Cinzas escrita por Ludi


Capítulo 45
Epílogo


Notas iniciais do capítulo

Rose, como sempre, esse é para você. Corri para escrever depois dos seus comentários liiindos!

Como prometido, esse é o epílogo e o fim verdadeiro desse universo! Obrigada por tudo!



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45 - Epílogo

Setembro 2017

O rapaz ajeitou seus robes distraidamente sem conseguir tirar o sorriso do rosto. Era o primeiro dia daquele ano letivo em Hogwarts. Do seu último ano letivo em Hogwarts.

E aquela seria uma boa noite. Ótima, se ele fosse otimista – e ele era otimista na maior parte do tempo, tinha que admitir.

Caminhando calmamente pelos corredores da escola, o jovem prometeu a si mesmo que não se negaria aos menores prazeres no seu último ano de escola.

Depois daquele período, seriam só responsabilidades, emprego, vida de adulto.

A chatice, ele pensou e soprou os fios castanhos escuros e lisos para longe dos olhos verdes como se com o gesto pudesse também assoprar todas as coisas tediosas para longe de si.

Sua postura ficou um pouco menos orgulhosa quando o pensamento trouxe um princípio de preocupação com seu futuro, abalando sorrateiramente sua confiança e fazendo seu sorriso murchar um pouquinho.

Seu pai queria que ele entrasse no treinamento para ser um Auror, dizendo que ele tinha a retidão e a coragem necessárias para o cargo. E que o mundo precisava de pessoas assim para protegê-lo.

Seu padrasto, por outro lado, insistia que precisava de mais cabeças para guiar alguns dos muitos negócios da família e que seria um desperdício que ele, um garoto com tendências a flexibilizar regras rígidas, fosse trancafiado no Ministério da Magia. Nas palavras do padrasto, 'já tinha visto como era entediante a vida de trabalho burocrático no Ministério e ninguém merecia aquilo, mesmo alguém com sangue do Potter.'

Sua mãe tentava ajudar dizendo que azararia o traseiro dos dois - seu pai e padrasto - se eles continuassem incomodando-o, mas tudo aquilo continuava pesando nos ombros do rapaz, principalmente nos últimos tempos.

Mas não hoje, ele pensou e sacudiu a cabeça para afastar a preocupação.

Naquela noite, James William Weasley Potter se aproveitaria das vantagens de ser monitor-chefe. E também de fazer certo sucesso com as garotas, ele pensou com um sorriso travesso.

Passando a mão pelo cabelo ainda úmido do banho, ele se preparou para encontrar aquela garota Lufa-lufa do quinto ano que andava povoando seus sonhos, mesmo que ele não soubesse nem seu sobrenome. Ao constatar isso, ele deu de ombros diante do fato revelador sobre sua relação com ela.

Logo descobrirei seu nome, ele pensou franzindo a testa. Eu acho.

Ela havia cercado-o durante semanas no ano anterior, afirmando de forma travessa que ele era sexy com aquela cicatriz no rosto. James teve que frear a vontade de dar risada ao passar o dedo pela cicatriz que começava acima da sobrancelha esquerda, passava pelo olho e terminava no meio da bochecha.

Antes de entrar na escola tinha pensado que aquela cicatriz era tudo, menos sexy – muito porque na época ele sequer sabia significava a palavra sexy. Mas, então, descobriu que as garotas estranhamente gostavam dela.

Quando comentou isso em casa, sua mãe tinha rolado os olhos e dito algo sobre a futilidade na adolescência. Seu padrasto, por outro lado, tinha dado seu típico sorriso torto e dito que aquilo fazia sentido, que as mulheres preferiam mesmo os homens com cara de mau. James ignorou o fato que a resposta da sua mãe para aquilo tinha sido uma cotovelada nas costelas do seu padrasto.

Ele deu de ombros mais uma vez, pensando que não seria ele a reclamar do status que a cicatriz trazia.

E que não lembraria, sob hipótese alguma, de como tinha adquirido aquela marca permanente.

Pelo menos não naquela noite.

Tinha prometido a Ted e Victorie que jantariam juntos e depois ficariam na Sala Comunal da Grifinória, mas James se sentia cada vez mais desconfortável ao segurar vela para a prima e o amigo. Então resolveu unir o útil ao agradável e ir se divertir com os prazeres que a vida proporcionava, longe dos dois.

Contudo, nem mesmo seu excelente estado de espírito era capaz de encobrir o fato de que nem tudo eram flores naquela noite promissora: havia um outro problema que estava incomodando-o e cuja resolução tivera que ser postergada.

Ele não havia encontrado o endiabrado do garoto causador da sua outra preocupação em nenhum dos lugares comuns da escola. Havia procurado em todos os lugares possíveis depois do jantar e só havia conseguido ficar frustrado.

É o primeiro dia dele em Hogwarts e já parece conhecer a escola como a palma da mão, James pensou com uma careta, droga de garoto esperto.

Ele praguejou mentalmente quando se deu conta que não aproveitaria plenamente dos momentos com a garota lufa-lufa enquanto sua cabeça estivesse em outro lugar.

James acelerou o passo atravessando os corredores escuros, inconscientemente desistindo de procurar pela garota e passando a procurar por ele.

Como se o universo estivesse conspirando contra sua vida amorosa, foi exatamente aquele o momento em que James o avistou.

