macho. Fiquei entre ele e o motorista - Você quer morrer? - sibilei, contendo a voz - Seus poderes, esqueceu? Esses caras são da pesada, eles não vão pensar duas vezes antes de te estripar e desovar por aí.
– Pode ter alguma pista no Impala - falou calmamente, me empurrando para o lado com suavidade.
– Saia do carro homem gordo - intimou o anjo novamente. O motorista desfez a expressão de deboche e ficou irado. Conselho: Nunca chame um gordinho de gordinho, pode ser a última coisa que você vai fazer na sua vida miserável.
– Desculpa gracinha, mas eu vou ter que dar umas porrada no seu namorado - prometeu Rick saindo do veículo.
– Ele não é meu... - fui interrompida quando o homem foi pra cima de Castiel, eu me esquivei como pude, ou seria derrubada também. Os outros quatro caras saíram do carro e fizeram um círculo em volta dos brigões, como as crianças fazem no colégio. Só faltava gritar "briga".

Castiel desviava como podia enquanto Rick desferia golpes pra todos os lados. Embora fosse lento, ele era forte e pesado. Quando eles levaram a luta para o chão, o anjo conseguiu imobilizar o homem com vários socos. Mas parece que os caras não gostaram muito dessa ideia e avançaram em cima dele como uma matilha de cães famintos em cima de um pedaço de carne. Apesar de Castiel estar sem seus poderes e com cinco caras em cima, ele parecia o Denzel Washington no filme "Dia de treinamento". Eu precisava pensar em alguma coisa antes que eles dessem um jeito de matar esse anjo brigão. E já que estávamos lembrando de filmes...

Aproveitei que todos estavam distraídos, e me lancei para a traseira do Impala, rapidamente colocando os números da senha que Dean havia me passado (a data da morte de Mary). O homem magrelo interceptou meus planos, me pegando pelos cabelos, puxando com força.
– O que pensa que está fazendo? - vociferou, sendo atingido em seguida por um de seus companheiros que veio desequilibrado em nossa direção.
– Vai! - exclamou Castiel que deve ter previsto meus planos, enquanto esquivava de Rick. Abri o porta malas revelando o armamento pesado dos Winchester. Relutante eu peguei uma pistola na intenção de dar alguns tiros pra cima e meter medo nos caras (como nos filmes do velho oeste), mas ao tentar destravá-la, a mesma atirou, impulsionando meu braço pra trás. Por sorte, ou azar, o tiro deu no pé de Rick que estava dando uma surra épica em Castiel na lateral do Impala. Ele demorou alguns segundos para notar, e então entrou em desespero, saindo mancando e gritando rua afora, seguido de sua patota. Uma cena vergonhosa. Eu estava com medo desses caras?

Larguei a arma imediatamente no lugar onde ela estava. Castiel levantou do chão, limpando o sangue que escorria no canto da boca. Minha vontade era de desferir uma série de socos nele, por não ter ouvidos e ser cabeça dura.
– Você é doido! – afirmei, ainda sentindo a adrenalina da luta.
– Precisávamos do carro - deu de ombros, entrando no veículo e sentando no banco do carona. Abri a porta e as chaves estavam no painel. O cheiro de cigarro e cerveja era de matar, sem falar no odor forte de suor masculino. Uma verdadeira lata de sardinha, até no cheiro. Meu Deus, se Dean visse isso...

