Qual é a cor do amor? escrita por hollandttinson


Capítulo 16
The world conspires.


Notas iniciais do capítulo

Ó quem voltou! Sei que demorei(como sempre), mas eu to SÓ esperando entrar de férias pra postar um capítulo novo bem lindo pra vocês. Espero que gostem dessa prévia de hoje, beijão.



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Finalmente pensei em algo que talvez pudesse me trazer qualquer tipo de conforto futuro: não mais pensarei sobre o que virá, focarei apenas no que está acontecendo no momento. É fato que um dia todos eles irão morrer, e não há nada que eu possa fazer para evitar, mesmo que algum dia eu tenha tentado, ou que o mundo inteiro conspire a favor deles, não adiante. Eles vão morrer, é a única certeza. Então, vamos nos concentrar em suas vidas, como eu fazia á tempos, e só agora me dei conta sobre o quanto é importante o meu trabalho voluntário para com eles.

Liesel estava feliz naquela manhã de dezembro, já fazia um tempo que não de divertia tanto. Ela, Rudy e algumas pessoas da escola, incluindo Evan, que estava com um humor impressionável naquele dia, brincaram de guerra de bolas de neve no fim da aula. Eu vi os adolescentes brincando como crianças, sem se preocupar com nada além da felicidade prematura que encontravam naquela brincadeira feliz. Eu quis me juntar á eles e conseguir sentir um pouquinho daquela felicidade também, mas não sou capaz. Não sou capaz.

Alguns minutos mais tarde, eles estavam exaustos da brincadeira e aos poucos, as pessoas foram se dispersando. Evan caminhou lentamente até a sua moto, e quando ia dando a partida, olhou para Rudy e Liesel. Talvez eu esteja ficando louca, ou apenas esteja vendo o que eu gostaria de ver, mas eu juro que vi Evan olhar para os dois com tristeza.

Liesel e Rudy andavam de mãos dadas por todo o caminho até em casa, e quando estavam no rio Amper, Liesel sorriu para ele e se aproximou, dando um beijinho na sua bochecha. O garoto sorriu e lhe deu um beijo singelo nos lábios.

– Eu contei ao papai.- Ela disse alguns segundos depois. Rudy se afastou, analisando a expressão de Liesel para saber se ela estava triste por isso, ou se não. Mas a garota estava sorrindo.

– E o que ele disse?- Rudy perguntou, mas no fundo não estava preocupado. Sabia que o pai de Liesel não ficaria irritado. Liesel deu de ombros.

– Ele disse que já sabia ou desconfiava de algo do tipo. Disse que nós não sabemos disfarçar, e que deve ser muito difícil namorar ás escondidas, mas eu disse á ele que nós não estamos namorando.- Disse Liesel, sorrindo no final para passar confiança. Mas já fazia tempo que Rudy queria mudar a situação atual deles para algo mais sério, mais concreto. Mas não naquele momento.

– Eu acho que já sabia que ele sabia, ele é muito inteligente.- Disse Rudy, dando de ombros e voltando á andar. Liesel segurou a mão dele e ele parou, olhando para ela. Um sorriso de malícia infantil brincava nos lábios de Liesel.

– O que você acha de uma corrida daqui até em casa?- Perguntou Liesel, Rudy ergueu uma sobrancelha, sorrindo. O ar ao redor de Rudy parecia ter mudado á menção da palavra correr. Á quanto tempo ele não corria?

– Porque você quer correr se podemos ir andando?- Perguntou, mas ele queria correr. Ela deu de ombros.

– Eu entendo que você esteja com medo de perder de mim, afinal, você perdeu a prática não foi?- Ela perguntou, ele fechou a cara.

– Se prepare para comer neve misturada com lama, Saumensch.- Ele disse, soltando a mão dela e se preparando para correr. Liesel gargalhou.

– O que eu ganho se eu chegar primeiro?- Ela perguntou e ele deu de ombros.

– Você quem sabe, a brincadeira é sua.- Ele disse. Ela pensou um pouco e finalmente decidiu:

– Se eu ganhar, você vai ter de escrever um livro igual ao meu diário, só que para mim.- Ela disse. Ele analisou ela e depois deu de ombros.

– Você não vai ganhar mesmo.- Ele disse e ele gargalhou, se ajeitando ao lado dele.

– O que você quer se ganhar?- Ela perguntou, dando um beijinho na bochecha dele.

– Quando eu ganhar, eu te falo.- Ele disse, sorrindo abertamente. E então eles começaram.

Sapato contra neve úmida, cabelos voando loucos, um empurrando o outro e muitas risadas no meio do caminho. As pessoas olhavam como se eles fossem loucos, mas aquele era só Jesse Owens voltando ao ser lugar habitual de sempre, e eu estava tão, mas tão feliz de ver que ele estava com a garota de roubava livros ali.

