Cinzas escrita por Ludi


Capítulo 27
Em Chamas


Notas iniciais do capítulo

Esse foi, so far, meu capítulo favoriiiito. Assim que terminei de escrever, reli em busca de erros e, geez, não acreditei que eu tinha escrito aquilo, dada a carga emocional muito grande, haha, foi quase um capítulo psicografado. Espero que vocês possam apreciar a leitura na medida em que eu apreciei escrever.

Meu objetivo inicial era construir quase todo o capítulo sob a ótica do Draco, mergulhar na sua complexidade, mesmo nas cenas mais, erm, interativas entre os dois. Acredito que eu tenha conseguido atingir o que queria.

E, dada essa peculiaridade, gostaria muito de saber a opinião de vocês com relação a esse monstrinho de quase doze mil palavras (bati meu recorde mais uma vez D:). Plz, plz, plz! Hahaha =P

Esse capítulo é especialmente para a Rose (mais do que os outros ainda) porque a importância que ele tem para o enredo rivaliza com a importância dela para o andamento dessa história. E é também para Babi Aveiro (já vou te responder, my dear) que me acompanha através dos sites, hahaha. Muito obrigada, minhas queridas!



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Maio 2006

Depois da sua descoberta inesperada no cemitério da Mansão, a primeira reação de Gina foi se trancafiar durante dias no seu quarto. Quando não pôde mais se virar com a varinha sem sair do cômodo e nem obrigar James a ficar no quarto com ela ou entrar furtivamente no berçário de Aries, ela decidiu que já era hora de sair e encarar a realidade.

Estava apaixonada por um homem mimado, egoísta, arrogante e egocêntrico, isso era um fato. Só precisava de um jeito de lidar com aquilo sem que ninguém suspeitasse. E, principalmente, sem que ela enlouquecesse.

Não podia se esconder eternamente de Draco simplesmente porque o que estava assustando-a era o que ela carregava dentro de si: seus próprios sentimentos. E, infelizmente, ainda não tinha aprendido a fugir de si mesma; se já tivesse esse conhecimento sua vida teria sido um bocado mais fácil nos últimos anos.

Entretanto, mesmo sabendo o que teria que fazer, a verdade é que ela, Gina Weasley, mulher notadamente corajosa e destemida, estava se escondendo pela Mansão, evitando que Draco cruzasse seu caminho. Não era realmente difícil; mesmo que agora ele passasse mais tempo em casa - seja lá por qual razão - a tática de Gina consistia em desviar seu caminho toda vez que ela vislumbrava um cabelo platinado vindo em sua direção.

E foi num desses momentos que Narcissa a surpreendeu.

Gina tinha percebido que, no outro lado do corredor, Draco saía da mesma sala de estar para qual ela estava se encaminhando, totalmente distraído e imerso em seus pensamentos, com a testa franzida como se algo estivesse incomodando-o profundamente. Ela abafou a curiosidade que sentiu ao se perguntar o que estava deixando Malfoy tão apreensivo e se camuflou na primeira brecha que teve, esperando que ele finalmente saísse do corredor.

Ficou lá por alguns instantes e nem percebeu quando Narcissa, vindo da mesma direção que ela, parou ao seu lado e observou sua situação: Gina estava estrategicamente posicionada atrás de uma estátua muito feia, com as costas contra a parede e os olhos fechados firmemente numa expressão cômica.

Narcissa ergueu uma sobrancelha interrogativa. "Por mais que eu usualmente estranhe seus costumes advindos de uma criação fora dos padrões, se esconder pelos cantos da casa é um pouco demais, não acha?"

Gina abriu os olhos assustada e, olhando ao redor para ver se estava segura, conseguiu recuperar um pouco da dignidade.

"Não estou me escondendo. É que…" Ela engoliu em seco, rezando para que não estivesse muito vermelha. "Bem, vi que aqui atrás estava muito empoeirado e resolvi que podia limpar."

Narcissa se empertigou levemente ofendida e um quadro do avô de Draco atrás dela começou a resmungar.

"Oh cale a boca sua traidora de sangue, animalzinho impuro, acha que a casa dos meus antepassados precisa da sua mão corrompida para qualquer tarefa..."

"Isso é o bastante, senhor." Narcissa disse alto e com tanta veemência que Gina estremeceu diante do tom e o quadro ficou imediatamente em silêncio, parecendo chocado. Então ela voltou sua atenção à Gina novamente. "Temos dois elfos nessa casa, Ginevra. Acho que eles podem fazer esse trabalho sem a sua ajuda."

Gina assentiu, sabendo que não havia nada mais que ela pudesse falar sem parecer mais idiota. Ela estava procurando uma maneira de escapar daquela situação com o que restava do seu amor próprio quando, para seu alívio momentâneo, Narcissa mudou de assunto. "Já falou com meu filho sobre as mensagens que chegaram nos últimos dias?"

Gina ficou tensa, mais uma vez. "Não, ainda não tive a oportunidade de encontrá-lo pela casa."

E aquilo não era uma mentira, certo?, ela pensou torcendo para que seu rosto não estivesse tatuado com o rubor.

E, por mais raro e desconcertante que aquilo parecesse, Narcissa riu.

"Certamente que não." Ela observou Gina fixamente com o ar de quem sabia demais. "Contudo, eu sugiro que o faça sem demora. Aquele tipo de pedido pode se tornar… insistente, se é sistematicamente ignorado." Narcissa disse, se afastando com passos suaves.

"Sim, eu sei." Gina murmurou para as costas da sogra, sentindo uma sensação amarga aflorar dentro dela diante do que estava por vir.

Então Narcissa, ainda de costas, jogou as palavras sobre o ombro. "E, Ginevra, fique tranquila. Draco acabou de sair para o Ministério, você pode voltar a andar livremente pela casa."

Gina cerrou os dentes ao perceber o tom bem humorado da bruxa mais velha.

Malditos Malfoys e seu senso de humor negro, ela pensou cruzando os braços protetoramente sobre o peito.

***

Sentada numa das poltronas confortáveis do seu quarto, Gina suspirou e apoiou o queixo na mão, sentindo vontade de incendiar o bilhete que segurava com um toque da varinha. Era o quinto em menos de um mês, contendo a mesma insinuação.

Franzindo a testa, ela se perguntou se já não era hora de tomar uma decisão a respeito. Ela releu o bilhete, para firmar sua resolução.

"Sr. e Sra. Malfoy.

É com alegria que enviamos essa carta parabenizando-os pelo nascimento do seu herdeiro. A sociedade se regozija em saber que mais um sangue-puro veio ao mundo para dar continuidade às nossas tradições mais benignas.

Mal podemos esperar a hora de conhecê-lo, assim como o enteado acolhido no seio da família Malfoy, no momento em que forem apresentados à sociedade e aos amigos.

Com respeito,

Anthony e Isabelle Avery."

Era aquela exigência velada para a apresentação de Aries e James para os 'amigos' de Draco e do Ministério que estava deixando-a à beira de um ataque de nervos. Como ela poderia expor um bebê de quatro meses àquelas pessoas? E James, ainda tão inocente de todas as coisas que cercavam sua identidade?

O constante medo da investigação da sua identidade e a de James povoava sua mente e, nos últimos dias, ela mal tinha conseguido dormir.

Narcissa, para completar, já tinha deixado seu ponto bem claro: ela devia falar com Draco sobre as mensagens recebidas anteriormente e que continham os mesmos comentários e insinuações.

Estava agoniada, mas era chegada a hora de encarar o problema de frente. Estar apaixonada por Draco não tinha feito com que ela virasse uma covarde, afinal.

Bom, pelo menos não quando o assunto era seus filhos, ela respirou fundo.

Se levantou de um salto da poltrona antes que perdesse a coragem.

Vamos acertar essa questão primeiro, ela pensou consigo mesma, se recriminando fortemente por estar se comportando de forma tão infantil. Draco e ela tinham um filho juntos, além do fato de que Malfoy e James tinham um laço mais forte do que qualquer outro, o vínculo de um voto perpétuo.

Os sentimentos que ela nutria por ele deviam ser colocados num segundo plano naquele momento.

Aries e James vinham em primeiro lugar, sempre.

Ela atravessou a galeria que dava acesso ao quarto de Draco e sentiu um arrepio involuntário ao se lembrar do que tinha sentido da primeira e última vez que estivera ali, há pouco mais de um ano. Na época não tivera a maturidade suficiente para entender como seu próprio corpo reagira e qual o recado que estava mandando para ela.

Sim, ela havia gostado de tudo. E esse arrepio no corpo traidor indicava que queria mais. Respirou fundo, contendo um possível rubor e mandando para inferno aqueles sentimentos juvenis.

Suspirou e se deteve diante da porta de carvalho negro, hesitando mais um momento. Depois, dizendo que sua atitude não tinha sentido, bateu levemente na porta. Mal teve tempo de recuar a mão quando Edril abriu a porta com um gesto servil.

