Setores de Sangue escrita por Carlos Junior


Capítulo 12
Capítulo 12: Respostas Solúveis




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Cour caminhava, com passos rápidos e largos, rumo ao fim do quarteirão. Estava atrasado para o encontro que ele mesmo havia organizado, chegava a ser engraçado. O conteúdo daquela reunião fora planejado com cuidado durante dois longos meses, e, inclusive, ainda existia a possibilidade de que nenhuma das pessoas que iria encontrar naquele momento concordasse com ele, já que ninguém além dele conhecia o propósito daquele encontro.

Porém, estava confiante de que lhe dariam ouvidos, teriam que dar, o que tinha a dizer era nada menos que uma solução prática sem muitas etapas de algo que, se conquistasse, receberia muito crédito. Infelizmente, tratava-se de algo politicamente incorreto, dessa forma resultando na omissão de qualquer informação sobre isso para quem não estivesse envolvido.

De repente, ele escutou um ruído, e olhou para trás. Havia uma caminhonete atrás dele, e lhe parecia familiar. Eva, tinha certeza que pertencia à ela, mas, se ela estava ali, com os faróis apagados e a velocidade do veículo reduzida, significava que o estava vigiando. Então, decidiu fingir que não havia visto nada, tornou o olhar para frente, e sorriu.

Ele realmente não nos enxergou? - perguntou Mero, franzindo a testa após perceber que o rapaz que perseguiam havia olhado na direção deles.

E assim como Mero, Eva também estava desconfiada.

Eu não sei - respondeu ela, encarando o andar de Cour, enquanto o homem se distanciava. Não estava à vontade para tratar Mero com desagrado, e o desconforto que sentia momentos atrás fora substituído por inquietação.

O que vamos fazer se, por acaso, ele nos viu? - Mero havia feito aquela pergunta com o objetivo de induzir Eva falar. Gostava quando ela falava.

A resposta veio para Eva em questão de milésimos.

Aguardar para ver o que ele pretende fazer - disse.

Cour permaneceu no mesmo ritmo que se encontrava antes. Não poderia alternar ou daria indícios de que avistara seus perseguidores. Sabia exatamente o que fazer para despistá-los.

Uma hora essa perseguição iria ficar óbvia de qualquer jeito - conformou-se Mero. - Não é melhor interrogarmos ele enquanto ainda temos a chance?

Eva não respondeu, estava concentrada demais nos passos constantes de Cour enquanto eles se direcionavam para uma papelaria que havia ali perto.

Ele nos viu - anunciou Eva, tentando, rapidamente, encontrar um lugar para estacionar no acostamento, sem sucesso.

Como você sabe? - os olhos de Mero foram de Eva para Cour, que já encontrava-se adentrando a papelaria. Estava confuso.

Eva freiou no meio da rua.

Desça - ordenou Eva.

O que? - indagou.

Agora! - ela virou o rosto raivoso para ele, que instantaneamente abriu a porta do carro e saltou. - Impeça que ele fuja por qualquer saída traseira que essa porcaria de papelaria tiver.

Mero acenou com a cabeça, havia finalmente compreendido, e correu para o interior do estabelecimento.

Não havia como deixar o carro parado ali, ou correria o risco de ser assaltada, ou, inclusive, o de ter seu veículo recolhido por órgãos governamentais. Eram um beco sem saída. Teria que permanecer em movimento, pois, além de tudo, o pequeno fluxo de carros que passava por ali aquela hora da noite lhe exigia isso.

Eva seguiu em frente levemente, até se tornar possível observar o interior da papelaria, onde não enxergou nada além de um balcão transparente, uma atendente mal humorada e uma série de estantes atrás dela. Cour já havia encontrado uma maneira de sair, com toda a certeza. Porém, ao sair, acabaria em algum lugar, e Eva daria a volta no quarteirão para encontrá-lo.

Ao contornar a esquina, deparou-se com Mero, correndo até a caminhonete, e exibiu uma expressão de incredulidade para ele.

Não encontrei - disse ele, abrindo a porta novamente e entrando no carro. - Ele é rápido.

Eva levou a mão à testa, e pisou no acelerador com força, mantendo a outra no volante.

Não podemos deixar ele escapar - exprimiu ela, olhando para o cenário à sua volta na esperança de encontrar quem procurava. Mas, após alguns minutos repetindo a ação, convenceu-se de que àquela hora Cour deveria estar longe. - O que, provavelmente, já aconteceu. Nós o perdemos.

Mero buscava algo bom para dizer. Algo como "valeu o esforço", mas não lhe parecia adequado.

Quer que eu ligue para ele? - perguntou ele, oferecendo uma solução um tanto quanto inútil.

Ficou maluco? - Eva lançou-lhe um olhar de reprovação, estava escorada sobre o volante e, não fazia a menor idéia de como encontrar Cour. A menos que utilizasse o rastreador de celular que fora implantado no aparelho de todos os integrantes do grupo. Algo que, infelizmente, apenas Zack sabia como fazer funcionar através do sistema de som da caminhonete.

Eram em momentos como aquele que ela sentia falta de Zack. E a falta que sentia dele já pairava antes mesmo do grande acontecimento envolvendo as gravações das câmeras de segurança do Setor 8.

