Cinzas escrita por Ludi


Capítulo 1
E a Vida Continuava para os Outros


Notas iniciais do capítulo

Hey! Essa é uma história cujo rascunho eu escrevi há muito tempo e ficou jogado no meu pc, correndo o risco de ser devorada pelas mazelas do mau armazenamento de dados. Resolvi publicar seguindo a velha linha de raciocínio de que, nós, como leitores impiedosos, julgamos e criticamos (na verdadeira acepção da palavra) o tempo todo, então é uma experiência válida se nos colocarmos na outra ponta da relação: deixar que os outros julguem, aproveitem e critiquem nossas histórias. Não deixa de ser um ato de coragem, haha (pelo menos para mim)Sobre a história em si: ela é quase toda narrada na visão da Gina, ainda que não seja em primeira pessoa, estritamente. É provável que em algum momento eu troque momentaneamente de POV, mas será apenas casual. Eu tentei seguir os nomes adotados na tradução aqui no Brasil, mas às vezes escorrego, voluntaria ou involuntariamente, dependendo do caso; tem algumas traduções que ficaram muito, muito feias mesmo. Ah, com relação à cronologia: os primeiros capítulos seguem fielmente a cronologia de Relíquias da Morte até o final da Batalha de Hogwarts, então se você não leu o livro ficará bem difícil entender qualquer coisa.



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1 – E a vida continuava para os outros.

Março 1998

A chuva é uma coisa engraçada. Ela sabia que esse era um estranho pensamento para se ter num momento como aquele, mas era justamente o que ela vinha pensando nos últimos instantes, aninhada e abraçando os próprios joelhos no limiar de uma janela, enquanto via as pesadas gotas de chuva castigarem os vidros das grandes janelas do castelo. A chuva tinha várias facetas, que podiam fazer você sentir verdadeiramente vivo, como quando as gotinhas de água batem no seu rosto e te fazem sorrir com a sensação de ficar contra elas. Ou podiam simplesmente arruinar suas esperanças, fazer com que elas escorressem por você como a água que encharca sua roupa e escorre pelas extremidades dos seus membros. E te deixar vazio.

Ela é cinza; podia ser boa ou ruim, depende do ângulo que você encara. Depende do seu momento.

A garota gostava de observá-la porque a chuva não traduzia a realidade maniqueísta dos últimos tempos; funcionava mais ou menos como uma válvula de escape que não envolvia cerveja amanteigada ou atividades mais ilícitas.

O nome da moça introspectiva era Ginevra Molly Weasley, tinha dezesseis anos e vivia num mundo que parecia se equilibrar numa corda bamba diante de uma platéia com o fôlego preso. Ninguém sabia para qual lado ele iria pender.

A vida dela tinha um lado branco, feliz. Que dava vontade de levantar de manhã e gritar para o mundo que, depois dessa 'crise', ela seria a mulher de Harry Potter, o Menino-Que-Continuava-Sobrevivendo. Não passava pela cabeça dela que depois de tanto tempo e de tantas lutas as coisas se encaminhassem mal. Era uma questão de destino, de justiça. O lado branco da vida dela também englobava sua família, aqueles que a cercavam de amor do mesmo jeito que um casulo cercava uma borboleta prestes a se transformar, ainda que essa comparação não fosse muito boa: crescer com seis irmãos mais velhos fizeram com que ela tivesse a graciosidade de um hipopótamo, não de uma borboleta. Mas ela não se importava, contanto que eles estivessem com ela. Contanto que Harry também estivesse com ela.

E então havia o lado negro da sua vida. Que parecia estar sempre à espreita, esperando o menor vacilo. O lado negro que fez com que ela quase morresse durante seu primeiro ano em Hogwarts por causa de um maldito diário enfeitiçado que pôs toda a escola em perigo; o lado negro que a fez literalmente correr pela vida no Ministério da Magia no seu quarto ano e que era o responsável por todo esse clima de tensão que deixava o ar quase irrespirável. O lado negro que levara Olho-Tonto Moody em julho, Dumbledore um ano antes, que desfigurara Gui. O lado negro que a afastava dele. Ela sentia tanta falta de Harry que as vezes achava que ia sufocar. Tanto pela ausência dele quanto pelo fato de ter sido condenada a ficar em Hogwarts enquanto ele se enfiava sabe-se lá onde com Rony e Hermione. E a mágoa que ficava era porque ela tinha certeza que já tinha dado provas suficientes no que dizia respeito a sua capacidade e entrega. No final das contas, ela nunca ia deixar de ser a irmã caçula, menina frágil que precisava ser protegida. E ela odiava isso.