"Senhora." Ele se inclinou respeitosamente. Depois que ela tinha ido morar na Mansão Malfoy, o elfo tinha realmente desenvolvido um bom comportamento com relação a ela.

Deixando Edril e suas oscilações de humor de lado, Gina espiou pela porta semiaberta e viu que Draco estava num dos cantos do quarto, sentado à uma grande mesa que servia de escrivaninha, e tentando – aparentemente sem sucesso – terminar uma partida de xadrez de bruxo. Com exceção daquele dia no parque, ela nunca o vira num momento de desconcentração, sem ter a palavra Ministério envolvida em tudo que ele fazia.

Com rara demonstração de cortesia, ele não demonstrou surpresa ao ver Gina na porta do seu quarto. A bem da verdade, ele quase não tirou os olhos do jogo, com uma expressão aborrecida tatuada no rosto. Apenas grunhiu um 'pode deixá-la entrar' e dispensou o elfo, gesticulando com um aceno casual para que ela se sentasse numa poltrona em frente a ele. Então, aguardou com paciência que ela dissesse por que estava ali.

Nos aposentos dele...

Não! Ela não deixaria seus pensamentos seguirem por aquele rumo!

Ela observou a maneira com a qual ele olhava para o jogo com determinação, lembrando muito a expressão de Rony quando se sentava diante de um tabuleiro semelhante.

Por fim, ele disse às suas peças o movimento que queria que elas fizessem, mas elas sequer se mexeram; ao invés disso, gritaram de volta sugestões de como elas deveriam se mover. Draco praguejou baixinho e Gina se perguntou mais uma vez o que fora buscar ali.

Um conselho? De Draco Malfoy, o homem que conseguia ser infinitamente mais infantil e mimado do que James?

E o homem por quem ela estava apaixonada, a pequena voz inconveniente zombou; para seu eterno desagrado, aquela manifestação da sua consciência tinha voltado com toda força nos últimos dias.

Gina optou por romper o silêncio antes que seus pensamentos se desviassem por vias proibidas mais uma vez.

"Recebi um convite com um alerta velado para que Aries seja apresentado à sociedade, como seu herdeiro. E a sugestão parece se estender a James também." Ela torceu o nariz ao perceber como aquilo tudo soava arcaico e tradicionalista. "Já é o quinto que recebemos, só nas últimas semanas."

Draco não se mostrou particularmente interessado: tentou dar mais uma ordem às suas peças e suspirou quando elas não obedeceram mais uma vez. Então levantou os olhos e olhou diretamente para Gina pela primeira vez – e ela não admitiria jamais o quanto aqueles olhos mexiam com seus nervos –, resolvendo que era hora de falar.

"Pode usar a Mansão, se é isso que te preocupa." Draco falou desinteressado e voltou sua atenção ao jogo. "E, se precisar de dinheiro para organizar tudo, eu posso mandar algum duende do Gringotes liberar a quantia que você achar necessária."

Gina se empertigou levemente na poltrona.

"Pode parecer estranho aos seus ouvidos, Draco, mas nem tudo na vida é uma questão de propriedades e dinheiro." Ela rebateu e ele ergueu os olhos do xadrez mais uma vez, com expressão entediada.

"Então qual é o problema?" Ele bufou.

"Exposição e contaminação." Gina disse sucinta e, quando ele rolou os olhos, ela continuou mais didaticamente. "Não quero expor meus filhos à essa sociedade corrompida, muito menos que eles cresçam com ideias erradas. E Aries ainda é um bebê de colo! Começamos apresentando-o para seus amigos e daqui uns anos ele estará brincando de ser um Comensal da Morte." Ela disse tão rápido que teve certeza que atropelou algumas palavras.

Para o crédito de Draco, ele não pareceu se ofender. Simplesmente ergueu as sobrancelhas levemente surpreso com a reação dela.

"É natural que as pessoas queiram conhecer Aries. Ele é meu filho, afinal." Draco contrapôs como se aquilo fosse uma dádiva. Gina suprimiu uma vontade súbita de azará-lo e bufou levantando uns fios ruivos do rosto.

"Não quero que meus filhos fiquem perto de pessoas assim." Ela afirmou tendo a consciência de que chegou a fazer um biquinho.

"Então quer que eles fiquem perto de quem? Da sua família?" Draco perguntou com a voz arrastada, unindo as mãos abaixo do queixo e apoiando os cotovelos na mesa. "Porque eu tenho a impressão de que você escolheu não estar mais com eles. E de que também escolheu ficar perto dessas pessoas que você tanto parece desprezar. Participar desse seu jogo não é uma tarefa fácil, você já deveria saber."

Gina sentiu como se tivesse levado um tapa, mas arrebitou o queixo em desafio. Era verdade que havia escolhido aquilo, mas isso não significava que ela tinha que aceitar tudo passivamente.

"Eles são muito jovens…" Ela mudou estrategicamente de assunto. "Não quero que eles vejam coisas que não são para a idade deles."

Eu sei o mal que isso pode causar, ela completou mentalmente quando a imagem de um diário enfeitiçado surgiu nos seus pensamentos sem ser convidada.

Draco deu uma risadinha de escárnio. "Quantos escrúpulos para uma mãe ambiciosa, Weasley."

"Não sou ambiciosa." Gina respirou fundo para conter o impulso de jogar o maldito tabuleiro no chão e sacudir Draco pela capa. "Só luto para proteger meus filhos desse regime que você ajudou a construir."

Draco semicerrou os olhos como sempre fazia quando algo o ameaçava.

"Acho que posso te falar uma coisa ou outra sobre o quão eficiente é a proteção materna e sobre ser novo demais para encarar o mundo como ele é. Minha mãe também tentou me proteger o máximo que pôde das ideias do meu pai, do Lorde das Trevas, da minha tia, das minhas próprias ideias. E, vejamos, que benefícios isso me trouxe?"

Gina cruzou os braços de forma beligerante, se recusando a responder uma pergunta retórica. Draco colocou um dedo indicador abaixo do queixo, forçando uma aparência pensativa. Então ele começou a enumerar.

"Fracassei tentando matar Dumbledore, fui torturado de várias formas possíveis, vi meu pai sendo morto por causa de informações fornecidas pela minha mãe. Matei aos dezoito anos e vomitei na sequência, porque era fraco demais para aquilo. Ironicamente, matei nos anos seguintes para não ter que matar mais, e em algum lugar do processo simplesmente me anulei, para não sentir mais nada. Quase fui morto diversas vezes e em muitas eu desejei realmente morrer. Internei minha mãe no St. Mungus para que ela ficasse segura, subornei, chantageei. E, realmente, Weasley, quando tudo isso começou, eu não tinha idade suficiente para ver coisas que vi, sentir as coisas que eu senti." Ele falou arrastando a voz num tom tipicamente jocoso e então desviou sua atenção para o tabuleiro novamente. "O que acha seu eu arrastar minha rainha para essa posição?" Ele perguntou, indicando uma casa no tabuleiro com um dedo delgado e pálido.

Gina não tinha palavras. A cada frase dele, ela tinha se encolhido um pouco mais na poltrona.

Estava moralmente destruída.

Não que a maior parte daquilo fosse novidade para ela, mas estava tão focada nas dificuldades da sua própria situação e da sua família que nunca tinha olhado as coisas por aquele prisma. E aquilo a deixou verdadeiramente abalada.

Teve vontade de levantar da poltrona para acariciá-lo, se aninhar junto a ele até que os dois se esquecessem de todas as coisas ruins que tinham passado, das duas infâncias destruídas, mas o máximo que pôde oferecer foi uma frase trêmula.

"Draco, eu não-"

"É, de fato não é um bom movimento. Tem razão." Draco concordou, claramente tentando evitar voltar ao assunto anterior. "Eu levaria um xeque-mate em três movimentos." Ele bufou, soprando para longe do rosto fios de cabelo que caíam sobre a testa.

Gina sentia-se gelada, triste e cheia de piedade, como se estivesse diante de um homem que tinha sido privado do indispensável, na maior parte da vida.

Estranhando o atípico silêncio de Gina, Draco ergueu o olhar para ela e notou sua expressão. O rosto dele se transformou na conhecida máscara de escárnio.

"Ora Ginevra, tire essa expressão de piedade do rosto, eu não preciso dela. Se as minhas opiniões te deixam assim, por que veio aqui? Você sabe tão bem quanto eu como é crescer nesse mundo. E você escolheu estar nele."

De novo, o ponto da escolha. Entretanto, dessa vez ela não desviou o assunto.

"Eu escolhi dar uma vida minimamente decente para os meus filhos, o que é bem diferente." Ela respondeu e teve consciência de que sua voz havia tremido um pouco. "Não quero que James e Aries cresçam…" como você, ela pensou. "sem um mínimo de alegria em volta deles."

