Como Ser Criado Por Um Maroto [SENDO REPOSTADA] escrita por MFR


Capítulo 41
Hiyake-me


Notas iniciais do capítulo

A demora tinha sido avisada, mas eu juro que nunca imaginei que ela seria desse tamanho.

Para quem está no grupo, sabe os motivos, quem não...

Bom, gente, foi assim: eu precisava fazer pesquisas para a FIC, e só isso levou um mês. Então eu comecei a escrever e escrevi... 13/14 do capítulo (vai ficar bem fácil de entender o "13/14" depois de lerem).
Então eu me mudei. E a mudança tirou minha vontade de fazer qualquer coisa. Tipo QUALQUER COISA!
~Não estou ficando depressiva, juro, só está sendo difíciL~
Era para eu ter postado o capítulo antes de me mudar, mas não consegui e depois veio o bloqueio pós mudança é aqui estamos!
Entrei de ferias semana passada (NUNCA FIQUEI TÃO FELIZ COM FERIAS! Período integral não é de Deus!) e com isso eu finalmente, FINALMENTE, saí do bloqueio e consegui escrever o final (pois só faltava o final) que eu estava imaginando a meses.

O bloqueio foi realmente insuperável por um tempo. Só que de qualquer forma eu não queria ter demorado tanto, eu peço perdão pela demora.

Eu indico que ouçam uma música triste. A que eu mais ouvi para escrever e que indico para ouvir é Cain - Cousin Marnie (não liguem para a letra, porém, ela só me faz lembrar do Dean).

Aqui é isso, aproveitem o capítulo ツ

... Ah, só avisar que, talvez, se você for REALMENTE MUITO sensível, MUUUITO, tome cuidado com o capítulo, pois há realmente cenas que falam sobre tortura, e descrevem um pouco. Embora eu acho que há mais gente que vai chorar do que se incomodar com as coisas que a Bella faz.



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Regra 1. Gritar, chorar e xingar são permitidos, totalmente.

Regra 2. Rony e Hermione são proibidos de se meter em qualquer um dos planos de Bellatrix contra mim. Caso quebrem a regras, sofreríamos as consequências.

Regra 3. Eu sou obrigado a receber cada tortura que Ballatrix quisesse. Se eu suportasse, meus amigos não sofreriam absolutamente nada.

.

No dia que fomos pegos, assim que Bellatrix avisou que me matar não estava em seus planos imediatos, ela nos deixou sozinhos.

Tentamos gritar, quebrar a janela e abrir a porta, porém nada surtiu efeito. Então ficamos sentados, encostados na parede com a janela, sem fazer nada. Nossas varinhas e mochilas foram levadas, o que nos deixava sozinhos no depósito frio e vazio.

No começo o silêncio era cansado, a ficha não tinha caído para nenhum de nós três. E ainda possuíamos uma forte esperança de que logo alguém nos acharia.

Com o passar das horas, com o céu escurecendo, foi ficando mais frio e nos sentamos mais próximos. Rony ficou com fome, Hermione voltou a chorar e eu estava quieto. Ninguém falava por mais que poucos segundos, mas os soluços da minha amiga faziam barulho. Ficou frio demais quando a noite chegou, a fome de Rony estava no "auge" e Hermione tinha parado de chorar. Ninguém tinha aparecido, nem para o bem, nem para o mal.

Meus amigos pareciam com medo, Rony até tentava disfarçar, só que eu via em seus olhos.

Por volta das vinte e duas, de acordo com nossos relógios, estávamos apertados juntos e nossas respirações condensavam.

— Perdão. — eu murmurei trêmulo de repente no meio da noite. Não por obrigação, não por culpa (naquela hora), não porque eu tinha medo que estivessem com raiva de mim. Mas porque eu precisava que eles soubessem que eu sabia que era culpa minha.

Rony não disse nada, batendo o ombro no meu, o que soou como um "Está tudo bem, companheiro" para mim naquela hora. Hermione agiu parecido, me abraçando e enfiando suas mãos junto das minhas em meus bolsos, entrelaçando nossos dedos.

E esses atos me trouxeram mais conforto do que um cobertor traria.

Durante a madrugada mal cochilamos, Rony acabou por se sentar no meio por ser maior, Hermione deitou-se em seu colo e quando vi já estava encostado no ombro alto do meu melhor amigo.

Num dado momento durante a noite eu chorei. E, dessa vez por medo e culpa, pedi desculpas repetidamente entre lágrimas. Rony tentava me acalmar enquanto Mione só me abraçava.

Eu estava com medo. Não arrependido - não principalmente, pelo menos - mas com medo. Na minha teimosia eu me condenei e, pior, condenei meus amigos. E Sirius, aquele que sempre disse que não viveria sem mim.

Ao lembrar do meu padrinho voltei a chorar, dessa vez mais forte.

.

Primeiro dia. Bellatrix não apareceu até que o sol estava alto e o porão menos gelado.

Por um lado esperar que ela voltasse era horrível, com a apreensão do que viria junto. Mas ninguém havia ficado feliz em ver a porta do porão sendo aberta e Bellatrix passando por ela enquanto ostentava seu próprio rosto e com um vestido ainda mais largo no corpo esquelético.

— Como estão meus ratinhos?

Embora o estômago de Rony roncasse em resposta, não foram as bocas dele e de Mione que se moveram, foi a minha:

— Não irá ganhar prêmios como anfitriã, mocreia.

Bellatrix estalou língua num som satisfeito.

— Você tem uma língua afiada, Harry... Exatamente como Sirius.

O som do nome de meu padrinho na boca dela me irritou. Não por ter me comparado a ele, ou pela bastarda referir-se a ele com a mesma boca que trazia tanta horror para os outros, mas sim pela familiaridade em que ela o pronunciava.

Como se não bastasse os malditos olhos idênticos...

Abaixei a cabeça não querendo encará-la, perguntando-me por que ela não podia ser parente de qualquer outra pessoa além de Sirius.

— O que você quer? — escutei Rony perguntando.

— Não é da sua conta, traídorzinho. — sua resposta saiu como com veneno de sua boca.

— Mas é da minha. — afirmei. Ergui os olhos para ela, tentando controlar-me e encarar o que viria. — Vamos, Bella, o que pretende fazer comigo?

— Ah... eu tenho muitas ideias. — ela murmura pensativa, medindo meu rosto as suas ideias. Tremo com o arrepio que se espalha em minhas costas.

— Você vai me matar?

— Não por enquanto. — Quatro passos foram dados e então me encontrei literalmente aos seus pés. — Tortura lenta que é o meu estilo. — Nossos olhos estavam ligados, ela me encarava com tanta intensidade que tenho que usar de muita força de vontade e audácia para não baixar os olhos de novo. Quando ela afastou os olhos, me dando as costas, sua voz voltou para o tom "bem humorado", senti tanto alívio que dei um pequeno suspiro. — Mas primeiro vamos as regras.

— Regras? — foi Hermione quem perguntou.

E ela não devia ter o feito, pois as feições de Bella mudaram totalmente. A boca se aperta e os olhos se estreitaram em direção a garota, Hermione se encolheu, e meus olhos se mexeram dela para Bellatrix, temendo que a antiga comensal atacasse minha amiga.