Observei que Castiel estava bem machucado. Na boca, e na altura da sobrancelha. Sem pensar duas vezes, peguei uma garrafa de cerveja que estava perto do câmbio e molhei a manga do meu moletom, me inclinando em sua direção.
– Idiota – murmurei pressionando o pano contra o corte em sua boca e balançando a cabeça em desaprovação – Devia saber que poderia se machucar sem seus poderes. Se eu não te conhecesse diria que estava tentando me impressionar com esse gesto quase suicida.
– Levando uma surra? Por que eu faria isso? - indagou ele, virando a cabeça de lado. Dei uma risada.
– Exatamente, se eu não te conhecesse.
Castiel segurou a minha mão e me fitou com uma expressão curiosa.
– Obrigada - murmurou depois de alguns instantes, provavelmente se referindo ao fato de eu estar limpando seus ferimentos. E por que eu estava fazendo isso afinal? Preferi pensar que eu não sabia, mas no fundo, bem lá no fundo, era um jeito de agradecer por ele cuidar de mim. De um jeito idiota, mandão e meio filho da mãe, mas mesmo assim... Ah meu Deus, o que eu estava fazendo? Balancei a cabeça e me afastei, girando a chave no painel.
– Vamos achar Sam e Dean.

Depois de procurar em todos os hotéis da cidade, entramos no último. Já passava das quatro horas da tarde e as poucas pessoas que andavam nas ruas agora haviam se escondido em suas casas, como coelhos em suas respectivas tocas. Entramos pela porta e seguimos diretamente para a recepção.
– Olá? - disse para a moça loira que estava de costas tagarelando no telefone. Assim que me viu, ela desligou o aparelho.
– Boa tarde, senhor e senhorita. Como posso ajudar? - perguntou com um sotaque francês. Até agora eu não havia pensado num motivo plausível para explicar a minha busca pelos Winchester. Digo, eu precisava de algo razoável para incentivar as pessoas a me ajudarem com pequenas informações. Decidi arriscar.
– Eu estou procurando dois policiais do FBI, nós marcamos de nos encontrar hoje, mas eu esqueci o número do quarto - falei dando um sorriso nervoso. A mulher fez uma careta e então puxou um livro grosso, molhando os dedos na boca e folheando algumas páginas.
– Spears e Aguilera? - perguntou ela depois de alguns instantes.
– Eu prefiro os irmãos Young... - disse, me perguntando o porquê do estilo musical ser colocado na conversa. Foi aí que caiu a ficha - Brincadeira. Sim, são eles.
– Quarto 368 - falou a mulher.
– Obrigada - agradeci indo em direção às escadas.

Logo chegamos ao terceiro andar do hotel. Andamos por um corredor extenso e repleto de portas até enfim achar o quarto dos Winchester. Bati na porta uma vez.
– Sam? Dean? - chamei. Esperei alguns segundos e nada. O anjo e eu cruzamos olhares duvidosos. Será que eles estavam bem? Tentei de novo, batendo com mais força - Somos nós, Esther e Castiel.

Esperei cerca de dois minutos, prestes a chutar a maldita porta quando a maçaneta girou e ela foi escancarada. Senti algo frio ser jogado na minha cara, me fazendo engasgar. Em seguida mãos me puxaram para dentro rapidamente. Observei minhas roupas encharcadas e eu senti uma vontade de xingar compulsivamente, quando me deparei com um garoto misteriosamente familiar. Ele era baixo, franzino, as roupas eram uns quatro ou cinco tamanhos maiores que ele. Seus olhos verdes estavam arregalados de pânico e suas feições me lembravam...
– Sam? - indagou Castiel surpreso ao meu lado, e um pouco ensopado também. Eu tossi sentindo a água que entrou pelo meu nariz.
– É bom ver vocês - falou o moreno com sua voz infantil, nos abraçando aliviado - Esther, o que você está fazendo aqui? É perigoso.
– Fui arrastada - sorri sarcástica para Castiel que revirou os olhos pra mim - Mas o que houve com você? Pelo que eu me lembro, saiu de Sioux Falls um homem feito e agora tem 13 anos?
– Quatorze na verdade. - corrigiu ele - É a bruxa. Ela está enfeitiçando as pessoas para que voltem a ser crianças novamente, e morram.
– Eu não sabia que isso era possível - comentou Castiel.
– Síndrome de Benjamin Button? - indaguei.
– Ela é muito poderosa - admitiu Sam. - Ela quer vingança, e temos certeza que não vai parar até conseguir. Quando encurralamos ela, caímos numa armadilha e fomos enfeitiçados.
– Certo, você diz nós, mas eu não estou vendo o Dean. - dei uma volta de 360 graus, observando novamente o pequeno apartamento com paredes alaranjadas - Onde o "Dezessete outra vez" se meteu? - questionei, Castiel lançou um olhar interrogativo pra mim - O filme... Ah, deixa. Cadê o Dean?