Eles nunca tratavam Hermione dessa forma. E por 'eles', ela definia metade do mundo mágico.

Mas ela continuava provando seu ponto, fazendo sua parte. Pelo menos é o que ela vinha tentando fazer em Hogwarts, desde que tinha saído d’A Toca do início de setembro do ano passado. Junto com a Armada de Dumbledore (ou pelo o que havia restado dela), ela formava o foco de resistência contra a influência de Você-Sabe-Quem em Hogwarts. E só Merlin sabia como isso estava custando caro: se antes as passagens pelas detenções se resumiam a horas de tédio e mais tédio fazendo alguma atividade que envolvesse lidar com livros empoeirados e animais viscosos, agora a coisa tinha realmente mudado de figura. Não era raro quando um aluno voltava para de uma dessas sessões de tortura disfarçadas de detenções incapaz até de andar direito com as próprias pernas. Isso era verdade principalmente para Neville; contra todos os prognósticos do Universo, ele vinha se mostrado um líder valoroso. E isso enchia o coração dela de ternura em relação a ele.

A coisa havia começado quando ela, Neville e Luna tentaram roubar a espada de Godrico Grifinória da sala do, agora diretor, Severo Snape. Eles haviam sido enviados para a Floresta Proibida e suas idas a Hogsmead foram banidas; Gina achou que esse era o máximo da punição que eles receberiam, mas então, depois disso, a parte disciplinar da escola ficou a critério de Aleto e Amico Carrow, que assumiram os postos de Professores de ‘Estudo dos Trouxas’ e da recém criada ‘Arte das Trevas’. Gina sentiu um arrepio diante da lembrança. Agora os estudantes eram obrigados a praticar maldições imperdoáveis em quem estivesse em detenção. O estômago de Gina dava voltas e voltas diante da ideia.

A pior parte, além de não ter notícias do mundo exterior, era ter que aturar as excentricidades dos irmãos Carrow. Hogwarts parecia um cemitério cheio de almas penadas vagando pelos corredores. Obviamente, efetivamente havia almas vagando por lá, mas o contexto era bem diferente.

A última ideia brilhante deles fora a de promover uma espécie de confraternização, para provar que o mundo mágico está unido sob um só estandarte. As quatro grandes casas de Hogwarts deveriam se unir, um sinal claro de que não havia mais espaço para a diferença e a pluraridade; essa ‘confraternização’ seria o primeiro passo rumo a homogeneidade. Mas o toque de masoquismo ficou mesmo a cargo dos irmãos comensais, que acharam que seria interessante (para não dizer engraçado) determinar os pares para a ocasião, criando potenciais situações de embaraço e punição para os envolvidos. Parecia desnecessário dizer a essa altura que se negar a comparecer a esse baile idiota poderia trazer mais problemas do que benefícios. E além do mais...

“Hey, Ruiva.”

Ela foi tirada abruptamente dos seus pensamentos.

E era exatamente nessas horas que todo o vocabulário proibido dos irmãos mais velhos e a necessidade de se ter um taco de quadribol em mãos pareciam brotar na mente dela. Blaise Zabini tinha saído de um canto sombreado no corredor, já parecendo estar pronto para a sessão de tortura disfarçada de baile. Ainda era muito estranho ter qualquer conversa civilizada com ele, mas de qualquer forma a presença dele era mais reconfortante do que a de um dos Carrow.

“Olá para você também, Zabini. Muito bom saber que seja normal para a boa educação recebida entre os de sangue puro espreitar meninas indefesas pelos corredores.” Ela falou frisando o ‘boa educação’ com ironia.

“Em primeiro lugar, você também é sangue puro, apesar dos pesares. Em segundo lugar, no dia que você for uma menina indefesa, Você-Sabe-Quem começará a usar feitiços para descongestionamento nasal.” Ele disse com sua voz constante. “E eu já presenciei uma ou duas conseqüências das suas azarações para verificar por mim mesmo o quão desprotegida você pode ser.”