Ele riu mais uma vez, totalmente sem humor. Certamente havia percebido o que ficou subentendido da frase dela.

"Ah sim, nós dois não tivemos a mesma educação. Crescendo onde você cresceu fica mais fácil se sentir alegre, livre. Aqueles que são sangue-puro deverdade não tem a mesma sorte." Draco respondeu frisando a palavra.

Finalmente, ele conseguiu movimentar uma peça do seu jogo, que foi sumariamente destruída por uma adversária. Apoiou o queixo na mão, claramente contrariado.

Os dois caíram num silêncio incômodo e Gina se mexeu desconfortável na poltrona. "Você não encontrou nada de alegre na vida? Como foi que conjurou um patrono, naquele dia em Hogwarts?"

Draco não hesitou em responder, distraído. "Os comensais desenvolveram certas técnicas que permitem acessar as memórias menos desagradáveis. Mesmo não sendo as condições ideais, costuma dar certo." Ele olhou para ela com um brilho malicioso e divertido nos olhos. "Nunca tinha tentado, para falar a verdade."

"Eu fui sua cobaia!?" Ela quase gritou, contendo a vontade de xingá-lo, e Draco simplesmente sorriu. Gina sacudiu a cabeça, espantando o pensamento. "Bem, não importa, eu acho. O fato é que deu certo." Ela cutucou o tapete com a ponta da bota antes de prosseguir. "Você não respondeu minha primeira pergunta."

Draco olhou para ela, sua vez de ficar desconfortável, indicando que ele havia desviado da pergunta de propósito. "Sim, eu tive algumas alegrias, Weasley." Ele falou, rolando os olhos. "Tive minhas sessões de bebedeiras com meus amigos, tive algumas mulheres, pude esbanjar dinheiro no que tinha vontade…" Ele deu de ombros, deixando a frase no ar.

"Não era bem esse tipo de alegria a qual eu estava me referindo." Ela comentou num tom levemente insistente. "No que você pensou, para conjurar seu patrono?"

Draco ergueu uma sobrancelha. "Não acha que está levando sua curiosidade um pouco longe demais?"

Ela reconheceu que tinha passado os limites estipulados para uma conversa civilizada – uma das poucas que eles tinham - e trocou de abordagem, abafando sua curiosidade mais explícita.

"Nunca gostou de verdade de algo? De alguém…?" Ela quase se beliscou discretamente. A necessidade de saber sobre os sentimentos dele quase a sufocava, mas tinha certeza que sua vida seria um inferno infinitamente maior se Draco sequer desconfiasse da razão daquela insistência, se desconfiasse do que ela sentia por ele. Ela seria alvo do seu escárnio e desprezo para sempre ou ele fugiria dela como um troll foge de um banho.

Pensando bem, Gina chegou à conclusão de que era provável que ele fizesse as duas coisas. E nenhuma das hipóteses a deixava particularmente satisfeita.

Draco a olhou com uma expressão interrogativa antes responder "Gostei da minha Nimbus 2001. Era realmente muito boa."

Gina rolou os olhos. "Alguém…?"

"Minha mãe. Mas sempre foi um amor impossível: ela amava outro homem." Ele deu um sorriso torto. Gina não sorriu, desconsiderando o fato de que era raro que ele fizesse uma piada que não tivesse o objetivo de denegrir alguém.

"Estava me referindo a gostar de outro jeito. Querer estar perto, apesar de todos os problemas, todos os defeitos. Ter um apoio para seguir em frente. Amar alguém…" Ela disse e instantaneamente ficou com medo.

E se ele dissesse que sentia isso por Astoria? Certamente, ela não queria mais saber. Entretanto, Draco já tinha apoiado as costas no encosto da cadeira e cruzado os braços sobre o peito, esquecendo o maldito jogo finalmente.

"Não, nunca senti isso. O que me agrada, se o preço a pagar fosse ficar com essa cara de idiota idealista que você está fazendo nesse exato momento." Gina rolou os olhos mais uma vez e ele fez um gesto conciliador com a mão. "Mas acho que eu posso entender aonde você quer chegar." Ele ficou em silêncio, como se tivesse se lembrando de algo muito distante. "Uma vez eu estendi a mão para algo assim, mas era tudo uma miragem e ela se esvaiu, como todas as outras coisas da minha vida."

Draco semicerrou os olhos e o rosto liso e pálido adquiriu uma aparência um pouco mais jovem. Agora ele realmente parecia só ter seus 25 anos e um sorriso enigmático cruzou os lábios finos.

Com espanto, ela se deu conta de que, no momento em que ele mais se abria e se aproximava dela, era aquele em que estava parecendo mais distante.

"Foi em Hogwarts. Eu estava prestes a completar dezoito anos e vivia num inferno depois da história do fracasso com Dumbledore. Estava num baile idiota organizado com o intuito de promover a união dos bruxos e eu sabia que, no fim das contas, aproveitariam a situação para me humilhar. Infelizmente, meu palpite foi certeiro."

Ele ficou em silêncio, como se a intensidade da fúria que ele tinha sentido o incomodasse até hoje. "Eu tinha uma raiva cega e vergonha borbulhando dentro de mim quando me designaram como par de uma garota. Ela era mais ou menos da minha idade, tinha um nariz arrebitado, um cabelo irritantemente chamativo, era mandona, teimosa, briguenta e atrevida. Na minha visão, não passava de uma criança imunda que não merecia um segundo olhar. Além de tudo, ela usava um vestidinho horroroso marrom, com detalhes dourados nas mangas. Péssimo mesmo."

Draco parou por um momento e Gina prendeu a respiração, consciente do caminho que a história estava tomando. Então ele continuou, como se estivesse puxando as memórias e organizando-as com cuidado na sua mente, uma a uma.

"Mas as coisas mudaram quando eu segurei a mão dela para conduzi-la para o Salão. Senti que ela havia tremido ao colocar a mão sobre a minha e aquilo me causou uma sensação nova e agradável. No meio das humilhações, caos e torturas em que eu vivia, alguém tinha tremido ao pegar na minha mão. Até então, era sempre eu a tremer, por medo, expectativa, receio. Com um simples gesto involuntário, aquela garota me devolveu um poder que tinha sido tomado de mim. Senti que ainda era uma pessoa, apesar de toda a sorte de privações que estava passando. Entendi que não precisava ser sempre um criado, mesmo que coragem não fosse meu ponto forte."

Ele parou para olhá-la nos olhos e Gina engoliu em seco diante da intensidade dos olhos dele, incapaz de emitir qualquer som.

"No entanto, ela era geniosa e eu acabei perdendo o pouco do controle que tinha naquela época conturbada. Apresentei-a para os meus colegas como a 'bruxa sangue-puro mais suja do Reino Unido' e então ela fugiu."

Draco levantou a mão pálida para olhá-la como se não visse aquela parte específica do seu corpo diariamente e Gina viu brilhar o único anel – sua aliança – que ele usava como adorno naquela mão, antes que ele voltasse a falar.

"Olhei para minha mão vazia como um idiota e um sentimento desagradável me invadiu – algo como culpa, provavelmente. Posso dizer com relativa certeza porque, apesar de ter sentido isso muitas vezes na minha vida depois daquele ano, aquela tinha sido a primeira vez que aquele sentimento estranho se apresentava a mim." Ele deu um sorriso torto e triste. "Eu tentei encontrá-la, mas sem saber o que falaria para ela caso tivesse sucesso. Então busquei ajuda com o único amigo que tínhamos em comum, vaguei pelo castelo, procurei pelo Salão." Ele deu de ombros levemente. "Mas não a encontrei mais naquela noite e nossos caminhos se separaram, como devia ser."

O que teria acontecido se ele tivesse me achado, em vez de Blaise? Ou o que eu teria pensado se Blaise tivesse dito que Draco estava me procurando?, Gina pensava freneticamente.

Ela sabia com certeza que não seria uma relação de amizade fácil – ela duvidava que poderia ter começado a olhar Draco com outros olhos, tão apaixonada por Harry como estava -, mas talvez fosse um começo. Talvez ela tivesse conseguido ajudá-lo e ele não teria enfrentado aquela vida cheia de tristezas e perdas. Talvez ele se sentasse com ela no terraço e simplesmente achassem apoio silencioso um no outro, com uma empatia que só pode ser sentida quando se tem dezessete anos e os olhos virgens para as coisas do mundo.

Gina suspirou, subitamente cansada de tantos 'se'.

"E a garota, voltou a vê-la alguma vez?" Ela perguntou, já sabendo a resposta perfeitamente bem. Tinha todas as lembranças dos encontros deles bem vívidas na sua memória.