Sam ficou apreensivo e em seguida caminhou até uma porta entre aberta. Segui seus passos com certo receio do que eu pudesse encontrar. O Winchester estava parado ao lado da cama no escuro, tateei a parede procurando o interruptor de luz. Quando minha visão clareou, o que eu vi me deixou perplexa.

Nós estávamos na sala enquanto eu segurava o pequeno Dean chorão Winchester no colo e balançava pra lá e pra cá. Sam estava sentado no sofá com as mãos na cabeça e Castiel apenas observava com sua expressão curiosa o bebê que estava chorando há quinze minutos sem parar.
– Boi, boi, boi. Boi da cara preta... - eu cantarolava e Dean se esganiçava mais - Ok, mudança de planos - suspirei, começando a cantar AC/DC. O moreno me olhou com uma expressão cética como se dissesse "Sério mesmo?", e por incrível que pareça o bebê parou de chorar no mesmo instante.
– Isso é inacreditável - espantou-se.
– Embora tenha apenas alguns meses de vida, continua sendo o Dean - argumentei, limpando as lágrimas que melavam a cara dele.
– Há uma hora ele tinha cinco anos - relevou Sam, mexendo nervosamente num chocalho em cima do sofá - Não sei quanto tempo ele tem, quanto tempo nós temos, pra falar a verdade. Cass, você não consegue rastrear a bruxa?
Castiel e eu nos entreolhamos, Sam não sabia que o anjo havia perdido temporariamente seus poderes.
– Essa bruxa é bem poderosa. Ela usou um feitiço para bloquear meus poderes. Sinto muito - expôs o anjo. O Winchester que antes estava nervoso, agora parecia que ia entrar em pânico.
– Certo. Estamos ferrados! - ele deu um murro no sofá.
– Qual é Sam, tem que ter um jeito - tentei encorajá-lo. Passei Dean para Castiel e fui até a mesa onde estava o notebook e vários papéis, juntamente com o diário de John. Peguei uma pasta que parecia ser algum tipo de arquivo e comecei a ler. - Agatha Kingstorm, órfã, nove anos. Foi acusada de bruxaria depois de queimar o jardineiro do orfanato religioso e condenada a morte na fogueira em 1809. Corrija-me se eu estiver errada, mas essa Agatha deve ser a nossa bruxa?
– Ela mesma - confirmou o garoto.
– E ela voltou buscando vingança - afirmei, me baseando no que eu havia lido no diário de John sobre fantasmas vingativos - Mas por que só agora? Depois de todo esse tempo?
– Não sabemos, mas ela voltou furiosa. Foram quatro pessoas mortas em duas semanas, elas viraram... - ele mexeu as mãos em frente ao corpo, fazendo uma careta de nojo - Aquilo.
Aquilo?! - indaguei espantada.
– Aquilo? - perguntou Castiel, ingênuo e avulso.
– Isso é nojento. Muito nojento! - exclamei, arregalando os olhos. Essa bruxa devia ser muito sádica, por que não lhes dar uma morte decente, com seus corações simplesmente parando de bater? Não. Ela tinha que voltar mais no tempo, segundos antes da concepção. Uma poça de...
– O que é nojento? - insistiu o anjo.
– Ah... Você sabe... Bom... Eu me recuso a explicar isso pra você! - falei, apontando um dedo sugestivamente. Ele fez uma careta triste, como uma criança, e Sam começou a rir. Mudei de assunto, algo que não fosse constrangedor. - Onde vocês caíram na armadilha?
– Estávamos investigando na escola da cidade que está desabilitada depois de um professor ser liquidificado em frente a uma sala cheia de crianças. - a julgar pela expressão do garoto, eu não ia querer ver as fotos daquela cena. - Essa foi a primeira morte.
– Certo, temos um começo. - voltei os olhos novamente para os papéis - Por que a escola?
– Antes de ser uma escola era um orfanato, onde Agatha morava. Seria fácil, era só achar os restos, salgar e queimar os ossos. Mas a questão é: A bruxa foi condenada a fogueira. E aí está o ponto. - Sam levantou do sofá e dirigiu-se até a mesa.
– Então ela é um fantasma capaz de voltar mesmo sem seus restos mortais.
– Aparentemente, sim.
– Apenas a linhagem pura das bruxas de Salém é capaz de tal feito. Elas podem se prender a lugares, e não só aos restos. Não me lembro de alguém que já tenha matado um espírito de uma pura - revelou o anjo, comprimindo os lábios.
– Agora sabemos por que ela continua por aqui, mas alguma coisa não bate... - espalhei as folhas em cima da superfície de mármore, como se isso pudesse clarear meu ponto de vista.
– Não vejo sentido na história inteira, ainda mais quando o Cass disse que não podemos matá-la - o garoto levantou as mãos pra cima, bufando.
– Não disse que não podem, disse que não conheço ninguém que tenha feito– o anjo deu de ombros - Esse professor, ele tem algo na ficha? - sugeriu, aproximando-se.
– Na verdade algumas pessoas dizem que ele veio de outra cidade, depois de passar três anos na cadeia por pedofilia. Mas se realmente aconteceu, o caso foi totalmente acobertado. - expôs Sam.
– É um fato para se averiguar. E o tal jardineiro? Matou ou aliciou alguém? - indaguei.
– Não faço ideia, mas Esther, ela está matando muita gente agora– o moreno pegou vários atestados de óbito das vítimas, grampeados uns aos outros e colocou em frente ao meu rosto - Não há nada que justifique isto.
– Mas se ela não matou, ela está buscando justiça. Não justifica, mas é um motivo. - argumentei, abaixando as folhas.
– E o que você sugere? Que a gente procure registros de arquivos que nem devem mais existir e depois tome um chá com a bruxa, sente num canto e chore as mágoas da vida dela?
– Cruzes, você está com o sarcasmo do seu irmão - fiz uma careta ao mesmo tempo em que o bebê resmungou no colo de Castiel, como se entendesse que eu falava dele. - Nós precisamos investigar o que realmente aconteceu. O que está por trás do que estão tentando encobrir - sibilei.
– Como? - perguntou Sam, nada satisfeito. Eu lancei um olhar para o anjo, buscando por ideias.
– Aquele prédio onde os governantes das cidades guardam as coisas - falou calmamente.
– Prefeitura - corrigi - E se ela for inocente vamos expor isso pra cidade, talvez assim ela pare.
– Você realmente acredita nisso? - o moreno se virou para o anjo e em seguida pra mim, estupefato.
– Se você tiver um plano melhor pode falar. - retruquei.

