Cinzas escrita por Ludi


Capítulo 35
Fugir é Preciso!


Notas iniciais do capítulo

Olá, queridas!

Eis aí a parte final do capítulo anterior.
Perdão, perdão, perdão! Sei que prometi não demorar, mas acabei esquecendo TOTALMENTE desse site e, no fim, o capítulo já estava pronto há um tempo. =/

Ok, então! Depois de muitas mensagens trocadas, cinco sessões de Vingadores, seis mil palavras e algumas horas sofrendo para digitar o capítulo no iPad, aqui estamos!

Espero que gostem (e me perdoem depois de terminar de ler)

Só um último detalhe: o comportamento do querido James pode estar suscitando algumas dúvidas pertinentes. Os pensamentos dele estão sempre girando em torno das mesmas coisas – em Della e nas mentiras da Gina, principalmente - e para mim faz sentido que assim o seja. É um sintoma de estresse pós traumático que se aplica bem ao caso dele. O isolamento e a hesitação em fazer novos contatos também são indicativos do que se passa com nosso menino.

Isso tudo para dizer que, apesar de eu estar longe de ser uma especialista em traumas psicológicos, quis trazer um pouco mais da vida real para dentro da história. Pessoas não se recuperam ou perdoam em situações assim do dia para noite, mesmo tendo sete anos de idade.

Veremos as exatas consequências disso nesse capítulo.

Obrigada do fundo do meu coração a todas que deixaram seus comentários, principalmente minha co-autora Rose!

(Gostaram da Gina tomando a iniciativa capítulo passado né? Girl power neles, meninas!) :P



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35 – Fugir é Preciso!

Abençoadamente alheio às atividades noturnas da sua mãe e padrasto, James, do outro lado da casa, se remexeu na cama inquieto.

E, assim como sua mãe e o Sr. Malfoy, ele sentia saudades da Mansão Malfoy, com seus grandes corredores e enormes salas, com as janelas duas vezes o seu tamanho e que davam para um jardim imponente, onde ele passava aqueles dias de fim de verão entre árvores no auge do seu esplendor e Aries fazendo suas primeiras tentativas de se equilibrar por si mesmo entre almofadas e as mãos da sua mãe.

Desde que tinha ido embora da Mansão, o sono não era uma coisa que vinha fácil para James. O luto, o pesar, as dúvidas, tudo isso o afastava da tranquilidade que deveria cercar toda e qualquer infância. Sua avó Molly, dias antes, tinha levado-o até a cozinha, feito bolinhos de caldeirão para ele é dito que todas aquelas sensações ruins – ainda que não tivesse especificado quais delas- iriam diminuir com o tempo, deixando apenas cicatrizes para trás.

James duvidava daquilo. Na verdade, ele estava bem certo de que aquelas impressões nunca iriam embora, tamanho caos emocional que geravam dentro dele...

Algumas vezes, ele tinha vontade de deitar na grama do Chalé e nunca mais se levantar. Em outras, ele sentia uma onda de agressividade tão forte o invadindo que invariavelmente algum objeto pequeno acabava explodindo perigosamente perto dele quando magia se manifestava através do seu estado de espírito.

Ele estava tão cansado. De todas as formas que o cansaço poderia se manifestar.

E agora tinha que lidar com o fato de que estava sendo abandonado também pelo Sr. Malfoy. Doía pensar que tinha sido abandonado pelo pai antes mesmo de nascer; pela mãe, graças às todas as mentiras que ela tinha contado; pela família, que não lutara para conhecê-lo. Abandonado por Della...

Mas aquilo não tinha sido culpa dela, pelo menos.

E como machucava o pensamento porque Della era a única que James tinha certeza de que não queria sair do seu lado. Ela faria tudo por ele.

As vezes, ele se apegava à ideia de que as coisas poderiam ter ocorrido de outra maneira.

Por que não?, ele se perguntou enquanto ajeitava o travesseiro sem muita gentileza. Ninguém além do Sr. Malfoy estava lá para garantir.

Não que não confiasse no Sr. Malfoy – ainda que estivesse magoado com a partida dele-, mas ele podia ter se enganado, não é? Quanto mais os dias passavam, mais James tinha aquela estranha convicção de que Della poderia ter escapado, porque, do contrário, sua mãe já teria ido atrás do tal Você-Sabe-Quem (e aquele era realmente um nome estranho para se ter), para vingar Della.