"Algumas vezes naquela mesma época. Depois, só anos mais tarde." Draco saiu de um torpor aparente, como se estivesse voltando à realidade, para então sorrir num misto de zombaria e tristeza. "E veja como são estranhas as ilusões que a mente de um adolescente pode criar. Quando a encontrei novamente ela estava bem diferente: tinha se tornado uma mulher ambiciosa, endurecida e vingativa, mais perigosa que todas as outras reunidas."

Gina se encolheu instintivamente. Estava totalmente sem palavras e Draco permanecia impassível.

"Esse jogo me irrita." Ele se levantou e, com um gesto da varinha, derrubou todas as peças rebeldes.

"Elas precisam confiar em você." Gina respondeu automaticamente, com a mente longe. Precisamente oito anos antes, em Hogwarts. "Do contrário, nunca irão te obedecer."

Draco deu de ombros. "Nunca fui bom e fazer os outros me obedecerem através da confiança." Ele se moveu, guardando as peças caídas numa caixa. "O que o Cicatriz Júnior acha dessa história?"

Gina demorou um tempo para perceber que ele se referia à apresentação formal dos meninos à sociedade e não a história que ele tinha acabado de contar.

A razão pela qual ela estava ali, para começo de conversa.

"Não sei ao certo, ainda não falei com ele…" Ela respondeu, distraída demais para repreendê-lo por usar aquele apelido infame.

"Com certeza seria ideal apresentá-los." Draco deu sua opinião finalmente. "Não podemos dar a impressão de estarmos escondendo nada ou dar a chance para fazerem comentários inapropriados." Ele disse ajeitando a capa e se preparando para sair.

Gina se limitou a assentir, concordando com a verdade daquelas palavras.

"Mas creio que você pode esperar mais alguns meses antes de fazer qualquer coisa, os outros que tenham paciência. Nós somos Malfoys, afinal." Ele falou com uma arrogância natural, como se ser um Malfoy concedesse direitos negados aos outros simples mortais. "Enquanto isso prepare seu filho, treine Oclumência, como ser uma boa anfitriã e como colocar um sorriso eterno no rosto. Merlin sabe como vamos precisar de tudo isso."

"Meus músculos do rosto já estão bem exercitados, depois de todos esses meses de sorrisos forçados." Ela comentou, ainda longe.

Draco deu um meio sorriso, como se tivesse prestes a contradizê-la com algum comentário sobre o gênio dela, mas então mudou de ideia, preferindo ficar em um território mais seguro para ambos.

"Vou para o Ministério. Minha hora de lazer acabou."

Ela procurou os olhos dele com os seus, já totalmente adaptada ao ar glacial e impenetrável que eles emitiam.

"Draco," Gina chamou com a voz fraca e ele se virou totalmente para ela com um ar interrogativo no rosto. "A garota daquela época ainda está aqui. Gostaria que você soubesse disso."

Draco hesitou um momento e então assentiu quase imperceptivelmente, saindo na sequência e deixando Gina no seu quarto, perdida nos próprios pensamentos.

***

Gina havia decidido por fim oferecer a tal recepção, mesmo que isso soasse extremamente piegas aos seus ouvidos. Pensara no que Draco havia dito, sobre a necessidade de não se esconder para permanecer oculto. Era uma dualidade que estava deixando-a louca, prestes a puxar os cabelos. Mas, rendida e derrotada, começara a fazer uma lista de cardápios, decoração e entretenimentos de variadas espécies.

E ela definitivamente odiava aquilo tudo.

Teria que pedir ajuda de Olívia e Narcissa, mas primeiro precisava levantar os pontos de melhoria na grande sala usada para recepções da Mansão. E, justamente quando necessitava das opiniões centradas de Narcissa sobre essas melhorias, a bruxa mais velha tinha saído com James e Aries para um passeio no Beco Diagonal, acompanhada por Della.

Entretanto, Gina não podia reclamar: ficava cada vez mais feliz com o fato da sua sogra estar se afeiçoando a James também e, mesmo que Aries fosse pouco mais que um recém-nascido, não tinha receio de deixá-lo aos cuidados da avó. Assim, naquela tarde que havia tirado uma folga da loja, ela se limitou a contar com a ajuda de Edril, que corria atrás dela com uma agilidade tortuosa.

Ela percorreu o salão consideravelmente escuro, com móveis severos e um clima gélido. Era sempre daquele jeito mesmo que se acendessem as lareiras, e só melhorava com um bom feitiço aquecedor. Gina havia jogado alguns tapetes felpudos pelo chão, mas, apesar de ter ajudado na questão da temperatura, não amenizava a austeridade dos móveis escuros. Precisava tirá-los dali, mas não agora, quando Edril estava ocupado procurando mais tapetes numa das despensas da Mansão.

Suspirou resignada e mal-humorada. Foi nesse exato momento que Draco escolheu para entrar no ambiente, buscando alguns papéis que o Ministério havia enviado para a Mansão, mas que, por alguma confusão dos elfos, ainda não haviam sido mandados para o escritório ou para o quarto de Draco.

"Della e Edril ainda estão se acostumando a trabalhar juntos, definitivamente." Ela comentou distraidamente com Draco, que por sua vez se limitou a grunhir, certamente mal humorado com a confusão dos elfos.

Gina aproveitou o fato de que ele estava com um humor tão miserável quanto o dela e resolveu descontar um pouco das suas frustrações no seu alvo favorito.

"Estou prestes a mudar de ideia sobre essa maldita recepção. Esse ambiente me deprime." Ela fez um gesto que abarcava o grande salão. "Não quero falar mal do gosto dos seus ancestrais, mas a decoração da sua casa é pavorosa." Ela espetou venenosamente.

Draco se empertigou como se achasse o cúmulo que alguém que cresceu num lugar chamado A Toca pudesse criticar a decoração da Mansão Malfoy.

"Está reclamando dos seus aposentos?" Ele perguntou na defensiva, se virando lentamente em direção a Gina.

"Não, meu quarto é muito agradável. Parece que foi redecorado recentemente e com muito mais bom gosto do que essa sala, por exemplo." Ela respondeu distraída e torceu o nariz de desgosto.

"É claro que a decoração do seu quarto tem mais bom gosto." Draco respondeu com um sorriso arrogante. "Fui eu quem mandou redecorar."

Gina, que no segundo anterior ainda estava observando a sala frustrada, girou cento e oitenta graus para ficar frente a frente com ele.

"Você? Mandou redecorar para mim?" Ela perguntou surpresa, notando que tinha gaguejado um pouco. Tinha engolido toda a raiva e frustração num segundo, em nome da curiosidade.

"Para quem mais seria, Weasley?" Draco perguntou impaciente, fechando bruscamente uma das gavetas onde buscava os papéis. "Você não parava de me infernizar, até ousou bancar a anfitriã na minha casa." Ele deu de ombros, como se não tivesse tido escolha. "E, bem, quando descobri que você estava grávida, achei que fosse prudente preparar um quarto para qualquer eventualidade, mesmo... mesmo tendo especificado que não te queria aqui." A última parte da frase foi pronunciada num murmúrio e Draco fez uma careta ao constatar o fato.

"E por que nunca me convidou?" Ela perguntou parando no centro da sala com uma expressão atônita. Não esperava por aquilo nem em um milhão de anos.

"Achei que você não aceitaria." Draco deu de ombros novamente e Gina pôde notar que o rosto dele expressava sentimentos conflitantes, ruborizando levemente. "As coisas começaram mal entre nós e permaneceram assim durante um bom tempo."

"O que quer dizer?" Ela perguntou se agarrando ferozmente à chance de conhecer um pouco mais dos sentimentos dele.

Draco pigarreou, tentando achar as palavras certas.

"Eu imaginei que só quisesse distância de mim, depois do dia do nosso casamento. Depois daquela noite… Enfim, depois de tudo que eu te fiz."

Gina engoliu em seco diante da memória da noite de núpcias. Ela preferiu omitir que provavelmente ele estava certo: pelo menos no começo, tudo que ela queria era distância de Draco Malfoy. Aquilo, é claro, estava longe de ser verdade naquele momento.

"E agora, como estão as coisas entre nós?"

Draco a olhou atenta e longamente antes de responder.

"Não como deveriam estar." E voltou a fazer sua busca não dando tempo para que ela perguntasse a razão, ainda com um discreto tom rosado no rosto.

Depois de bufar e não encontrar o que queria, ele passou por ela em direção a porta e Gina percebeu com um lampejo de tristeza que ele a deixaria mais uma vez.

Mas, subitamente, ele pareceu mudar de ideia e murmurar algo como 'para o inferno o medo' e Gina ficou alerta.

Ele deu meia volta e se postou exatamente atrás dela. Ela ficou muito quieta, com receio de se virar e fazer com que ele se afastasse, acabando com aquela estranha proximidade.

Depois de um momento de hesitação, ele colocou as mãos sobre seus ombros, fazendo uma pressão levemente dolorida. Gina se manteve imóvel.