O garoto bufou, irritado e contragosto ao plano que na verdade era muito simples. Observei-o se virar e caminhar até o quarto. Arrastei as mãos pelo rosto, nem eu mesma tinha plena certeza que isso fosse funcionar, mas era o que tínhamos agora. Então isso tinha que dar certo. Levantei os olhos e fitei Castiel, que olhava apreensivo para Dean em seu colo, enquanto o bebê fazia sonoros ruídos na fralda e ria.
– Isso foi o que eu acho que foi? - perguntou o anjo segurando o pequeno com os braços afastados do corpo. Comecei a rir da cena.
– Você como pai seria um excelente... Anjo– comentei, recebendo um olhar confuso como resposta - Certo, vou buscar uma fralda nova.
Me dirigi até o quarto, Sam estava sentado na cama, balançando as pernas, nervoso. Ao seu lado tinha vários objetos úteis, como pomada, fraldas, brinquedos, mamadeira, roupas, chupetas. O garoto tinha as mãos em frente aos olhos, esfregando-os vagarosamente. Ele parecia exausto.
– Vai dar tudo certo. Você vai ficar bem, nós todos vamos - disse, me agachando na sua frente e segurando suas mãos.
– Não é comigo que eu me preocupo, é com o Dean. Você o viu, ele tem pouco tempo, Esther. Eu sinto isso. E também sinto que eu sou totalmente impotente e inútil, e vou ser a cada minuto conforme eu for... Decrescendo. Isso me mata por dentro, por eu ser incapaz de salvar o meu próprio irmão. - confessou, e eu percebi que ele estava se segurando para não desabar em lágrimas. Estava tentando ser forte pelo irmão.
– Eu sei como você se sente, Sam. Eu perdi toda a minha família, a maior parte na frente dos meus olhos, acredite, eu sei bem. E sabe de uma coisa? Nós vamos sair dessa. Eu prometo pra você que nós vamos dar um jeito, ok?

