Qual é a cor do amor? escrita por hollandttinson


Capítulo 28
Epílogo.


Notas iniciais do capítulo

Peguem um lencinho antes de ler.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/498451/chapter/28

Quando o corpo de Rudy não apresentava mais sinais exagerados de dor, ele foi liberado para voltar para casa. Era seguro andar, e Alex jurou que ele seria medicado nos horários certos, e Liesel prometeu que o ajudaria com a tarefa; e assim fizeram. Demorou cerca de 1 mês até que Rudy estivesse 100% recuperado para voltar para a escola, e foi recebido com uma festa de boas-vindas organizada por Liesel e Marieta, que voltou á trabalhar na escola.

Com o tempo Marieta voltou para a sua casa, levando a filha, o que deixou Hans um pouco triste, pois já estava acostumado com a presença da neta, porém, com o namoro de Max e Marieta, a garota ainda passava bastante tempo na casa dos avós, não dava tempo de sentir saudade.

Com a morte de Hans Júnior, todo o dinheiro que ele arrecadou em vida – dignamente ou não - se tornou herança para a pequena Rosa, mas, não se sentindo confortável com a ideia, Marieta pediu aos Hubermann que usassem o dinheiro para terminar a sua casa mais rápido, e eles não recusaram, fazendo com que a casa deles ficasse de pé mais rápido do que imaginavam. E ainda sobrou dinheiro suficiente para a faculdade de Liesel, que veio alguns anos mais tarde.

No último ano de Rudy no ensino médio, houve uma corrida na escola, para comemorar o início dos jogos olímpicos, e, apesar de não correr á muito tempo, Rudy concordou em participar, deixando meu coração muito feliz com a escolha. Me lembro de toda a emoção que me invadiu enquanto ele corria, seu cabelo da cor de limões voando, seu rosto lívido de qualquer pensamento que não fosse a chegada. Ele era o garoto mais incrível que eu já tinha conhecido, e eu estava satisfeita por não ter ido embora, não importa por quais coisas eu tive de passar para vê-lo assim, pelo menos eu vi!

Enquanto corria, Rudy sentia aquele frio natural alemão, sentia os músculos da sua perna voltarem á tensionar da forma que mais lhe dava prazer, seu coração e respiração acelerados pelo esforço, seu corpo estava vivo novamente. Rudy tinha reencontrado a felicidade na corrida, e ficar no quinto lugar deixou ele mais feliz do que eu esperava, ele estava radiante!

— Quero voltar.- Enquanto voltavam para casa, Rudy declarou em voz alta algo que ele vinha pensando á um tempo. Rudy queria voltar á ser o Jesse Owens, o meu garoto Jesse Owens. Todos olharam para ele diante de sua revelação, alguns chocados, e outros – Alex e Liesel – emocionados e felizes.

— Como é?- Alex ergueu uma sobrancelha, sem conseguir conter o sorriso. Rudy sorriu de volta para o pai, percebendo a emoção que o consumia. Que nos consumia.

— Quero voltar á correr. Era o meu sonho, não era? Ser um corredor profissional.- Ele disse, olhando para a sua medalha de participação. Liesel sorriu e deu um beijinho na bochecha dele, também sem conseguir se conter, feliz demais para saber o que falar.

— Apoio.- Ela disse simplesmente, ainda sem saber qual a palavra certa para usar. Todos sorriram para Rudy, concordando com ele, incentivando-o á seguir seu sonho.

Quando o ensino médio acabou, Rudy ganhou uma bolsa na faculdade de Berlim por meio da corrida, esporte pelo qual ele se profissionalizou, ganhando medalhas em todas as competições ás quais participou. Liesel também ganhou uma bolsa na faculdade de Berlim, mas por seus esforços com os estudos, algo que chamava muita atenção, já que a maior parte das pessoas da escola de lá não eram muito interessadas. Rudy e Liesel viajaram juntos para Berlim, vivendo em um apartamento, também juntos.

Tiveram que voltar 2 anos depois, para participar do casamento de Marieta e Max. Eles eram os padrinhos. E alguns meses depois, tiveram que visitar novamente a rua Himmel para conhecer o garoto que tinha o nome do pai de Max, uma representação digna para alguém que, se não tivesse existido, essa história não existiria, e provavelmente Liesel e Rudy estariam mortos agora, já que não haveria livro para escrever no porão.

Liesel se formou em letras, Rudy não se formou. Apesar de ter cursado a faculdade na mesma época de Liesel, e ter participado da formatura, Rudy não quis estudar nada. Queria viver sua vida de atleta, mesmo sabendo que qualquer coisa a estragaria, ele não se importou com qualquer situação futura, ele seguiu seu sonho. Rudy começou á viajar com a equipe de corrida do país depois da faculdade, se tornando famoso pela sua velocidade, ganhando medalhas e troféus que não cabiam no apartamento onde ele e Liesel moravam.