"Você teve alguma coisa com Blaise?" Pelo que Gina podia se lembrar, aquela tinha sido a primeira vez que Draco tinha falado algo rápido demais, se atropelando no meio da frase.

"O quê?!" Ela disse alto demais, totalmente surpresa pela pergunta. Quando se lembrou do incidente em Hogwarts, enrubesceu fortemente e agradeceu por ele não estar vendo o rosto dela. "Pelas barbas de Merlin, Draco! Eu tinha até me esquecido daquilo." Ela ficou em silêncio um instante antes de completar. "Você me tratou muito mal naquela noite, depois do meu acidente com os dementadores… Acho que... que eu só queria me vingar. É infantil, eu sei, mas as vezes não tenho muito controle sobre meu gênio."

Se pudesse, ela teria apostado sua pequena fortuna recém recuperada na hipótese de que ele havia levantado uma sobrancelha para expressar sua descrença. Ainda assim, ele permaneceu com as mãos firmes sobre os ombros dela.

"As vezes?" A pergunta escorria sarcasmo, mas na sequência ele prosseguiu mais seriamente. "E você queria se vingar de mim? Acho que inverteu os papéis: eu é que deveria querer me vingar, não você. Não se esqueça que quem nos colocou nessa situação foi exclusivamente você."

Ela não pôde evitar rolar os olhos. "Eu já te pedi desculpas por isso."

"Como se isso pudesse me impedir de continuar te aturando perto de mim, na minha casa, com meu nome…" Ele enumerando ironicamente.

Contudo, para seu eterno espanto, Gina podia jurar que havia um toque de divertimento na voz dele.

Era estranho conversar com ele naquela posição, só tendo os ouvidos para guiá-la, para decifrar aquele homem através da voz arrastada que ele possuía. Mas, ao mesmo tempo, era inebriante, como a expectativa que a situação criava.

Ela riu simplesmente por tê-lo tão perto de si e num gesto ousado pendeu a cabeça suavemente para trás, para apoiá-la no ombro dele; Draco, por sua vez, deslizou as mãos até a cintura dela, onde pousaram inocentemente. Os lábios dele – agora tão próximos da sua testa – se crisparam numa linha fina e Gina pôde deduzir a batalha interna que ele estava travando. Sentiu que o fôlego dele tinha se acelerado sutilmente e ela fechou os olhos, aproveitando o momento.

Pareceu que horas haviam se passado quando ele finalmente abriu a boca e Gina sentiu na fronte o hálito quente e familiar.

"Deveríamos ter nos encontrado depois daquele baile, não agora. Agora tudo que restou foi ódio, sonhos destruídos e cinzas." Ele sussurrou arrastando as palavras e Gina se surpreendeu com a intensidade da amargura em sua voz.

"A vida e os sonhos podem ser reconstruídos, Draco." Finalmente ela se virou de frente para ele para poder encará-lo, olhá-lo nos olhos. "Venho fazendo isso todo dia, depois da Batalha na Floresta Proibida."

"Talvez eu não tenha sua força de vontade para reconstruir as coisas." Ele falou com o sorriso triste e envergonhado de quem reconhece uma fraqueza.

"Claro que tem. Eu me lembro como sua família estava desprestigiada com Você-sabe-Quem e olhe até onde você chegou, sozinho." Gina disse suavemente e ele entendeu que ela estava se referindo ao seu poder no Ministério, ao fato de ele ter conseguido sobreviver apesar de todos as dificuldades. "E, mesmo se você fraquejar, eu vou te ajudar." Então ela colocou a mão sobre o rosto dele, numa carícia gentil. "Na verdade, acho que sempre quis te ajudar e te entender, por alguma razão que até hoje não compreendo completamente."

Visivelmente, aquilo pegou Draco de surpresa, como se a ideia de que alguém realmente queria estar próximo dele fosse algo totalmente incomum.

"Você me quis do seu lado, alguma vez?" Draco perguntou genuinamente curioso e desviando o olhar dela, como se estivesse... tímido.

"Ainda quero." Ela respondeu se surpreendendo com a própria sinceridade e ele encostou sua testa na dela, como se hesitasse em beijá-la; Gina já borbulhava por dentro ansiando pelo toque dele, mas não queria apressá-lo: lidar com Draco era sempre assim, como se ela estivesse andando num lago coberto de gelo; qualquer movimento precipitado e ela cairia em um interminável poço de frieza.

Então ela continuou falando, na tentativa de deixá-lo confortável.

"Seus olhos sempre me enfeitiçaram, desde aquela época. Eles são tão… perturbadores. Seu rosto é inexpressivo, você sempre o controla. Mas não os seus olhos, não a cor deles." Ela acrescentou com um leve sorriso, passando a um dedo pela bochecha dele. "Agora eles estão pálidos, como geada. Você deve estar com um medo terrível." Ela completou dando uma risadinha maliciosa.

Draco piscou duas vezes e engoliu em seco, como se estivesse se preparando para falar algo que tinha um gosto desagradável.

"Tudo que poderia ter sido, Ginevra..." Ele falou com um tom sério a despeito da descontração dela. "Para tudo isso, não há retorno."

"Mas há progresso." Ela disse amavelmente e ele fechou os olhos, sentindo o toque da mão dela. Então ele suspirou se dando por vencido e a enlaçou pela cintura, estreitando-a nos braços. Gina nunca se sentiu tão protegida antes.

"Eu – eu acho que vou te beijar." Draco sussurrou, franzindo a testa como se aquela decisão tivesse deixado-o absolutamente confuso.

"Acha?" Gina provocou deliberadamente.

"Acho que tenho que te beijar." Ele disse como se não acreditasse no que estava dizendo. "É como respirar." Quando Gina o olhou sem entender, Draco se obrigou a explicar, ainda confuso consigo mesmo. "Não há muita liberdade de escolha."

Então, sem conseguir hesitar mais, ele a beijou com ardor, como se quisesse tirar o atraso de todos esses meses. Quando os lábios se tocaram, Gina soube que estava irremediavelmente envolvida por ele. Era um beijo diferente de todos os outros que ela já experimentara porque não era gentil ou doce; era possessivo, exigente, dominador e fazia uma pressão considerável sobre os lábios dela, mas que enviava ondas de calor incontroláveis por todo seu corpo Sentiu os dedos dele segurando firmemente sua cabeça, se entrelaçados nos cabelos ruivos e roçando o couro cabeludo, como se ele tivesse medo de que ela pudesse se afastar dele.

Foi absolutamente impressionante. Gina sentiu seus joelhos fraquejarem e ela se agarrou ao robe dele em busca de apoio.

Com gestos nervosos e apressados que não combinavam de forma alguma com ele, Draco deslizou as mãos para baixo e começou a tirar a capa dela, se atrapalhando com os cordões e praguejando baixinho. Gina teve que se segurar para não rir e ele se inclinou para morder o pescoço muito branco. Se era uma punição para a quase-risada dela ou a saciedade de um desejo para ele, Gina jamais poderia dizer.

"É vergonhoso admitir o quanto eu desejei isso, sua pele sardenta, seu cheiro." Ele disse com a voz arrastada abafada pelo pescoço alvo, enquanto terminava de jogar o robe dela no chão e tentava se separar do seu, com a ajuda mais do que solícita de Gina. "Eu não devo estar bem."

Ela riu levemente, inebriada por aquela loucura que também parecia ter acometido-a. "Vou entender isso como um elogio." Ela lançou os braços ao redor do pescoço dele, abandonando seu peso sobre ele, que por sua vez a trouxe lentamente até a maciez do tapete que ela tinha mandado colocar naquela sala.

Benditos tapetes, bendita sala sombria, ela pensou incoerentemente entre um beijo e outro.

A respiração dele estava tão rápida quanto a sua - o som áspero e irregular nos seus ouvidos-, e Gina sentiu uma onda de prazer diante da realização de que ele, o gelado e impassível Draco Malfoy, estava sendo tão afetado quanto ela. E, dessa vez, não era a sombra da cláusula de um contrato matrimonial que o impulsionava. Ele a desejava. E, Merlin, ela o desejava também. Tinha desejado durante um bom tempo, percebia agora.

Draco colocou uma mão por baixo da camisa dela, buscando – e encontrando - seu seio, tentando libertá-lo de todas as proteções que as roupas proporcionavam.

"Draco!" Gina exclamou, recuperando - um pouco - a lucidez e afastando-o gentilmente. "Estamos na sala que você recepciona as pessoas. Não é um lugar muito apropriado para-"

"Por que não?" Ele a interrompeu, fazendo uma careta. "Eu quero, você quer, isso é suficiente." Ele disse e seu rosto arrogante não incomodou Gina pela primeira vez.

"No tapete!?" Ela perguntou incrédula.

"Sim, no tapete." Ele voltou a beijá-la em todos os lugares ao alcance da sua boca. "Se eu não posso transar com aminha mulher no chão da minha casa, então não vejo vantagens no casamento."