Porém não é o que acontece. Os olhos da bruxa mais velha voltaram para mim, com a mesma raiva de antes. Engoli em seco pelo susto de ter tanto ódio em minha direção.

Num segundo (menos, provavelmente) eu encarava com medo a bruxa a minha frente e no outro ela tinha sua varinha erguida em minha direção. Meu pescoço foi apertado por um chicote escuro e fui puxado com tanta força e velocidade que caí de quatro até seus pés.

Meu pescoço estalou dolorosamente na hora e o pensamento dele ter se quebrado me preocupou por um segundo. Ouvi Hermione gritar e então abri os olhos, só conseguindo ver as botas de Bellatrix próximas de meu rosto.

Lutei inutilmente para respirar, e era impossível. Meus olhos se encheram de água enquanto eu puxava ar com a boca aberta de forma desesperada.

A pressão em meu pescoço sumiu assim que eu comecei a perder a consciência. Quando puxei o ar pela segunda vez, sem nem mesmo encher meus pulmões direito, vi a bota de Bellatrix vindo rapidamente em direção ao meu rosto.

A força do chute me jogou de costas e me fez grunhir pela dor, minha boca se encheu de sangue e Hemione e Rony gritaram meu nome. Ofeguei tentando respirar, mas a maldita enfia seu pé em meu estômago.

Segurei seu tornozelo tentando empurrá-la para longe de mim e só consigo que ela coloque mais peso. Rosnei irritado continuando a tentar.

— Regras da casa, Harry.— Bellatrix começou, inclinando-se da frente para ver meu rosto. — Número um: gritar, chorar, xingar, rosnar, ou qualquer coisa no estilo está totalmente permitido. — Rosno outra vez em resposta — Esse porão está tão apinhado de proteções que ninguém poderá te ouvir... ou encontrar. — ela terminou com um sorriso maldoso no rosto. — Regra número dois...

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Segundo dia, foi a pouca luz do sol nascendo que nos fez acordar.

Estávamos encolhidos juntos de novo por causa do frio, mas dessa vez eu somente usei uma das pernas de Mione como apoio.

Bellatrix foi rápida no primeiro dia, somente ditou suas regras entre estrangulamentos, chutes, socos e tapas, e então partiu me deixando com um corte na bochecha, um dedo da mão quebrado e outros deslocados e promessas de muitos hematomas.

E graças as escoriações, tanto respirar quanto manter-me sentado estava difícil.

Faziam mais de 48 horas que não comíamos e a única água disponível era a que tinha gosto de ferrugem que saía da torneira imunda do banheiro no depósito. Já sentíamos tonturas além da fome horrível - que Rony não reclamou, algo que em qualquer outra situação teria se tornado piada.

E se a Comensal foi rápida no primeiro dia, ela decidiu mostrar um pouco de seu "melhor" lado no segundo.

Logo cedo ela apareceu, apertando sua varinha e com um vestido estranhamente ajustado no seu verdadeiro corpo. Me mandou levantar e me aproximar dela, e com essas poucas palavras tive vontade de chorar.

Mas a mão de Mione em meu ombro, num pedido para que não me colocasse entre eles e ela, tem o resultado oposto ao que minha amiga esperava, pois me fez querer protegê-la.

Quieto, escondendo as dores que sentia, sigo até Bellatrix.

— Sem xingamentos hoje, Harry? — ela perguntou.

Limitei-me a dar de ombros o mais lentamente possível para não sentir tanta dor pelos meus machucados.

Bellatrix movimentou a cabeça como se entendesse, como se tudo isso não fosse nada além de uma conversa normal, como se não tivesse conseguido machucar-me tanto em um único dia que eu nem queria discutir. Um segundo depois, porém, seu braço se move me dando um tapa.

Descobri então que, pelas palavras da própria, Bellatrix não gostava de vítimas quietas. E também descobri o que é receber um crucio pela primeira vez na vida.

E pela segunda vez, e pela terceira, e pela quarta, e pela quinta.

.

No terceiro e no quarto dia ela seguiu com a maldição Cruciatus. Eram tardes comigo jogado no chão recebendo a maldição de momento em momento, cada uma com uma forma de tortura diferente.

Choques, facadas, algo picando meu cérebro, agulhas em cada nervo do meu corpo, ossos quebrados ou arrancados, sede...

Me afogando ou me queimando vivo, não importava, Bella estava animada e sorria para cada grito que saía dos meus lábios.

Eu tentava aguentar cada tortura, no começo eu tentava até mesmo não gritar para não dar o gostinho para Bellatrix, mas com o passar do tempo ia ficando difícil e eu sempre desmaiava, sendo acordado na hora por um Enervate.

Rony e Hermione eram obrigados a ver tudo. Em geral eles não sabiam o que eu sofria e mesmo quando perguntavam eu me recusava a contar. No começo eles até gritavam por mim, tentando por vezes lutar com ela, mas depois de algumas ameaças de Bellatrix eles se seguravam, ficando quietos e até mesmo tentando ignorar meus berros.

Era tudo mesmo uma droga.

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No quinto dia acordamos tremendo de fraqueza, eu mal consegui me por sentado e se não fosse para ir beber água no banheiro, duvidava que alguém ia levantar.

Bellatrix não apareceu até a noite e quando voltou não estava sozinha. O seu rosto era o da Sra. Flume e em seu ombro se equilibrava um rato.

Ignorando a dor em meus dedos machucados e a sensação de meu cérebro estar solto em meu crânio, me coloquei de joelhos.

— Quero que conheça alguém, Harry. — Bellatrix disse, por algum motivo preferindo vê-la com o rosto de uma bruxa morta. Meus olhos pulam para seu ombro onde o rato roía feliz um pedaço de queijo sem dar atenção para a bruxa que o carregava. — Vamos, Peter, não quer falar com Harry? — Bellatrix perguntou.

O animago terminou seu pedaço de queijo despreocupadamente e então pulou do ombro de Bellatrix, que em nenhum momento se mostrou impaciente, vindo até a minha frente. De joelhos vi o enorme rato se transformar num homem pequeno e quase tão magro quanto Bellatrix.

Ele farejou o ar e então me encarou nos olhos. Piscou uma vez e sua boca se abriu num sorriso de poucos e podres dentes.

— Harry! Você cresceu! — ele disse de forma tão feliz quanto uma criança inocente.

Meus punhos se fecharam dolorosamente enquanto memórias inundaram minha mente, como quando Sirius me contou sobre a morte dos meus pais, da sensação de ódio que senti quando soube que ele estava livre, de uma foto dos Marotos juntos no casamento de meus pais...

Não agi por impulso quando pulei nele, eu estava completamente ciente de Bellatrix a poucos passos e de meus amigos atrás de mim. Sabia que estava fraco e machucado demais para conseguir o fazer, mas eu só conseguia pensar em arrancar o resto dos dentes do desgraçado que traiu meus pais. Assim que subi nele comecei a socá-lo no rosto com raiva. Peter grania de forma amedrontada, como um rato, e isso me fez tentar bater com mais força.