Apertei as mãos dele gentilmente e sorri. Eu não sabia de fato se nós conseguiríamos dar um jeito, mas eu sabia é que eu ia cair tentando. Não, Sam e Dean não iriam ter uma morte patética dessas. Não se eu ainda tivesse 1% de chances de impedir. Peguei lenços umedecidos, uma fralda, talco e pomada pra assaduras e me dirigi para a sala. Castiel estava segurando Dean de ponta cabeça enquanto o bebê resmungava.
– Por Deus! Eu devia saber que anjo sem noção mais pirralho não daria certo - disse me aproximando rapidamente e desvirando a criança que estava vermelha feito um tomate.

Duas horas depois
Estávamos espreitando a prefeitura municipal há mais de quarenta minutos. As longas escadas que davam para o prédio de pedra antigo estavam escuras, graças aos postes com as lâmpadas quebradas. Não havia sinal de qualquer pessoa do lado de fora, muito menos seguranças, o que era estranho, ou no mínimo displicente. Castiel, que estava no banco do carona, se virou para me encarar.
– Tem certeza?
Olhei pelo canto do olho para Sam assustado no banco de trás, que segurava Dean entre os braços, o loiro dormia como um anjinho.
– Absoluta - confirmei, embora sentisse meu estômago começar a se revirar de tensão. O que íamos tentar agora era arriscado, e tinha grandes chances de dar errado, porém era preciso. Respirei algumas vezes, preparando meu psicológico para o que viria a seguir e enfiei a mão debaixo do banco, onde Sam revelou existir uma caixa de emergência com roupas, documentos falsos e um distintivo do FBI para mim, caso fosse "necessário". Bem, agora era.

Observei o terno preto por alguns segundos, nunca na minha vida eu pensei que usaria algo tão formal assim. Enfiei as mãos na minha camiseta para trocar de roupa, mas parei quando percebi dois pares de olhos em mim.
– Ei, virem-se! - chiei com o anjo e o mini projeto de caçador no banco de trás. Troquei de roupa rapidamente, fazendo acrobacias dentro do espaço limitado do Impala.
– Você parece nervosa - constatou Castiel enquanto eu tentava dar um nó na gravata preta, algo que eu não sabia fazer.
– Você acha? - indaguei irônica. O anjo chegou mais perto, tirando as minhas mãos e passando o tecido acetinado pelo meu colarinho.
– Eu estou com medo - falou Sam, pulando os olhos do irmão para mim. Talvez o feitiço não decrescesse apenas o corpo, mas também a mente e os sentimentos da vítima. Eu não imaginaria o moreno falando algo do tipo, ele pulou numa jaula com Lúcifer sem pestanejar. Mas o fato era que ele realmente temia, principalmente por Dean.
– Eu não vou falhar com vocês - prometi, sentindo uma onda de coragem repentina - Assim como eu sei que vocês não falhariam comigo.