Ele estava num corredor deserto, sentado em um banco de madeira encostado na parede. Naquele horário, os estudantes do primeiro ano já deveriam estar há muito tempo na cama, mas o menino fujão não parecia se importar. Segurava um pedaço de pergaminho dobrado entre os dedos pálidos, mas sem amassá-lo ou brincar com ele.

James suspirou.

O garoto tinha uma tendência à organização que surpreendia nove em cada dez pessoas da família. E, pensando na quantidade de Weasley no mundo, aquilo era bastante coisa.

"Hey." James disse simplesmente e se jogou no banco ao lado a figura franzina e desanimada. "Tudo okay?"

Aries Arthur Weasley Malfoy tirou os cabelos dourados e exageradamente longos dos olhos cinzas, franzindo o nariz arrebitado e cheio de sardas por um milésimo de segundo antes de responder.

"Como se você já não soubesse. " Ele disse depois de um momento, claramente mal-humorado. "Estava lá no Salão Principal, como todo resto da escola."

"Ow, cuidado com o acidez das palavras, Aprendiz de Doninha." James exclamou fingindo mágoa e não hesitou ao usar o apelido que seu tio Rony empregava ao se referir ao seu irmão mais novo. "Elas podem me machucar."

James esperou uma réplica esperta ou algum comentário espirituoso. Não recebeu nenhum dos dois. Seu irmão simplesmente abaixou a cabeça, com o queixo quase encostando no peito e permitindo que seus cabelos claros caíssem sobre os olhos novamente.

Oh oh, mal sinal, James pensou preocupado.

Ver Aries em silêncio não era nada raro.

Ele era dado aos seus momentos de reflexão, de uma solidão quase melancólica, entre livros e poções, numa aptidão para o ofício da mãe que James nunca havia demonstrado. Ele gostava de passear sozinho pelo jardim da Mansão Malfoy fazendo anotações ou pensando seja lá no que aquela mente ardilosa dele pudesse convocar.

Mas vê-lo tão... inseguro, era totalmente atípico.

Ao ver a reação do menino, James continuou num tom mais sério.

"O que ele te disse?" James perguntou, cutucando distraidamente uma pedra solta do chão com a ponta do tênis antes de voltar a falar rapidamente. "O Chapéu, eu quis dizer." Havia tido contato o suficiente com o Chapéu Seletor para considerá-lo um parceiro antigo que não demandava formalidades, mas se corrigiu a tempo quando se lembrou que aquilo não era familiar para as outras pessoas. "Ele passou um bom tempo na sua cabeça, afinal."

Aries respirou fundo antes de responder.

"Disse que eu podia ser estupidamente corajoso e me importar mais com as pessoas do que seria aconselhável. Que eu me metia em problemas com facilidade – muitos deles graças a você." Aries apontou um dedo pálido para o irmão mais velho e James se limitou a sorrir orgulhoso. "E que isso me colocava na Grifinória."

"O chapéu usou essas palavras?" James perguntou depois que as palavras de Aries assentaram no seu cérebro, levantando as duas sobrancelhas numa expressão de espanto diante do tom jocoso usado pelo chapéu para se referir às características mais grifinórias. "Falou de mim!?"

"Não exatamente." Aries respondeu dando um meio sorriso travesso que lembrou terrivelmente o Sr. Malfoy. "Mas essa era a ideia geral da coisa. Só usei licença poética para interpretar. "

"Que criança de onze anos usa o termo licença poética!?" James bufou incrédulo e Aries deu de ombros antes de continuar seu raciocínio.

"Disse também que eu não era cego por causa de idealismos, que era seguro de mim, orgulhoso. Que eu podia me adaptar a qualquer situação. " O garoto parou por um momento e James notou que suas bochechas pálidas tinham ficado um pouco rosadas. "Que eu podia ser impiedoso e sangue frio também. E que tudo isso me colocava na Sonserina."

"Você argumentou com ele?" James se acomodou melhor no banco e passou o braço no apoio por trás de Aries, ficando mais relaxado e próximo do garoto. Talvez aquilo ajudasse seu irmão. "As vezes ele ouve o que temos a dizer. " Ele comentou ao se lembrar da história que seu pai tinha contado para ele sobre a sua própria seleção para a Grifinória, antes de toda aquela história com Voldemort...

Inconscientemente, James levou a mão até sua cicatriz.

Mas não, ele não se lembraria daquele bruxo por nada nesse mundo. Preferiu se concentrar no irmão.

"Não." Aries suspirou fingindo indiferença. "Para falar a verdade, eu só fiquei lá e escutei. Fiquei com a impressão que qualquer interferência minha fosse cutucar algo que não deveria ser cutucado."

Aquele garoto era mais maduro do que seria aconselhável para o seu próprio bem, James pensou retendo uma careta de preocupação.

"Certo..." James disse tentando organizar tudo que tinha ouvido. "E por que você está chateado então? Você fez o que achou certo. "

Aries rolou os olhos claramente dando a entender que a análise de James era simplista demais.

"Talvez porque papai vai sofrer uma combustão instantânea quando ficar sabendo? E a minha avó vai querer voltar para St. Mungus, dizendo que 'a sociedade anda fazendo mais sentido no lado de dentro do hospital do que do lado de fora'"

James riu com a voz fria e cheia de formalidade, tão essencialmente parecida com o tom de Narcissa Malfoy; Aries tinha o talento para imitar as pessoas exatamente como a mãe deles, ainda que não o usasse o dom com frequência para tristeza do próprio James e do tio Jorge.

