Identidade Homicida escrita por ninoka


Capítulo 45
Gaivotas


Notas iniciais do capítulo

quem são as duas gaivotas?



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[Nathaniel]

Eu sempre detestei chorar. Sempre, sempre detestei deixar qualquer fraqueza minha vir à tona e voar pra fora. Mas dessa vez era demais. Eu precisava. Precisava chorar e até mais; gritar, se possível.

Não tivemos aula o dia todo -- não tinha clima pra nada disso. O orgulho me fez subir para o telhado da escola no meio da tarde. A primeira coisa que fiz quando cheguei foi me escorar nas bordas.

Não havia se passado um segundo sequer: na primeira tremida de boca eu já estava fungando, caindo com a testa no parapeito e soluçando. Fazia tempo que meu peito não doía daquela forma. Aguei e tremi, engasguei com a própria saliva. Patético. 

 

Eu tô falando que você diz que Jackelino é isso ou aquilo, mas acho que no fundo você é igualzinho a ele. Você nunca fala sobre o que sente até que isso exploda pra fora de você.

 

A mescla entre ira, ódio, culpa e orgulho ferido estava me matando pouco a pouco. Doía no estômago e nos ombros. Meu peito ardia.    

Senti alguém subindo as escadas para o telhado. Rapidamente tratei de passar a costa da mão pelo rosto e segurar a turbulência; as bochechas vermelhas e os olhos inchados, o nariz ainda embebido.

Dei uma coçada, apoiei os antebraços na borda e ergui o queixo. Fingi mirar o horizonte.

Captei pela visão periférica: Jack. Ele se aproximou em silêncio; parou ao lado e também fingiu olhar para o mundo, as duas mãos contornando o peitoril.

— Como você tá? — perguntou, puramente retórico.

— ...O que você acha? — tentei inclinar o rosto o mais naturalmente possível para o lado, de forma que conseguisse esconder a terrível e estúpida fragilidade que minha face não negava.

Ficamos em silêncio. Haviam duas gaivotas planando céu.  

— Eu falhei, Jack.

 

Você está proibido de morrer antes de desvendarmos toda essa maluquice, Sherlock.

 

— Do que você tá falando, moleque?

 

Não quero que ninguém mais se vá, Jay.

 

Virei para Jack. A emoção, presa nos olhos, de repente transbordou, sem controle: despenquei de novo, as duas mãos cobrindo o rosto e os ombros estremecendo compulsivamente.

Senti a mão de Jack afagando minhas costas. As duas gaivotas ainda estavam no céu.




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