Tudo isso durou menos que trinta segundos, pois logo fiquei tão tonto que tombei de lado por causa da fraqueza. Foram cinco dias sem comer e um dedo quebrado que me impediram de transformar a cabeça de Peter Pettigrew em queijo cremoso.

No momento que caí, Peter se transformou e voltou ganindo para o ombro de Bellatrix. Ao olhar para cima reparei no olhar animado dela.

— Você adorou isso, não é? — pergunto raivoso.

— É estupidamente incrível quando você perde a cabeça, Harry. — ela respondeu abrindo o sorriso.

De olhos fechados e tremendo, xinguei-a.

Ela riu como se entendesse meu português de baixo calão, ou talvez só riu da minha cara mesmo, e ouvi seus passos indo para escada.

— Vamos, pequeno Peter, vamos deixar esse Harry mau aí com fome.

Esperei eles saírem para abrir meus olhos e três segundos depois Rony e Mione se inclinavam sobre mim para me ver soluçar tão forte que meu peito doeu.

.

No sexto dia não tinha mais como. Eu fui despertado por tapas, gritos e uma Hermione chorando desesperada porque eu não podia acordar graças a fome.

Cinco horas depois a situação se inverteu e éramos eu e Rony a tentar fazer nossa amiga acordar.

Sentíamos náuseas, dores de cabeça, dores na barriga. Nossa visão estava enevoada e nossas unhas estavam escurecendo e o cabelo caindo, e isso estava nos assustando fora de nossas calças.

Então, quando Bellatrix passou pela porta com seu costumeiro "Harry" cantado me coloquei sentado, com muita dificuldade, e neguei com a cabeça.

— O que é isso, Harry? Resolveu dividir o fardo com seus queridos amigos?

— Que se dane o que você faz comigo, Bella, mas temos um trato. — digo. — Você. Não. Machuca. Meus. Amigos.

Bellatriz fez uma careta tão cômica que eu poderia até rir se fosse em outro momento e em outra pessoa (sem esses malditos olhos, preferencialmente).

— Eu nem toquei em seus amigos! — ela ralhou incrédula.

— Não comemos a dias! — disse e sinceramente me decepcionei em como minha voz soa fraca e grave. — Isso com certeza está entre as torturas dessa sua cabeça psicótica.

— Ah, por favor, o que você quer de mim?! Eu poderia tê-los matado na hora que cruzaram aquele alçapão e torturando você do mesmo jeito que estou. Mas nãããão, eles estão aí ó! E quando saio o que eles fazem? Te enchem de um cuidado que ninguém que eu torturei já recebeu enquanto esteve nas minhas mãos.

Apertei os dentes com essa resposta, enquanto ao meu lado Rony e Hermione se contorciam para não entrar no meio, para não piorar a situação, para não quebrar a segunda regra.

Acho que isso, fora a fome, era a tortura imposta a eles.

— Só traga a comida, mocreia. — digo simplesmente.

Ela parou parecendo pensar enquanto nos encarava com a mão na cintura, e então acenou concordando e saiu do porão. Alguns momentos depois ela voltou com pão e uma garrafa de leite, estendi a mão para pegar a comida, mas invés disso ela segurou minha mão, abaixou-se para deixar a comida no papelão que dormíamos e me ajudou a levantar.

Gemi e me apoiei nela mais do que eu quero admitir, porém era a única forma de me manter na vertical.

— Seus amigos vão comer, Harry, mas você estava certo antes, jejum será uma das nossas brincadeiras.

Mordo o lábio para não reclamar com a notícia e tento não olhar para meus amigos. Falho nessa último, e eles também pareciam querer gritar (entre outras coisas) com ela.

— Que seja. — aceitei e ela sorriu maldosa.

— Ah, também vou dar água para eles. Não é uma boa ideia se manter bebendo daquele banheiro, os canos estão mais do que desgastados. — ela completou.

E continuou me apoiando até outro canto do porão, onde costumava aplicar todos os crucius. Me colocou no chão quase delicadamente, onde sentou comigo e esperou meus amigos terminarem de comer para virar um soco no meu queixo que me pôs desmaiado de primeira.

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Sétimo dia, depois da décima aplicação de Cruciatus, Bellatrix quebrou meu braço num acesso de raiva.

Foi o primeiro de muitos. Enquanto me recuperava de sentir meus pulmões sendo transformados em fogo, com o peito no chão, olhei para o Bellatrix. Ela tinha seus olhos cravados em mim, mostrando-me tanta raiva e desprezo quanto um dia eu esperava poder mostrar para Peter.

Então abaixei os olhos, não querendo de forma alguma sentir qualquer traço de pena. E com isso perdi as feições dela quando Bellatrix gritou de forma agonizante.

Apertei os olhos fechados, chorando baixinho. Querendo meu tio, querendo sair dali, querendo acima de tudo o meu pai.

O costumeiro chicote se enrolou em meu pulso e meu braço foi erguido com um estalo, doeu, mas não reclamei, continuei de bruços e olhos fechados. Tentando abafar os soluços que ouvia de Hermione com os meus próprios.

A primeira pancada não dói tanto, a segunda acerta meu cotovelo e eu grito, a terceira e a quarta parecem triturar minhas juntas. Ela continuou me pisotear e eu a gritar,

Gritei, gritei tanto quanto pude e em meio aos berros soluços enchiam minha boca também.

E entre os meus, ouço os berros da comensal, gritando sobre sua adoração por Voldemort e seu ódio por mim.

Quando ela parou nós dois estávamos chorando. Não sei como pude reparar nisso, mas sim, ela estava chorando e quando saiu do porão bateu a porta com força.

Meu braço doía de uma forma que eu não podia descrever, diferente de Cruciatus eu ainda sofria depois que ela ia embora. Eu sentia tudo gritar e havia uma certeza no canto da minha mente que deixava claro que meus ossos estavam granulados.

Não tinha nem curiosidade de olhar para o meu braço e quando meus melhores amigos chegaram até mim, meus soluços estavam tão fortes quanto era humanamente possível.

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No oitavo dia a porta foi aberta cedo e por ela passou Peter. Ele carregava num prato três batatas que pareciam gordurosas e uma jarra de água; assim que entregou as coisas para Rony e Mione, ele parou e se pôs a me observar.

Eu queria causar dor nele, esfregar seu rosto nas paredes até que conseguisse ver seus dentes ou quebrar a garrafa de leite (que agora era usada para colocar água do banheiro e trazer para mim quando eu não podia andar) e esfaqueá-lo. Era o que eu queria e, naquele momento, acreditei que merecia.

No entanto, eu era aquele que já podia ver partes de ossos, ossos do meu braço, que não só estava em uma posição nada saudável, mas como aberto numa fratura exposta.

Eu tinha perdido sangue e isso me deixava ainda mais fraco, o bastante para não conseguir levantar minha cabeça quando Peter aproximou-se de mim.