Perto da casa, Liesel percebeu que ganharia de Rudy, e ela não queria que isso acontecesse. Fazia tempo que queria vê-lo correndo, então diminuiu o passo e viu ele passar á frente, como uma flecha de encontro ao alvo.

Rudy bateu o corpo com a parede da casa dos Hubermann, que já estava com algumas paredes de pé. Virou-se rindo como um louco, suando apesar do frio, e com o rosto completamente vermelho. Liesel o acompanhou depois, abraçando ele.

– Parabéns, Saukerl.- Ela disse ofegante. Ele concordou com a cabeça e se sentou no chão, respirando com dificuldade.

– Eu... Estava... Com... Tanta... Saudade... Disso...- Ele falou. Liesel concordou com a cabeça.

– Porque você parou de correr, Rudy? Porque você não quis mais ser o Jesse Owens?- Ela perguntou. Ele olhou para ela e então deu de ombros, respirando fundo.

– Eu não sabia mais o que... O que era vencer, Liesel. Eu tinha perdido tanto, eu tenho perdido tanto, eu não sei se eu queria ganhar alguma coisa. Eu não queria ganhar mais nada e ver essa coisa partir, como todas as coisas que eu tinha e não tenho mais.- Ele declarou, olhando para a neve branca brilhando no chão. Liesel engoliu em seco, e eu também.

– E o que mudou?- Perguntou Liesel. Ele sorriu para ela.

– Tudo é diferente quando eu tenho você, eu quase esqueço o quanto as outras coisas ao redor são ruins.- Ele disse, fazendo a menina sorrir.- Mas e você, porque não rouba mais?- Ele perguntou. Ela sorriu ainda mais.

– Outro dia, Rudy. Outro dia.- Ela disse, levantando. Olhou para ele.- Mas o que você quer agora? Disse que me diria o que queria quando ganhasse.- Ele sorriu.

– Você vai ter que me ajudar com o que eu quero.- Ele disse, levantando e se aproximando. Segurou as mãos dela.

– Rudy, aqui não.- Ela disse, olhando ao redor e tentando soltar as mãos de Rudy. As pessoas passavam apressadas para lá e para cá, mas nenhuma delas parecia prestar atenção neles. Na janela da cozinha, a mãe e Liesel não estava á vista.

– Relaxa.- Ele disse, sorrindo.

– Diga logo o que quer, estou imunda.- Ela disse.

– Eu quero que você seja minha namorada. Assim mesmo, namorada. Eu quero poder chegar em casa e ficar de mãos dadas com você, eu quero ver a reação de Frau Hubermann quando souber, eu quero ver o Max sorrir e o Herr Hubermann também. Eu quero poder dar um nome para o que a gente tem, e quero que todos saibam que você roubou meu coração. Esse foi o maior roubo que você já fez na vida, cá entre nós. E então, que tal isso?- Ele perguntou. Liesel estava atônita, e eu também. De onde tinha vindo tanta poesia? O amor teria feito Rudy falar coisas tão bonitas, aposto.

– Você quer... Namorar comigo?- Ela perguntou, ainda chocada. Eu revirei os olhos, Liesel bobinha, não querem todos?

– Sim, e você quer?- Ele perguntou, sorrindo. A confiança dele não tinha vacilado. Ele sabia que ela aceitaria mais cedo ou mais tarde, como fez com o beijo. Ela engoliu em seco e colocou a mão na testa, sentia que ia desmaiar.

– Eu preciso pensar.- Ela disse e Rudy fez uma careta, revirando os olhos.

– Pode fazer quanto doce você quiser, no final nós vamos ser namorados mesmo. Agora venha, sua medrosa, vamos tomar banho.- Ele disse, virando-se e abrindo a porta. Liesel achou que ele estivesse triste por não ter aceitado o seu pedido, mas Rudy realmente não estava. No fundo eles já estavam namorando, só que sem a pressão que a palavra “namorar” impõe.

Durante o banho, Rudy pensou em como tinha se sentido feliz correndo, e em como gostaria de correr por competição novamente. Ele já sabia o que ia fazer na manhã seguinte.

E Liesel também já sabia o que ia fazer, só que o que ela faria trazia um cheiro amargo e ao mesmo tempo adocicado demais, um cheio de roubo.

(…)

Marieta sorriu quando viu Max na porta da sua casa no fim da noite, com a sua mercadoria. Ela parecia estar mais triste do que no dia que pedira para que ele não o fizesse, e Max tinha jurado que não faria, mas hoje ele tinha que ir lá de todo jeito.