Eles se enrolaram no chão, numa confusão de braços e pernas, bocas se confrontando e respirações aceleradas.

"Você já não vê vantagens." Ela engasgou quando ele puxou seu casaco de lã pela sua cabeça e ela ansiosamente alcançou os botões da cara camisa negra, desabotoando-os com as mãos tremendo levemente diante da constatação de que ele não iria pará-la, afastá-la. Ela sequer estava vendo o que fazia, beijando-o enquanto terminava com os botões e puxava a camisa para fora da calça, deixando-a totalmente aberta e revelando o peito pálido e magro.

"Touchè." Foi a única resposta que Draco se deu ao trabalho de expressar, claramente não dando a mínima para o fato de que ela estava certa sobre a natureza das opiniões dele acerca do matrimônio.

"Mas pode entrar alguém..." Gina insistiu, mesmo mordiscando a orelha dele no processo. Ela ignorou a contradição, pelo bem da sua própria sanidade.

Draco fez um gesto dissuasivo com a mão, enquanto chutava seus sapatos para longe e tirava as próprias calças. Gina engoliu em seco e finalmente puxou a camisa aberta dele, libertando-o da última peça de roupa. Estava realmente em chamas por causa de Draco Malfoy.

E mais: se recriminou por não ter experimentado mais vezes aquilo.

Draco levantou uma sobrancelha prepotente para o claro desejo que ela estava expressando no rosto; ele apontou para si e então para ela. "Dificilmente parece justa a quantidade de roupas que você está vestindo comparada com a quantidade que eu estou vestindo – no caso, nada." Ele afirmou com ar de zombaria. "Se importa de equilibrar as coisas?"

"Não..." Gina ofegou e fechou os olhos brevemente quando ele passou a mão pelo quadril dela. "Quer dizer, sim! Sua mãe, os meninos..." Ela gaguejou e Draco rolou os olhos.

"Eles não vou voltar tão cedo. E quero você agora. Além do mais, você também não se importa com o lugar. Está receptiva." Por baixo da fina camiseta dela, ele acariciou a curva de um seio com o dedo indicador, prendendo seus olhos nos dela. "Vamos Ginevra, vai ser melhor do que seria há oito anos, posso te garantir." Ele sorriu malicioso e ela se rendeu, estendendo os braços e chamando-o.

"Você é louco." Ela suspirou se entregando e ele levantou a cabeça apenas o suficiente para que ela pudesse olhar dentro dos seus olhos. O preto da pupila quase sugava o cinza e Gina praticamente se perdeu dentro deles.

"Está no sangue da minha família." Foi tudo que ele disse num sussurro rouco, sua respiração quente na garganta dela.

Gina respirou fundo e deixou cair por terra todas as suas objeções. Não tinha mais condições de resistir.

Nem soube o momento em que ela tinha se despido das sapatilhas, nem da sua calça, somente vagamente consciente de quando, entre um beijo e outro, Draco puxou a camiseta pela cabeça dela, deixando-a nua diante do seu olhar penetrante.

Ele não se mexeu por alguns segundos. Seus olhos estavam presos no corpo dela, espalhado sensualmente embaixo do dele, observando cada detalhe. Os seios ainda maiores por causa da amamentação, algumas cicatrizes da época da escola, a pequena marca de nascença na barriga, cada e toda curva que ela possuía. Ela quase se sentiu constrangida e tentou se cobrir, mas então viu que ele tinha engolido em seco, respirando com dificuldade. No rosto dele, havia quase uma expressão de reverência.

Gina sorriu abertamente, sentindo sua confiança voltar com toda força. "Sabe, Malfoy, eu não tenho o dia inteiro."

Diante da frase espirituosa, Draco pareceu voltar a si, rolando os olhos e voltando a beijá-la daquela maneira enlouquecedora.

E tudo que Gina conseguia pensar é que ela queria mais.

Começou a deslizar a mão pelo corpo dele – ela também tinha direito à exploração, não é? – mas, para sua frustração, Draco segurou seu pulso abruptamente com um sorriso irritante nos lábios e um brilho de malícia nos olhos.

"Posso supor que você não vai engravidar dessa vez, não é?"

Gina ficou mais vermelha, agora devido à vergonha, e ficou dividida entre dar um soco ou um beijo nele. Percebeu como ele controlava uma risada a todo custo, mas resolveu responder sinceramente.

"Não, agora estou tomando precauções..." Ela murmurou, ainda envergonhada.

"Medidas preventivas..." Ele falou pensativamente. "Pretendia seduzir alguém, Ginevra?" Ele perguntou levantando o queixo dela com um dedo com sua mão livre e Gina podia jurar que algo como insegurança havia cruzado aqueles olhos claros.

"Sim..." Ela respondeu sinceramente, só agora se dando conta da verdade daquela afirmação. "Um homem irascível, mimado, exigente e idiota."

"Já simpatizo com ele." Draco respondeu, demonstrando alívio por um milésimo de segundo ao se reconhecer na descrição e soltando o pulso dela, permitindo que ela o movesse livremente. "Tirando a parte do idiota, claro."

Gina rolou os olhos, mas continuou explorando o corpo dele, ávida por domínio sobre um território que ela nunca achou que desejaria. Recuou a cabeça para olhá-lo melhor.

Eles nunca tinham se visto tão expostos daquela forma, ela se deu conta.

Ele era realmente magro e sua pele parecia suave, apesar da palidez. Ela roçou os dedos pelo peito dele, vendo finas cicatrizes aqui e ali por todo o tronco; franziu um pouco a testa ao se lembrar de como ele havia adquirido aquilo – Harry, sectusempra–, contudo, ela se obrigou a manter o silêncio. Não valia a pena trazer aquilo à tona naquele momento.

Nem sabia se aquilo merecia ser trazido à tona, em qualquer momento.

Se concentrando no que importava, Gina continuou acariciando o peito dele com cuidado, conhecendo seu corpo. O pelo era tão claro e fino quanto o cabelo dele e era quase inexistente na região, com exceção de uma linha tênue e um pouco mais dourada que levava à parte de baixo do seu abdômen. Com a ponta dos dedos, ela seguiu aquela trilha e levantou os olhos para ele, sorrindo maliciosamente.

Draco soltou a respiração que nem se dera conta que estava segurando, de tanta expectativa.

Endiabrada, ele pensou impaciente e agarrou a mão dela para colocá-la num ponto muito específico que, naquele momento, estava pulsando como se tivesse vida própria.

Quando ele se moveu, Gina viu a mancha escura no seu braço esquerdo ficando evidente e, sem conseguir se controlar, ela ofegou e recuou a mão, tirando-a do alcance dele.

Racionalmente, ela tinha consciência de que a Marca Negra estaria lá. Já tinha visto da primeira vez que eles chegavam naqueles termos, mas não de forma tão acintosa. Naquele momento, à luz do dia, a mancha escura contra uma pele tão pálida era evidente demais, quase gritante. Era horrível, o crânio sorrindo com uma expressão comparada a lascívia maníaca, enrolada numa cobra nojenta que era quase... viva.

Ela fechou os olhos brevemente. Aquilo fazia parte dele e, mesmo que ela quisesse, não havia como mudar.

Ela tomou seu momento para assimilar.

Para compreender.

Para aceitar.

E, no fim das contas, foi mais fácil do que havia pensado.

Porque ela soube que era a soma de todos aquelas características – boas e ruins - que faziam Draco ser o que ele era. Quem ele era.

Porque Draco era cinza.

E ela soube também que os sentimentos que sentia por ele existiam não 'apesar de certas características' e sim 'por causa da junção de certas características'.

Abrindo os olhos, Gina estremeceu, mas se forçou a estender a mão para tocar a marca. Entretanto, antes que seus dedos pudessem encostar nela, Draco recuou bruscamente, segurando o braço junto ao peito e observando a reação dela com olhos semicerrados, desconfiados.

"O que foi?" Ele disse defensivamente, ofendido com a hesitação momentânea dela. A frieza costumeira deu lugar a uma voz mais trêmula, tanto pela luxúria quanto pela desconfiança. "Você sabia que ela estava aí, o tempo todo."

"Acho que sim," Gina admitiu olhando-o fixamente depois de um segundo em silêncio. "Só me assustei, vendo-a assim, tão exposta..."

A expressão dele se fechou, convocando o escudo de zombaria que era a forma que Draco usava para se proteger. "Vê-la assim faz com que fique mais difícil continuar fingindo que ela não existe, Weasley?"

"Eu não estou fingindo nada." Ela lutou para não deixar a pergunta brusca quebrar aquele momento que ambos – ela tinha certeza – desejaram por tanto tempo. "Eu sei o que você é."

"Sabe?" Ele zombou, levantando uma sobrancelha e sorrindo do jeito que Gina detestava. "O que eu sou, então?"