Em sua mão, preso a um garfo de madeira, um pedaço de batata menor que uma mordida. Quando ele se inclinou sobre mim, aproximando a batata da minha boca, quis pegar o garfo e enfiar em seu olho, mas então a batata tocou meus lábios. Estava fria, dura demais para realmente ter sido cozinhada, porém parecia maravilhosa no momento.

Meu estômago pareceu apertar enquanto mastigava lentamente e depois engoli. Ao abrir os olhos, que eu nem tinha reparado que fechara, percebo que Peter me encarava aparentemente feliz que eu tinha gostado da comida.

Fiquei confuso, mas me mantive quieto. Alguns momentos depois o homem ficou desconfortável, ou pareceu, se transformou em rato e deu o fora.

Nem a dor no braço, ou Hermione voltando para o meu lado, fazendo carinho em meu cabelo, ou Bellatrix algumas horas depois tendo que me paralisar para que eu não machucasse mais ainda o braço e ela pudesse aplicar seu crucius livremente, me fez tirar a estranha bondade do bastardo do Peter da cabeça.

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No nono dia Bellatrix tentou fazer algo novo, mas açoitamento devia ser mais interessante com a vítima em pé.
Então me "eletrocutou" com um crucius e enfiou uma agulha tirada de seu bolso no músculo da minha panturrilha. E saiu para não voltar até o outro dia.
Enquanto meus amigos tiravam a enorme agulha de metal da minha perna comecei a ouvir algo além dos meus soluços.

Era a voz de Sirius. Soando baixa, tranquila, e cantada.

Uma canção de ninar brasileira que Sirius nunca soube cantar inteira, e com as palavras tão carregadas de sotaque que mal pareciam ser em português.

"... dourado / Que nasceu no campo, / sem ser semeado".

Eu sabia que era uma alucinação, mas qualquer preocupação era sobreposta pela sensação de conforto que a voz do meu padrinho, parecendo tão real, me trouxe.

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Bellatrix curou meu braço no décimo dia. Pois aparentemente eu não poderia aguentar o que viria por aí com o braço naquele estado. Ela não fez com cuidado nenhum e no final meu braço estava torto, deformado, e eu não podia dobra-lo, porém ele estava fechado e não doía por ora.

Meu alivio durou até que ela arrancou minha última camiseta e me amarrou numa parede com as costas viradas para ela. Ela proferiu o feitiço que transformava sua varinha num chicote e então pelo porão se espalhou o som do estalo alto quando o bateu em minhas costas.

Gritei quando minha pele foi queimada pelo força da chicotada. Na segunda e na terceira vez tentei não gritar tanto, então sons estrangulados saíam por meus dentes cerrados. Quando puxei ar, recebi outra e sem querer mordi minha língua.

Meu sangue tinha um gosto quase tão metálico quanto da água que eu era obrigado a beber.

Perdi a conta logo e poucos segundos depois foi a minha consciência que se foi.

Estava ficando cada vez mais fraco.

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Somente acordei no outro dia, no décimo primeiro, e simplesmente não lembrava de quase nada do outro dia. Mione dormia encostada em Rony e esse murmurava algo enquanto rodeava a garota com um braço.

— Está rev-visando as matéria de história? — gaguejei, sua única reação foi soltar um suspiro de alívio. Senti minhas costas queimarem quando tentei me mexer, mas quando parei a dor para junto. — Quanto tempo eu dormi?

— Umas... umas trinta horas. — ele responde checando seu relógio.

Tentei por um momento não pensar no que Bellatrix possa ter feito comigo para me fazer dormir por tanto tempo, porém não contenho minha pergunta.

— O que aconteceu?

— Você não lembra?

— Pergunta meio óbvia, parceiro. — rebato e ele suspira.

Só depois de limpar a garganta que ele respondeu:

— Ela te chicoteou algumas vezes e você desmaiou, só que ela continuou até começar a sangrar. Ela curou a maioria dos machucados, mas deixou os piores cortes e jogou alguma poção neles.

A resposta tinha saído com dificuldade, com Rony se apressando para contar e deixar a memória de lado.

— E? — incentivei.

— Eles não sangram, m-mas também não melhoram.

— São... são quantos cortes?

Rony demora para responder e me questiono por um segundo se falei tão baixo que ele não pôde me ouvir. Porém sua resposta vem logo. A voz dele ficou baixa - ali sempre falávamos baixo - e ele soluçou.

— S-s-sete. — e o número no final saiu um pouco chorado.

O número bruxo, claro.

Suspiro, eu estava quase desmaiando de novo, mas consegui captar o sofrimento do meu amigo.

Por mais forte que meu amigo fosse, que estivesse sendo, naquele momento ele quebrou. Não sei se era por Hermione estar dormindo e aquela ser uma hora que o permitisse ainda parecer forte para ela, ou se eu realmente estava muito mal ao ponto de assustá-lo, ou, mais provavel, uma mistura de tudo isso e mais o resto da nossa situação.

Uma parte de mim, normalmente muito ignorada, se perguntou como em meu estado eu ainda podia me preocupar tanto com algo como Rony chorando. E observando que a minha capacidade em ser idiota devia ser seriamente estudada.

— Rony... — murmurei apreensivo.

— Eu não aguento mais, companheiro. Eu quero meus pais, eu quero minha vida. Eu. Preciso. Ir. Embora.

— E-eu sei-

— É egoísmo eu reclamar, porque é você que está sofrendo. Você não deixa ela nos machucar, mas não aguentamos mais ver você sendo torturado, Harry.

Não me movo, não era como se pudesse, porém suspirei de olhos fechados, ainda exausto.

— Perdão. — murmurei, eu sabia que não servia para nada, era só uma palavra idiota que por mais significante não mudava nossa situação, mas eu precisava daquilo. — Perdão, Rony, eu não queria, eu nunca-

— Não é sua culpa-

— É s-sim. — afirmo com uma tentativa de soar forte. — Foi a minha arrogância que nos trouxe para cá, fui eu-

— Não, Harry. Você foi teimoso, mas não nos amarrou e nos trouxe. Queríamos vir, concordamos e sabíamos dos riscos... Estamos juntos, parceiro, e não hesitaríamos em dividir o que você está sofrendo.

— Já conversamos sobre-

— Não, não conversamos. — contesta — Você ignorou quando tentamos e então quanto percebeu que não íamos parar começou a tagarelar sobre como ela não quer fazer nada comigo e com Mione, que ela não liga para nossa existência, que você vai passar pelas mesmas coisas com ou sem sofrermos... Pode até ser tudo verdade, mas, Harry, não pense que não vemos através disso. Você se culpa e está passando por isso culpa! Só que... você sofrer esta matando a gente.

O silêncio caiu naquele momento, causado por simplesmente não ter o que se falar.

— Desculpa. — murmuro de novo.

Meu amigo suspirou, arrancou de si seu casaco e o jogou sobre mim. Os cortes em minhas costas arderam, mas nem me encolho por causa.

— Por que você não volta a dormir? Trinta horas parece bem menos do que você precisa.

Quis continuar a conversar para ter certeza que meu amigo estava bem, embora fosse óbvio que não estava, mas meus olhos pesaram. Fiquei quieto de olhos fechados por um momento, sentindo menos frio e desconforto.