Após o sequestro de Thomas, muita coisa havia mudado, inclusive seu relacionamento amoroso. Nada mais era como antes, e semanas após o ocorrido, Zack deixara o apartamento que dividia com sua esposa, seu filho e seu sogro para ir viver em um pequeno aposento próximo ao centro.

Eva suspirou.

Vamos para casa - falou.

Mero sorriu.

》》》

Eu tive uma idéia - disse Robert.

Pode falar - respondeu Wilbur, na tentativa de soar amigável, da mesma forma que havia agido aquela manhã. Mas estava com algo entalado na garganta. - Espera. Você apareceu no telão depois de mim?

Robert o encarou por um momento, com a boca aberta, e na tentativa de mudar de assunto, iniciou:

Eu estava pensando em te arrumar um disfarce - porém, ao dizer aquilo, percebeu que acabara de responder a pergunta que Wilbur lhe fizera.

Então você não apareceu no telão? - indagou, em tom de ironia. - Por que? - dirigiu-se à si mesmo.

Pois então - prosseguiu Robert, ignorando as conclusões que Wilbur havia feito anteriormente. - Eu estava pensando em nos aproveitarmos das roupas de Mayla - ele acenou para a mochila alaranjada que carregava. - para cobrir o seu rosto ou algo do tipo. Isso é tudo por ela, de qualquer forma.

Eu não entendo - Wilbur encarou a parede de aço ao seu lado, pertencente à uma das casas que cercava o beco.

Não entende o que? - Robert franziu a testa.

O por que de você também não ter aparecido no telão.

Robert suspirou.

Wilbur, estamos falando de uma forma de sair daqui - disse.

Wilbur acenou com a cabeça.

Sim, sim - ele alterou sua postura. - Continue.

Podemos usar algumas roupas da Mayla - Robert pousou a mochila no chão e tirou dela algumas peças de roupa, todas coloridas. - Qualquer coisa que não chame muita atenção.

Acho que eu ficaria muito bem com esse vestidinho roxo - brincou Wilbur, analisando as opções disponíveis.

Não é hora para piadas - Robert manteve uma expressão séria.

Você é muito sem graça - respondeu Wilbur, revirando os olhos.

Estamos em uma situação extremamente séria aqui - Robert tentava evitar um tom agressivo, para que Wilbur não sentisse que estava em uma discussão.

Mas é exatamente nesses momentos que rir é o melhor remédio - Wilbur fez o possível para ser claro. - Ajuda a relaxar.

Era estranho, mas naquele momento, Robert sentia-se íntimo de Wilbur, e com a frequência com que discutiam, o entendia como um verdadeiro amigo. Era como se se conhecessem de muito tempo.

Robert sorriu. Era divertido ver a maneira como Wilbur enxergava as coisas.

De repente, um pequeno guincho foi emitido da área próxima ao semicírculo.

O locomotor - identificou Wilbur. - Chegou.

Robert, em um movimento rápido, tirou a mochila do chão e a estendeu para Wilbur.

É melhor escolher - avisou.

Eu vou de roxo mesmo - Wilbur exibiu o vestido roxo, que ainda segurava na mão, e o colocou sobre a cabeça, permitindo que a gola da vestimenta exposse apenas uma parcela do seu rosto, o que incluía seu olho direito. - Vamos.

Eles correram o mais depressa que puderam para fora do breu que dominava o beco e, para suas sortes, conseguiram pegar o locomotor.

Você paga - sussurrou Wilbur, entregando discretamente um bolo de dinheiro para Robert, e escondendo o rosto com o vestido, em seguida.

》》》

Clarice chorava próxima a porta, estava desconsolada. Não queria considerar a hipótese de que Key, seu primeiro e único amor, havia delatado o romance secreto que guardavam com tanta dificuldade. Além do mais, não fazia sentido. Mas que outra hipótese consideraria?

Clarice? - pergunto ele, do lado de fora do quarto.

O que você quer? - respondeu ela, tentando parecer ríspida, porém sem sucesso.

Não acha melhor me deixar entrar? Vamos, me deixe entrar - pediu, sua voz expressava arrependimento.

Ela balançou a cabeça.

Não - disse, arduamente.

Ficar aqui sozinho sem você não é a mesma coisa - explicou Key, e ao perceber que não teria sucesso com aqueles argumentos, apelou. - Nós vamos descobrir quem enviou aquele comentário. Eu prometo. Nós dois. Juntos.

Mas tudo que Clarice fez foi afundar o rosto entre as pernas, e prosseguir com o choro.

Key suspirou. Não havia obtido uma reação positiva sequer de Clarice após o misterioso comentário que abalara sua noite, e aquilo lhe desagradava, por mais que estivesse tudo programado.

Ele puxou o aparelho celular do bolso, e buscou na agenda de contatos pelo nome. Cour. Era com ele que precisava falar.

》》》

Cour acelerava o passo conforme aproximava-se do endereço combinado, a residência de um primo cuja sala de estar era grande o suficiente para abrigar um grupo. Já havia abrigado, portanto, o grupo de Eva uma vez.

Ele empurrou a porta da casa, que estava encostada, e se dirigiu para a sala, que já estava ocupada.

Boa noite - cumprimentou ele.

As pessoas que o aguardavam tornaram a atenção para ele, algumas, inclusive, acenando com a cabeça em resposta.

Temos muito o que conversar - disse Cour, acomodando-se em uma poltrona de fibra.

Eu que o diga - respondeu Martin, ajustando-se no sofá.


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