"Eles vão entender." James deu um tapinha encorajador no ombro do irmão. "Tenho certeza."

Aries olhou ceticamente para ele por baixo das franjas douradas e seus os olhos cinzas brilharam com exasperação e impaciência.

"Tem certeza?" Aries perguntou com certa dose de sarcasmo. "Vou ser maior vergonha na história da minha família. " Ele falou lentamente como se estivesse explicando algo simples para alguém com capacidade limitada de aprendizado. "Provavelmente eu serei o primeiro Malfoy a entrar na Grifinória em, sei lá, centenas de anos. Isso sem contar que com certeza sou o primeiro a ter sardas."

"Provavelmente?" James perguntou retoricamente e bem-humorado apesar da situação. "Como se você já não tivesse feito todos os cálculos genealógicos para chegar a essa conclusão. "

"Isso porque eu sei fazer contas." Aries bufou insolentemente.

James ergueu o queixo do irmão com um dedo, ignorando a ofensa. "Ser tão diferente é o que te faz mais especial do que todos os outros Malfoy juntos." James sorriu abertamente, do jeito que só ele sabia fazer. "Você é uma mistura única, irmãozinho. Weasleys e Malfoys provavelmente nunca mais vão gerar descendentes juntos."

Aries tratou de ignorar a onda de carinho que ameaçou brotar dentro de si e afastou a mão do irmão, ainda que com gentileza. "Meu pai não vai ficar nada feliz."

"Mas a mamãe vai." James argumentou e aquilo pareceu animar um pouco mais o garoto. A mãe definitivamente era o calor da vida dos dois e a perspectiva de agradá-la já era suficiente para animá-los. "Além do mais, a Lyra com certeza vai fazer seu pai feliz quando chegar a hora dela. Nossa irmã está crescendo para se tornar uma verdadeira sonserina." James afirmou ao lembrar o quão chantagista e esperta a menina de seis anos estava ficando.

Dessa vez Aries riu. "Se a Lyra não entrar na Sonserina, papai vai deserdar a todos nós."

"Bom, se o Sr. Malfoy me riscasse do testamento dele pelo menos meu pai ficaria feliz." James falou tentando ver o lado bom da situação e Aries conteve um outro sorriso ao pensar na cara que o Sr. Potter tinha feito quando descobriu que Draco tinha colocado James no testamento dos Malfoy, dizendo que ele tinha dinheiro mais que suficiente para enriquecer todos os Weasley da terra no dia em que morresse e que o Sr. Potter podia agradecê-lo por garantir um futuro para James.

Aries se lembrou que aquilo tinha causado um certo alvoroço na família da sua mãe, mas não pôde deixar de se divertir ao recordar.

Alheio aos pensamentos do irmão, James continuou falando, mais pensativo dessa vez. "É uma pena que eu não vá mais estar em Hogwarts quando ela chegar, para ficar de olho nela."

"Se eu sobreviver a essa noite e papai não me deixar inválido com um feitiço incurável, eu tomarei conta dela." Aries garantiu, parecendo partilhar das preocupações fraternais e superprotetoras do irmão.

James o olhou entre divertido e pensativo.

"Sabe, o Sr. Malfoy não é tão mau como parece." Ele disse antes de se levantar do banco. "Ele sempre foi exigente comigo porque, de uma forma particular e estranha, ele quis o melhor para mim, mesmo não dizendo isso em voz alta. Você sabe como ele guarda os sentimentos para si, não é?" Ele perguntou e Aries balançou a cabeça, concordando quase que imperceptivelmente. "Vai ser assim com você também. E, por via das dúvidas, nossa mãe estará lá para lembrá-lo de fazer a coisa certa."

James se lembrou como ela olhava feio para o Sr. Malfoy e ele estreitava os olhos em retribuição, como se estivessem sempre prestes a dizer algo que começaria uma guerra. Ou que continuaria alguma.

Então parecia que algo se suavizava entre eles, como se ar em volta congelasse e só houvesse os dois no mundo.

"É, acho que sim." Aries concordou, dando um sorriso fraco.

"E então, vamos para o corujal enviar essa mensagem com a boa notícia de que temos mais um grifinório na família?" James propôs, esticando a mão para o irmão.

"E qual alternativa eu tenho?" Pela primeira vez, Aries levantou completamente o rosto para olhar adequadamente para James. Ele pegou na mão do irmão, que por sua vez o puxou para ficar de pé, ao lado dele.

"Além de se mudar para a Romênia e ir cuidar de dragões com tio Carlinhos ?" James perguntou e se começou a caminhar em direção ao corujal.

Aries fez uma careta diante da perspectiva de conviver com as queimaduras criadas por dragões ou da perspectiva de conviver com a tia Mirela, a mulher geniosa e ameaçadora do tio. Ainda não tinha certeza do que o deixava mais incomodado.

"Vamos logo mandar a droga da carta, James." Ele deu de ombros e seguiu ao lado de James, como sempre tinha feito desde que aprendera a andar.

XXX

Ginevra Weasley Malfoy tirou do rosto os cabelos ruivos que insistiam em cair sobre os olhos enquanto ela escrevia.