Antes de dormir, porém, ouço algo como Rony soluçando sobre por que crianças como nós tínhamos que passar por isso.

.

Décimo terceiro dia.

Eu estava ficando pior. Sim, pior do que o pior. E pior ainda provavelmente, porque não tem como eu dizer o quanto eu estava mal.

Nos últimos dias eu comecei a ter febre. E isso somado a não ter comido praticamente nada a dias me impedia completamente de me mover. Só que isso não era o que me assustava mais.

A alucinação de Sirius cantando tinha voltado. Eu não conseguia passar mais do que um dia sem ouvi-lo. Eu tinha dúvidas entre ver as alucinações como uma pós-tortura, ou se elas serviam para mim mais como um conforto no meio do inferno.

Preferia a segunda opção. Mas infelizmente quando toda a canção acabava, quando tudo voltava a ser silencioso e frio, "Alecrim Dourado" era só uma lembrança do mundo que eu não possuía enquanto estivesse naquele depósito.

— Crucius! — Belletrix me amaldiçoou de novo. Porém no lugar de berrar e chorar somente tremia pelo poder do feitiço no meu corpo pequeno que estava ainda menor que o normal graças ao jejum. — Por que você não grita?!

De certa forma eu até queria o fazer, porém eu já não tinha força nem para isso. Por dias eu não conseguia nem levantar o pescoço, quiçá voltar a gritar.

Mas de qualquer forma, Cruciatus já não tinha tanto poder sobre mim. Doía muito, claro que doía, só que eu estava tão completamente fora de controle, tão fraco, faminto e febril, que ver o que acontecia a minha volta ou em mim mesmo estava beirando o impossível na maioria do tempo.

Nos breves momentos em que ficava lúcido eu somente conseguia beber um pouco de água e sussurrar algo com Rony ou Mione.

Eu não contei à eles sobre as alucinações, isso seria algo que eu levaria para o túmulo (admitindo, claro, que eu teria esse luxo), pois não queria que eles começassem a pensar que estava ficando louco. Já bastava que eu tivesse essa certeza.

Ouvi Bella respirar de forma descompassada e raivosa. Não era um bom sinal porque em geral isso era procedido por alguns ossos quebrados.

No entanto, invés de começar a me pisotear como de costume, vi pela visão periférica ela se virar para meus amigos que se encolhiam o mais distante possível.

— Já que não está cooperando, Harry, vou ter que brincar com os outros.

Quis gritar, mas minha garganta estava seca e arranhada pelos berros antigos. Então estiquei dolorosamente meu braço até fechar os dedos na barra de seu vestido e conseguir puxar.

O rosto de Bellatrix se virou para mim e neguei com a cabeça. Ela suspirou e se abaixou apoiando-se em seus calcanhares.

— Se eu não souber que você está sofrendo, eu não posso manter nosso acordo.

Eu quis dizer que estava sofrendo, dizer para ela que eu sofria a cada maldito segundo que respirava, que sofria tanto que eu não podia dizer o quanto, que até enquanto dormia eu podia sentir o poder do feitiço, como se invés de descanso cada parte do meu corpo estava perdendo qualquer sensibilidade. Eu apenas não podia reagir mais a isso. Mas minha voz me traiu e só pude continuar a mexer a cabeça.

Bellatrix suspirou quase com desapontamento e me amaldiçoou outra vez.

Tremi como numa convulsão e gemi mordendo a língua. Ela mantêm o feitiço que me trazia a sensação de ter gelo no lugar de ossos por longos segundos e então me libera.

"Foi meu amor... / Que me disse assim / Que a flor do campo... / é o alecrim".

Gemi quando a voz de Sirius enche meus ouvidos e quis aperta-los para tentar abafar a canção. Ergui os olhos e quase chorei quando encontro os dela.

— Você não aguenta mais, não é, Harry? — ela afirmou. Quis berrar, quis cuspir e mordê-la, quis fazer qualquer coisa menos encará-la enquanto ouvia a voz de Sirius — Você aguenta e continua sofrendo para proteger seus amigos... — ela segura meu rosto — porque sabe que se morrer, eu vou mata-los.

Ela soltou meu rosto e não pude simplesmente aguentar o peso dele, então minha cabeça caiu e bati o queixo no chão de madeira. Fiquei ali jogado com o rosto no chão, com dificuldade até mesmo para respirar.

— Eu acabei com você, Harry Potter, e agora você está completamente aos meus pés. Mas ainda não terminei. Eu. Irei. Te. Matar. — Sua voz vinha do alto, baixa e séria, se mesclando com a de Sirius na minha mente. E ela continuou por muito mais tempo, porém eu já não conseguia compreender completamente — ...farei é em nome do Lord das Trevas! — Nem pensei em rebater, mesmo se eu pudesse. E continuei "ouvindo" ela, somente captando pequenas coisas que ela dizia.

Não consegui pegar mais, porque pela terceira vez, só no dia, eu desmaiei.

.

Acordei algum tempo depois com Peter balançando meu ombro.

— Certo. — sussurrei tão fraco que se não fosse pela audição aguçada pela animagia ele não teria ouvido.

Vi com o único olho que eu podia abrir ele depositando um prato no chão e então se voltando para mim, ele me virou de barriga para cima e me segurou pela cintura, me colocando sentado com as costas na parede. Sua mão me prendeu pelo ombro, me impedindo de tombar como provavelmente faria, e com a outra colocou o prato de sopa sobre minhas pernas.

O cheiro da sopa, de alguma forma, parecia machucar minhas narinas. E meu estômago se contraiu.

— Dormindo, dormindo. — Peter murmurou baixinho, enquanto apontava para Hemione e Rony que dormiam no canto abraçados. — Você tá fraco, tem que comer, tem que comer, Harry. — Assenti concordando.

Ele continuou me segurando contra a parede quando comecei a tentar tomar a sopa. Minha mão não podia dar nem as primeiras colheradas então Peter pegou a colher da minha mão.

Apoiei a cabeça na parede enquanto ele enchia uma colher e a aproximava de minha boca. A abri e recebi mais uma vez comida dele, forçando-me a engolir com dificuldade.

A sopa não era mais que um caldo com um gosto muitos quilômetros longe do de galinha, porém era o mais próximo que eu podia pensar para descrever. E enquanto o caldo quente passava pela minha garganta machucada, doía. Pois, afinal, tudo isso não era sobre dor?

É claro que qualquer comida ficava centenas de vezes pior com toda a situação que eu me encontrava, somente por ter que olhar nos olhos do Peter um gosto amargo se espalhava no fundo do minha língua.

Só era algo que eu ignorava.

Peter traiu meus pais, por culpa dele eles morreram e isso ninguém mudaria. Porém era como Bellatrix disse, a mente dele foi destruída por Azkaban. Ele aparecia durante os dias, trazendo comida para meus amigos e até de vez em quando interrompendo Bellatrix.

Ele sorria desdentado, fechando os olhos e granindo feliz para mim. E nesses momentos eu não tinha vontade de explodi-lo.

A verdade era que eu estava morrendo muito lenta e dolorosamente. E isso trazia certa... certa calma. Não, melhor dizendo: trazia certo estupor.