Ninguém nunca soube que ele era o garoto que sobreviveu duas vezes, e ele fez questão de apagar todo o passado sombrio, e viver o presente feliz com Liesel.

Fico feliz em dizer que Liesel se tornou uma escritora renomada, escrevendo livros de todos os tipos, enquanto viajava sem parar com Rudy. Ela era bombardeada com ideias de várias partes do mundo, histórias de pessoas, culturas, coisas que aconteciam com ela; viajar com Rudy a deixava tão feliz! E os troféus em sua estante também eram grandes, já que seus livros acabaram encantando muitas pessoas, inclusive á mim, que não podia perder a oportunidade de me apaixonar mais pela minha sacudidora de palavras.

Apesar de toda a fama, Liesel e Rudy não deixavam de visitar a rua Himmel, pelo menos algumas vezes no ano; seja para rever os pais, ou para darem presentes de todos os lugares que passavam.

Em um belo dia de outono, Rudy e Liesel estavam em Amsterdã, viajando de férias, quando Rudy decidiu que já era o momento certo de fazer o que ele queria desde o primeiro dia que viu Liesel: Ficar com ela para sempre. O rapaz, que na verdade já era um homem feito, convidou-a para um jantar em um restaurante chique e renomado da cidade, ás margens do rio, e a pediu em casamento.

A partir daquele dia não houve nada, nenhum momento, tristeza, doença ou intriga que os afastasse. Liesel e Rudy casaram-se em uma pequena igreja na rua Himmel, e tiveram 3 lindos filhos. Quando o terceiro filho nasceu, Rudy já estava aposentado do seu trabalho como corredor, e tinha dinheiro suficiente para não trabalhar nunca mais, então ele e Liesel decidiram voltar para onde tudo começou, levando os filhos junto. No mesmo ano eu levei Hans comigo, coloquei sua alma leve e feliz em meus ombros, e o carreguei.

Não havia peso nele, ele era feliz. Ele tinha feito tudo o que podia para dar ás pessoas que amava um pouco de paz, e tinha encontrado sua própria paz nisso. Hans foi um homem sem igual, o universo nunca mais teria alguém tão incrível habitando aqui. Nenhum outro homem seria tão maravilhoso como ele foi. Eu estava feliz por tê-lo conhecido, e quando finalmente ele olhou para mim, eu vi um pequeno sorriso se formar no canto dos seus lábios, e ele me agradeceu por todas as segundas chances que eu lhe dei. Suspirei para ele, agradecendo por ele ter sido maravilhosamente bom em escapar de mim.

A morte de Hans deixou todos muito abalados, começando por Rosa, que não suportava mais viver sozinha, e ficou muito feliz quando Liesel e Rudy foram morar com ela, trazendo Alex Steiner junto, e alugando a casa dos Steiner. Era como se tudo voltasse á anos atrás, mas sem um assassino á espreita, apenas os castigos do tempo.

Rosa faleceu 2 anos depois de Hans, feliz por finalmente poder encontrar o seu amor e seus dois filhos. Alex a acompanhou pouco tempo depois, e ambas as mortes me fizeram felizes. Não porque eu queria tirá-los do mundo, mas porque eu sabia que eles tinham feito seu papel, eles tinham feito tudo o que podiam. Lá estavam Liesel e Rudy, sendo pessoas incríveis, e a culpa era deles dois e de Hans. Não havia tristeza naquelas mortes. Eu estava feliz.

Quando Max morreu eu sofri. Lembro de como eu me agachei triste de encontro á sua alma. Lembro da forma gentil como a cor dele me encantava. Eu limpei meu rosto e olhei para ele, quando ele veio ao meu encontro.

— Pensei que você fosse me dar um soco quando eu viesse buscá-lo.- Eu comentei quando ele estava próximo bastante para me socar. Ele abriu um sorriso, um belo sorriso que só alguém como Max Vandenburg poderia me dar. Ouvi-o suspirar.

— Pensei que ia odiá-la quando viesse, mas, para ser sincero, estou feliz por finalmente descansar.- Ele disse, fechando os olhos com força e respirando fundo. Ele estava bem, eu não tinha motivos para tanta melancolia, mas, mesmo assim, me entristeci.