Ela mordeu o lábio inferior para evitar um sorriso não desejado. Se alguém dissesse para ela, há alguns meses, que ela chegaria a ter alguma coisa perto de uma amizade com Blaise Zabini, ela mesma daria uma carona para essa pessoa até o St Mungus. Ainda que mais reclusos que seus amigos sonserinos, Blaise nunca havia feito questão de esconder seu desprezo pelos nascidos trouxas. Embora contasse ao seu favor o fato de que ele sempre dera a entender que desprezava quase todo mundo, independente da origem. A verdade é que Blaise vinha se mostrando um alívio quando aparecia com suas tiradas ácidas, seu cinismo para com o mundo e seu jeito constante. Gina ponderou, não pela primeira vez, que era isso que faltava para ela naquela época: Constância.

É claro que ela estava longe de pensar que Blaise Zabini era o novo paladino da luta contra o Lorde das Trevas, capaz de forjar uma cicatriz na testa e sair derrotando Comensais da Morte. Talvez o que a atraísse na presença dele fosse justamente isso; estava acostumada com um mundo tão ‘o bem contra o mal’ que encontrar uma pessoa que não pendia exatamente para nenhum lado fazia a curiosidade dela acender automaticamente. E assim, desde uma detenção na qual ela fora forçada a ficar quatro horas sob a supervisão dele (que deveria, supostamente, infringir alguns tipos moderados de tortura), a convivência deles aumentou consideravelmente. Ele era bem agradável de conversar, desde que se ignorasse o fato de que ele era um bastardo egocêntrico.

Em essência, Blaise era isso: extremamente egoísta. Ele não era fiel a nenhuma ideologia, a nenhuma causa. Não gostava de fundamentalismos de nenhuma espécie, nem arriscava o pescoço por ninguém. Ele queria (e iria, ela tinha o pressentimento) estar do lado que ganhasse. Mas pelo menos ele era divertido e fazia com que ela esquecesse, por breves momentos, da grande porcaria que era viver no meio da guerra.

Uma coisa que Gina havia aprendido é que na guerra não se escolhe aliados; você simplesmente aproveita os que lhe são dados. Ela saltou do limiar da janela, se espreguiçou num dos seus movimentos tipicamente felinos e começou a caminhar.

“Não é de bom tom fazer piadas desse tipo nos corredores de Hogwarts atualmente, Blaise” ela suspirou, ainda lutando contra um leve sorriso. Não se sentia no direito de sorrir enquanto Harry e Rony estavam passando fome e frio ou enquanto a Armada de Dumbledore era caçada incessantemente.

“Assim como não é de bom tom escolher um vestido marrom quando se tem esses cabelos flamejantes. Parece que estou olhando para uma mancha de ferrugem.” Ele torceu o nariz aristocrático na direção dela. “Mas assim é a vida, minha cara grifinória. Bom gosto é como o dinheiro, uns tem tanto, outros tem tão pouco.” Ele sorriu malicioso.

Ela comparou o vestido marrom recatado com rendinhas douradas nas mangas e na barra com o traje elegantemente feito sob medida para ele. Era de um azul escuro que de certa forma combinava com a pele negra e bonita de Zabini. Por um breve instante, ela se sentiu como se estivesse vestindo um vestido feito sob encomenda para a sua avó. Mas foi muito breve. Não era o momento de se apegar a essas futilidades.

O fato relevante era: ela não se importava mais com as tiradas de Blaise a respeito da sua condição financeira porque geralmente elas vinham acompanhadas de algum comentário ainda mais venenoso sobre alguma outra pessoa, não importando classe, condição financeira ou status de sangue. Como os comentários que ele sempre fazia sobre a inteligência limitada de Pansy Parkinson.

Gina aproveitou a chance.

“Nesse caso, fico feliz que você tenha conseguido um par que tenha muito dinheiro e péssimo gosto.” Ela falou, meio sorrindo, meio séria. “Aposto que vai ter uma noite bem divertida com a Parkinson.”

Ela sentiu que ele ficou desconfortável “Touché. Não sou muito dado a revirar o lixo deixado pelos outros,” ele disse com o orgulho um pouco ferido, para completar com um tom absurdamente malicioso. “ainda que eu ache que o Malfoy não se importará muito com o que eu venha a fazer com Pansy, dado que estará em companhia muito mais interessante.”

Gina ruborizou automaticamente. De raiva. Ter que ir ao um baile despropositado já era ruim o bastante, mas terem escolhido Draco Malfoy como seu acompanhante era digno de queima na fogueira. Desde o final do ano anterior, só a imagem dele parecia fazer o estômago dela descer uns bons centímetros. Dumbledore. Culpa dele. Gui. Culpa dele. Luto em Hogwarts. Tudo culpa dele e daquele armário sumidouro maldito.