O homem que me dava comida foi aquele que traiu meus pais, mas ao mesmo tempo não era. Ele lembrava deles, lembrava de Sirius e aparentemente lembrava até mesmo de me pegar no colo. Mas as vezes ele esquecia até que não era um rato.

Então, eu entendo que me julguem, até porque eu mesmo me julgava, mas eu não conseguia odia-lo ou sentir raiva. Somente desprezo e uma pena gelada e incômoda.

De qualquer forma, quando aconteceu... quando Bellatrix abriu a porta e chamou Peter logo que terminei de beber a sopa, eu não estava preparado para aquilo.

Não estava preparado para o sorriso e a forma que Bellatrix olhou para Peter, como seus olhos se estreitaram e seus dedos mexeram na varinha. Meus olhos não estavam preparados para ver aquilo, não estavam preparados nem para o brilho verde que saiu da varinha.

Então o corpo de Peter foi jogado em minha direção pela força da maldição, fazendo barulho e acordando meus amigos que gritaram ao ver Peter Pettigrew morto quase em cima de mim.

.

Décimo quarto dia, hoje.

Por causa da sopa no dia anterior eu acordei muito mais lúcido, mesmo que durante a madrugada eu tivesse vomitado uma boa parte do líquido, se pelo meu estômago não estar preparado ou se foi graças a morte de Peter, eu já não sabia.

Ainda não podia andar, mas em parte era por causa do cortes nas minhas costas que ardiam como o inferno quando eu me mexia, não tanto mais pela fome.

Quando Rony me ajudou (carregou) a ir no banheiro bebi água e joguei um pouco no rosto e pescoço. Suspirei enquanto me apoiava em pé na parede da pia, Rony encostado no batente da porta esperando.

Ele e Hermione me contaram de novo o que Bellatrix disse no outro dia, já que eu não pude entender no estado em que estava.

Ela ia fazer algo comigo que mesmo se eu estivesse forte talvez não suportasse, e eu não podia ficar sem imaginar o que era.

Encostei a testa na parede fria, que parecia ainda mais fria com a minha febre, e de olhos fechados rezo. Para ninguém em específico, mas a minha mente se encheu com a imagem da igreja na cidade que cresci.

A luz do sol nos vitrais, as roupas dos padres, o gosto de uma hóstia não consagrada que pedi uma vez para Sirius pegar para mim...

— Harry, você está bem? — Rony perguntou.

Me movi para ficar de frente para ele e sorrir.

— Sim.

E não liguei de mentir.

.

Bellatrix não demorou depois disso. Estávamos deitados em silêncio tentando ficar longe do cadáver quando ela passou pela porta perto das duas horas da tarde.

— Está melhor, Harry? — pergunta.

— Maravilhoso. — respondo com sarcasmo, minha voz mal sendo ouvida.

— Ah, é bom ouvir sua voz. — afirma e então passa me encarar por um momento. — Consegue andar?

— Não. — respondo.

— É, eu acredito. — aceita. — Vocês dois para lá. — ordena apontando para onde eles deviam ir. Rony e Hermione se levantam e cruzam o depósito, sendo seguidos pelos olhos da comensal. — Não, não, separados. — instrui depois que eles sentam encostados. Claramente incomodados, eles se afastam, deixando mais de meio metro de distância entre si.

— Para que isso? — pergunto apreensivo. Ela me ignoro e ergue a varinha para eles. — Não! — digo tentando gritar.

Sendo ignorado de novo, Bellatrix balança a varinha soltando um feitiço sem som na direção deles.

Algo escuro se agarra prendendo seus tornozelos juntos, na cintura prendendo os braços e no rosto tampando seus lábios. Vejo isso enquanto implorava que Bellatrix parasse, e ao passo de cinco segundos meus amigos estavam sem poder nem mesmo levantar.

— Por que fez isso? — pergunto quando ela se virou para mim.

— Pois não quero ser incomodada. — responde simplesmente.

— Você não pode machucá-los! V-você!...

Ela corre até mim, do seu jeito desengonçado e torto, e agarra meu rosto.

— Não estou fazendo nada! — ela rosna apertando minhas bochechas e então arrancando meus óculos e os jogando para longe. Me encolho soltando o ar devagar e assustado com sua reação. — Eles estão bem! Pare de agir como se não! Você está morrendo, você! Se importa tanto assim viva, viva!, por eles!

— E isso não é o que eu estou fazendo?! — rebato com os dentes cerrados.

— É! — ela grita de volta ainda com o rosto próximo do meu, e então se afasta. — E é por isso, Harry Potter, pela lealdade que o torna tão frágil, que eu adoro você. E estou torcendo com todas as minhas forças para que você não morra.

1... 2... 3 segundos se passam comigo encarando a figura de Bellatrix Lestrange, talvez sorridente e completamente disforme graças ao meu astigmatismo.

Esse era um dos motivos para ela manter sempre meus óculos inteiros e no meu rosto tanto quanto possível. Ela não só queria que eu sentisse suas maldições como também soubesse de todas as formas possíveis quem estava me fazendo sofrer. Vendo seu rosto com os olhos iguais de Sirius ou com os da falecida Sra. Flume, sentindo seu toque que variava do gentil à um que quebrava meus ossos, seu cheiro de caramelo agridoce ou de seu mau hálito, ouvindo seus gritos sobre sua devoção a Voldemort, seus berros de ódio... não sentindo o gosto dos alimentos.

A certeza da minha morte veio nos primeiros segundos que nos encaramos. Mas logo outra ideia me surge.

Se ela ia me matar, então eu não iria mais sofrer. Se ela me matasse, talvez ficasse feliz o bastante para ignorar Rony e Hermione e os deixasse livres. Se ela me matasse, talvez meu pai sofresse no começo, mas logo ficaria livre para fazer o que quisesse pelo resto da sua vida.

Entretanto, tanto quanto acreditar nisso me acalmava, me machucava, pois no fundo eu sabia o quanto tudo aquilo era mentira.

Bellatrix levanta sua varinha em minha direção, mantenho os olhos firmes em sua imagem distorcida esperando sem nem piscar. O feitiço que ela me lança foi murmurado, mas é apenas um para me levantar no ar e me levar até próximo a ela, me abaixando sem cuidado bem onde a luz do sol que passava pela pequena janela formava um retângulo claro.

O sol machuca e me cega por um momento, me forçando a piscar repetidamente o único olho que não estava enegrecido e inchado.

— Ah, Harry... Você não tem ideia do quão terrível parece. — Bellatrix comenta.

Ela está certa. Eu podia ver a forma exata das minhas costelas, ver que as calças se prendiam no meu quadril somente por causa do cinto, ver que meus braços estavam finos e um deles todo torto e marcado por hematomas amarelados e algumas manchas que pareciam bolsas de sangue. Mas eu não podia ver os cortes nas minhas costas, ou o meu olho direito que estava roxo e inchado, não podia ver a imagem dos meus dentes quebrados ou como eu ficava com todo o cabelo que tinha caído.
Rony e Hermione estavam horríveis a ponto de eu não querer olhá-los, e eu não devia estar menos que cinco vezes pior.

