Cupido estava na fila da cafeteria, hesitante sobre sua intenção. Certo, não tinha mais vínculo algum com o Escritório e suas regras, mas ainda era um Cupido. E se desse algum problema? E se Eros resolvesse ser um chefe razoável e o chamasse de volta, pedindo desculpas? Cupido queria o emprego de volta? Essa era a pergunta problemática, sua voz interior respondia simultaneamente “sim” e “não”. Mas ainda tinha outra pergunta, mais aterrorizante.
“E se ele já encontrou alguém?”
Cupidos apaixonados podiam ser os tutores do humano pelo qual se apaixonaram, e nisso Cupido sempre foi muito profissional. Esforçava-se para encontrar os melhores pares e dar uma vida feliz aos seus tutelados. Mas as flechas só podem causar a paixão. Se isso se torna amor ou não, depende do humano. Depende tanto que Marília tornava em amor sem passar pela paixão. Mas, depois de arranjar tudo, Cupido se afastava. Agora que tinha a chance real de viver uma paixão, as dúvidas não o deixavam em paz.
Dan fora o último por quem Cupido havia se apaixonado. Muitos outros nomes já haviam lhe conquistado durante sua longa existência. Cupido não sabia o que levava-o a se apaixonar por humanos. Com certeza não tinha a ver com o gênero, não tinha restrições nesse sentido. Cupido nem mesmo era um humano, por que escolheria gênero?
Talvez Dan tivesse transformado em amor a paixão pela Helena. Mesmo assim, havia certo fascínio de Cupido em estar frente a um futuro que não podia vaticinar.
— Vai pedir algo? – perguntou Dan, com uma leve inflexão de impaciência na voz. Ele era jovem e, Cupido sabia, tinha uma tendência a se distrair, razão pela qual não se importava muito em atender os clientes, mas a fila atrás de Cupido ficava maior a cada minuto a despeito de sua hesitação. Cupido não conhecia nenhuma das bebidas, então pediu qualquer café do cardápio.
— Obrigado, Dan… – falou, arrependendo-se ao ver o rapaz arquear as sobrancelhas, curioso. – É… Obrigado, é “danmais” essa bebida, eu adoro… – Tentou consertar, bebendo um longo gole, somente para descobrir que não gostava de café, mas se esforçou para fingir. Não sabia se fora convincente, mas o rapaz deu um intrigado sorriso, achando graça daquele cliente estranho.
— Nos conhecemos?
— Não, eu me lembraria… – “Droga!” pensou, com vontade de fugir e se esconder o mais depressa possível. – Tchau… – E se dirigiu para uma das mesas, uma em que ficasse de costas para o balcão do atendimento.