Sua mãe sempre tinha protegido-os, não era? Ele, Della, Dave.

Sua mãe… Ele sentiu um nó no estômago ao pensar nela. Ela era tudo para ele e aquilo só fazia com que o fato de que ela tinha mentido por tanto tempo se traduzisse numa mistura de sentimentos ruins que James – com toda a maturidade dos seus sete anos – não conseguia compreender, por mais que se esforçasse.

Assim, impulsionado por uma mágoa que sequer tinha começado a entender, James se levantou num salto e –

"Ewww!"

–sentiu o chão gelado contra os pés descalços.

Um pouco da sua determinação murchou visivelmente.

Algo dentro de si gritou para que ele voltasse para a cama, se enrolasse no cobertor e ficasse ali – com sua mãe, pai, padrasto, avós e primos – até que fizesse dezoito anos e fosse seguro sair da cama.

Contudo, James ignorou o frio e o sentimento desconfortável, sabendo que estava inquieto demais para voltar a dormir. Sabendo que era hora de virar o jogo ao seu favor.

Mas ele não podia fazer nada.

...

Ou podia?

A ideia sobre o que fazer começou parcialmente a se formar no fundo da sua mente, com as palavras do seu pai e do Sr. Malfoy se misturando e se enraizando no seu âmago.

Nunca pensei que teria um filho, ainda mais um corajoso como você.

Talvez só mesmo o responsável entenda a razão.

É uma capa da invisibilidade. Vem passando por gerações e gerações da minha família.

Ele ergueu o queixo de maneira determinada e firmou suas resoluções.

Para atingir seus objetivos, não poderia contar com sua mãe. Nem sabia ao certo se queria falar com ela.

Havia Harr- quer dizer, seu pai-, mas James ainda não sabia bem se podia contar com ele também, para começo de conversa.

Havia ainda o Sr. Malfoy, que James considerava de confiança apesar de estar com os olhos sempre gelados e indiferentes – talvez não quando ele estava perto da sua mãe, mas James ainda não tinha se resolvido sobre essa questão. O problema era que, da última vez que eles se falaram, James não havia se comportado muito bem e o Sr. Malfoy não era do tipo que perdoava facilmente. Além de tudo, ele iria embora no dia seguinte...

Se sentindo extremamente sozinho, James tomou sua decisão definitiva, já que ninguém ali parecia preocupado em ajudá-lo.

Iria atrás de Della!, ele pensou empinando o nariz arrebitado e estufando o peito.

E descobriria por si mesmo o que realmente tinha acontecido.

Pondo os sapatos rapidamente e pegando sua mochila com desenhos de sapos – ele não gostava dela, mas não podia contar com suas próprias coisas desde que fugira da Mansão-, ele atravessou o quarto e olhou de esguelha para o berço onde Aries dormia.

Aquela era uma das boas novidades daquele lugar cheio de família e amigos: dividia o quarto com o irmão, numa experiência que ainda não havia vivido. Foi até lá e viu que o bebê dormia pacificamente, de barriga para cima e com as pequenas mãos ao lado da cabeça. James tirou os cachos dourados que caíam no rosto do irmão numa despedida silenciosa. Ele achou que Aries gostaria daquele estilo, uma vez que era sempre tão quieto.

Mas ele não resistiu por muito tempo e sentiu necessidade de falar alguma coisa.

"Vou saber o que aconteceu com a nossa amiga e prometo que conto tudo para você quando chegar, irmãozinho." James sussurrou e o bebê resmungou no sono, se mexendo inquieto; James sorriu abertamente.. "Não precisa se preocupar, volto logo."

Ele saiu do quarto, não sem antes se certificar de que não havia ninguém no corredor.

Vire à esquerda, esquerda de novo e, então, dobre à direita. Siga sempre em frente.

James repetiu o mantra na sua cabeça de um caminho que tinha decorado inconscientemente.

Ele se interrompeu em frente a um quarto. Uma parada estratégica.