Depois do anúncio dos pares, ela havia ficado uma semana de mau humor absoluto. Ela comprovou a veracidade do ‘Nada nunca é tão ruim que não possa piorar um pouco mais.’

De toda forma, parecia que a influência dos Malfoy no círculo dos Comensais da Morte estava desgastada. Que a escolha do par era uma punição para Gina não havia dúvidas; ainda que a companhia de Zabini causasse uma impressão de que ela pudesse estar de alguma forma se inclinando ao lado negro da força, essa impressão era muito fraca comparada ao fato de que a família dela ainda era uma traidora de sangue e que ela havia sido a namorada de Harry Potter.

Mas a ‘punição’ para o Malfoy só poderia significar uma coisa: A família dele estava encrencada com Você-Sabe-Quem. Depois dos acontecimentos no Ministério da Magia e na Torre de Astronomia, alguma coisa havia dado muito errado para eles. Muito provavelmente fosse o fato de que Draco Malfoy tivesse falhado na sua tentativa de matar o Professor Dumbledore, ainda que ele tivesse sido o responsável por criar todo o caos em Hogwarts naquela noite. Mas sobre isso, Gina só poderia fazer conjecturas.

“Ah sim, a acompanhante dele é uma pessoa muito distinta. Uma pena que, na visão dele, ela valha menos do que um grindylow desdentado.” ela disse distraidamente.

Dessa vez Blaise riu. Ele não fazia isso com freqüência e Gina pensou que o sorriso fazia o semblante dele ficar muito mais leve. “Então presumo que a feliz acompanhante se importe com o valor que o jovem Malfoy dá para ela?”

Mais uma vez, o estômago dela se contorceu. Dessa vez, devido à náusea que a simples piada de Zabini causava. Ela não pôde deixar de pensar em todos os problemas que o Malfoy tinha criado no final do ano letivo anterior, nos ferimentos de Gui e em como Harry havia terminado com ela no velório do Professor Dumbledore.

“Mais fácil eu estar preocupada com a opinião do Snape sobre o meu vestido” ela falou com mais rancor do que pretendia. O único pecado de Zabini era de ser um grande bastardo egoísta e, por enquanto, não merecia uma dose extra do gênio Weasley.

“Hm, duvido um pouco que o gosto dele seja confiável. Mas de qualquer forma, você pode pedir para ele alguns conselhos sobre como lavar os cabelos. Ou não.” Ele havia voltado para o seu jeito introspectivo e Gina se surpreendeu, não pela primeira vez, como Blaise não parecia se importar com ninguém a não ser consigo mesmo.

Levantando a barra do vestido até uma altura que a permitisse andar um pouco mais rápido, Gina acelerou o passo em direção ao salão destinado a ‘confraternização’. Draco Malfoy não tinha se dado ao trabalho de tentar entrar em contato com ela, embora verdade seja dita, ela também não tinha feito nenhum esforço para tal. Como a maioria dos pares foi formada arbitrariamente de forma desagradar os envolvidos, os murmúrios que corriam pela escola davam conta de que o melhor era se encontrar na porta do Salão Principal, se mostrar aos irmãos Carrow, fazer cara de quem chupou limão e sair dali o mais rápido que possível.

Virando entre corredores, com Zabini em silêncio nos seus calcanhares, Gina tinha o pensamento fixo no término da noite. Andava mais rápido como se isso pudesse antecipar o final dessa baboseira, seus sapatos ecoando levemente contra as paredes de pedra do castelo. Blaise parecia caminhar com muito mais classe e desenvoltura, sequer se esforçando para acompanhar os passos dela. Quando viraram no corredor que dava acesso a um das salas, viram duas figuras arrastarem uma terceira, que parecia mais inconsciente do que desperta. De certa forma, a presença de Zabini deu a ela a coragem para se aproximar do trio que se movia lentamente. Diante da cena, Gina prendeu a respiração.

Neville jazia entre dois marmanjos e cambaleava na tentativa de ficar em pé. Um corte sangrava sobre seu olho direito enquanto seu olho esquerdo estava tão inchado que parecia um simples risco no mar de protuberâncias roxas que era o lado direito do seu rosto. Ele parecia estar vestido com um traje de festa, mas tão decomposto que Gina não ficaria surpresa se ele tivesse dito que tinha sido atropelado pelo Expresso de Hogwarts. Depois de beber cinco garrafas de firewhiskey.

“Por Merlin, Neville! O que aconteceu com você?!” ela disse ofegante, se aproximando do grupo.