Debruçada sobre a grande escrivaninha do quarto principal da Mansão Malfoy, ela se perdia há horas entre anotações de ingredientes, contas e melhorias que poderiam ser feitas nas poções. Sentiu seu pescoço doer por ficar tanto tempo naquela posição e sua visão ficou turva depois de olhar por infindáveis momentos para pergaminhos, livros e rabiscos. Ela estreitou os olhos para enxergar melhor e se deu conta de que em breve precisaria de óculos.

Bom, parece que a idade chega para todos, ela suspirou resignadamente. No auge dos seus trinta e seis anos, Gina tinha esperanças de que a miopia ainda demoraria um pouco mais para chegar.

Mas não, não reclamaria da miopia recém adquirida, nem de nada na sua vida. Ela não tinha esse direito, depois de ter sobrevivido à tantas perdas, dores e provações. Gina só poderia ser grata por tudo que ela havia conquistado nos últimos anos. Ser grata pela paz.

Massageando suavemente o pescoço, seus olhos pousaram no outro ocupante do quarto, que jazia confortavelmente de pernas cruzadas numa enorme poltrona em frente à lareira, balançando o pé no gesto automático de quem estava começando a pegar no sono, com os olhos fechados e o Profeta Diário aberto sobre o colo.

Ela não pode evitar sorrir ao se sentir tão tranquila e familiarizada com aquilo.

Aquele homem, aliás, era uma das razões pela qual ela não poderia reclamar do que a vida havia lhe reservado.

"Alguma coisa de interessante no jornal?" Gina perguntou suavemente enquanto molhava a pena no tinteiro para recomeçar a escrever.

"Nah, nada demais." Draco Lucius Malfoy decidiu que precisava abrir somente um olho para conversar com a esposa e foi exatamente o que ele fez ao responder. "Aparentemente Rita Skeeter descobriu que a Sangue-Ruim está grávida de novo."

"Malfoy-" Gina começou num tom de aviso, esquecendo qualquer comentário que ela poderia fazer sobre o fato de que Draco estava realmente lendo a coluna de fofocas d'O Profeta Diário.

"Como se fosse surpreendente o potencial de fertilidade da sua família." Ignorando o tom de Gina, Draco falou preguiçosamente antes de mudar de assunto. "E também há uma página inteira sobre o acordo que nós fizemos com o Ministério da Magia da Áustria. Algo a ver com o fato de agora dominarmos a fabricação e distribuição de poções em larga escala na Europa e estarmos nos tornando mais ricos, blábláblá."

Dessa vez ele se deu ao trabalho de abrir o outro olho também, para então sorrir de forma arrogante para Gina.

"Como você consegue ser tão prepotente?" Gina perguntou genuinamente curiosa. E aquela certamente não era a primeira vez que a mesma dúvida aparecia na cabeça dela.

E ainda parecer tão sexy fazendo isso, ela completou em sua mente, mas sabiamente manteve aquele pensamento para si. Acariciar o ego já inflado de Draco Malfoy era altamente desnecessário.

"É um privilégio de ser um Malfoy, suponho." Draco respondeu indiferente, fechou os olhos mais uma vez e se acomodou mais confortavelmente na poltrona.

"Merlin permita que seus filhos não pensem nisso como um privilégio." Gina rolou os olhos e bocejou antes de se dar conta do quão tarde estava.

"Nossos filhos." Draco se limitou a dizer entrelaçando os dedos das mãos atrás da cabeça. "Eu não fiz sozinho, só para constar. Aliás, se você estiver incluindo o Cicatriz Júnior nessa categoria, eu sequer tive participação na concepção dele, para começo de conversa."

Gina ignorou quando ele completou com um 'Graças a Merlin' baixinho e fez uma careta de nojo, certamente pensando em como seria ter participado da noite em que James foi concebido, junto com Harry e ela.

"Por mais que me agrade ouvir você tecer comentários venenosos sobre a origem dos nossos filhos-" Gina falou, dando a entender no tom de voz que aquele obviamente não era o caso. "Acho que tenho que ir dormir. Precisaremos levantar cedo; Blaise vem aqui pela manhã para tratar de um novo cliente que fizemos na Itália."

"Cancele com Blaise." Draco interpôs com tom entediado. "Ele vai nos agradecer por não o tirarmos da cama da Lovegood cedo demais, por mais que eu ache tal comportamento incompreensível. "

"O quê!?" Gina quase engasgou ao desviar abruptamente os olhos da receita que estava escrevendo. "O que você sabe e que eu não sei sobre Blaise e Luna, Draco Malfoy?"

"Eu tenho dois lindos olhos, Ginevra." Draco comentou insolente, apontando lentamente seus globos oculares com um indicador. "E os uso para observar. Se você não percebeu nada, certamente não serei eu a sacrificar meu tempo para te esclarecer sobre os falatórios da vida alheia."

"Seu hipócrita!" Gina acusou exaltada. "Você estava lendo a coluna de fofoca d'O Profeta agora mesmo!"

"Estava angariando informações! " Draco se empertigou ofendido. "Como guardo apenas para mim, não pode ser considerado fofoca."

"Ei, esse não é o ponto!" Gina estalou os dedos energicamente para retomar o assunto. "Se Blaise e Luna estivessem... Erm, não sei como classificar isso. Mas se eles estivessem de alguma forma juntos, Luna me contaria, não é?"

Malfoy suspirou cheio de desalento, como se esperasse mais da capacidade intelectual da esposa.