Segurei o olhar de Sam por segundos suficientes para perceber que ele confiou na minha palavra, ele estava contando comigo e esse era mais um motivo para eu não falhar. Sorri e me virei, encontrando o azul poderoso dos olhos de um certo anjo que estava dependurado na minha gravata. Sua expressão demonstrava um misto de confusão, receio, mas principalmente ternura. Senti meu coração desestabilizar, começando um ritmo rápido e quase desesperador contra as costelas. Mais uma vez, sem perceber, eu me deixei hipnotizar por aquele olhar.
– Ei - chamou Sam, com um sonoro pigarro, me tirando de meus devaneios. - Vai fazer cinco minutos que vocês estão se encarando...
Balancei a cabeça e me afastei, sentindo meu rosto ficar vermelho e quente de vergonha. Que situação constrangedora.
– Hum, ah... Obrigado, ficou bom, eu acho - disse, apontando para a gravata e tirando o meu distintivo falso da caixa.
– De nada - murmurou Castiel observando a janela.
– Caroline Gilbert? - franzi a testa mostrando o documento para Sam - Talvez eu consiga entrar na comic con com isso aqui.
– Foi ideia do Dean, não minha - se defendeu o garoto.
– Nós vamos ter uma longa conversa quando você reaprender a falar - intimei o bebê que dormia profundamente.

Sai do Impala, e subi a longa escadaria em direção a prefeitura. Castiel estava logo atrás de mim, o que me fazia sentir mais segura. Meus passos ecoavam graças ao salto do sapato de "agente" que também me fazia dar alguns tropeços. Eu não nasci pra usar isso.

Passei por baixo do arco de postes, o último emitia uma luz fraca e faiscava. Senti um arrepio estremecer meu corpo, engoli em seco e encarei o anjo mais uma vez quando estava em frente a enorme porta de vidro. Ele colocou a mão na maçaneta, sabendo que eu estava um pouco petrificada pelo nervosismo, e a abriu.

As paredes verdes de material tinham vários quadros da época da primeira guerra mundial, muitos deles retratando mortes horrendas. O cômodo era enorme, tendo uma escada que dava para o segundo andar logo ao lado da porta. E no centro havia a recepção no estilo oval, logo atrás dela um homem de cabelos grisalhos, um pouco acima do peso e com olhos curiosos a respeito dos dois estranhos ali. Precisei de três segundos para reunir coragem e ir até ele.
– Boa noite - cumprimentou o homem, inclinando-se na cadeira sem tirar os dedos do teclado em que digitava.
– Boa noite. Gostaríamos de ver os seus registros de 1809, mais precisamente o de Agatha Kingstorm - falei rapidamente e atrapalhada, puxando meu distintivo nada convincente e colocando em frente ao seu rosto - por favor– acrescentei. Ele deu uma risada baixa, mas logo a conteve. Juntou as mãos sob o balcão, nos analisando.
– Por que agentes do FBI estariam interessados num caso de bruxaria de quase dois séculos atrás? - perguntou desconfiado.
– Isso é confidencial - respondi tentando transparecer calma. Logo atrás dele estava um mural de funcionário do mês, e junto com sua foto estava o nome "Carl Maguison" - Sugiro que coopere conosco, Sr. Maguison.
– Certo, certo - Carl tinha um sorriso sarcástico no rosto - Eu não sei quem são vocês, mas eu sei que o FBI não está investigando o caso de uma bruxa, então se puderem se retirar antes que eu chame a polícia...
– Você já trabalhou para o FBI, Sr. Maguison? Provavelmente não, então não pode saber o que é ou não é caso para nós - se meteu Castiel, sendo terrivelmente convincente. Até um anjo mente melhor que eu.
– Vocês já estão me irritando - disse ele - Eu não vou apostar meu pescoço e deixar duas pessoas que não provam nada revirar os arquivos confidenciais do município.
– Ah, então são confidenciais? - enfatizei. O homem ficou vermelho e enfiou os dedos na gola da camisa, puxando-a, desconfortável.
– Por favor, saiam e voltem quando tiverem um mandato.
– Não vamos sair - ressaltou Castiel, autoritário. A voz grave ecoando nas paredes.
– Então eu vou fazer vocês saírem - Carl colocou a mão debaixo do balcão, e então uma sirene começou a tocar freneticamente. Algum tipo de alarme pra invasores. Encarei o anjo apavorada.
Fudeu geral.
– O quê? - perguntou ingênuo, embora estivéssemos compartilhando quase o mesmo sentimento de pânico. Três seguranças armados desceram as escadas, nos encurralando. Castiel e eu estávamos de costas um para o outro, e muito bem enrascados.
– Seria muita sorte se seus poderes voltassem justo nessa hora?
– Seria surreal - observou o anjo - Se defenda como puder, e tente não morrer ou se ferir gravemente.
Dei uma risada nervosa. Como se isso fosse fácil, completei em pensamento.