Precisava de algo que estava naquele quarto e, ignorando a sensação de que aquilo era errado, ele entrou sorrateiramente. Depois de alguns longos segundos, emergiu do quarto com a mochila – e a consciência- mais pesada e seguiu com passos silenciosos pelo caminho que tinha vindo, passando cômodo por cômodo, garantindo que estava realmente sozinho a cada passo.

Ele prendeu a respiração quando encontrou um dos seus tios na sala – Gui, ele identificou depois de observar uns segundos –, dormindo com seu priminho Dominique no colo.

Tomou um mais minuto para apreciar a cena diante de si, com um pai e seu filho em um momento que era só dos dois. Todas as mágoas e dores pelo que ele havia perdido voltaram a pesar no seu coração e James se sentiu mais determinado a fazer o que precisava ser feito.

Com uma agilidade felina que ele não sabia de quem tinha herdado - mas pela qual ele estava extremamente grato-, James passou pela porta da sala em direção à saída.

À porta da grande casa, ele parou para regularizar a respiração e aproveitou para olhar o ambiente ao seu redor, conjecturando sobre o que teria que fazer na sequência.

Pelo que se lembrava de quando tinha chegado ao Chalé das Conchas, precisaria seguir numa trilha de pedra que serpenteava rente a praia, em direção a um ponto onde teria chance de encontrar alguém que pudesse lhe dizer onde estava o tal de Você-Sabe-Quem.

Limpou o suor da testa e não resistiu ao impulso de abotoar bem o casaco por cima do pijama – algo a ver com a cara que sua mãe fazia quando ele saía no frio sem estar bem agasalhado – e jogou a capa da invisibilidade que havia surrupiado do quarto de Harry por cima de si, tirando-a da mochila.

Iria conseguir informações que ninguém da sua família estava disposto a lhe dar.

Nem que para isso precisasse fugir.

xxx

O mundo estava mergulhado em silêncio. Era aquela hora da noite quando o sol começava a nascer, pondo um fim na luz azulada da lua.

Ainda assim, aquela luz fraca ainda era persistente o bastante para invadir o interior do quarto de Draco, iluminando a cama onde eles estavam, juntos. Para ele, parecia que a única coisa que estava se mexendo era o subir e descer do seio de Ginevra enquanto ela respirava tranquilamente.

Draco havia despertado com os cabelos dela roçando no seu rosto, numa sensação nova e curiosa. Ele havia julgado que nunca conseguiria dormir uma noite inteira ao lado de alguém – e nunca havia dormido, realmente-, mas, com ela, aquilo foi surpreendentemente fácil.

Ele tinha dormido profundamente como não havia feito em anos, mesmo que por pouco tempo. Claro, a noite intensa que eles partilharam tinha seu papel na profundidade do sono, mas Draco não podia se dar ao luxo de relembrar nada daquilo. Seu corpo era um grande traidor quando o assunto era Ginevra e a última coisa que ele queria era que as memórias – e o quadril dela tão colado ao seu – dessem vida ao que deveria permanecer frio.

Como era habitual, havia acordado antes do amanhecer – mesmo que tivesse planejado dormir tanto quanto pudesse e aproveitar a presença dela ali. Ele se obrigou a ignorar a estranha dor que sentiu no peito quando se deu conta de que acordar significava que ele deveria partir em breve.

Expulsando toda e qualquer vontade de ficar ali abraçado com Ginevra até o fim dos tempos, ele se desenlaçou dela com o maior cuidado possível para não acordá-la e levantou silenciosamente.

Pensando bem, a última coisa que ele queria mesmo era ver de novo o apelo mudo para que ele ficasse dentro dos olhos escuros e hipnotizantes.

Com o movimento e a perda de calor do corpo dele, Ginevra simplesmente gemeu numa reclamação cheia de sono, se virou para o outro lado e continuou dormindo. Só nesse instante é que Draco soltou a respiração que nem se deu conta de que estava segurando. Graças a Merlin a mulher tinha o sono pesado.

Mais uma diferença entre eles.

Diferenças, aliás, eram o que ditavam o ritmo do relacionamento dos dois.

Draco suspirou tristemente diante do pensamento. Um dos dois tinha que ser racional o suficiente para saber que aquilo nunca daria certo; não com a história que eles tinham, cheia de ódio, desentendimentos, ofensas e incompatibilidade. E, quando o pior acontecesse...

