– Temos uma novata hoje. – o meu novo professor de inglês falou, e é claro que a novata era eu. Minha mãe insistiu tanto que conseguiu com que meu pai me colocasse em um desses cursinhos de inglês. Ela disse que eu gastava muitas partes da minha vida pensando em futilidades, o que não é nada verdade. Mas agora eu estava lá, numa sala lotada, acenando para o meu novo professor, nada legal, aliás. – Você não quer se apresentar para a galera, Alice?

– Sim. – falei. – Eu sou a Alice e...

– Venha até aqui! - ele convidou. Humf. De qualquer forma, eu fui. Era muito pior se apresentar para as pessoas lá na frente. A mamãe me paga.

– Bem, como eu estava dizendo, me chamo Alice. Mas o professor já tinha mesmo me chamado assim, então... É. Eu moro em um condomínio nessa rua, e estou aqui porque fui obrigada! – todos me olharam como se eu fosse uma maluca – Hã, não, quer dizer, estou aqui porque aprender inglês é muito importante hoje em dia, obviamente. Ta,é isso. Valeu!

Dei tchauzinho para “galera” e voltei ao meu lugar. Era isso. Divertido. Ok, músicas em inglês são a melhor coisa. A Demi Lovato arrasa, e one more time da Britney é hino, mas, pelos duendes, todas essas regras e coisas dão vontade de sair correndo. E foi justamente isso que eu fiz, quando a aula finalmente acabou. Não correndo literalmente, pois realmente correr não é comigo. Andando rápido, apenas.

– Você mora aqui perto, então. – uma garota morena falou, se pondo ao meu lado.

– Sim. – respondi.

– Sou a Martha. Olá.

– Martha, sério? Caramba! A terceira Martha! Isso é completamente minha nossa! Sabe, eu nunca daria o nome Martha a minha filha. É um nome perfeitamente aceitável e até bem legal, mas já existem Marthas suficientes, por favor.

– Deve ser. Mas, na verdade, nunca conheci nenhuma outra Martha.

– Sorte sua! – respondi. – Se bem que a Martha número dois foi legal comigo. E a anãzinha nem é tão cruel.

– Ah.

– É. Ei, eu tenho que ir andando até o meu condomínio, porque é claro que os pais tinham que fazer alguma coisa para me castigar por ser assim tão incrivelmente linda e fofa. Eu tenho um super carma! Devo ter sido uma pessoa realmente horrível nas minhas vidas passadas. Talvez uma maquiadora sem talento ou coisa assim. Você quer vir?

– Tenho que esperar meu padrasto, obrigada. Nos vemos próxima semana!

– Infelizmente. – eu disse. – Não pelo fato de te ver, mas pelo fato de ter que voltar aqui. Eu acho que prefiro até comer salada de tomate. Ah, whatever. Até próxima semana.

Ir andando para casa. Melhor dia da minha vida. Aplausos, por favor. Certo, estou mal humorada. Mas tenho muitos motivos!

– Tenho uma surpresa para você. – a Victoria falou, quando cheguei à minha casa.

– Bolo de chocolate! – exclamei. Seria algo que me faria ficar mais feliz, certamente.

– Que bolo de chocolate, menina! Modelo não come isso não. Seu vestido de Julieta chegou. Você não tinha pedido emprestado para aquela mulher lá?

– A professora de teatro da escola. Ela é bem legal. Onde está?

– No seu quarto. Deixei lá.

– Obrigada, Vic! – agradeci, pulando rapidinho os degraus da escada. Havia uma caixa gigante na minha cama. As roupas dos garotos ela não tinha, mas eu iria aluga-lás com a tia da Alissa, minha vizinha. Sairia grátis: A melhor parte. A roupa das outras garotas também, o que incluía apenas a anãzinha e a Alissa. E o trabalho era para essa segunda-feira, ou seja, teríamos que terminar tudo no final de semana. E já era quinta!

O vestido é completamente perfeito. Longo, num tom de rosa incrível. É um rosa mais claro, muito fofo. Tomara que caia (enquanto eu torço para que não caia) e acinturado. É um pouco simples, sem detalhes, mas combina perfeitamente com o que eu desejava. A saia também não é muito volumosa. Usarei com uma espécie de xale por cima, da mesma cor, apenas um pouco transparente. A Mel aceitou ser a nossa maquiadora particular, afinal, o Pedro também estará lá para gravar o vídeo. Eu já havia até decidido o penteado: Um coque. Como o da Taylor Swift em Love story. Depois de ligar para a professora Anna, a de teatro, e agradecer a ela, resolvi ligar para o Jake. Por causa do trabalho, é claro.

– Oi. – falei.

– Oi.

– O vestido chegou. Já aluguei a roupa dos garotos. O cenário está perfeito?

– Eu não diria perfeito.

– O que? O que você fez, idiota?

– Eu? Eu não fiz nada! Olha só, está tudo dando certo. Relaxa.

– “Relaxa”- repeti, imitando a voz do dragão ocidental. – Se algo der errado, cabeças vão rolar.

– Ah, ual. A princesinha está estressada.

– Vai pentear macaco! – respondi, e desliguei. Está tudo dando certo. Eu realmente espero.