Um dos seguranças avançou rapidamente contra nós, eu corri em direção ao balcão e vi Castiel segurar o impacto. Seu corpo se arrastou para trás, e ele rapidamente se abaixou para desviar-se de um soco. Rolei os olhos pelo cômodo para procurar os outros dois homens, encontrei um deles, alto e corpulento, logo a minha frente, me pegando pelo braço.
– Você é muito azarada sua pequena marginalzinha, não faz ideia das coisas que vou fazer com você - ameaçou ele com um sorriso malicioso. Esse era o típico abuso de poder da sociedade atual. Fechei o punho com força e dei um soco no segurança, que levou a mão a boca enquanto algumas gotas de sangue começavam a escorrer.
– Vadia - vociferou ele, me segurando pelos ombros e desferindo um chute no meu estômago. Eu grunhi de dor, sentindo um gosto ácido se misturar com a saliva. Coloquei as mãos em frente ao corpo, não conseguia respirar direito. Mas eu não podia me dar ao luxo de deitar e agonizar agora.

Me apoiei com uma mão, me levantando a tempo de ver o homem avançar na minha direção. Rapidamente peguei o monitor de LCD que estava em cima do balcão e atirei na direção do segurança, acertando-o diretamente na cabeça e deixando-o inconsciente. Tropecei no segundo homem que estava desacordado no chão e me virei no exato momento em que Castiel arremessava o terceiro contra a porta de vidro, fazendo um ruído enorme. Coloquei as mãos em frente ao rosto para me proteger dos estilhaços que voaram pra todo lado.

Nossos olhares se encontraram por milésimos de segundo, transmitindo preocupação mútua, e então uma figura correu apressada entre nós.

Me lancei a frente e segurei Carl pela camiseta, o jogando de costas contra o balcão, em seguida dando um soco em seu rosto.
– É tudo culpa sua! - exclamei estupefata, abrindo os braços pra que ele reparasse na bagunça ao redor - Então, você vai desembuchar ou nós vamos ter que te dar umas porradas também?
Mais uma vez Carl tentou correr, e foi impedido por Castiel, que o prensou contra a parede, colocando o braço na altura do pescoço, fazendo-o sufocar.
– Os arquivos - ordenou o anjo com o tom grave e autoritário. O homem começou a espernear quando seus pés não alcançavam mais o chão. Então ele puxou algo do bolso e apontou na minha direção, peguei o objeto prateado, identificando como uma chave. Castiel o soltou, mas ainda o segurava pelo ombro.
– O que ela abre? - perguntei, enquanto Carl arquejava.
– A porta com cadeado - respondeu com dificuldade - É tudo que eu sei. Eu juro! Nunca me disseram mais nada, eu nunca entrei lá!
Fale a verdade– rosnou o anjo, prensando-o com mais força contra a parede.
– É verdade! Eu juro, eu juro! Por favor! - suplicava o homem. Castiel e eu nos encaramos, de fato não parecia que Carl estava mentindo agora.
– Foi difícil? Precisava toda essa bagunça? - perguntei sarcástica. Em seguida o anjo soltou-o, fitando-o seriamente.
– Me desculpe por isso, mas já que estou sem meus poderes... - disse, e rapidamente nocauteou o homem que caiu desacordado. Fiquei perplexa.
– O que deu em você? - exclamei, arregalando os olhos.
– Ele ia correr, gritar e chamar a polícia - argumentou calmamente, abrindo os braços.
– E aí você nocauteia o cara? Quem é você? Rock Balboa? - ele franziu a testa - Quer saber, agora não temos tempo pra isso. - falei, me virando para a escada.
– Quem é Rock Balboa? - perguntou, indo logo atrás de mim.