– Eu sei que pediu para que eu não viesse, e não estou aqui porque sou insistente. Mas eu já viria aqui de qualquer jeito, e achei que o seu estoque talvez já estivesse vazio, então tome.- Ele disse, colocando as sacolas na soleira da porta. Ela sorriu para ele e concordou com a cabeça.

– Obrigada Max, é muita gentileza sua. Escute, eu não tive tempo de me desculpar por ter sido tão rude com você naquele dia, não é culpa sua, eu só ando um pouco estressada.- Ela disse, colocando a mão na testa, ela parecia prestes á explodir em nervos, então Max sorriu gentilmente.

– Tudo bem, eu compreendo. Que tal desestressar um pouco?- Ele perguntou. Ela olhou para ele com a sobrancelha erguida.

– O que sugere?

– Os Hubermann estão te convidando para um jantar hoje, é por isso que eu estou aqui. Tenho certeza que será muito agradável, além disso, pode ir embora quando quiser. Eu trago você em casa, se ficar tarde e você estiver com medo.- Ele disse sendo gentil. Ela riu, nada meteria medo na Marieta, pelo menos nada que viesse daqui.

– É muita gentileza de vocês, eu aceito. Só espere eu trocar de roupa. Venha cá, entre.- Ela disse, abrindo a porta e dando passagem para que ele entrasse. Ele se sentou no sofá e ficou esperando ela, que não demorou muito.

– Pronta?- Ele perguntou quando a viu descer toda empacotada em casacos grossos. Realmente estava muito frio lá fora para alguém sair totalmente desprotegido.

– Você quer um copo d'água? Desculpe, eu não costumo receber visitas.- Ela disse, sorrindo. Ela parecia sincera em todos os seus gestos, todas as suas palavras. EU não estava vendo mais a assassina que me assustara em seus olhos, á cada segundo eu via apenas uma mulher normal cheia de medos e tarefas indigestas. Ele sorriu.

– Sim, obrigado.- Ele disse, assistindo-a abrir a geladeira velha e que rangia, tirar uma garrafa de água e encher o copo.

Marieta e Max andaram em silêncio pela rua, vendo os comércios fecharem e as pessoas andarem exaustas pelo dia de trabalho.

– Esta é a casa dos Hubermann?- Perguntou Marieta. A casa em questão já estava mais evoluída do que na última vez, e eu sabia que era uma questão de poucos fins de semanas até que a casa estivesse concluída. Max sorriu.

– Sim, estamos trabalhando muito nela, e em pouco tempo é aqui que eu vou morar. Os Hubermann são ótimas pessoas.- Disse Max, sorrindo com uma admiração quase palpável em seus olhos. Marieta achou aquilo tão bonito que sorriu, e eu nunca a tinha visto sorrir tão abertamente. Ela tinha ficado tão mais bonita daquele jeito, e eu não era a única que tinha notado, Max também tinha.

– Eu acredito em você.- Ela disse. Eles subiram as escadinhas da entrada da casa dos Steiner, e Max bateu na porta. Foi Rosa que abriu, ela revirou os olhos quando viu Max.

– Não sei porque você bateu se tem a chave e pode entrar a hora que quiser, sinceramente Max.- Ela disse e Max apontou para Marieta, que sustentava um sorriso gentil no rosto. A expressão de Rosa clareou e ela olhou para Marieta de cima á baixo.

– Esta é Marieta Inderoviski, a professora dos meninos.- Disse Max. Marieta apertou a mão de Rosa e foi convidada para entrar. Eles já estavam colocando a mesa e Rudy e Liesel sorriram para a professora, dando-lhe beijos no rosto.

O jantar correu calmo, feliz e cheio de conversas animadas. Alex e Hans se arriscaram em piadas que soltaram risos só por sua idiotice. Marieta se sentiu em casa, mesmo que aquela não fosse sua casa, mesmo que soubesse que mataria Rudy e Liesel. Ela tentou não pensar nisso o tempo todo, e realmente conseguiu. Até aquele momento.

– Mas e então, você veio para cá á muito tempo?- Perguntou Rosa quando as “crianças” já tinham se posto para dormir, e só os adultos estavam na sala de estar, tomando alguns conhaques antigos que Alex tinha guardado. Todos olhavam para Marieta, que sorriu.

– Na verdade não. Eu servia ao exército antigamente, então eu vivia em Berlim. Vim para cá porque ouvi dizer que estavam reconstruindo uma cidadezinha aqui, e eu imaginei que fosse mais calmo. Além disso, tinha a escola, fui uma das primeiras voluntárias á lecionar nela.- Disse Marieta, parecia orgulhosa do seu feito.