"Depois de todos esses anos, você acha mesmo que as pessoas ficam sabendo de coisas que Zabini não quer que elas saibam?" Ele perguntou num tom condescendente, incrédulo de que Gina fosse tão inocente com relação ao alcance de Blaise. "Sabe-se lá quais foram os artifícios que ele usou para convencer a Di-Lua a manter segredo. Ou simplesmente ela esqueceu de mencionar que estava indo para cama com Blaise há meses. Não seria de todo estranho. "

Gina estava chocada, mas não podia argumentar contra aquilo. Não poria a mão no fogo pela memória de Luna, por mais querida que a amiga fosse. Então resolveu ignorar o assunto por ora (depois de acrescentar mentalmente que precisava marcar um encontro com Luna urgentemente no dia seguinte) e mudar de abordagem.

"Independentemente de onde ele tenha dormido, não há porque cancelar com Blaise; ele também virá por notícias do afilhado, assim que Aries mandar sua coruja." Gina disse num tom de severidade maternal. "Além disso temos três entregas para fazer para a indústria têxtil trouxa," Ela ignorou a careta discreta que Draco fez e continuou falando. "-um carregamento de poção potencialmente lucrativo para a loja de Jorge e um encontro com o Chefe do Departamento de Transportes. " Ela enumerou metodicamente.

"Pelas barbas de Salazar, mulher!" Draco exclamou finalmente despertando do seu estado preguiçoso e encarando-a novamente, sono totalmente esquecido. "Acabei de dizer que estamos ficando mais ricos! E eu já era muito rico antes! Não entendo a razão dessa ânsia por trabalho. Não é porque você faz algo que gosta-"

"Que eu amo." Gina corrigiu mecanicamente enquanto organizava suas anotações.

"-que precisa trabalhar como um elfo doméstico e cometer o maior sacrilégio: acordar cedo." Draco continuou como se ela não tivesse falado nada. "Passei tempo demais levantando terrivelmente cedo para ir para o maldito Ministério. Depois de sobreviver a Voldemort e ir para Azkaban, creio que eu mereço dormir até a hora que achar conveniente."

"Isso foi há dez anos, Draco." Gina argumentou inabalada pelo sofrimento de Draco, fechou seu livro de registros e se levantou na sequência. "Você já teve tempo suficiente para se recuperar."

"Nunca terei tempo o suficiente para me recuperar daquilo." Draco respondeu sombriamente e, no mesmo instante, Gina sentiu o peso das palavras dele.

Automaticamente, ela se lembrou de Hermione dizendo há tantos anos que nunca se vivia o suficiente para se lamentar as consequências de uma guerra... Quase não conseguiu conter o arrepio que percorreu sua espinha e o arrependimento por ter trazido aquilo à tona. Nunca tinha sido um tópico fácil entre os dois. (Aliás, poucos tópicos eram fáceis entre os dois, se ela fosse sincera consigo mesma).

Para desviar a mente de Draco – e também a sua - de questões que só o machucariam, Gina continuou falando.

"E ter paz não significa ficar o dia inteiro à toa, Lorde Malfoy. Você precisa ser um exemplo para a sociedade." Ela disse de forma travessa e piscou um olho para ele tentando desfazer a tensão que caiu no ar diante da menção a Voldemort.

"Eu sou um ex-Comensal da Morte e um ex-condenado, Ginevra." Draco respondeu impaciente e se levantou da poltrona. "A sociedade quer o meu dinheiro, não meu exemplo."

Gina deu de ombros concedendo a ele um ponto. De fato, até aquele momento, dez anos depois de todos os acontecimentos que culminaram com a morte de Voldemort, o nome Malfoy ainda carregava um sentido negativo, como se fosse um mal necessário que devia ser apenas tolerado, mas nunca totalmente aceito. Afinal, fora basicamente o dinheiro dos Malfoy – e dos Black – que tinham financiado a reconstrução do Ministério da Magia da Inglaterra, bem como da sociedade bruxa de forma geral.

Mas ela não se deu por vencida facilmente. Nunca tinha se dado.

"De qualquer forma, ainda há as crianças. Lyra principalmente. " Gina comentou pensativa. "Ela está crescendo terrivelmente mandona e arrogante, graças a você. "

Draco abriu a boca para retrucar algo malcriado provavelmente relacionado com o fato de que se a filha deles era mandona não se devia a ele, mas sim a megera ruiva que atendia como mãe dela.

Contudo, Lyra Anne Weasley Malfoy escolheu aquele exatamente momento para adentrar o quarto dos pais como um furacão de cabelos alaranjados, se jogando nos braços do progenitor mais próximo – no caso, Gina.

"Oláááá, mamãe." Lyra exclamou animadamente. "Muito tarde para conversar?"

Gina fingiu que estava pensando seriamente no assunto com o dedo indicador no queixo.

"Acho que posso arranjar um tempinho para você, meu amor. " Ela respondeu depois de um tempo, vendo se dissipar toda a severidade da conversa com Draco e apoiando a menina suavemente no chão.

"E você, papai? " Lyra disse quando encostou os pés no chão, olhando para Draco com grandes olhos cinzas que o desarmaram totalmente. "Estava com saudades? "

"Não creio que eu possa responder isso sem te magoar." Draco respondeu passando pela menina em direção à cama e roçando os dedos nos cabelos dela com um sorriso discreto. Ainda que não sorrisse com frequência, Draco parecia não se importar em ser mais aberto com seus filhos, principalmente com a sua filha mais nova. "Contudo, estou disposto a te ouvir, Lyra."