Um comensal da morte, um egoísta, um arrogante. O pai do meu filho, meu protetor, o homem por quem eu me apaixonei pouco a pouco, Gina pensou, mas não disse nada por um instante.

Gina suspirou e esticou novamente a mão, puxando gentilmente o braço que ele ainda estava pressionando contra o peito, como se estivesse escondendo-o. Relutantemente, Draco cedeu e ela pegou no seu pulso, virando-o para cima e passando um dedo pelas extremidades da Marca Negra.

Draco a olhou com um misto de tristeza e expectativa que não escapou aos olhos de Gina e então, não aguentando mais, ela o puxou de volta para si.

"Você é com quem eu quero estar." Gina respondeu com a boca colada no ouvido dele.

Draco estremeceu de desejo e alívio; com uma paixão que sequer sabia que possuía, ele se posicionou entre as pernas dela, separando-as com suas coxas e involuntariamente esperou por um consentimento. A boa educação de cama dizia que ele devia esperar, cortejar, se focar nas preliminares que as mulheres tanto gostavam, mas tinha que admitir para si mesmo que ainda tinha muito o que aprender sobre elas, que nunca tinha sido muito paciente com os desejos femininos.

Além disso, achava que iria se consumir em febre se esperasse por mais tempo. Depois daquelas palavras, do jeito que ela tinha olhado para ele, sem nojo, sem repúdio ou raiva, quase com... carinho.

Quando Gina assentiu silenciosamente com um sorriso doce, ele deslizou para dentro dela numa única investida, cheio de uma curiosidade nova que fazia com que ele prestasse atenção na mulher diante de si.

Os olhos da cor de chocolate, que quase todo o tempo mostravam desafio e dureza, estavam cobertos com expectativa e ternura - e isso o desconcertou mais do que tudo. Os lábios entreabertos eram um convite e proferiam gemidos tímidos que elevavam consideravelmente sua excitação.

Por um momento, ele não fez nada além de segurá-la firme, os corpos grudados e sem nenhum espaço entre eles. Naquele momento, os anos do passado não eram importantes, não eram sequer uma lembrança. Eles estavam ali, juntos, e aquilo era tudo que importava.

Então Draco se moveu e o corpo de Gina se arqueou instintivamente para se encontrar com o dele.

Era certo que eles não eram mais inimigos, isso há tempos. Mas, misturada ao desejo sufocante que ele sentia, inundava sua mente uma confusão quase tão impressionante quanto. O que eles eram agora?

Ela confiava nele. Draco tremeu levemente diante do pensamento e parou de se movimentar. Gina pareceu não perceber sua hesitação e, num gemido audível e exigente, puxou-o novamente para si. Ele se rendeu investindo novamente contra ela, ainda num ritmo moderado.

A descoberta o encorajou a agir com mais carinho com ela; Draco sentiu que eles começavam a descobrir juntos uma área antes inexplorada para os dois.

Sua tendência à melancolia disse a ele que aquela mulher havia humilhado-o e que ele a odiava mais do que tudo. Mas, ao olhá-la presa entre seus braços com os cabelos ruivos revoltos como se fossem seu travesseiro e olhos fechados de prazer, um novo sentimento brotou dentro dele.

Draco não conseguia desviar os olhos dela, perdido no seu próprio prazer. Ele estava observando-a enquanto ela se movia, seus músculos se flexionavam, enquanto o suor impregnava seus corpos – quente, úmido, unicamente deles.

Ele preenchia implacavelmente o corpo dela assim como ela fazia com a mente dele.

Da primeira vez que eles fizeram aquilo, ele sabia que ela não tinha chegado ao clímax, mas daquela vez seria diferente, era quase uma questão de honra. Beijou a boca dela ardentemente, correu os lábios e língua sobre os mamilos rosados que tanto o enfeitiçavam, investiu com mais força.

Ela grudou nos ombros dele, sentindo pela primeira vez na vida o momento em que seu corpo se despedaçava em milhões de fragmentos, como se lava escaldante estivesse correndo pelas suas veias, só para então serem reunidos novamente por uma amalgama ardente. E quando um espasmo a sacudiu bruscamente e o nome dele escapou num gemido dos lábios dela, Draco simplesmente sorriu com um orgulho visceral.

Cada instante que se passava o exaltava mais e ele aumentou o ritmo das investidas. Um sentimento de vitória o invadia, um que ele nunca tinha experimentado. Fechou os olhos, amando a sensação, amando o corpo dela.

Ele já tinha admitido para si mesmo que o que mais gostava era de ganhar. E ele tinha ganhado dela. Ganhado ela.

Ginevra se esticava entre seus braços, arqueando o corpo de uma forma extremamente excitante, como se tivesse programado para se encaixar ao dele. No instante em que esse pensamento cruzou sua mente - assustando-o levemente-, ela contraiu o corpo, relaxando languidamente na sequência e Draco soube que ela tinha chegado mais uma vez. Então ele se abandonou diante de todas aquelas sensações, desejando que eles pudessem ter feito aquilo antes, daquela forma.

Desejou que pudessem ter agido assim depois que se casaram, quando voltaram a se encontrar na Loja de Poções dela, que tivessem feito aquilo em Hogwarts…

Ele experimentou uma onda estranha de satisfação animalesca ao reivindicar o corpo dela.

No ponto onde o raciocínio perde espaço para os desejos e comandos do corpo, Draco pensou que ela seria dele e de mais ninguém.

Ainda que sua mente estivesse acostumada com a ideia de propriedade, foi espantoso ouvir os ecos de um passado evolutivo que rosnaram na sua mente um sonoro 'Minha!' quando ele se derramou dentro dela com um gemido quase sombrio, sentindo uma onda de prazer que fez todo seu corpo tremer e seus braços cederem sob seu próprio peso.

Havia ali algo mais do que sexo. Draco não era um idiota para negar isso. Algo quente e terrível, algo triunfante e assustador. Era algum sentimento, puro e implacável, uma estranha mistura de alívio, alegria, desejo e medo.

Ele, que tinha passado a maior parte da sua vida evitando tais sentimentos, não sabia o que fazer com aquilo. E, para complicar, ouviu a voz melodiosa de Ginevra o chamando de volta à realidade.

"Draco…"

Ele não respondeu.

Tinha escondido o rosto na curva do pescoço dela, cansado demais para se mover. A voz dela estava rouca e carregada de uma coisa que ele nunca tinha ouvido antes. Ele teve medo de levantar os olhos para ela e sentir que todo o encanto tinha se quebrado.

A realidade voltava pouco a pouco à mente de Gina e ela estava mais uma vez no salão feio, sobre o tapete fofo e levemente incomodada com o silêncio dele.

"Draco?"

Queria lhe dizer que estava apaixonada, que queria sentir aquilo infinitas vezes ainda. Mas ele estava tão quieto...

Será que foi tão ruim assim? Gina pensou, mordendo o lábio e condenando sua inexperiência sexual apesar dos dois filhos.

Depois de alguns instantes, ele finalmente cedeu e ergueu a cabeça suavemente. Seu rosto impassível permanecia enigmático, ainda que estivesse úmido com o suor. Contudo, Gina não se enganava mais pela falta de expressão, não quando podia observar os olhos dele. Escuros, da cor de tempestade, inundados de prazer. Ela sorriu e pousou um dedo sobre os lábios dele.

"O jeito que você fez amor comigo foi a coisa mais doce e gentil que alguém fez por mim." Ela disse suavemente, desejando passar todo os seus sentimentos através das palavras. "Obrigada, Draco."

Ele assentiu e abaixou a cabeça novamente, relaxando e descansando sobre o seio de Gina, como se tivesse medo do que pudesse responder.

Mas, mesmo com toda a cautela que ele tinha desenvolvido com os anos, sua mente estava nublada, grata, quase... feliz. Era uma sensação que ele pensou que havia esquecido e só se deu conta de que estava dizendo alguma coisa quando as palavras já tinham saído da sua boca.

"Eu usei a lembrança que eu tinha de nós dois do baile em Hogwarts para conjurar o patrono quando te salvei dos dementadores."

Sentiu que ela ficou tensa, mas foi absurdamente rápido. No instante seguinte, ela tinha rolado sobre ele, ficando por cima e voltando a beijá-lo com um ardor e ousadia que ele havia aprendido que combinavam com ela. Que combinavam com aqueles deslumbrantes cabelos vermelhos.

Subitamente, Draco teve a consciência de que tinha entrado num caminho sem volta.

***

E, como era de se esperar em situações como aquelas, alguém entrou.

Era Edril trazendo dois visitantes, Anthony e Isabelle Avery, que provavelmente tinham vindo intensificar o pedido que já tinham feito por coruja.

Ao se deparar com a cena de seu mestre – nu-, sob a mulher – também nua - o elfo correu até a lareira mais próxima para se castigar seja lá por qual falta que achou que tivesse cometido. O homem deu um risinho malicioso e a mulher ficou mais vermelha, de raiva e de vergonha, do que as cortinas do dormitório da Grifinória.