Draco olhou para ela uma última vez: os cabelos longos parcialmente espalhados pelo rosto, a mão pequena e sardenta servindo de apoio para o rosto bonito, as curvas dos seios e dos quadris, o jeito de se encolher na cama como se ela pudesse se satisfazer com os menores espaços concedidos a ela. Como se Gina Weasley sempre tivesse precisado de muito pouco para si mesma.

Ele desviou o olhar quando o aperto no peito começou a se assemelhar a dor física.

Se era covardia não poder lidar com aquilo, então Draco Malfoy poderia se decretar oficialmente um covarde.

Finalmente, ele admitiu para si mesmo o que mais o afugentava naquela situação toda.

Ginevra tinha todo o poder sobre a relação dos dois e isso o assustava mais do que tudo, fazia os pelos da sua nuca se eriçarem diante do pânico de saber que ela tinha, num nível mais primário, o completo controle sobre alguns dos sentimentos dele.

Ginevra tinha Aries. Ela poderia criá-lo para odiar o pai ou para simplesmente ignorá-lo.

Ela era senhora de si mesma.

Tudo que Draco desejava, tudo que era desejável para ele, todas as coisas que faziam dele um fraco e um carente pertenciam a ela, Gina Weasley.

Draco não podia lidar com aquilo. Simplesmente não podia.

Quando terminou de se vestir e se limpar o melhor que pôde no escuro, ele ainda cheirava a Ginevra, sexo e lençóis baratos, numa combinação excruciante. Ele levantou o capuz da capa, fechou os olhos e instantaneamente soube que (se ele fosse um homem diferente) iria chorar.

Então antes que pudesse se torturar ainda mais, ele levitou sua mala com feitiço murmurado e saiu do seu quarto, da vida dela.

Iria retomar o controle da sua própria vida.

Nem que para isso precisasse fugir.

xxx

James Potter se deu por vencido: estava com medo por estar sozinho por tanto tempo.

Ao se afastar, ele tinha suores frios e sentia que seu estômago estava cheio de pássaros que revoavam tentando sair dali; suas pernas também tremiam, mas não se atrevia a chorar porque era ele quem salvaria Della. Então, ordenou à sua bexiga para que se comportasse e seguiu em frente.

Sabia que já tinha andado por quase três horas por uma floresta sombria desde que tinha saído de casa; não tinha um relógio com ele, mas sua mãe havia lhe ensinado a calcular a hora pela posição do Sol nas tardes ensolaradas que eles haviam passado no jardim da casa antiga e depois na Mansão Malfoy. E o sol já estava quase nascendo.

James começou a se preocupar realmente com a maneira pela qual ele conseguiria chegar até Londres. E mais, como ele descobriria onde encontrar o tal Você-Sabe-Quem.

Bufou sonoramente para espantar a irritação que veio misturada ao medo – ter paciência nunca tinha sido o seu forte, afinal.

Devia ter bolado um plano melhor além de pegar a capa do meu pai e sair de casa, ele pensou chutando pedrinhas pelo caminho.

Estava começando a cogitar voltar para casa e pedir ajuda de alguém para saber o que tinha acontecido com sua amiga quando, no exato momento em que chutou uma pedra maior, ele ouviu o barulho de galhos sendo partidos com o peso de alguém.

James ficou imóvel, seu medo se intensificando repentinamente.

"Quem está aí?" Perguntou uma voz rouca que deixou o garoto desconfortável.

Ele permaneceu tão quieto quanto poderia estar, sentindo uma onda de pavor subindo pela sua espinha.

"Não foi ninguém, seu estúpido." Depois de um momento de silêncio outra voz se manifestou. "Vamos continuar com a vigília e acabar logo com isso."

"Como se você estivesse tão ansioso para voltar para casa e para sua mulher." Outro – uma terceira voz - zombou. "Mais fácil encarar seis dragões."

Pelo plano que havia concebido, aquela era a chance de pedir auxílio e, com sorte, também conseguiria uma carona até Londres. Contudo, um sexto sentido recém-descoberto o mandou ficar exatamente onde estava e não ousar tirar a capa da invisibilidade, principalmente depois que os homens entraram –quatro no total- no seu campo de visão, todos eles vestidos de negro, todos eles com rostos que James não considerou como amigáveis muito porque estavam cobertos por máscaras.