Lyra praticamente inflou com o consentimento do pai, uniu as duas mãos pequeninas e começou a tagarelar animadamente. "Vovó Cissy disse que vai me levar para o Beco Diagonal e que eu posso comprar o que eu quiser. Eu vou escolher uma vassoura liiiinda! Sei que ela não vai gostar de me dar uma vassoura, mas eu gosto de voar e tenho certeza de que James vai me ajudar quando chegar de Hogwarts e-" Ela então pareceu se lembrar de algo. "Quando James chega de Hogwarts? Estou com muuuuuuitas saudades, ainda mais agora que Aries também foi embora... A mansão está tããão vazia."

Não escapou aos dois adultos o poder que o biquinho que ela tinha feito possuía sobre eles, mas Gina manteve sua postura e não sei deixou abalar.

"Eles acabaram de partir, meu amor. Mas o Natal logo chegará e eles estarão aqui mais uma vez. " Ela respondeu suavemente, mas franziu a testa na sequência e Draco soube imediatamente que havia algo a incomodando.

Entretanto, Gina não pôde expressar em voz alta o que estava aborrecendo-a porque Lyra, já animada mais uma vez, havia retomado seu monólogo sobre presentes, seus irmãos e quadribol, não necessariamente nessa ordem.

Draco ouvia distraidamente sua filha falar, lembrando uma versão em miniatura de Ginevra, tagarela, atrevida e impulsiva. Até na paixão pelo quadribol havia semelhança e afinidade.

Aries nunca havia sido um grande admirador do esporte, preferindo a companhia dos livros e de histórias contadas pelas suas avós. Lyra, por outro lado, tinha uma verdadeira adoração por quadribol, o que a aproximava muito do Cicatriz Júnior. Os dois tinham temperamentos realmente parecidos.

O temperamento de Ginevra.

Draco conjecturou que não seria improvável que sua única filha enveredasse pelo esporte, fugindo de tudo que ele e Narcissa planejavam para a menina.

Típico do famigerado sangue Weasley, ele pensou retendo a tempo uma careta.

Gina, contudo, não parecia compartilhar das divagações de Draco e ouvia com muita atenção o que Lyra tinha a dizer.

"Por quê?" Ela perguntou suavemente para a filha, finalmente interrompendo a menina e expondo o que estava incomodando-a.

Lyra parou de falar e a olhou intrigada, passando o peso de um pé para o outro de maneira agitada. "O quê disse, mamãe?"

"Por que você vai ganhar um presente?" Gina repetiu mais didaticamente dessa vez.

Lyra deu de ombros como se aquela fosse uma pergunta realmente idiota. "Porque eu posso, ué."

"Viu?" Gina girou com um brilho assustador de fúria nos olhos castanhos e apontou o dedo indicador para Draco. "Culpa sua!"

Draco encolheu os ombros. "Ela não está de todo errada-"

"Draco Malfoy!" Gina repreendeu rispidamente. Draco e Lyra estremeceram de forma muito parecida, para então colocarem no rosto idêntica expressão de desagrado, com lábios pressionados numa linha severa e olhos cinzas entrecerrados.

Draco, agora com anos de prática lidando com Ginevra, se recuperou primeiro.

"Ok, ok." Ele se virou para a filha. "Escute Lyra, parece haver um consenso nessa nova sociedade de que é errado termos tudo o que queremos, na hora que queremos e como queremos." Ele disse tentativamente algumas palavras, mas Ginevra ainda continuou com cara de quem tinha comido uma das vomitilhas que Jorge vendia em sua loja.

Ele levantou os olhos para ela e mexeu a boca silenciosamente longe da linha de visão de Lyra para que a menina não fizesse leitura labial.

O que há de errado dessa vez?!, ele perguntou em direção à Gina.

Gina rolou os olhou e virou gentilmente a filha para si, de costas para Draco.

Malfoy, por sua vez, se afastou delas em direção à cama, bufando de frustração mal reprimida.

A expressão de Gina se suavizou ao falar com a filha. "Querida, é importante ter limites e saber que nossas vontades não regem o universo. Você consegue me entender?"

"Sim, mamãe." Lyra abaixou os olhos claros para as mãos entrelaçadas.

"Isso significa que você não pode fazer todos se comportarem conforme seus desejos e ganhar presentes todo dia." Gina frisou o ponto, não deixando brechas que Lyra pudesse burlar. Ultimamente, ela tinha aperfeiçoado aquele hábito muito sonserino, para seu desgosto.

"Nem do meu padrinho?" Ela perguntou baixinho, ainda com um fiozinho de esperança na voz.

"Nem de Jorge." Gina respondeu firme.

"Especialmente dele." Draco acrescentou enquanto se preparava para se enfiar na cama e dormir pelas próximas três gerações. "Não quero que ele te dê nada que possa fazer você vomitar lesmas pela Mansão. Se ele insistir, diga que eu contarei à Olívia Thicknesse todos os elogios que ele despejou sobre ela enquanto estava bêbado no último Natal."

"Draco!" Gina exclamou irritada. Nunca tinha entendido ao certo a quedinha que o mais contraventor dos seus irmãos tinha pelo símbolo da retidão que era Olívia, mas não achava certo que Draco usasse aquilo para provocar Jorge. "Olívia é uma mulher casada e que ama o marido!"