— Já conheceu o Japão? — Bellatrix pergunta. — Imagino que Sirius tenha o levado para muitos lugares. — nego com a cabeça. — Também não conheço, mas dizem que é muito bonito. Moderno, rico, organizado. É um lugar muito rígido, com a educação mágica sendo principalmente doméstica e com magias e feitiçarias passadas de pai para filho, de mestre para discípulo. Dizem que Imperius foi baseada em um feitiço vindo do Japão. Assim como também criaram uma outra, a Hiyake-me. — A pronúncia do nome em japonês sai quase cantada — O próprio Lord das Trevas me ensinou e durante guerra tive a oportunidade de aplicar em muitas cobaias. Principalmente trouxas imundos, mas a maioria desses não conseguia sobreviver. Só pude usá-la em dois bruxos, que eu tive o prazer de matar algum tempo depois, e soube que alguém do meu lado conseguiu pegar um auror... É uma maldição realmente interessante, você vai ver, magia negra fortíssima, muito antiga. Quando meu mestre me ensinou, contou a história dela para mim, os casos mais importantes, os maiores magos a usarem e sua criação... A verdade é que nem os maiores estudiosos descobriram com certeza quem criou Hiyake-me. Duas das teorias são muito parecidas e são as mais famosas, além de interessantes. A primeira é que Amaterasu, a grande deusa do Sol, nascida do olho esquerdo do pai dos deuses, criou uma maldição para condenar todos aqueles deixavam de adorá-la, traíam ou a irritavam, fazendo-os sofrerem em seus domínios. A outra teoria é que seu irmão, Tsukuyomi, o deus da Lua, odiava sua irmã e todos aqueles que a preferiam em seu lugar, então amaldiçoava os devotos dela a dor sob o sol... Eu particularmente acho que quem criou tinha um senso de humor maravilhoso e agradeço aos céus por quem quer seja ele... Entendeu? "Céus", "Sol" e "Lua". Ah, vê-lo nesse estado deixa a mim de bom humor. De qualquer forma, é uma boa estória.

Do alto sua voz soava quase parte da minha mente. E nos últimos dias isso vinha sendo tão comum.

Como se eu tivesse me perdido em minha própria mente, correndo da dor da realidade, ali, fria e cruel, para minha mente onde tudo o que acontecia era a escuridão e a saudade do meu pai.

Fora da minha loucura, a de não conseguir mais definir muito do que acontecia comigo, eu só tinha dois propósitos: Viver e não deixá-la machucar Rony e Mione.

E eram eles que estavam em minha mente, junto do interminável coro de "Alecrim Dourado" e outras pessoas que eu amava.

Rony, Mione, Sirius-pai, Rony, Mione, Tio Remus, Sirius, Tia Bina, Pai, Mãe...

Bellatrix se abaixou perto de mim, estudando meu rosto enquanto eu a encarava tão de perto.

— Eu espero que você viva, Harry, para que eu possa fazer tudo o que eu já fiz até agora outras e outras vezes. — ela murmura, pertinho do meu ouvido. Eu sentia a umidade que saia de sua boca dentro do meu ouvido, me fazendo engolir enojado. — Tudo por ter impedido que meu mestre fizesse o que ele tinha direito. Tudo por tirá-lo de mim. Tudo, toda a dor... você merece.

Engulo em seco de olhos fechados. Tomando o resquício de coragem que ainda tinha e os abrindo para olhar meus amigos.

Eu não podia ver seus contornos faciais, apenas os contrastes das cores das roupas, das amarras, do cabelo e do sombreamento dos olhos e narizes. Porém eu ainda os via, eu ainda sabia que eram eles ali.

— Voldemort está morto. — digo, ainda encarando meu amigos. Então mudo para Bellatrix, tão perto de mim que conseguia ver cada um de seus cílios, cada espasmo de ódio provocado em seu rosto por minhas poucas palavras. — Não o matei, Bella... foram meus pais.

Ela me agarra pelo queixo. Forte, duro.

— Não adianta contar essa ladainha. De qualquer forma é culpado! Se não foi o assassino, era a você que a sangue ruim da sua mãe e o traidor de sangue do seu pai estavam protegendo!

— Sangue ruim, traidor... o grande Lord das Trevas foi derrotado por eles.

— Não! Ele foi morto por você! Pois existe algo, alguma coisa!, que sobrepujou meu mestre e está em você, não numa sangue ruim...

— Voldemort era mestiço!

— Mentira!

— Sua mãe se apaixonou por um trouxa! Ele me disse! Seu fantasma no diário! Seu nome de verdade era Tom Riddle! O mesmo nome do seu pai trou-

O tapa interrompe meu discurso encalorado.

Respiro pesado, mas volto a encará-la.

— Meu mestre era puro! Era um descendente legítimo de Salazar Sonserina! Um ofidioglota como nosso patrono... — Sua voz tremia em adoração e raiva, me apertando contra o chão, esmagando minhas costelas aparentes contra meus pulmões.

Sua grande vaca, — murmuro em ofidioglês — eu também sou, isso me faz puro também?

— Não. Fale. Como. Ele! — grita de dentes cerrados estrangulando meu pescoço, perfurando com as unhas minha pele. Não luto. Como poderia? Um dos meus braços era quase inútil, todo deformado, e outro ainda gritava pela dor da queimadura de dois dias atrás. Me vendo movimentando o rosto, como a única forma de reagir, Bellatrix me solto depois de alguns momentos se pondo de pé e sacando a varinha, iniciando um cântico. — Kage no jissai no mokutekichi no...

Sinto um peso invisível mexer meu corpo enquanto me aperta junto ao solo. Perco o fôlego mal tomado e aperto os punhos.

— Você vai encontrar seu mestre, Bella. — digo o mais alto possível.

— ...aikō-ka no mono ni zokushi, shitagau...

O peso aumenta, como todo o céu estivesse caindo sobre mim de forma arrasadora. Mas isso não me interrompe, não impede minhas palavras.

Não impede que meu desejo seja contado com palavras tão carregadas de ódio...

Do ódio criado por cada tortura, por cada ameaça aos meus amigos, de cada vez que mencionou meu pai como se ele fosse parte dela, das ofensas aos meus pais verdadeiros, do que ela fez com os pais de Neville, da dor, de toda a dor!...

— Você vai queimar no inferno com ele! — rugi apertado.

— ...hikarinonakade umareta meiyo kodomo wa... — ela continua, sem se interromper, mas soando raivosa.

Grunho pela dor do aperto contra o chão, e então vejo um círculo sendo desenhado a minha volta com pequenas chamas arroxeadas que continuam queimando enquanto o cântico continua.

Choramingo pela dor que vai das pontas de meus dedos e sobe para o resto de meu corpo. Abro os olhos uma última vez, o esquerdo que não estava machucado, me esforçando para ver Rony e Mione.

Movimento meus lábios num "perdão" sem som e chorado. E vejo o quanto eles lutavam para se soltarem.

Mas eles não se soltam e minhas desculpas nunca adiantaram de nada.

