Eu te deixei entrar na minha vida escrita por psyluna


Capítulo 1
Ruínas.


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura.



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Eu te deixei entrar na minha vida porque alguma coisa precisava mudar. Não foi por tédio; talvez minha curiosidade tenha lá sua parcela de culpa. O que todos sabemos é que eu arrisquei. Fui contra a corrente, contra alguns conselhos que me deram, contra muita coisa em que eu acreditava com firmeza, contra coisas que eram meu porto seguro. E, eu ouso perguntar, em que aspecto dessa vida não corremos nenhum tipo de risco? A segurança é a maior ilusão que existe. Não, nunca estamos seguros, nem quando somos deixados a sós conosco. Seguros do quê, já que não existe aprendizado sem dor? Seguros de melhoras, de avanços? Essa não é a segurança que eu quero. Não é a zona de conforto solitária que me satisfaz mais. Às vezes, esse pode ser o maior risco que se corre: ser trancafiado ao lado de você mesmo, seu maior inimigo. Isso pode ser mortal, eu garanto.

Eu te deixei entrar na minha vida porque me pareceu a coisa certa a se fazer. Porque a sensação de estar com você, depois de tudo o que eu já tinha repensado, era confortável. Uma sensação da qual eu aprendi a gostar, e que antes me incomodava. Um sentimento construído, mas não por isso falso. Aliás, mais verdadeiro do que nunca, e sólido, tão sólido. Não era seguro… Era confortável. Era o lar que nunca tinha existido para mim. Um lugar para onde, no fim das contas, eu voltaria; a recorrência da sua presença me fazia bem porque não existe lugar no mundo como a sua própria casa. E era tudo tão novo. Talvez por isso eu não tenha feito todas as melhores escolhas. Talvez eu sofreria um pouco menos agora se tivesse maneirado nisso ou me soltado mais daquilo, mas não sou obrigada a acertar da primeira vez, sou?

Eu te deixei entrar na minha vida porque escolhi parar de ter medo. Principalmente por isso. Deixei que você ocupasse seu espaço na minha rotina, na minha mente, no meu coração. Só que eu, se você encarar que resultado é sucesso, errei. Errei porque não fui capaz de você fazer o mesmo comigo. Eu não te manipulei para gostar de mim porque isso não me pareceu algo justo a se fazer com um ser humano, ainda mais a pessoa cheia de marcas e traumas que eu sei que você é. Você tem a vida muito mais cheia de coisas e pessoas do que eu; por consequência, sobra muito menos espaço para mim. É questão de lógica. Duvido que você alguma vez sentiu qualquer coisa por mim com a mesma intensidade que senti por você. Não estou me menosprezando nem te julgando, de forma alguma. Sem ironias. É realismo. Devemos saber qual é nosso real tamanho e poder. E agora, ainda mais depois de você, eu sei quem sou.

Eu não fazia ideia do meu lugar na sua vida. Permiti que você fosse o primeiro pensamento do meu dia sem entrar em pânico por isso, sem ouvir todo aquele palavreado clichê sobre “amor é uma porcaria”. Porque eu acredito que, de uma forma de outra, eu amei você. Você mesmo disse que existem várias formas de amar. Quando você me chamava de “amiga”, eu deixava passar sem entender o que significava a amizade para você. Somos pessoas muito diferentes nesse ponto. Por muito tempo, eu mesma não me amei, e em exata sincronia, era obrigada a ficar sozinha. Forçada a não fazer barulho, a não incomodar, a me anular, porque qualquer sinal de que eu vivia e pensava poderia voltar para mim como uma onda de ódio. Em circunstâncias assim, aqueles que chamamos de amigos são faróis durante a noite. Pequenos pontos de coisas boas onde você tenta se agarrar, espaços para respirar e sentir um pouco de alívio, mas o buraco negro da vida real te puxa de volta, suga suas energias, te mata aos poucos. Amigos me salvaram. Eles me salvaram até de mim mesma. Estou aqui hoje, olhando para essa tela e elaborando estas palavras, porque eles se asseguraram de que eu chegaria viva até aqui, e eu fiz o mesmo por eles, não duvido disso.

Concluo que foi tudo um erro de conceito da minha parte.

Como você mesmo me ensinou, pessoas que se incomodam com a solidão não gostam da própria presença. E, deus do céu, eu aprendi a gostar de mim. Foi o passo inicial para que eu me cuidasse. Voltei a ouvir as músicas que tanto me faziam falta. Tenho cantado melhor do que nunca. Comprei as roupas que sempre quis usar. Vou aonde quero ir, penso o que quero pensar, escrevo o que quero escrever. Até tenho lido, de vez em quando. Você fez com que eu me acostumasse ao lado bom da vida, que eu voltasse a sorrir sem achar que estava fazendo algo de errado. Quando eu olhei para o fundo do universo e pedi que ele iluminasse meu caminho, eu nem imaginava de que forma isso aconteceria. Agradeço a ele pelo presente, e terminalmente a você, por ter existido na minha estrada.

Não se preocupe, eu já fiz isso antes. Já tive que jogar fora as coisas boas que sentia por alguém, porque de repente elas já não valiam mais nada. Tive que deixar de me importar. Tive que matar o que eu tinha criado antes que a saudade me matasse. Eu sei como sobreviver a um afastamento. Acredite, eu vou sentir muito a sua falta. Mas não vai ser você a me destruir. Você não tem todo esse poder sobre mim. Se houve uma coisa que eu aprendi com você, foi a ser forte; que a força existe de várias formas. Escrevo sobre você não porque meu coração está partido, não porque me sinto rejeitada, e sim porque não sei viver de outro jeito. Você não é o primeiro nem vai ser o último a quem eu dedico palavras. E não tenha dúvidas de que alguém vai ler.

Você deu seu passo para trás, para fora da minha vida, porque não achou próprio estar tão dentro dela. Por vários motivos que você não vai me dizer tão cedo, ou nunca vai. O principal deles, em palavras suas, foi que você não estava sendo quem realmente era. Eu acho que estava, sim. Só era uma versão nova de você, assim como eu. Acho que você não se deu o tempo para se adaptar a ela. Acho que sentiu medo dos riscos que eu, antes covarde, enfrentei. Não te culpo por isso. Não te culpo por nada, para ser sincera. Nem raiva eu sinto, só gratidão.

Agora que você saiu, observe. Assista à pessoa que eu vou me tornar. Isso não é uma ameaça, é um convite. Assista-me crescer. Acompanhe da distância que achar mais confortável, e aí eu saberei qual é a dimensão do seu temor pelo novo. Qual é o tamanho real das cicatrizes que você carrega. É contraditório, mas eu vou conhecer muito mais de você do que quando eu estava tão perto. Vou saber de longe se estar perto era o melhor para mim. Não sei se eu te contei, mas minha intuição não costuma me enganar. E ela tem me dito, com uma certeza nunca antes vista, que esse não é o fim. Que essa história ainda não acabou. Talvez um dia você queira voltar a ocupar o lugar que ontem eu te dei; até lá, eu vou ter decidido se as portas estarão abertas para você.


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Notas finais do capítulo

Chegamos ao fim. O que acharam? É um texto bastante pessoal, mas acho que pode tocar algumas pessoas. Gostaria da opinião de vocês.