Naturalmente, eles viraram as costas e se retiraram rapidamente, soltando suspiros escandalizados e sem trocar uma palavra com os Malfoy.

Mais naturalmente ainda, Draco e Gina se olharam chocados por um segundo, então ele cobriu tardiamente os seios dela com as mãos e, um momento depois, quando os Avery saíram do ambiente com o que lhes restava da dignidade, Gina gargalhou verdadeiramente do absurdo da situação. Draco, por sua vez, cobriu a centelha de preocupação com as futuras fofocas que esse comportamento traria e mergulhou naquela imagem diante dos seus olhos, dos cabelos vermelhos caindo pelas costas e se entrelaçando nos seus dedos pálidos que ainda cobriam os seios dela, das bochechas coradas de felicidade, dos olhos escuros brilhando de divertimento e malícia.

E, também naturalmente, toda a sociedade comentava à boca pequena no dia seguinte.

Em uma mesa num elegante restaurante no Beco Diagonal, Avery tratava de passar a fofoca adiante mais uma vez.

"Em plena luz do dia, na sala de recepção da Mansão Malfoy! E há pessoas que falavam que os dois se odiavam! É o cúmulo do vício!" Ele terminou com uma risada gutural e virou seu copo de firewhiskey de uma só vez.

"Você acha que ele gosta mesmo dela?" Goyle, seu acompanhante, perguntou com a estupidez disfarçada em discrição.

"Merlin, se ele não está caidinho por ela, eu não sei de mais nada. Só vi Malfoy com aquela cara de cordeirinho diante do Lorde." O comensal disse, enchendo mais um copo. "E vou te dizer que gostaria de ter aquela mulher em minha cama também. O cabelo é um pouco chamativo demais, mas do jeito que a vi ali, só pude pensar em colocar minhas mãos por todo o corpo dela."

"Malfoy sempre fica com as melhores coisas." Goyle disse simplesmente, sendo corroído internamente por um sentimento de inveja e vingança dentro de si.

Contudo, tinha um consolo. Agora ele sabia onde atacar Malfoy.

Tirar de Draco o que ele mais gostava, como ele tinha feito uma vez, ao tirar Crabbe dele, seu único amigo verdadeiro, seu quase irmão.

Avery deu de ombros, já satisfeito por ter a oportunidade de espalhar a fofoca, e Goyle não pôde conter um sorrisinho estúpido que brotou nos seus lábios.

Só precisava ficar de olho na ruiva apetitosa e esperar o momento oportuno.

***

Em algum lugar ao sul da Espanha

Ele tinha que admitir que era bom dormir.

Tinha se sentido extremamente cansado durante tanto tempo da sua vida que agora aquele descanso era bem-vindo. Mais que isso, era idolatrado.

Ali, ele se sentia mais leve; podia passar seu tempo conversando com o pai ou com a mãe e as vezes até Sirius aparecia para dar um olá, trocar umas palavras.

Passavam horas falando de coisas do passado que ele nem sabia se tinham acontecido realmente ou se eram apenas fruto da sua imaginação. E a verdade era que a resposta para aquela dúvida não importava, não significava nada. O importante era ter a pessoas que amava ali, com ele.

Dumbledore também aparecia, mas cada vez com menor frequência; ele era mais triste e aborrecido que os outros, dizendo coisas que ele não queria ouvir.

Em algum lugar do seu subconsciente, sabia que seu corpo estava dolorido por ficar tanto tempo deitado. Mas a grande questão era outra.

Quanto tempo realmente?

E mais, ele se importava?

Naquele dia, ele tinha escolhido visitar A Toca, muito porque estava com muitas saudades de Rony… E de Gina.

Depois da última noite dele juntos, ele teve a convicção de que era com ela que queria passar o resto da vida… Se houvesse vida ainda, um pensamento chegou não convidado e ele o expulsou, como fazia com todos os outros pensamentos dessa natureza.

Ele olhou para as mãos espalmadas, tentando identificar se ainda estava vivo.

Possivelmente.

E possivelmente não dava a mínima também.

Teve sua atenção desviada desses pensamentos quando, atrás de si, ouviu o chão de madeira rústica estalar quando Dumbledore apareceu e, apesar de tudo, ele sorriu como se estivesse vendo um velho amigo.

"Olá Professor!" Ele acenou animadamente. "Dia bonito para um passeio, não é?"

"Certamente, certamente." O professor respondeu amável, ajeitando seus óculos de meia-lua e sorrindo indulgentemente. "Achei sua escolha de lugar interessante. A Toca sempre foi um lugar muito acolhedor."

O garoto-homem assentiu. "Aqui vivem as pessoas que eu mais amo no mundo."

"Ou viviam." Dumbledore completou, sem nunca deixar de sorrir de forma travessa.

Ele sentiu vontade de rolar os olhos. Lá vinha o Professor com aquela conversa mais uma vez. Fez um gesto com a mão, espantando a ideia. "Os Weasleys nunca deixariam a Toca."

"Eles podem não ter tido escolha." Ele não se lembrava muito bem do que aconteceu antes de ir dormir, como uma mancha nebulosa que era difícil de relembrar, mas Dumbledore parecia querer insistir sempre nesse ponto. "Nunca saberemos ao certo o que aconteceu, porque você escolheu ficar aqui."

"Por que não escolheria? É agradável, tenho meus pais e Sirius aqui, posso ir para lugares sem ter a obrigação de salvar o mundo." Ele deu uma risadinha sem jeito para encobrir seu desconforto.

O velho assentiu alegre, apesar da tensão da situação. "São vantagens realmente invejáveis. Muitos dariam tudo que possuem para viver num lugar como esse, manipulá-lo de acordo com seus interesses e necessidades." O garoto balançou a cabeça concordando e eles ficaram em silêncio uns instantes, ouvindo os pássaros cantarem e o sol brilhar lá fora. O garoto não admitiria, mas, apesar de tudo isso, se sentiu vazio e engoliu em seco, como se faltasse o principal.

Dumbledore voltou a falar. "No entanto, me sinto na obrigação de alertá-lo. Com certeza você se lembra de quando estava no primeiro ano e conheceu o espelho de Ojesed." Ele esperou o garoto assentir mais uma vez, antes de completar. "É como se você estivesse vivendo dentro dele, o que é ainda menos recomendável."

"É a minha vida." Ele cruzou os braços, rebelde. "Pela primeira vez quero decidir o que fazer com ela, sem cumprir destinos e profecias."

"Vida?" Dumbledore perguntou suavemente e o garoto se contraiu instintivamente.

"Não tenho mais nada para fazer acordado." O garoto se obrigou a dar de ombros diante da sua inutilidade. "O que está feito, está feito."

"E com relação às pessoas que te amam e que sofreram por você?" Dumbledore insistiu, sem nunca mudar o tom jovial.

Aquilo doeu, porque ele percebeu que sentia tanta falta das pessoas – de Gina, Rony e Hermione – que achava que ia sufocar. Ele se limitou a dar de ombros, sem achar as palavras para responder sem trair o que sentia.

"E com relação ao Neville?" Dumbledore fez outra pergunta e a frase atingiu o garoto-homem como um raio.

Pela primeira vez ali, ele teve lembranças de Neville. Não entendia porque não queria lembrar de Neville... Ele era seu amigo, um dos maiores, seu companheiro de Hogwarts, havia liderado em seu lugar, enquanto ele tinha ido caçar horcruxes...

Então, como se pudesse controlar as memórias ao seu bel-prazer, ele convocou as lembranças, uma a uma. E sentiu como se estivesse sendo esfaqueado. Aos poucos. Deliberadamente. Cruelmente.

Memórias de Neville se atirando a sua frente para salvar sua vida. De Neville fazendo por ele o que Lílian já tinha feito uma vez.

Então, como se sua mente estivesse livre de uma névoa pela primeira vez, ele soube imediatamente que não poderia mais ficar ali. Neville não dera a sua vida para que ele vegetasse, fosse egoísta e se isolasse dentro da sua própria mente.

Com um esforço sobre-humano, seu consciente foi sobrepujando o subconsciente. A figura magra de Dumbledore – agora com um sorriso mais largo no rosto, como se finalmente tivesse acertado o ponto - começou a se desfazer numa névoa grossa, junto com resto d'A Toca, dos pássaros, do sol.

Sentiu todos os músculos do corpo doerem, mesmo estando em cima de uma cama macia. Gemeu levemente, com a boca extremamente seca, como se tivesse tomando uma poção ruim durante semanas.

Então, com um último esforço considerável, Harry Potter abriu os olhos.

Estava de volta à realidade da qual havia escolhido se separar por muitos anos.


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Notas finais do capítulo

Rose, te darei uma resposta a altura da próxima! Sorry!



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