* * *

Enfim, chegou o grande dia. Se eu estava mais relaxada? Isso com certeza não. Eu estava muito pior. O vídeo começaria num parque, com o Bruno (que seria um Capuleto) e o Marcos (representando um Montecchio) no maior fight. Aí o príncipe de Verona (no caso, o Pedro meu quase vizinho idiota) chegaria lá e declararia “que irá punir com morte as pessoas que colaborarem para mais uma briga de ambas as famílias”. Tínhamos até arranjado um cavalo para o Pedro chegar lá com estilo. A gravação começou de manhã, sete horas, porque pensamos que o parque estaria mais vazio. Mas nem estava. De qualquer forma, deu tudo certo na primeira cena.

A segunda cena é o baile, onde usarei meu vestido rosa. Mas iremos grava-lá em um salão de festas, cujo dono é o pai do Rafael. Vai ter um cara que me “cortejará”, o Páris. Esse aí já havia me pedido em casamento ao meu pai. O Páris será interpretado por um amigo dos meninos. Ele é até bonitinho, mas nenhum deus grego. Talvez por isso que a Julieta tenha preferido o Romeu. Não que eu prefira o Jake. Então, estávamos agora em uma mini van, indo em direção ao salão de festas. Eu me trocaria lá, já que sentar com o vestido longo é meio complicado, mas os meninos estavam devidamente vestidos com roupas de época.

Paralelo à cena em que sou cortejada, o Romeu conversa com um cara lá, o Benvólio, e decide ir ao baile para se encontrar com Rosalina, sobrinha do meu “pai” Capuleto por quem ele estava apaixonado. Mas ele acaba por encontrar a Julieta (eu!) e se apaixona por ela.

– Chegamos. – o Rafael anunciou, e todos nós descemos do veículo. A Alissa (minha vizinha) e a Martha (número um) estavam super amiguinhas, já que elas têm tipo a mesma idade. O Gabriel e o Luan tinham arranjado outros atores também, como o que vai interpretar o Páris, o que vai ser o Benvólio e etc. O Eduardo havia arranjado umas atrizes.

O salão de festas é muito incrível. Parece mesmo um castelo! Cheio de coisas douradas, enfeites maravilhosos. Até o banheiro é perfeito. E cheiroso. Coloquei meu vestido (com a ajuda da anãzinha, que não parou de reclamar um minuto. “Ai, Alice, fica quieta!” “ih, parece que você engordou” “ops, o zíper não quer fechar. Tá mais gorda mesmo”) e fui ver como estava tudo. O nosso câmera (que, no caso, agora era o Marcos Zac Efron) anunciou que iríamos começar a gravar. Mas é claro que não podia ser tão simples. Quando eu finalmente cheguei ao salão principal, o Romeu maldito me puxou para o outro lado do universo.

– Ei! – protestei.

– Vamos ter que dançar valsa.

– É, e daí?

– Você sabe dançar valsa? – O Jake/Romeu perguntou, com a cara de preocupação mais engraçada do mundo. Mas eu não ri porque estava com raiva.

– Dãã! É claro que eu sei. Tive que aprender para o meu aniversário de 15 anos. Sério, mané, porque você não falou que não sabia dançar, tipo, antes?

– Eu não sabia que teríamos que dançar.

– Agora não dá mais tempo. – resmunguei. – Se vira.

– Ah, valeu.

– Temos que voltar para lá. – falei, apontando com a cabeça para onde todos estavam.

– Ta. Hã, ei, você está... Bonita. Mais bonita.

Murmurei um obrigada e sai andando depressa. Ok, é fato que eu sou linda e maravilhosa, mas ainda fico meio desconcertada quando outras pessoas admitem isso. E mesmo que o Jake já tenha dito coisas do tipo algumas vezes, ainda é estranho.

O ponto alto do meu dia definitivamente não foi ser girada um milhão de vezes pelo Páris, mas ele sabia dançar. O Jake teve que improvisar uma dança com as nossas atrizes ajudantes, e não me pareceu nada divertido. Mas, então, chegou a vez de o Romeu dançar com a Julieta. Ótimo.

– Hã, tudo bem. A sua mão direita deve ficar na minha cintura, certo?

– Certo. – ele respondeu. – As outras garotas me ensinaram isso.

– E a minha mão direita fica no seu ombro. Então, devemos dar as nossas mãos, e bem, dançar.

– É. Talvez eu leve esse lance de dançar valsa para o resto da minha vida. Posso precisar no futuro, quem sabe. Acho que devo agradece-lá por me forçar a fazer isso.

– Que seja. – respondi, tentando me concentrar nos meus pés. Até que era quase legal dançar com o dragão ocidental. Mas não conta isso para ele.

– Você vai usar outro vestido no nosso casamento?

– Vamos nos casar?! – exclamei, assustada.

– O que? Sim, é uma das próximas cenas, eu acho.

– Ah, certo. Você quis dizer para as gravações. Eu realmente pensei besteira, oh, céus.

– Ta. Seria um pedido meio precipitado.

– Não vamos falar sobre isso! – cortei – E eu acho que a Julieta morre antes de casar. Você não leu o roteiro? Poxa vida! Bem, de qualquer forma, eu tenho outro vestido sim.

A primeira música então acabou, assim, vamos para a terceira cena, o clássico momento da sacada, em que o Romeu é todo fofo com a Julieta e blá blá blá. A gravação da cena será no lado externo do salão e, sim, eles tem uma sacada. Pois é! Antes que pudéssemos todos ir para o lado de fora, ouvimos um rebuliço. Aparentemente, o Rafael e o Marcos estavam discutindo. Só pude ouvir a última parte. Que foi o Marcos respondendo:

– Viado é o seu focinho! Eu sou homossexual, querido.

Adoro essas pessoas que não levam desaforo para casa.