Mas, Gina pensou sabiamente, quem sou eu para questionar as paixonites alheias?

"Explique isso para o seu irmão, não para mim." Draco apontou com sua lógica infalível.

"Então nada de presentes amanhã?" Ignorando o ponto sobre tio Jorge, Lyra insistiu com voz triste e procurou Draco com o olhar em busca de apoio.

"Exatamente." Ele respondeu impassivelmente. Por mais que o incomodasse negar alguma coisa para sua filha, não estava nem um pouco disposto a travar uma batalha com Ginevra. Já bastavam as tradicionais que eles travavam todo dia. Acrescentar uma disputa a mais entre os dois definitivamente não estava na sua lista de prioridades.

"Posso pelo menos ir para o Beco Diagonal com a vovó amanhã? "

"Não." Gina disse firmemente.

"Sim." Draco respondeu ao mesmo tempo.

Lyra rolou os olhos cinzas, numa clara atitude 'vocês podiam concordar pelo menos uma vez? '

Gina suspirou vencida. "Querida, que tal você ir para sua cama e me esperar lá? Vou te contar uma história e te colocar para dormir, amanhã pela manhã podemos conversar melhor, inclusive com a sua avó," Ela sugeriu e olhou feio para Draco indicando claramente quem seria responsável por falar com Narcissa e ele se limitou a erguer uma sobrancelha desafiadora para ela. "-sobre ir para o Beco Diagonal."

"Okay..." Lyra respondeu hesitante. "Posso escolher a história?"

"Pode apostar." Gina piscou um olho para filha, sabendo exatamente que ela escolheria a história de Dulce Griffiths, a melhor jogadora de quadribol de todos os tempos.

A menina sorriu, correu até Draco e dessa vez se enrolou nas pernas dele, pedindo colo. "Te amo, papai."

E Draco congelou levemente como sempre fazia quando ouvia aquilo, mesmo sendo de Aries e de Lyra. Contudo, ele relaxou no instante seguinte, quando levantou a menina para que ela ficasse na altura dos seus olhos. "Acho que eu também."

"Acha?" A menina perguntou olhando-o com uma malícia que poderia rivalizar com a dele.

"Terei certeza pela manhã, se você me deixar dormir." Draco respondeu com o mesmo olhar.

Lyra deu seu maior sorriso – mais uma coisa que ela tinha herdado de Ginevra – e roçou seu pequeno nariz sardento no do seu pai num gesto habitual que era só dos dois. "Boa noite, papai."

Depois de esperar Draco assentir para ela, Lyra desceu do colo dele, passou correndo por Gina – não sem antes dar um beijo estalado na bochecha da mãe – e correu para o seu quarto, cheia de expectativa por uma história.

Draco e Gina olharam para sua filha, até que a porta dupla se fechou com um estrondo atrás dela.

"Ela está cada vez mais parecida com você." Draco disse distraidamente enquanto ajeitava os travesseiros para – finalmente— conseguir deitar na sua enorme e convidativa cama.

"Uma pena o gênio ser todo seu. " Gina implicou com o olhar ainda no ponto por onde a menina tinha saído.

Draco não teve tempo de retrucar algo sarcástico porque no instante seguinte uma coruja negra como a noite começou a bater na grande porta de vidro que dava acesso a varanda do quarto.

"É a coruja de Aries!" Gina reconheceu o animal e se encaminhou apressadamente até a porta. De forma desajeitada, ela abriu a porta e permitiu que a coruja entrasse, se preparando para tirar o bilhete amarrado à perna do pássaro.

Draco, no entanto, foi mais rápido: esqueceu a cama e os travesseiros e cruzou o quarto com poucos passos. Chegou lá antes que ela pudesse pegar o papel, pegou a carta da coruja apressadamente e a dispensou com um gesto mal-humorado. Enquanto a coruja olhava ressentida para ele, Gina o alcançou com uma exclamação ultrajada.

"Ei!"

"Nem pense em tentar ler primeiro." Draco apontou um dedo acusador para Gina enquanto ela tentava ficar na ponta do pé para alcançar a carta que ele tinha erguido acima da cabeça dela. "Você disse que não se importava com a Casa para a qual ele seria mandado."

"E não me importo mesmo!" Gina cruzou os braços exasperada, ficando numa posição mais digna. "Só estou curiosa!"

"Então tenho mais direito que você, porque eu me importo. E muito!" Draco a afastou com um braço enquanto tentava segurar a carta com o outro. "Fiquei esperando por isso o dia inteiro."

"Oh sim, como não percebi quando começou a roer unhas e arrancar os cabelos?" Gina rebateu sarcasticamente. "Você é tão efusivo ao demonstrar o que está sentindo."

Draco rolou os olhos. "Se você não tivesse me impedido de mandar um espião para Hogwarts, poderia ficar à vontade para ler a maldita carta. Agora é tarde." Ele teve que girar cento e oitenta graus quando Gina avançou sobre ele, quase conseguindo pegar a carta da sua mão.

Gina suspirou e deu a volta em torno dele, para ficar cara a cara com a doninha branquela.

Então ela o olhou maliciosamente, mudando a tática da abordagem e passando a mão suavemente pelo peito dele, descendo vagarosamente.

"Ginevra-" Ele murmurou num tom de aviso e ela se ergueu para beijar a linha do maxilar dele, seu pescoço, o pomo-de-adão, e sorriu quando percebeu que ele tinha engolido em seco. "Você é uma chantagista indecente."