Vi Marieta definhar á perda do marido, que acabou sendo seu único companheiro. Vi Liesel chorar por semanas, meses, e sempre lamentar a perda do melhor amigo. Vi Rudy sem saber o que fazer, se sofria para sempre, ou tentava dar apoio ás duas mulheres, mesmo depois de ter perdido toda a família. E vi os filhos de todos eles tentando sobreviver, como eles mesmo tinham feito á anos atrás.

O meu encontro com Marieta foi formal, apesar de feliz. Ela estava um pouco assustada quando me encontrou, mas quando me olhou nos olhos, eu sorri para ela. Batemos um bom papo por um tempo, até que ela suspirou, fechou os olhos como Max tinha feito, e sorriu.

— Meu Max, onde ele está?- Perguntou. Eu sorri.

— Esperando por você, sua cretina.- Eu disse, e ela gargalhou, se despedindo de mim e indo de encontro á Max.

Liesel escreveu mais 2 livros depois dessas duas mortes. Ela era uma idosa com muita disposição, assim como Rudy, que estava sempre cuidando dela como se ela fosse uma criança. Os dois viveram por muitos anos, posso afirmar com alegria. Eles conheceram seus netos, e ficaram feliz por sua descendência ser próspera e abençoada. Mas, só existe uma única verdade absoluta: Eles iriam morrer. Não importa quanto tempo eu tentasse fugir desse encontro, em algum momento, o meu garoto com o cabelo da dor de limões, meu Jesse Owens; a minha menina que roubava livros, e sacudidora de palavras, a pequena garota rebelde; eles morreriam. Eles se encontrariam comigo. E o momento chegou.

Posso dizer que não sofri, apesar de ter achado que sofreria, quando encontrei Rudy. Ele já estava velhinho demais, não conseguia mais correr como o Jesse Owens, e seus cabelos já não tinham mais a cor de limões. Sua pele estava tão flácida que nem mais podíamos ver as marcas que outrora Hans Júnior tivera feito pelo seu corpo, e outras que ele veio adquirindo com o tempo. Ele já tinha vivido tudo o que podia, e para um senhor de 92 anos, Rudy tinha uma memória incrível. Fiquei surpresa quando ele me falou sobre o homem do avião, e do ursinho de pelúcia. Meu olhos brilharam quando eu o entreguei o ursinho, que eu tinha guardado com carinho. Ele abraçou o urso, como se tivesse voltado á ter 13 anos de novo. Limpou as lágrimas do rosto marcado pela idade, e sorriu para mim.

— Obrigado.- Ele me agradeceu.

Como explicar á ele que eu devia ser a pessoa agradecida aqui? Como explicar todas as vezes que esse garoto me distraiu dos meus trabalhos? Ah Rudy, você continua acabando comigo, garoto. Você continua partindo meu coração em milhares de pedaços, e eu sou masoquista o suficiente para amar isso.

A morte de Rudy abalou Liesel demais, a senhora que ela se tornou, já cansada de tudo o que viveu, decidiu apenas ficar observando o que era a vida. Ela observou por 6 anos, falecendo aos 98 anos, e me encontrando com disposição de 15. Ela deu uma piscada para mim, e eu, no auge da minha insensatez, não consegui me segurar e abracei a senhora. Liesel demorou para captar meu abraço, provavelmente estranhando a forma como eu sou, mas logo eu senti seu abraço de volta.

Contei a história de Liesel pelo meu ângulo, ela sorriu para mim e disse algo que eu nunca esperava ouvir:

— Se eu tivesse escrito um livro sobre isso, com certeza teria mais troféus em minha estante do que tinha.- Ela disse, sorrindo gentil para mim. Ela me elogiou por eu ser uma boa contadora de histórias antes de perguntar por Rudy. Levei-a até Rudy, e ela ficou satisfeita por encontrá-lo, assim como normalmente é.

Os filhos de Rudy e Liesel se formaram e tornaram-se pessoas completamente diferentes dos pais. O filho mais velho deles se tornou médico, a filha do meio se tornou advogada, e o garoto mais novo é, atualmente, um químico incrível. A pequena Rosa é bióloga, mora no Brasil com o marido e seus filhos atualmente. Seu irmão continua na rua Himmel até hoje, dando seguimento á loja dos Steiner, que acabou se tornando sua loja, de presente de Rudy.

E, para fechar esta história, quero comunicar que eu nunca tive minhas férias. Apesar de eu ter procurado incansavelmente, nunca houve, em momento algum, em parte alguma do mundo, outros sobreviventes. Nunca mais amei novamente, nunca mais me permiti ficar. Aprendi que quando a gente fica uma vez, queremos ficar para sempre, as distrações não podem se tornar rotina.

