A Natureza das Ondas escrita por Enki


Capítulo 6
Capítulo 06 - Voltamos ao Mar




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Houve a condecoração minha e do Comandante. A festa continuou por mais algumas horas. No final, procurei Cooper e o encontrei a caminho da saída. Ele falou para que eu aproveitasse a festa, mas ele já estaria saindo, pois aquele não era o seu lugar. Como ambos não estávamos muito à vontade, acompanhei-o. Saímos do palácio e fomos a taverna mais próxima. O ambiente era mais acolhedor, logo nos sentíamos em casa. As pessoas bebiam e gargalhavam, como em uma festa boa de verdade. Então ele fez uma insinuação sobre ter encontrado a princesa Ariel em meu quarto.

“Você não está pensando que eu... nós...” Eu retruquei.

Ele não respondeu.

“Pelo amor de Luna, Peto," esse era seu primeiro nome, que eu só usava quando estávamos em um ambiente mais descontraído "eu não fiz nada. Ela só foi lá ver como eu estava. Além do mais, ela tem o que, quinze anos?”

“Dezesseis.”

“Ou isso. Eu não me envolveria com a garota, você sabe.”

“Você não, eu tenho certeza. Mas essa gente pouco se importa conosco, nos usam como querem sem pensar nas consequências, porque sabem que nada irá acontecer com eles. Mas quando você vê, soldados batem na sua porta e o levam para a prisão. Botam-no numa cela e jogam a chave fora. Ninguém se importa, porque você não faz diferença nenhuma e nunca mais vai ver o céu que não seja de uma janela com grades. Falo isso porque já vi acontecer muitas vezes, até com caras mais novos que você. Não se envolva com essa gente. Para o seu próprio bem.”

Tentei imaginar a menina que eu conheci se aproveitando das pessoas desse jeito. Não consegui.

“Eu vou tomar cuidado e não me vou envolver.” Falei para confortá-lo, mas isso não seria preciso.

Ele também já não prestava mais atenção em mim, mas numa mulher que se oferecia na mesa do lado.

“Eu vou aproveitar o restante da noite. Você vem?” Ele perguntou.

Um ano depois que fazia parte da tripulação de bordo do Capitão Cooper que começamos a ficar mais próximos. Na época, eu estava com dezessete anos quando nós começamos a conversar mais. Quando íamos aos bares, ele estranhou eu não passar a noite com nenhuma mulher e me perguntou se já tinha feito aquilo alguma vez. Desnecessário dizer qual fora a resposta.

“Garoto, a vida é muito curta para você não aproveita-la.” Ele havia dito depois de várias garrafas de rum. “Venha, vamos resolver isso.”

Minha primeira vez foi com uma mulher que ele escolheu. Segundo ele, era a melhor do lugar e ficou no quarto observando o que fazíamos. Nos meses seguintes, toda vez que íamos a um lugar desse gênero, ele me arranjava uma até que certo dia ele mesmo se deitou com nós dois. Depois me falou que foi para avaliar se eu tinha aprendido direito, mas eu duvido. Naquele dia ele estava muito, muito bêbado, mais do que costumava ficar quando íamos para os bares. Repetimos mais umas vezes desde então até que ficou normal ele me perguntar se eu queria me juntar a ele quando ele pretendia se deitar com uma mulher. Naquela noite especifica, depois do baile, eu não estava muito afim.

“Dessa vez não, Peto. Vou ficar aqui. Deixa para a próxima.”

Ele foi. Podia-se perceber que ele estava animado só pelo sorriso que tinha no rosto. Eu ri. Pedi mais uma garrafa de cachaça e a tomei. No dia seguinte, voltamos ao navio e zarpamos mar adentro. O rei tinha pago os consertos do nosso navio por causa da luta contra o monstro e depois dos dias que ficamos lá, nossa nau já estava pronta. Havíamos sido chamados para reforçar tropas na Baía cristal que estava sendo atacada por alguma coisa que não ficou claro na carta de convocação. Em um dia alcançamos as Ilhas Morella. O segundo foi inteiramente em mar aberto. Pegávamos a corrente nor-noroeste e até ultrapassarmos três dias depois o Mar Caldante, cujas águas eram sempre mornas, pela manhã ou noite sem motivos aparentes. Então abandonamos as correntes para seguir em águas mais calmas. Dale era o melhor navegador que tínhamos arranjado. Não era muito viajado, mas conhecia bons caminhos. Ele sabia as correntes marítimas tanto quanto os ventos e organizava nosso curso correlacionando os dois. Sabia onde as tempestades costumavam se formar assim como onde os ventos eram rápidos. Estávamos sempre com velocidade depois que ele assumiu o cargo. Entramos, portanto, nos ventos do norte e mantínhamos subindo várias léguas. Demorou exatamente mais oito dias para chegarmos a baía cristal, treze dias de viagem no total.

No fim da manhã do decimo segundo dia, já era possível ver a baía em forma de arco que era nosso destino. Atracamos no final do dia e recebemos ordens do sargento local de que descansássemos. Nossa função ali seria designada no dia seguinte. Eu e o vigia Colby fomos arranjar suprimentos para o navio. O depósito do cais estava meio vazio, então demoramos menos do que esperávamos. Resolvemos aproveitar o tempo livre para ir a cidade. Já estava meio escuro quando atravessamos as ruas. Tudo bem que a noite já tinha chegado, mas não estava tão tarde para as ruas estarem tão desertas quanto nós encontramos. Eu estranhei, mas Colby com certeza já começava a imaginar motivos tenebrosos para não haver nenhuma pessoa na rua.

Tínhamos acabado de encontrar um mercado de vegetais e confabulávamos sobre ele estar fechado quando escutamos um estranho som ecoar no ar. As letras criadas pelo homem não são suficientes pra representar o barulho desconhecido que escutamos. Era algo entre um guincho de dor e uma reverberação grave como o ranger de madeira. Quando nos damos conta, o som vinha da praia. Por alguns segundos, poucos segundos e nem um pouco mais, um estranho brilho na água escura se fez, para, em seguida, deslizar sob as ondas e desaparecer pouco a frente. Era do tamanho da minha mão, mas considerando a distância que eu estava da praia, de perto, o que quer que tenha causado aquele brilho, devia ser imenso.


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