Subi apressada, chegando ao segundo andar quase colocando os pulmões pra fora. Deslizei os dedos pelo corrimão, observando o corredor estreito com três portas, uma devidamente trancada com uma corrente presa por um cadeado. Os caras desse lugar não devem ser familiarizados com a frase "Esconda bem seus rastros".

Destravei a entrada com a chave, puxando as correntes e jogando no chão, o que fez um barulho alto. Coloquei a mão na maçaneta e girei, incerta sobre o que eu ia encontrar ali.

Era um cômodo surpreendentemente pequeno, talvez uns cinco ou seis metros quadrados. O piso de parquê estava apodrecido em várias partes, as paredes sem reboque tinham manchas de mofo. Apertei os olhos para as enormes estantes de registros empoeirados, há quanto tempo alguém não entra nesse lugar?

Procurei rapidamente por arquivos do ano de 1809, notando depois de alguns minutos que essa era a única data que estava faltando até o ano de 1912, onde eles provavelmente instituíram o amigável computador.
– Mas que droga! - arrastei as mãos pelo rosto, irritada. Eu não acreditava que nós tínhamos feito essa algazarra inteira pra chegar aqui e descobrir que eles sumiram com os registros da bruxa. Castiel colocou uma pasta de papelão azul marinho pacientemente na estante e se voltou para mim com a expressão preocupada.
– Parece que não estão aqui.

Nós não tínhamos tempo e eu me via na estaca zero novamente, sem pistas, sem nada. Senti um nó na garganta, que ia aumentando conforme eu percebia que estava falhando. Eu queria chorar de raiva diante da minha impotência, mas ao invés disso eu contei até dez, tentando colocar meus pensamentos em ordem.

Respirei fundo e me recostei na estante de registros, que bamboleou pra trás, provavelmente devido a umidade que apodreceu a madeira, e eu me desequilibrei. Me apoiei com o joelho no chão, limpando as mãos na calça de tecido negro, quando algo chamou minha atenção. No pé da estante havia marcas escuras e bem delineadas que se estendiam por uns 15 centímetros a frente. Como se alguém tivesse arrastado o móvel.
– Mas é óbvio - me levantei num pulo enquanto Castiel me observava enfiar o braço no espaço entre a estante e a parede e fazer força, derrubando-a no chão, o que fez um estrondo e levantou muito poeira. Abanei as mãos em frente ao rosto, tossindo com todo aquele pó, e como eu suspeitava, logo atrás do móvel havia um buraco que dava para outro cômodo menor.
– Inteligente - elogiou o anjo - Como sabia?
– Filmes de espião - revelei. Entrei pela abertura minúscula e escura, não havia nada além de mofo, umidade, e uma caixa repleta de registros no chão. Castiel se lançou a minha frente, procurando pelos papéis, e segundos depois levantou uma pasta onde estava escrito "Agatha Kingstorm".
– Aparentemente todos esses registros são casos Sobrenaturais - observou enquanto se levantava.

Um barulho ao longe capturou minha atenção, demorei um pouco pra entender do que se tratava. Castiel e eu nos olhamos alarmados ao mesmo tempo em que ele constatou.
– Polícia.


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