"Como se você já não soubesse." Ela rebateu com arrogância. "Só estamos aqui por causa disso, lembra?"

"E eu ainda me surpreendo como fico satisfeito por você ser tão imoral." Draco fez uma careta de desagrado, mas não a afastou. "Mas, para sua infelicidade, eu também sei como jogar esse jogo."

Com a mão livre, ele puxou a varinha do bolso de trás da calça do pijama e, com um aceno suave, a carta se desvaneceu no ar.

A boca de Gina formou um perfeito 'o', enquanto Draco jogava a varinha no chão e, agora com as mãos livres, ergueu a esposa, passando as coxas dela em volta da sua cintura.

"Isso foi sujo!" Gina exclamou enquanto tentava se soltar. "Eu quero leeer!"

Draco a prendeu mais firme, encaminhando-se para a cama e levando-a junto. "Primeiro, você vai terminar o que começou." Ele a jogou na cama um tanto bruscamente e ela o olhou com repreensão muda. Ele deu de ombros e sorriu afetadamente. "Velhos hábitos custam a morrer."

Gina rolou os olhos e ele se posicionou sobre ela, prendendo o corpo dela com o seu, numa posição que era íntima e ao mesmo tempo confortável, como se não houvesse nada no Universo além dos dois.

Gina não demorou a se render com um sorriso.

De certa forma, sempre tinha se rendido a ele.

Mesmo com todas as adversidades, incompatibilidades de gênios, histórias e opiniões muito dissonantes.

Mesmo contra todas as pessoas que diziam que aquilo -os dois – nunca daria certo.

Mas Gina sabia melhor.

Essas pessoas nunca conheceriam Draco da verdadeira forma que ele era. Seus momentos de fraqueza, de desespero, de raiva gélida e controlada, os pequenos lampejos dos sentimentos que ele tinha por ela e que a sensibilizavam mais do que qualquer declaração aberta de amor poderia ter feito. O jeito que ele a olhava depois de brigarem e a intensidade com a qual eles faziam as pazes, como os olhos cinzas brilhavam com uma alegria feroz e com uma sensação de pertencimento entre os dois que ele nunca verbalizaria.

Essas pessoas nunca saberiam a intensidade do amor dele. E Gina sorriu diante daquele pequeno conhecimento que só ela tinha e que significava seu mundo.

Ele só tinha dito que a amava uma vez - no dia em que foi libertado de Azkaban - e ela duvidava que fosse fazê-lo novamente. Ela o conhecia bem demais para sequer tentar levantar o assunto. Mas ela sabia mesmo assim. Sabia porque ela observava. A evidência estava lá e ela reconhecia os sinais. O jeito que os olhos dele se iluminavam toda vez que ela entrava no ambiente; o jeito em que ele insistia em deixá-la confortável. E quando seus dedos roçavam sua face ou se entrelaçavam no seu cabelo vermelho, ela sabia e podia ouvir 'Eu te amo' tão eloquentemente como se ele estivesse usando um berrador.

"Draco, espere." Ela ofegou, desviando seus pensamentos do marido e se focando no filho, que precisava da atenção deles naquele momento. "E se... e se não for como você quer? Se ele tiver um destino diferente eu não quero que ele se magoe e-"

Draco se apoiou em um cotovelo para olhá-la melhor.

"Bom, certamente eu não vou gostar." Ele respondeu depois de um momento em silêncio, sem conseguir reter o desgosto na voz.

Gina franziu a testa em desaprovação.

"Se Aries não for escolhido para a Sonserina, quero estar junto quando você escrever a resposta para ele." Ela afirmou num tom que não admitia contestação.

"Qual a necessidade disso?" Draco perguntou com sua típica polidez falsa de quem faz a pergunta sabendo que não vai gostar da resposta.

"Para garantir que você não vai falar nada estúpido." Ela disse estreitando os olhos escuros perigosamente para ele. "Melhor, quero estar junto se ele for escolhido também. Com certeza você vai encher a cabeça dele com essas baboseiras de sangue puro."

"Não são baboseiras!" Draco protestou ofendido, frisando a palavra como se ela fosse algo particularmente viscosa e nojenta. "É a história da família dele."

"Groselhas." Gina fingiu que tossiu para disfarçar a acusação.

Em nome do seu casamento, Draco ignorou aquilo. "Além do mais, lamento informá-la, querida esposa megera, que não será possível que você esteja comigo quando eu responder a maldita carta."

"Posso saber por quê?" O oposto de Draco, Gina se sobressaltou por causa da curiosidade.

"Eu já mandei uma carta para ele há quarenta minutos." Draco disse com um sorriso vitorioso.

"Sem saber para onde ele foi selecionado?" Verdadeiramente surpresa, Gina se virou para o lado para ficar frente a frente com ele, ávida pela resposta. "Por quê?"

"Para garantir que ele saiba o quanto eu o amo, independente da casa para onde ele for mandado." Draco respondeu impassivelmente, antes de acrescentar com a voz bem baixa e lenta, quase em um murmúrio mal-humorado. "E para garantir que eu não fale nada estúpido se ficar decepcionado com o resultado."

Gina sorriu radiante e orgulhosa. Não foi preciso dizer mais nada.

Ela se projetou por cima de Draco, beijando-o como se sua vida dependesse daquilo.

A carta, enfim, poderia esperar até a manhã seguinte.

FIM


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