Os trogloditas que o carregavam (que imediatamente Gina reconheceu como Vicente Crabbe e David Urquhart) tentaram bloquear seu caminho, mas a figura de Blaise Zabini, imóvel e imponente como uma estátua atrás dela de algum modo intimidou maiores reações dos ‘guardas’.

“Ah, oi Gin!” ele falou com dificuldade “Não é nada, sério. Só fui levar pessoalmente minhas considerações para os Carrow sobre o que eu achava da idéia de se fazer um baile nessas condições. Acho que eles não gostaram muito da minha manifestação.” Ele terminou a frase com um misto de riso e tosse, que fez com que o corpo dele balançasse meio inerte entre os dois trogloditas.

Na mesma hora, Gina olhou para seu traje, preparada para ir a um baile e se sentiu a mais deplorável das pessoas, que se submetia aos caprichos de um grupo de lunáticos. Teve vontade de rasgar seu vestido, empunhar sua varinha e dizer ao mundo que lutaria, como seus irmãos, como Neville.

Neville, que já começava a ser arrastado novamente para seja lá onde fosse seu destino, percebeu a reação dela e disse com o máximo de gentileza que seu estado permitia “Relaxa, Gin. Cada um luta à sua maneira, do seu jeito. Isso não quer dizer não lutar.” Ele terminou dando uma piscadela para ela, mas o efeito foi totalmente neutralizado pelo aspecto do seu olho. No instante seguinte, Crabbe desferiu um chute violento em um das pernas de Neville, que foi ao chão como um grande saco de aveia. O sonserino riu como numa rara ocasião em que contaram uma piada que ele pudesse entender. Gina tentou reagir, mas a mão que procurava a varinha foi menos rápida do que a mão de Zabini, que segurou a sua.

Seu olhar de pedra obviamente dizia ‘não faça nada que possa se arrepender’. Gina se soltou bruscamente e saiu andando a passos rápidos na direção oposta à cena, por sua vez enviando um claro recado de ‘não ouse me seguir’. Blaise era muito bom em entender meias palavras. Nesse caso, nem isso fora necessário. Iria dar um jeito de ver Neville quando conseguisse se livrar do estúpido baile.

Gina apertou os olhos tentando conter as lágrimas. Se lembrou do seu primeiro baile em Hogwarts, quando Neville a convidara para ir com ele, no que parecia séculos atrás. Sentia falta daquela época. Sentia falta do seu quarto com os pôsteres d’As Esquisitonas na parede, de como sua mãe comandava louças e talheres que flutuavam no ar numa dança tão familiar, sentia falta de Luna, que havia sido sequestrada do Expresso de Hogwarts pelos comensais no Natal, de Hermione, dos gêmeos, de Harry. Merlin, como ela sentia falta de Harry. Sentia falta de tudo que havia perdido no último ano, depois do velório de Dumbledore.

Ela balançou a cabeça, fixando na mente a ideia de Neville. Ela lutaria, sim. Mas uma batalha de cada vez. Nesse exato momento, ela precisava sobreviver a essa noite que tinha tudo para ser uma das memórias que ela, de boa vontade, tiraria da cabeça quando tivesse uma penseira à disposição.

Gina diminuiu o passo, para ganhar algum fôlego; normalizou sua respiração, tentou prestar atenção nos detalhes da sala que antecedia o Salão Principal, que outrora havia sido tão bem decorado para o Baile de Inverno na época do torneio Tribruxo. Não havia tanto brilho e a iluminação estava mais fraca, mas o mais diferente, com absoluta certeza, eram os rostos das pessoas, que antes haviam sido felizes - cheios de expectativa com relação aos encontros, à música, à comida, aos murmúrios que o Baile geraria no dia seguinte - agora só mostravam ansiedade e desgosto, na espera por seus pares indesejados.

Ela pensou, fungando entro o choro e o humor desesperado, que aquele lugar era como a sala de espera do St. Mungus, onde as pessoas não sabiam muito bem o que encontrariam na sala ao lado, mas com certeza não seria algo muito agradável. As portas do Salão Principal já estavam abertas, mas Gina não conseguia ver ao certo o que havia lá dentro. No momento em que ela ia aprofundar a inspeção, sua atenção foi desviada.

Lá estava ele, parado, de costas, encostado num dos pilares que davam sustentação ao teto monstruosamente alto daquela parte do castelo.

Era agora. Hora de lidar com Draco Malfoy.


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