— ...jibun no hontō no shizen ni se o muke, kare no gōman no okage de basse rareta to kare no gen no ie o hinin suru yō meiji...

O fogo se ergue do chão, parecendo inflamar meu corpo por dentro. Grito e me debato contra o peso que me prendia para baixo.

E choro, choro alto. Pois eu não ouvia nada além de Bellatrix, do fogo crepitando e assobiando enquanto começava a girar e de mim mesmo.

Não havia mais música de ninar.

Irônico, pois logo eu estaria dormindo.

— ...yami no teshita, sono osoroshī gādian!

Sinto que o cântico havia terminado, pois o peso some. Puxo o ar com dor abrindo o único olho que eu podia ver qualquer coisa.

Bella ainda tinha a varinha erguida e o fogo ainda girava a minha volta. Meus amigos se debatiam e de repente tudo parecia calmo, em baixa velocidade.

Só o fogo girando e girando e eu deitado. Eu respirava, eu ainda via.

Então veio a sensação.

Todos os pelos do meu corpo se eriçando e minha visão sendo puxada para cima, me fazendo encarar o teto de onde descia um raio que brilhava roxo como o fogo.

O raio alcança meu olho esquerdo e desse para o meu peito descoberto mutilando por onde passava e trazendo agonia para cada minúsculo pedaço do meu ser.

Não saberia explicar como minha garganta tão ferida pôde gritar daquela forma, ou se todo o barulho era dentro da minha cabeça. Porém de alguma forma eu havia gritado, berrado com tanta força que para mim sobrepujou o estrondo do raio.

Então ao meio de tudo isso, ainda pude notar quando Bellatrix gritou explodindo a parede do porão deixando a luz entrar e então desaparatando.

No entanto, o que me fez notar não foi nada como a possibilidade de liberdade. E sim como a dor pôde se intensificar quando a luz do sol se encontrou com meu corpo e tudo se tornou fogo.

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Notas finais do capítulo

ᕕ( ᐛ )ᕗ TERMINEI ᕕ( ᐛ )ᕗ

ᕕ( ᐛ )ᕗ EU POSTEI ᕕ( ᐛ )ᕗ

ᕕ( ᐛ )ᕗ YEAH, I DO ᕕ( ᐛ )ᕗ

Primeiro, eu agradeço MUITÍSSIMO por todo o apoio e por cada pessoa que está lendo. Eu realmente fiquei sentida por ter parado numa hora como essa - Afinal o capítulo passado terminou tenso... Não como esse, mas ainda assim. - e ter sumido.

Como eu disse, essa mudança está sendo bem difícil, é tudo meio ~muito~ diferente e isso mexe muito com meu psicológico. Mesmo assim eu não devia ter demorado, faltei com minha responsabilidade, mas também espero que entendam.

TEMOS MUITOS LEITORES NOVOS, NO ENTANTO.

Fazendo tanto tempo que postei imagino que alguém está indicando, então obrigada (ღ˘◡˘ღ)

PARA QUEM É NOVO:

Seja bem vindo, espero que esteja gostando. E, por favor, não pense que eu costumo ficar tanto tempo sem postar, foi um caso à parte.

日焼け目 S O B R E O C A P I T U L O 日焼け目

É uma ideia que eu tive quando eu tinha começado a ler Tokyo Ghoul (anime/mangá japonês) onde há essas cenas de torturas, num contesto diferente é claro, e me deu ideias.

A Bellatrix matou o Sirius nos livros, então nada faria mais sentido a Bella ser a principal vilã da FIC (será mesmo que ela é a principal? Haverá outros?). E eu odeio ela! Tem todos os fãs dela e eu entendo, é uma personagem interessante, mas eu só consigo a odiar.

Perguntaram nos comentários e acho que vale responder aqui também: Bellatrix não é pedófila '-' tem sérios problemas, mas isso não.

Harry está bem machucado, será que ele sobrevive? Curiosos?

"Hiyake-me". Bom, como puderam ver é uma magia das trevas, com um cântico. Eu criei com ajuda da minha irmã (de chalé), de pesquisas sobre mitologia japonesa (que, aliás, é um saco) e de assistir muito House M.D. para criar como ela atua nas pessoas (eu precisava entender de medicina! Esse foi o jeito mais prático).

As palavras que a Bellatrix disse são: "A honrosa criança nascida na luz que se voltou contra sua verdadeira natureza e graças a sua insolência fora punida e condenada a repudiar seu antigo lar, pertencendo e obedecendo àqueles de seu destino real, os amantes das sombras, os lacaios das trevas, seus terríveis guardiões" - vcs viram aí embaixo, certo?

✧ FUTURO DA FIC ✧

Bom, algo que me ajudou a escrever esse capítulo foi meu lado competitivo, eu apostei com uma amiga quem postava dois capítulos antes da outra! Mas a aposta foi desfeita, pois ela está ocupada - WO, VENCI!

Com a mudança eu não tive internet por muito tempo, então eu acabava relendo Como Ser Criado Por Um Maroto inteira de vez em quando (pois eu tenho salvo no Ênio (para quem não sabe, Ênio é o nome do meu iPad, onde eu escrevo... e vivo. Sim, eu dei nome para meu tablet, e apelido também, pq eu só o chamo de Baby - like Dean Winchester)) e pensava na FIC muito também, e eu percebi que, cara!, a FIC tem tantas falhas, tanta coisa que na minha cabeça é tão real na vida do nossa Harry e que vcs não tem nem ideia! É tanta coisa que com o tempo eu decidi mudar... Bom, eu tenho REALMENTE que fazer alguma coisa!

E eu vou. Eu irei rescrever a FIC inteira.

COMPLETAMENTE.

Incluir detalhes da vida do Harry, reformar, concertar, adicionar... É um monte de coisa.

Então, sim, é oficial. Depois do próximo capítulo, QUE VAI SER POSTADO ANTES DO FINAL DO ANO, a FIC vai ser rescrita, melhorada. Espero que entendam e aceitem, e gostem! Pois a FIC vai ficar muito melhor, eu tenho certeza.

Afinal, essa FIC esta perto de completar dois anos!!! Eu já me mudei duas vezes nesse meio tempo, EU mudei nesse tempo. Tem coisas que eu quero diferente.

Para terem uma ideia há esse bônus (que está no grupo) e que eu espero que leiam. Ele conta uma parte da infância do Harry e está atualizado pela... pela nova visão que eu tenho da FIC.

O próximo capítulo sai até o dia 31 desse mês! Sem falta!... Depois que a situação complica e volta a demorar.

Eu tenho ainda que responder alguns passados, mas tem muitas mensagens privadas que eu acabei perdendo :/

✧MFR

Eu quero pedir desculpas outra vez e agradecer também.
Gente, obrigada por tudo! Vocês são muito importantes para mim, estou com saudades e espero que falem comigo agora, por favor!
Comente , me digam o acharam das novidades.

—A FIC rescrita
—Harry morrendo
—Eu voltando

...ninguém, ninguém MESMO, mora no Tocantins? Serio isso???

Bom, beijos! Obrigada por lerem, por favor comentem ✧ᴗ✧