– Você tem família ou está sozinha?- Perguntou Alex, a pergunta interessou Max mais do que qualquer um aqui gostaria, e eu fiquei irritada com isso. Marieta pareceu pensar bastante antes de responder, e eu vi certa tristeza em seu olhar, mas ela soube disfarçar bem.

– Meus pais morreram na guerra, eles eram judeus.- Disse Marieta. Max ficou espantado, e eu também. Ela não tinha trabalhado em um campo de concentração? Talvez ela tivesse mentido, talvez na verdade ela tenha sido presa em um campo, e dito ao Evan que trabalhava, só para não passar pela vergonha.

– Eu sinto muito.- Disse Hans, olhando para Max. Ela deu de ombros.

– Como você servia ao exército sendo filha de judeus?- Perguntou Max, interessado. Ela sorriu para ele, sabia que era judeu.

– Eu não sou judia, sou cristã. Meus pais ficaram bravos comigo, então eu mudei meu sobrenome para o sobrenome de uma amiga minha, que morreu. Ninguém desconfiou quando eu entrei para o exército, então eu continuo usando o nome dela e tudo mais. Não é tão difícil.- Ela disse, dando de ombros.

– O que você fazia no exército?- perguntou Rosa. Por incrível que pareça, Marieta não estava incomodada com as perguntas, muito pelo contrário, estava feliz por falar de si e ser sincera. Marieta suspirou.

– No começo eu cuidava apenas de quem entrava ou saía do exército, enviava cartas aos familiares dos mortos em combate, e coisas do gênero. Mas depois de um tempo ninguém mais se importava com esses números, as coisas ficaram um pouco loucas, então me mandaram para um campo de concentração. Eu era supervisora da área das mulheres.- Disse Marieta.

– Você não foi presa quando a guerra acabou. Porque?- Max começava á pensar que talvez não fosse uma boa ideia ele ser amigo de Marieta, afinal, ela podia ser a favor das obras nazistas. Ela deu de ombros.

– Muita gente não foi presa. Eu disse: eu sabia das coisas antes de qualquer pessoa, eu tinha amigos em todas as partes do mundo. Foi fácil sair quando eu já sabia o que tinha por vir, então eu fui embora. Além disso, eu não tinha nada á ver com as barbaridades que aconteciam, eu só estava fazendo o meu trabalho.- Ela disse, lembrando-se do que acontecia ali. Não tremeu nem nada do tipo, na época ela achava que estava fazendo o certo, o bem para o país. Isso tudo foi antes de conhecer Max, agora era tudo diferente.

– E então hoje você é sozinha no mundo? Apenas uma professora que mora sozinha?- Perguntou Alex, achando que era muito estranha a forma que ela lidava com as coisas.

– Sim.- Ela respondeu, não considerava Evan muita coisa, e não queria envolver ele naquilo.

– Você nunca se casou? Uma mulher tão bonita, tão gentil e boa, não se casou?- Perguntou Hans, sorrindo. Ela sorriu também, e eu vi a assassina naquele sorriso. Boa? Ela era o demônio em pessoa, se quisesse. Aquelas pobres pessoas não sabiam de nada.

– Digamos que eu não seja a pessoa adequada para cuidar de uma casa, filhos e marido.- Ela disse, mas eu sabia que ela estava mentindo.

Marieta já se casara uma vez, no campo de concentração, com um dos chefes de lá. Marieta tinha uma filha, ela tinha 5 anos e se chamava Rosa, como a avó.

Sim, avó.

Marieta foi casada com Hans Júnior. Diferente do que as pessoas achavam, ele não tinha morrido, não tinha sido preso, estava vivo, bem vivo. O homem cruel que se tornou o fez tirar da mãe a filha, a única coisa que tinha. Faziam anos que Marieta não via a pequena Rosa, e todos os dias Marieta se arrependia de ter entrado no mundo do crime por causa de Hans.

Ele tinha prometido: “se você matar Liesel e Rudy, eu deixo a garota com você, eu mando vocês para outro país, ninguém vai tocar em vocês, você não vai se presa. Eu juro que vocês vão viver em paz e eu nunca mais apareço na sua vida.” E então era isso, ela teria que matar Liesel e Rudy para ter sua pequena Rosa.

E eu conseguia gostar mais de Marieta por isso. Agora eu sabia quem era o chefe dela, e eu tinha pena dela por isso, e tinha mais dó ainda de Rosa e Hans, que não mereciam ter um filho como ele. Era melhor que estivesse morto.

Erros, erros, e erros, é só disso que sou capaz ás vezes. Porque não o levei quando tinha tempo? É como eu disse: nem sempre o mundo conspira ao meu favor.

(...)


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Notas finais do capítulo

É aí, o que acharam do nosso assassino? Surpresos?