Continuo fazendo o meu trabalho, eu ainda coleciono cores por aí, e nenhuma cor foi mais bonita do que a cor de cada um dos meus sobreviventes. Nunca me distraí tanto como com eles, e ainda sinto saudade em alguns momentos, e fico repassando toda a história para mim mesma, e rindo nos momentos de lembranças alegres, e choro nos momentos de lembranças tristes. Sempre imaginei como seria se outras pessoas tivessem acesso á essa história, e se elas parariam para ler uma história contada pela morte.

Me pergunto sobre as outras pessoas. O mundo é tão vasto! Quantas histórias para contar, imagino que você deva ter alguma história incrível para ser contada, e que você acha que não é digna de ser ouvida, ou acha que o mundo não merece conhecê-la.

Por muito tempo guardei essa história para mim, acreditando que a melhor forma de eternizar essa história, seria deixar com alguém que nunca se vai, e você sabe que não tem como eu ir embora, certo? Mas acabei descobrindo que é mais inteligente repassar história, mostrar ás pessoas que existiram pessoas que correram pintadas de preto, porque queriam ser um corredor famoso, e acabou se tornando isso, sem precisar se pintar novamente, mas será sempre Jesse Owens. Com ou sem tinta.

Queria que soubessem que existiu uma garota, que era filha de uma comunista que a abandonou. Que essa garota tinha um irmão, e que o pequeno garoto se fora após um acesso de tosse, e foi enterrado na neve por coveiros distraídos que deixaram cair um livro, que acabou sendo a esperança dessa garota. A menina que roubava livros não sabia ler, mas estava sempre assombrada pelas palavras, e o poder que elas tem. Hoje ela sabe que quem assombra de verdade são os humanos.

Existiu, á anos atrás, um lutador judeu, que teve de abandonar tudo para viver com estranhos. Um lutador com cabelos de plumas, que carregava um livro alemão. Um lutador que, apesar de ter prometido me socar quando me visse, decidiu que já tinha vivido o suficiente para uma pessoa só, e realmente viveu!

Queria que as pessoas soubessem sobre os Hubermann e Steiner, queria que todos soubessem que eles existiram, porque se apenas uma pessoa ouvisse essa história, eu creio que ela repassaria para mais pessoas, e logo essa história estaria eternizada. Como lendas urbanas que nunca morrem.

Imagino o tanto de histórias que você deve conhecer, mas, por medo de contar, ou por achar que não vale á pena, esconde para si mesmo. Quero que saiba que vale á pena sim! Acha que ninguém vai parar para ouvir, meu caro? Você acabou de ler uma história contada pela morte, então quando se sentir inseguro sobre isso, lembre-se desse fato, e tome coragem. Seja corajoso como nossos sobreviventes.

Creio que Liesel ficaria muito orgulhosa de mim se pudesse me ver agora, falando sobre ela por aí, incentivando pessoas á contarem histórias. Bem, eu acho que aprendo mais com os vivos do que imaginava.

Por muito tempo as pessoas me temeram, mas não eles. Eles estavam face á face comigo várias vezes, mas eles descobriram algo que eu espero, do fundo do meu coração gélido, morto e assassino, que vocês tenham descoberto também: O mundo inteiro é assombrado pelos humanos.

E apesar de me assombrarem, vocês humanos são capazes de coisas que eu jamais compreenderei, mas pretendo não desistir de achar mais histórias para contar. Que tal a sua? Que cor terá a sua história quando eu começar á escrevê-la? A história que você acabou de ler tem cor de amor, mas eu não sei que cor é essa ainda, mas deve ser algo parecido com o infinito. E que essa história se junte ao eterno e infinito, assim como deve ser.

Até breve.

Fim.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

ACABOU!
Quem passou todo esse tempo comigo sabe todos os problemas que a gente enfrentou para que essa fanfic fosse o que ela foi, passamos por internet que não pegava, estudos que atrapalhavam, e críticas alheias, mas graças á Deus eu não desisti de postar pra vocês, e vocês não desistiram de ler. Essa fanfic foi um projeto muito especial meu, que eu tenho um amor particular, porque eu sempre quis saber o que aconteceria se eles não tivessem morrido e tudo o mais, e eu fiquei MUITO feliz por ter mais gente compartilhando desse sonho comigo, e por fazer vocês felizes, e tristes, e com raiva, e depois felizes de novo! Vocês foram incríveis comigo, me incentivaram á escrever – não só a fanfic, mas coisas profissionais também – e eu sou muito grata por isso. Alguns comentários eu pretendo levar pra vida toda, sem zoa. Mas, como tudo na vida, essa fanfic acabou, e a gente tem que se despedir. Deixo aqui meu muitíssimo obrigada por tudo, e até a próxima, nos encontramos por aí!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Qual é a cor do amor?" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.