Eles se aproximaram lentamente, conversando palavras que James, no auge do seu terror, sequer ouvia, só prestando atenção nos seus movimentos. O menino ousou dar um passo para trás pensando numa rota de fuga, mas o som da relva contra seus pés pareceu ensurdecedor aos seus ouvidos e ele parou mais uma vez.

Estou invisível, ninguém pode me achar, ele pensou sem ter a audácia de fechar os olhos para dar ênfase ao seu pedido, quase uma oração.

Estavam muito perto agora e James sentiu o suor escorrer pelas suas costas, sua cabeça girar com a descarga de adrenalina gerada pelo medo e sua bexiga querer criar vida própria.

"Shhhh." A primeira voz disse, chamando a atenção do menino novamente. "Vamos prestar mais atenção. Já vasculhamos toda a Inglaterra atrás desses malditos, só nos resta repassar todos os pontos de novo."

Ele deu dois passos em direção ao local onde James estava e, não podendo se controlar mais, o garoto se assustou e recuou abruptamente, tropeçando na barra da capa e caindo com um baque surdo.

"Mas que merda foi isso?" Como se o homem alto tivesse tomado um susto, ele olhou para o ponto onde o menino estava.

Então o James percebeu que, com a queda, seus pés haviam sido descobertos pela capa, formando uma cena bizarra onde dois pés pareciam flutuar no ar, não conectados a nenhuma parte do corpo.

Com a varinha na mão, o sujeito mais à frente se aproximou rapidamente, esticou o braço e tateou onde supostamente deveria estar o dono dos pés, encontrando o corpo de James. Ele se debateu diante do toque num gesto que fez a capa escorregar parcialmente de cima do seu corpo.

"Não toque em mim!" Ele disse alto, muito para esconder seu susto. "Não toque em mim!"

"Ora o que temos aqui!" O homem alto e de robes negros parecia estar se divertindo e ignorou a reação dele, não fazendo nenhuma menção de permitir que o menino se levantasse. Ele tateou no escuro até fechar seus dedos em torno da capa da invisibilidade e, com um gesto cauteloso, passou-a a outro homem atrás dele. Só então voltou sua atenção para o menino a sua frente. "Qual é o seu nome, garotinho?"

Aparentemente para dar mais confiança a James, o homem retirou a máscara revelando um rosto de um senhor já de idade. Em teoria, um James sabia que velhinhos eram inofensivos, mas se manteve imóvel no chão quando outros dois homens apareceram atrás do homem velho. Ele agachou ao lado de James, tentando olhá-lo de forma simpática, mas que, dado o contexto, só pareceu ameaçadora.

"James." O menino respondeu a contragosto. Quanto mais rápido aqueles homens o deixassem partir, mais rápido ele chegaria até Della. Ou voltaria para casa, numa hipótese que estava cada vez parecendo mais tentadora.

"James do quê?" O homem perguntou suavemente.

Ele não soube o que dizer, pensando em Woodcroft, Weasley, Potter, Malfoy, todos eles parecendo certos e ao mesmo tempo errados.

"James." Ele repetiu a resposta anterior basicamente porque não sabia qual dos sobrenomes usar.

Um dos mascarados atrás do homem alto riu desagradavelmente.

"E o que um homenzinho sem sobrenome como você faz sozinho a essa hora da madrugada, no meio de uma floresta fechada?" Ele disse e James notou como a frase tinha soado de forma cínica.

Vou mostrar a eles que não tenho medo e que não me importo se zombam de mim, ele pensou se enchendo de bravura.

"Estou procurando Você-Sabe-Quem." James ergueu o nariz arrebitado da maneira mais corajosa que podia. "Quero saber por que ele machucou minha elfo."

Depois de um momento de puro silêncio estupefato, os homens começaram a rir simultaneamente e James não entendeu a razão. E não gostou nada da forma pela qual aquilo havia soado um pouco nervoso aos seus ouvidos.

Por que eles dão risada se alguém foi machucado?, ele se questionou querendo saber mais sobre o tal Você-Sabe-Quem.

"De que planeta você veio, garoto?" Um outro mascarado perguntou cheio de surpresa na voz. "Se tem um elfo, veio de uma família bruxa. E, ainda assim, soa como um ignorante."

