Alice e a Rainha deixaram o Chapeleiro em uma das salas do castelo e seguiram para uma das bibliotecas, localizada entre uma saída para o jardim e um quarto de hóspedes.

As estantes eram de carvalho pintadas de branco e repletas de livros de capa dourada. Haviam mesas de mármore branco e bancos do mesmo material das estantes. As janelas, enormes, tinham poltronas douradas á sua frente com almofadas brancas e pequenas mesinhas para servir um chá.

– Alice querida, sente aqui! - a Rainha estava sentada na frente de uma janela de ferro.

– Rainha, primeiramente eu gostaria de dizer que pode contar comigo. Sei que não convivemos juntas e há muito não nos vemos, mas se precisar de mim para algo. Eu vi suas lágrimas, aquilo era saudade. - Alice abaixou a cabeça - Eu chorei muito assim, pelo Chapeleiro... Eu quero dizer que se precisar de uma amiga, se precisar conversar. Suas lágrimas tem dono, não sei seu passado, o que aconteceu, quem era ou porque sente tanto sua falta, mas eu posso ajudá-la se precisar.

Corada, Alice voltou seus olhos para Mirana que sorria.

– Alice querida!

A Rainha abraçou Alice enquanto derramava lagrimas nas mechas loiras da garota.

– Escute minha pequena, nunca alguém falou tão sério comigo. Nuca ninguém se preocupou assim comigo. Eu tenho sim, muitos súditos reais, mas mesmo que me vissem naquele estado, prefeririam não se intrometer por medo de me chatear. Você teve coragem o bastante para tentar entender meu sofrimento. Merece saber tudo.

Mirana chorava ao mesmo tempo que sorria e Alice sorria embaraçada com os elogios.

– Há muito tempo, quando Iracebeth ainda reinava, eu conheci um rapaz. Ele tinha cabelos negros como o ébano e olhos verdes como a mais frondosa copa de árvore. Era esbelto, sua pele era pálida como a minha e parecia que suas mãos tinham o encaixe perfeito para as minhas. Mas assim como ele chegou, de repente, teve de partir. Minha irmã ameaçava tomar o poder de seu reino também e ele precisava dominar a batalha junto ao seu pai e seus irmãos. Depois da grande batalha, que o Iracebeth perdeu, ele sumiu. Eu procurei por ele, por notícias. Mas ele sumiu. Seus pais o procuraram também, sua mãe vive a chorar até hoje.

Minha tristeza é enorme, cada dia maior. Mas eu governo tudo isso - Mirana indicou a janela para Alice, de onde podia-se ver todo o País das Maravilhas - tenho que me manter forte e segura de mim e minhas ações todos os dias. Não posso falhar com meu povo. Sou a Rainha deles, a esperança deles, a segurança de todos...

Mirana colocou as mãos no rosto, tentando esconder as lágrimas de frustração, angústia, medo, solidão e talvez até raiva. Ela sempre fora calma e contida na frente de todos, mas como Alice sempre desconfiara, ela escondia por trás de seu rosto sereno um turbilhão de emoções.

Alice, devagar, segurou os pulsos de Mirana e a fez tirar as mãos do rosto. Levantou seu rosto delicadamente, e sorrindo ternamente disse:

– Está tudo bem!

...

O Chapeleiro esperava as moças. Sentava em um sofá, andava em volta da mesinha, acendia e apagava o abajur, mudava toda hora de cômodo, subia e descia escadas, voltava pro lugar de onde saiu.

Ele imaginava o que elas tanto conversavam enquanto sorria ao lembrar de que Alice estava com ele novamente.

Seus cabelos, seu cheiro, seu sorriso. Aquele rosto alegre e sério ao mesmo tempo, pronto para qualquer coisa e qualquer situação. Seu coração se alegrava apenas de recordar a cor dos seus olhos.

Escutou passos vindos de um dos 3 corredores. Mirana e Alice saíram pelo corredor esquerdo de braços dados e sorrindo uma para a outra.

– Chapeleiro, vamos encontrar Bayard? Seus filhotes devem estar muito crescidos e quero falar-lhe. Também sinto saudade e aquela pequena conversa na entrada não me satisfez.

– Claro, senhorita. Vam... - Foi interrompido pela Rainha.

– Alice, antes de ir, quero te dar uma coisa. Espere no salão principal Chapeleiro! - rindo-se, a Rainha puxou Alice pelo terceiro corredor.

...

– O que quer me entregar Branca?

– Isto!

Mirana segurava um lindo vestido azul. Era um tipo de seda, mas não brilhava. Tinha mangas curtas e abaloadas. Ia até a metade das coxas. Junto, Mirana trazia uma meia-calça listrada de azul e preto e luvas de pulso azuis. Na saia do vestido, havia tule e algumas correntes finas e prateadas.

Entregou para Alice e enquanto a garota olhava o vestido maravilhada, buscou uma caixa de sapato branca.

– Vamos! Vista-o! - Mirana empurrava Alice para atrás de um biombo de madeira branco.

Alice vestiu e sentiu uma sensação diferente de todas que já havia sentido.

Saiu de trás do Biombo e viu os olhos de Mirana brilharem ao vê-la.

O Chapeleiro desceu algumas escadas até o salão principal. Esperou por um tempo até que viu a Rainha descendo as escadas.

– Onde está Alice? - ele não conseguia esconder a ansiosidade de tê-la por perto logo.

– Aí - Mirana apontou para a escada.

Alice descia devagar, corada. Os cabelos loiros e compridos caíam-lhe sobre os ombros. Usava um vestido azul maravilhoso que se encaixava perfeitamente á ela. Um par de botinhas pretas contornavam seus pequeninos pés e as pernas estavam cobertas por uma divertida meia-calça.

Nunca estivera tão linda.

O Chapeleiro sentiu como se um imã o puxasse para ela, e foi andando até a beira da escada. Segurou sua mão, e aproximando-se de seu ouvido disse:

– Você é minha rainha, Alice.

Beijou sua mão.