James não se deixou ofender pelas palavras, afinal, elas tinham um pouco de verdade. Ele fora mantido no escuro pela sua família durante toda a sua vida.

"Não vim de nenhum lugar." Ele respondeu baixinho. Aquilo não era uma mentira, não é?

"Certo então, como quiser, Sr. James de Lugar Nenhum. Podemos obter a informação com ou sem sua colaboração." O senhor agachado junto a ele falou bruscamente. "Você virá conosco até checarmos qual é seu status de sangue, mas duvido um pouco – só um pouco - que o Lorde queira receber vossa alteza."

"Então ele é um covarde!" Sem pensar, James exclamou desafiador e o homem sem máscara o encarou com um olhar estranho, desconfiado.

"Espere, Lestrange, é como se ele sequer conhecesse tivesse ouvido falar do Lorde das Trevas." O terceiro Comensal se aproximou e também retirou a máscara, revelando um rosto vermelho e redondo, cheio de curiosidade pelo menino a sua frente.

"Sim. Ele é estranhamente familiar." Lestrange – agora James tinha um nome para associar a ele - pegou no braço de James e o levantou bruscamente. "Quem são seus pais, garoto?"

James foi impedido de dar qualquer resposta que pudesse inventar quando o quarto homem que investigava a capa da invisibilidade com a varinha se manifestou.

"Silêncio, todos!" Ele esbravejou com a voz abafada pela máscara. "Isso é uma capa da invisibilidade mesmo! Uma verdadeira!"

"Tem certeza?" Lestrange, aparentemente o líder, perguntou desconfiado.

"Resistiu a todos os encantamentos para retirar feitiços de desilusão, nem contém azarações de ofuscamento..." O outro respondeu ainda analisando a capa. "Sinta essa textura, o peso, veja o grau de invisibilidade. É perfeita."

Então, como se um raio de conhecimento tivesse sido lançado contra os homens, todos os olhos se voltaram para James, como águias diante da presa.

"Só há uma pessoa que possui uma capa como essa..." Um deles deixou a frase no ar. "Alguém que realmente se parece com o garoto, agora que parei para reparar."

"Ora, ora." Lestrange disse - e James se deu conta de que detestava aquela voz que o fazia os pêlinhos do seu pescoço se arrepiarem. "Se não foi o bastardo do Potter que caiu no nosso colo. Aquele que meu estimado sobrinho assumiu."

Os outros permaneceram num silêncio deferente, quase hipnotizados. James, por sua vez, sentiu o pavor congelar todos os seus membros e ele teve que se lembrar de respirar antes que caísse asfixiado no chão.

"Creio que o Lorde gostará de te receber, afinal." Lestrange completou e sorriu suavemente para o garoto.

E dois braços fortes o puxando para cima foi tudo que James sentiu.

Gina acordou com pancadas brutas em uma porta, como se a casa estivesse pegando fogo.

Será que é mesmo nessa porta?, ela se perguntou parcialmente inconsciente.

A bem da verdade, ela não se importou devidamente com a resposta à sua pergunta porque, no instante seguinte, memórias da noite anterior invadiram sua mente e ela sorriu de forma travessa. Se estivesse acordada e de pé, certamente teria dado pulinhos de alegria pelo quarto.

Então, ainda sonolenta e de olhos fechados, ela esticou a mão em direção ao lugar onde Draco deveria estar.

Vazio.

Frio.

Ela tateou com mais firmeza para ter certeza e então uma onda de desânimo a invadiu.

"Bastardo!" Gina murmurou com a voz rouca de sono. Abrindo os olhos, ela se sentou e observou o lado da cama onde ele estivera a noite, amassado como se alguém tivesse dormido ali, porém, sem nenhum corpo ocupando-o. "Grande estúpido, covarde!"

O idiota havia partido, mesmo depois da última noite, mesmo depois de ela ter demonstrado que o amava.

O que havia de errado com ele, afinal?, ela pensou com raiva, evitando quebrar a primeira coisa que conseguisse por a mão.

Antes que Gina pudesse satisfazer seus instintos mais homicidas, contudo, as batidas na porta se tornaram mais urgentes e ela se obrigou a acordar completamente, enrolou o lençol em torno de si e, quando se preparava para se levantar e se vestir antes de saber quem era, a porta se abriu com um estrondo.

Harry e seus pais adentraram o quarto como um furacão. E pararam abruptamente ao ver a cena à sua frente.

Gina soube instantaneamente que devia estar dando um espetáculo e tanto. Enrolada nos lençóis, previsivelmente nua por baixo deles, com os cabelos vermelhos bagunçados e com o rosto ruborizado de satisfação.

Harry, que estava visivelmente contrariado, se virou de lado, assim como seu pai, que tinha ficado da cor dos ralos cabelos. Ambos não queriam olhar para ela, aparentemente por razões bem distintas.

Molly quebrou a tensão palpável ao falar, se dirigindo ao marido e Harry. "Eu disse que ela estaria no quarto de Draco. Foi inútil vocês revirarem a casa inteira para achá-la." E completou num tom bem mais gentil quando se virou para Gina. "Querida, precisa vir conosco."

O tom de voz condescendente atingiu Gina como um raio.

Há algo errado, ela pensou sentindo um frio terrível na barriga.

"O que aconteceu?" Ela franziu a testa intrigada, repentinamente se esquecendo da situação constrangedora em que estava. Havia algo acontecendo ali, definitivamente. E algo do qual ela não gostava.

Foi Harry que respondeu sem olhar para ela – e Gina não pôde dizer se era por vergonha, aflição ou desprezo. "James sumiu."

O estômago de Gina afundou.

Ela sempre tinha sido uma pessoa forte. Sua força ajudara-lhe a sobreviver à Câmara Secreta, à perda de familiares e amigos. Ajudara-lhe a sobreviver na Batalha de Hogwarts e muito depois dela.

Mas somente aquelas duas palavras tinham feito algo que nem Voldemort conseguira todos aqueles anos: elas tinham literalmente derrubado seu mundo.

Então, Gina fez o que a maioria das pessoas faz nessas ocasiões: entrou em negação.

Não acreditando naquilo, ela apertou os lençóis ainda mais em torno de si e pulou da cama.

"Como - como assim, James sumiu?" Ela conseguiu gaguejar enquanto segurava o lençol da maneira mais firme que podia e pegava desajeitadamente sua camisola, a varinha e roupão do chão com a mão livre. Ela se encaminhou para o banheiro simples do quarto, mas deixou a porta entreaberta atrás de si.

"Gui foi acordar as crianças para o café da manhã e a cama de James estava vazia." Molly respondeu em tom gentil, certamente notando o estado da filha.

"Aries...?"

"Aries está com Luna." Sua mãe nem precisou que ela completasse a frase para entender o que estava preocupando-a.

"Ele deve ter fugido durante a troca de turnos e-" Harry começou a conjecturar, andando para lá e para cá num gesto que evidenciava seu nervosismo.

"Vocês estão enganados..." Gina disse com um pouco mais de veemência do que deveria, se vestindo e limpando da melhor forma que podia. "Ele deve estar na praia ou no Jardim de Fleur. Ele gosta muito daquele lugar! É, com certeza está no jardim..."

"Não, filha, já vasculhamos tudo." Ela ouviu a voz do pai um pouco nervosa do outro lado da porta, o que a deixou mais nervosa ainda. "Seguimos a trilha dele até nosso perímetro de proteção. Ele se foi."

Já vestida e semi protegida pelo roupão aberto, Gina saiu do banheiro com um estrondo, mas não teve tempo de perguntar nada mais.

Rony entrou no quarto apressadamente, trazendo na mão a edição matinal d'O Profeta Diário que passou despercebida por todos.

"Gina, graças a Merlin está aqui." Ele estava visivelmente aliviado, até que uniu as sobrancelhas ruivas numa expressão de dúvida. "Aliás, o que você está fazendo aqui?" Ele perguntou com a voz instável. "Te procuramos pela casa inteira e-" Quando o olhar dele passou pela fina e indiscreta camisola e depois pelo seu rosto dela, as pontas das suas orelhas começaram a ficar vermelhas com o entendimento que o invadiu. "Er-" Ele perdeu a voz.

"Ronald Weasley, temos assuntos importantes que demandam a sua voz." Molly colocou a mão na cintura e continuou. "Então trate de achá-la antes que eu ache por você."

"Certo, tem razão." Rony olhou para Harry como se estivesse com pena da situação do amigo, perdendo mulher e filho ao mesmo tempo, e então continuou. "Conseguimos reproduzir o caminho que James fez e o seguimos até três quilômetros além do nosso perímetro de segurança. Sabíamos que havia Comensais rondando essa região – assim como todas as outras da Inglaterra – mas com as precauções que tomamos, nós-"

"Merlin, que precauções, Rony? James tem sete anos!" Gina passou as mãos pelos cabelos soltos nervosamente. "Como ele conseguiu fazer em uma semana o que Você-Sabe-Quem não conseguiu em anos!?"

"Nós tomamos cuidado com quem entra nos nossos domínios, Gina, não com quem sai." Foi a resposta paciente do seu pai, que parecia estar com os pensamentos distantes e com a expressão muito parecida com a qual ele ficava quando tentava desvendar o mistério de algum aparelho trouxa. "Tomamos por base a confiança que temos em cada pessoa que entra no coração da Resistência."

"Além disso, ele pegou minha capa da Invisibilidade..." Harry completou levemente envergonhado, olhando para ela pela primeira vez. "Tudo foi minha culpa e-"

"Ele pode estar perdido- pode..." Gina ignorou a manifestação da consciência pesada de Harry, se agarrando a fraca esperança que ainda insistia em manter.

"Na verdade, não." Rony falou e Gina percebeu seus olhos vermelhos e sua expressão abatida pela primeira vez. "Foi por isso que me separei do grupo de buscas para vir até aqui. Percy trouxe o jornal de Londres."

Ele esticou a mão para Gina e lhe entregou a edição matinal d'O Profeta Diário. A manchete estampava a foto de um James arredio, com um olhar assustado apesar de querer demonstrar coragem com o queixo erguido, segurando forte a pequena mochila contra o peito, como se ela pudesse protegê-lo das pessoas em volta de si.

MENINO DESAPARECIDO BUSCA SUA FAMÍLIA.

Em mais um serviço de utilidade pública fornecido pelo Profeta Diário, cedemos informações sobre o caso do menino encontrado por patrulheiros do Ministério essa madrugada, num bosque no sudoeste da Inglaterra, carregando artefatos mágicos que atestam sua origem não-trouxa.

James – como aparenta ser sua única identificação – parece não ter informações sobre seus pais ou sobrenome, num claro indício de confusão mental e incapacidade de ficar sozinho.

Sensibilizado pela situação atípica do menino e prezando igualmente todos os membros da sociedade bruxa, o próprio Ministro, Pio Thicknesse, tomou interesse pelo assunto e está conduzindo-o pessoalmente.

"Teríamos o maior prazer em devolver o menino para as pessoas do seu convívio, basta que os pais e a família dele se manifestem e venham buscá-lo, prestar contas das possíveis razões pelas quais um menino tão novo estava andando sozinho por um lugar deserto. Vivemos em tempos difíceis onde não é prudente cometermos descuidos de tal magnitude", afirmou o Ministro na saída do Ministério, hoje pela manhã.

Uma resolução para o caso é esperado para as próximas horas. Para informações adicionais sobre o curioso caso do menino perdido é preciso procurar Rodolfo Lestrange no Ministério da Magia, principal responsável pelo caso, ao lado do Ministro.

Inconscientemente, Gina amassou o jornal na mão quando uma vertigem lhe acometeu subitamente.

Harry a enlaçou pela cintura, mas ela mal percebeu. Antes, tinha pensado que sabia o que significava a palavra desespero, mas só teve a real dimensão do sentimento agora.

Registrou vagamente que seus pais tentavam falar com ela, que Rony a olhava preocupado, que Harry estava ao seu lado. Mas nada importava.

Nada além do buraco que se formou dentro de si diante da perspectiva de perder um filho. Não aguentaria se James fosse morto por Voldemort. Duvidada que seria até mesmo capaz de lidar com aquela simples hipótese.

"Precisamos trazer Draco de volta." Foi tudo que ela conseguiu falar antes de cair num estupor causado pelo desespero.

Se Draco não pudesse proteger seu filho com todo o conhecimento que ele tinha de Voldemort e o interesse de que o menino mantivesse sua vida, ninguém mais poderia.


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